Pode descer
Juscelino Kubitschek era um personagem de romance. Suas histórias aéreas matavam de medo os companheiros da campanha e, depois, do governo. Para ele, avião é para voar e acabou-se. Uma noite, na campanha, ia descer no interior do RS. As luzes da cidade apagaram-se, o campo não tinha pista iluminada, o piloto quis voltar para Porto Alegre. Juscelino ordenou:
- Pode descer. Deus é juscelinista.
Desceram. Era. Outra vez, voavam sobre a Amazônia. Pegaram uma tempestade terrível. Raios, trovões. O avião pinoteando no ar, como pipa, os líderes do PSD e PTB apavorados, de olhos fechados, duros, rezavam, suavam. Juscelino sorriu:
- Vou dormir um pouco.
Ninguém acreditou. Um mais incrédulo levantou-se, foi lá atrás, puxou a cortina da pequena cabine presidencial privativa. Juscelino dormia e roncava. Outra tarde, voltava de Salvador, anoiteceu em Caravelas, mas precisava voltar ao Rio. O piloto avisou:
- Governador, o combustível está acabando. Pode ser que não dê para chegar ao Rio.
Vieira de Melo, Getúlio Moura, José Maria Alkmin, João Goulart, apavorados, queriam descer em Caravelas. JK insistiu:
- Vamos. Lá a gente vê se deu.
Deu.
Reta final
Ainda é cedo para se fechar o painel de leituras. Mas os nomes que despontam na liderança de algumas capitais abrem a primeira hipótese: o eleitor está saturado das velhas caras. Não se trata de apenas escolher perfis mais jovens, mas pessoas que estão abrindo o leque da política. Vejamos alguns nomes: Carlos Amastha, de origem colombiana, do PP, lidera a corrida em Palmas, TO; Geraldo Julio, PSB, que ganhará o pleito em Recife, puxado pelo governador Eduardo Campos; Nelson Pelegrino, PT, que passou à frente de ACM Neto, em Salvador; Elmano de Freitas, PT, lidera em Fortaleza; Luciano Cartaxo, PT, lidera em João Pessoa; Mauro Mendes, PSB, está na frente em Cuiabá; Alcides Bernal, PP, em Campo Grande, passou Edson Giroto, do PMDB; em Manaus, a senadora Vanessa Grazziotin, do PC do B, empata com o ex-senador tucano, Arthur Virgílio. O que essas caras têm em comum? Assepsia política. Não tomaram banho nas águas da velha política.
O eleitor na última hora
Como o eleitor toma decisão de última hora? Ou seja, como escolherá o candidato se está em dúvida na última semana? Ele conversa com amigos, troca ideias, põe o sistema racional para funcionar, deixando o espaço motivo de observador. Vê os últimos programas de TV, analisa as informações gerais dando conta de fenômenos que incidem sobre partidos e atores. Joga a massa informativo-analítica na cachola, sacoleja as ideias e acaba optando por um perfil. Nesse instante, também é movido pelo instinto de selecionar o candidato com mais chances de ganhar. Ou seja, acaba praticando um voto útil. Mas, que fique bem claro: esse processo só se desenvolve no eleitor que ainda está indeciso.
Russomanno segura?
A expressão contundente é mais intensa nos programas eleitorais nesta final de campanha. Em SP, berço da maior campanha eleitoral do país, os candidatos José Serra, Fernando Haddad e Gabriel Chalita elegeram Celso Russomanno como alvo preferencial. Que é comparado ao ex-prefeito Celso Pitta, já falecido, e eleito sob as graças e o antigo prestígio de Paulo Maluf. O foco da mensagem procura argumentar sobre o despreparo do candidato do PRB e, ainda, o fato de ser candidato de uma Igreja Evangélica, a Universal do Reino de Deus, comandada pelo bispo Edir Macedo. A questão é: o discurso da desconstrução de Russomanno mudará o voto do paulistano? Ele conseguirá segurar a taxa de 30% de intenção de voto? Os 5% que perdeu nos últimos dias são efeito do ataque massacrante sobre ele?
É possível
Sem dúvida, os ataques que procuram desconstruir a fortaleza em que se refugiou o candidato do PRB estão conseguindo abalar seus alicerces. Os votos do petismo na Zona Leste, que concentra a maior densidade eleitoral de SP, começam a voltar ao leito. Haviam se desgarrado. É o que algumas pesquisas constatam. A conferir.
