Eleições diretas
Durante a campanha pelas Diretas Já, em 1983/84, o jornal Folha de S.Paulo transformou o assunto em sua bandeira, até com uma fitinha verde-amarela no alto da primeira página. Noticiário e editoriais davam como garantida a vitória da emenda que devolvia ao país as eleições diretas para presidente da República, depois de vinte anos de ditadura - a emenda Dante de Oliveira. O jornal cantava a vitória e abria fotos do povo nas praças. A contagem a favor só crescia. Seu concorrente, O Estado de S. Paulo, era bem mais sóbrio e cauteloso e tinha lá seus motivos. Um deles, um informante especial em Brasília. Ao ser questionado sobre a contagem da Folha, que dava mais de cem votos a favor da emenda, o informante deu uma boa risada ao telefone e completou assim a conversa:
- Meu filho, fique tranquilo, eles não sabem contar.
Era Tancredo Neves. (Da coleção de Luciano Ornelas)
Valério, uma bomba?
Marcos Valério conta que dinheiro do mensalão foi parar nas contas de Lula. A declaração, registrada pelo Estadão, que teve acesso a documentos, pode ser tentativa de chutar o pau da barraca e botar mais lenha na fogueira? Pode. Mas não deve ser descartada. Urge apurar todas as informações e versões. Ocorre que a apuração, a esta altura, seria de responsabilidade de um juiz de primeira instância, eis que Lula não goza mais de foro privilegiado. Portanto, abriria um novo processo. Quem acredita que isso pode ocorrer?
Perdeu a oportunidade
A fala de Marcos Valério entra no fosso das dúvidas porque ocorreu depois da condenação. Procurou o MP para entrar no compartimento da "delação premiada". Ou seja, chegou com atraso.
Se Lula fosse o alvo...
Este consultor não tem nenhuma dúvida. Se Luiz Inácio fizesse parte da relação de incriminados na denúncia sobre mensalão, o processo não ganharia continuidade. Estaria trancado nas gavetas. Avançamos muito em matéria de direitos humanos, cidadania e avanços no terreno dos valores republicanos. Mas não a ponto de queimar por completo o perfil mais carismático do país. Lula continua a encarnar a figura do "pai dos pobres". Nessa condição, ganharia um gigantesco escudo de proteção. Não seria tosquiado pela fogueira.
E agora?
Tudo pode recomeçar se Marcos Valério mostrar documentos cabais, provas densas, revelações bombásticas. É pouco provável que tenha esse acervo. Há, isso sim, muita especulação. Teria recebido ameaças de morte? É possível. Conta que teria ouvido de Paulo Okamotto, que dirige o Instituto Lula: "Ou você se comporta ou morre". Mas, por enquanto, é a palavra de um condenado no mensalão como operador do sistema.
Lula e Dilma
Quase 3 horas de papo em Paris. Foi quanto durou a conversa entre a presidente Dilma e Lula em um hotel da capital francesa. Longe dos telefonemas e dos curiosos. Certamente passaram os olhos nos últimos acontecimentos: mensalão; comportamento de ministros; condenações em regimes aberto e fechado; o caso Rosemary; as implicações para o PT e impactos sobre o governo; o cenário pré-eleitoral; as eleições para as presidências do Senado e da Câmara; as MPs em tramitação, etc. Pauta densa. Dilma fazendo consultas e Lula dando as suas impressões.
Direção das casas legislativas
Está acertado. As casas legislativas deverão ficar sob o comando do PMDB. O fato é que, no Senado, o rito é de que o partido com o maior número de senadores tem direito à presidência da mesa. Ali é uma tradição. O nome deverá ser Renan Calheiros. Na Câmara, o PMDB fez um acordo com o PT. Cedeu a presidência na atual legislatura para ganhar o comando na próxima. Acordo assinado pelas lideranças partidárias. Há resistências a esse acordo? Há. Grupos de deputados têm se rebelado contra acordos feitos pelas cúpulas. No caso do deputado Henrique Alves, o indicado do PMDB, vale lembrar que se trata do parlamentar com o maior número acumulado de mandatos naquela casa. Chegou ali com 22 anos. Ademais, é líder do partido em seguidas legislaturas. Trata-se de um deputado com muita experiência.
