Este espaço se quer simples: um altar à deusa Themis, um forno que libere pão para o espírito, uma mesa para erguer um brinde à ética, uma calçada onde se partilhe sonho e poesia!
quinta-feira, 10 de dezembro de 2009
LEMBRANDO D. FRAGOSO
Meu amigo Boaventura Bonfim me lembra que, hoje, 10.12.2009, é aniversário de 89 anos de nosso querido D. Fragoso. Para o imortal bispo-profeta do Crateús, que me ensinou lições indeléveis de amor às grandes causas humanas, esculpi a seguinte crônica:
Jamais olvidarei sua silhueta severa e simples: a metálica voz, o andar inconfundível, o olhar cortante, a firmeza de aço na defesa dos ideais, a verdejante convicção brotando da alma árida de sertanejo.
Corria o ano de 1980 quando o conheci pessoalmente. Era o segundo ano da chamada “seca verde” (as chuvas eram suficientes para tornar verde a paisagem, mas insuficientes para gerar fartura). No País, muitas bocas falavam em “abertura”, palavra que eu pouco entendia. A eufórica expectativa nacional estava voltada para a viagem que o Papa João Paulo II faria ao Brasil.
Nessa ambiência de política e religiosa efervescência fui levado a Dom Antonio Batista Fragoso. Pensava, à época, em ser padre e subir ao altar da vida religiosa, que imaginava tranqüila, recatada e distante das tentações mundanas. Quanta ignorância!... O bispo me mostrou que, diferentemente do que eu imaginava, servir a Cristo era, sobretudo, servir à Justiça. Ao invés de velejar sobre águas tranqüilas, deveria me preparar para mergulhar num oceano de ondas tempestuosas.
(Logo comecei a ver o mundo com outros olhos e abri o meu coração à luz da vida: descobri a raiz do mal, as raízes do antagonismo de classes na sociedade piramidal, a engrenagem que gera a injustiça, o sonho de transformação, a festa do mundo, o pão da poesia!).
O menino de Teixeira, na Paraíba, fez-se Profeta no mais genuíno sentido bíblico. Nascido aos 10 de dezembro de 1920 no sítio do Riacho Verde, era o filho mais velho do agricultor José Fragoso. Entrou no Seminário Arquidiocesano da Paraíba em João Pessoa no ano de 1934 - onde trabalhou como porteiro – ordenando-se sacerdote no dia 02 de julho de 1944. De 1945 a 1948 foi Assistente Eclesiástico do Círculo Operário de João Pessoa. De 1948 a 1957 foi Assistente Eclesiástico da Juventude Operária Católica (JOC) do Nordeste. De 1944 a 1957 foi professor no Seminário Arquidiocesano da Paraíba.
Sagrou-se Bispo na Catedral de Nossa Senhora das Neves no dia 30 de maio de 1957, assumindo logo em seguida a função de Bispo Auxiliar de São Luiz do Maranhão, onde permaneceu de 1957 a 1964. Foi “Padre Conciliar” no Vaticano II, de 1962 a 1965. Nomeado Bispo Diocesano de Crateús em 1964, chocou a sociedade local com a proposta de uma Igreja Libertadora, que acabou com o privilégio dos ricos, despojou-se da ânsia patrimonialista e enfrentou, com ira evangélica, a ação dos mercenários de templos.
Durante o seu bispado em Crateús, no período mais ostensivo da ditadura, abriu aqui trincheiras de resistência democrática e hospedou, nos prédios diocesanos, amantes da liberdade dos mais diferentes credos. Escreveu vários livros, traduzidos em diversos idiomas. Teve o seu nome cotado para o Nobel da Paz. Proferiu palestras em quase todos os continentes do planeta. Ainda como padre novo, fez uma palestra em Paris que levou Rafael de Oliveira a dizer no jornal da Paraíba: “O menino pobre do Teixeira brilha em Paris”.
A eletricidade da coerência impulsionou toda sua trajetória. Fiel à sua profunda fibra existencial, foi residir nos últimos anos num bairro popular de João Pessoa. Faleceu em 12 de agosto de 2006.
Arquitetou um modelo de Igreja que priorizava a iluminação das consciências. Não erigiu prédios. Absteve-se de construir visíveis edifícios de concreto; ergueu templos à virtude no chão invisível das almas sensíveis. É impossível divisar sua obra em placas, estandartes ou exposições. Como os lençóis freáticos que, sem alarde, abrigam a água vital nos subterrâneos do nosso sertão, sua ação heróica repousa nos âmagos sublimes. Como ensinou Saint Exupéry, só a enxergamos com o coração!
(Júnior Bonfim)
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2 comentários:
Quintino Cunha
Rui Morto
Cerebração complexa e o primeiro
dos grandes homens nacionais em tudo.
Continente a viver do conteúdo
de si mesmo, na Pátria e no estrangeiro.
De virtudes, um másculo pioneiro;
da nossa Liberdade, eterno escudo;
deram-lhe tudo, menos sobretudo,
a direção do povo brasileiro!
Vivo, não fora a tanto necessário...
Morto, é tão grande, é tão extraordinário,
que encontra, em cada Estrela, um cemitério!
De onde passo a ilagir, um tanto aflito:
ou o Rui foi menos do que se tem dito,
ou este nosso Brasil é um caso sério...
Nota:
soneto feito de improviso,
numa mesa do bar Rotisserie,
em Fortaleza,
a pedido de Leonardo Mota,
quando da morte de Rui Barbosa.
José Quintino da Cunha, o Quintino Cunha (1875/1943), se tornou uma figura lendária no Ceará. Não há quem não tenha ouvido falar nesse notável poeta e advogado. Na verdade, menos pelas suas belas poesias do que pela fama de repentista emérito. No entanto, Quintino foi um dos vultos mais importantes da literatura cearense, além de poeta era contista, orador e advogado.(cearamoleque).
A Paciência do Juiz
Em uma cidade do interior cearense, das muitas pelas quais Quintino andava, um rico e portanto importante morador achava de insultar sempre um pobre e infeliz bêbado muito popular na cidade.
- Bêbado safado! Vagabundo! Corno!
E todo dia era a mesma história. Durante dez anos o pobre homem agüentou as ofensas. Mas um dia a paciência acabou e o bêbado matou o ofensor.
Nenhum advogado queria defender o coitado.Quintino, sabendo do acontecido, logo se apresentou como advogado deste.
No júri, o promotor praticamente liquidou com as chances de defesa do inditoso acusado.
Já o Quintino, iniciou com estas palavras:
– Meritíssimo senhor juiz!
– Meritíssimo senhor juiz!
– Meritíssimo senhor juiz!
Por dez minutos o intrépido advogado repetiu essas palavras dando uma leve batida na mesa. O juiz se impacientou e falou.
Doutor Quintino, eu não agüento mais, pare com isso e comece logo!
Era só o que o Quintino queria ouvir para arrasar o argumento do promotor.
– Meritíssimo senhor juiz, por apenas dez minutos eu repeti um respeitoso elogio e Vossa Excelência já se impacientou. Imagine então, um homem agüentar, por dez anos seguidos, os maiores insultos, pelo simples motivo de se embriagar…
– O acusado foi absolvido por unanimidade.
(Do anedotário popular – Redação: Ceará-moleque
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