Proximidade
Já se procurou analisar o fenômeno Russomanno sob diversas teses, cada qual tendo sua razoabilidade. Argumenta-se, por exemplo, sobre o conservadorismo do eleitorado paulistano. Que se inclina a votar em um perfil mais conservador, no caso, o candidato do PRB. Mostra-se que, ao longo dos últimos 20 anos, ele teceu a couraça do defensor dos pobres, a partir do eixo de defesa do consumidor. Ou seja, agora está puxando os consumidores para a arena dos eleitores. Diz-se, ainda, que o eleitorado está saturado da polarização entre PT e PSDB. E Russomanno se apresentaria como opção para fugir a esta velha arenga. Todas essas hipóteses são passíveis de demonstração. Tentando resumi-las em um só conceito: proximidade. Celso Russomanno cresceu por ter conseguido se apresentar como o candidato mais próximo das margens sociais. Proximidade abre outros conceitos: conhecimento, popularidade, intimidade, amizade. Escopo que confere aos conjuntos eleitorais autonomia de decisão. Um voto sem chancela das celebridades políticas.
Segundo turno
Quem irá ao segundo turno no pleito paulistano? Russomano estaria com passagem comprada. Mas... E José Serra e Fernando Haddad? Quem tende a subir? Este analista ainda não consegue enxergar a dupla que correrá a segunda volta. O fato é que o segundo turno apresenta uma arena diferente do campo de lutas. Os tempos de TV serão iguais: 10 minutos. O eleitor terá melhores condições de fazer comparação entre os dois perfis. Portanto, os critérios de escolha levarão em conta a razão e não apenas a emoção.
2014
Tenho feito muitas palestras. Lula volta ao cenário político? Respondo: ele ainda não saiu. É o patrocinador de muitos candidatos. O Guru do PT. Volta a ser candidato à presidência da República? Não acredito. Ele se dá bem no papel de orientador-mor do PT. Dilma será candidata à reeleição. Lula será um grande eleitor. Se a saúde assim o permitir.
Ganhos
"Com talento ganhamos partidas; com trabalho em equipe e inteligência ganhamos campeonatos". (Michael Jordan)
Daniel, o riponga
Vejam como o eleitorado brasileiro gosta de mudar os ambientes e a causar surpresas. Pois não é que o tucano Daniel Coelho, um riponga que se veste à moda hippie, tomou o segundo lugar em Recife, desbancando o senador petista Humberto Costa? Quem diria, hein? A se confirmar sua posição, o PT sofrerá uma das mais contundentes derrotas, ou seja, em Recife. O candidato do PSB de Eduardo Campos, Geraldo Julio, navega firme em primeiro lugar. Curiosidade: o tucano riponga entrou maneiro no gosto dos jovens. É a novidade que gera impacto na programação eleitoral.
Teori
O ministro Teori Zavascki não se submeterá a bateria de críticas gerais - a partir da onda midiática - caso entre em tempo no STF e decida julgar os réus da Ação Penal 470. Tem um perfil de juiz recatado, sem gosto pelo espalhafato. Para julgar, deve se considerar apto. É evidente que ele, sob o aspecto formal, reúne todas as condições para entrar no jogo. Na visão deste analista, estará contemplando a cena. Sem expor seu juízo.
E a Copa, hein?
A Copa do Mundo terá influência sobre as eleições de 2014? Sem dúvida. Se o Brasil sagrar-se campeão em junho, as eleições de outubro consagrarão a candidata governista. O ambiente festivo e a catarse nacional emoldurarão o perfil da presidente Dilma. Se o Brasil for derrotado, parte da indignação poderá (não necessariamente) recair sobre o governismo. Principalmente se a economia estiver na UTI.
Uma Justiça que trabalha
Sob esse título, este escriba dedicou sua análise dominical no Estadão (12/8/2012) à Justiça do Trabalho. Alguns dados causaram impacto: em 2011 chegaram às prateleiras da Justiça do Trabalho 3.069.489 processos, dos quais 3.016.219 foram julgados. Os números mostraram que, a cada 100 mil habitantes, 88 ingressaram com ação ou recurso no TST, 296 nos TRTs e 1.097 nas varas do Trabalho, uma expansão de quase 2% em relação ao ano anterior. A seguir, fiz uma análise dos fatores responsáveis pela expansão dos conflitos trabalhistas.
Produtividade
A Justiça do Trabalho, dizia, apresenta desempenho dos mais produtivos do Poder Judiciário, bastando anotar os resultados de suas instâncias: o TST, em 2011, decidiu 206,9 mil processos dos 211,7 mil recebidos, enquanto os TRTs receberam quase 757 mil, julgando mais de 722 mil ações. A carga de trabalho dos ministros impressiona: 15.857 processos para cada um, considerando, ainda, que o TST reduziu em cem dias o tempo médio de tramitação de processos. Já a primeira instância recebeu 2.135.215 processos e decidiu 2.052.487 casos. E quase R$ 15 bilhões foram repassados para pagamento a trabalhadores que ganharam ações. Esse eixo do Judiciário é um dos mais integrados à modernização. A tramitação eletrônica dos processos judiciais, que simplifica a burocracia e torna a Justiça mais ágil, já é realidade. Os advogados festejam o fato de hoje ser cada vez mais possível enxergar o fim de uma ação trabalhista, ao contrário do que se constata nas áreas civil e tributária. Outra nota de destaque é a transparência: o TST foi o primeiro dos tribunais superiores a divulgar salários de ministros, juízes e servidores.
O recordista
Hoje, o registro vai para o nome do ministro Emmanoel Pereira. Em 2009, o ministro solucionou 14.529 processos, finalizando aquele ano com o saldo de 2.707 processos conclusos. E mais: ao longo dos 70 anos de Justiça do Trabalho, no Brasil, foi o que mais solucionou processos. Dados dos relatórios do TST. Registro que orgulha a Nação Potiguar, o RN, terrinha do ministro, sob o reconhecimento de outras Nações brasileiras.
Bela história
Lembrando: em 1932 criaram-se as Comissões Mistas de Conciliação e as Juntas de Conciliação e Julgamento. A Justiça do Trabalho apareceu em 1939, tendo sido regulamentada em 1940 e instalada no ano seguinte. Dois anos depois veio a CLT, reunindo e ampliando a dispersa legislação feita em duas décadas. Os dissídios individuais e coletivos passaram a formar o escopo da Justiça do Trabalho. As mudanças, ao longo dos anos, contemplaram as transformações socioeconômicas e nichos, como as questões portuária e previdenciária e as ações de indenização por dano material e moral decorrentes de acidente de trabalho e de doença profissional. Bela história.
Ética sob dúvida
A Comissão de Ética Pública entra na lupa dos observadores que formam opinião. Qual será sua próxima decisão? Pelo visto, o veto da presidente Dilma à renovação do mandato de dois conselheiros colocou um ponto de interrogação na trajetória da Comissão. Que se encontra na encruzilhada.
A calma
"A calma é a loucura dos sábios". (Napoleão Bonaparte)
Guerra na indústria do álcool
Produtores e envasadores de álcool estão atônitos com recente decisão da Justiça de reconhecer o direito da Anvisa em proibir a venda do álcool líquido ao consumidor. A alegação é de que os acidentes com o produto estariam aumentando. O estudo que comprovaria a tese, no entanto, tem sido alvo de críticas, já que nem na audiência pública da Comissão de Defesa do Consumidor da Câmara Federal a Anvisa o apresentou. Produtores acreditam em lobby da indústria multinacional para retirada das empresas nacionais do mercado de limpeza.
Dizendo não
Mesmo na noite mais fria
Em tempo de servidão
há sempre alguém que resiste,
há sempre alguém que diz não. (Manoel Alegre)
Conselho ao eleitor
Esta coluna dedica sua última nota a pequenos conselhos a políticos, governantes e líderes nacionais. Na última coluna, o espaço foi destinado aos assessores dos candidatos. Hoje, sua atenção se volta ao eleitor:
1. Examine a vida dos candidatos a prefeito. Escolha o de sua preferência, ancorado em: passado limpo, vida decente; melhores propostas em sua visão; perfil mais próximo a você; credibilidade.
2. Veja se as propostas são factíveis. Se não são apenas promessas mirabolantes.
3. Entre os candidatos a vereador, examine os compromissos daqueles que você considera os mais aptos e sérios. Escolha o perfil que atenda com mais precisão as demandas das comunidades.
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(Gaudêncio Torquato)
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