Para a esquerda, não vou
Depois de eleito presidente da República pelo Colégio Eleitoral, em eleição indireta, Tancredo Neves começou a ser pressionado para empunhar algumas causas do PT - aliás, partido que se omitiu naquela eleição; mas não se sabe se já era aliado de Paulo Maluf na ocasião, em 1985. A pressão chegou a tal ponto que Tancredo teve de ser duro, à sua maneira:
- Não adianta empurrar, para a esquerda eu não vou.
Uma figura pública
Ontem, demos adeus a uma grande figura pública: dr. Dante Ancona Montagnana, presidente da Federação dos Hospitais, Clínicas, Casas de Saúde, Laboratórios de Pesquisas e Análises e outros estabelecimentos de Saúde do Estado de São Paulo. Era também presidente do Sindicato. Uma figura incansável em defesa de sua classe. Um lutador. Acompanhei sua luta por bom tempo. Gentil, afável, educado, nunca o vi levantar a voz nem quando demonstrava irritação. Seria homenageado, hoje à noite, com um jantar e as palmas dos muitos amigos. Adeus, dr. Dante!
A saúde pública
Eis o que pensava sobre a saúde pública em nosso país: "a deterioração da saúde pública já vem de longa data ..O SUS é, teoricamente, o sistema público ideal e ninguém pode dizer o contrário. Só que não podemos tapar nossos olhos e bater palmas, porque ele não está funcionando como deveria, pois não dá ao cidadão o seu direito garantido constitucionalmente: a saúde - direito de todos e dever do Estado. O Estado não cumpre seu dever, ou seja, não aumenta os recursos para a saúde, deixando a rede privada, principalmente a filantrópica, com a responsabilidade do atendimento, mesmo que isto represente um déficit em cada procedimento, o que tem levado as Santas Casas a uma insolvência como nunca nos últimos anos".
Cassação de mandatos
Mais uma pendenga se forma. O STF deverá votar, hoje, por maioria de 5 a 4, pela cassação de mandatos de parlamentares condenados na Ação Penal 470. Há interpretações para todos os gostos. O presidente da Câmara, Marco Maia, diz que não acatará decisão do Supremo, pois a CF garante (art. 55) que essa é uma prerrogativa da Casa. O Supremo, por maioria, decide que parlamentar condenado perde o direito à representação. Se perde os direitos políticos, como continuar a ter esses direitos? Um condenado em regime fechado (é o exemplo in extremis) como poderia dar o voto na Câmara? Seria seu voto colhido na prisão? Será que a Câmara não deveria verificar apenas se todos os rituais de cassação foram cumpridos? É claro que deve haver alguma manifestação da Câmara. O dono do mandato é o povo.
Imagem forte
A presidente Dilma Rousseff continua a manter imagem forte perante o eleitorado, principalmente os contingentes situados nas margens. Mensalão, affaire Rosemary e denúncias de favorecimento envolvendo quadros da administração Federal não têm impactado negativamente a imagem da governante. A pergunta é recorrente: qual é a razão? Este consultor enumera: 1. o perfil envolvido no manto técnico, que lhe confere a imagem de faxineira; 2. a maneira rápida com que toma decisões, mandando demitir os implicados; 3. a expansão do cinturão social (programas Brasil sem Miséria e Brasil Carinhoso, extensões do Bolsa Família). Enquanto correr o dinheirinho no bolso das margens sociais, Dilma continuará com a imagem inabalável.
A locomotiva econômica
E como será o quadro eleitoral? Dilma será reeleita? Resposta: se a locomotiva econômica se mantiver nos trilhos, o trem correrá sem solavancos rumo à plataforma 2014. Crescimento poder ser até baixo em 2013, algo em torno de 3% a 4%. Mas se as margens sociais continuarem a se acomodar no gigantesco cobertor social, Dilma deverá continuar sentadinha na cadeira central do Palácio do Planalto. Pois os eleitores mais uma vez se guiarão pela geografia do voto : bolso, estômago (geladeira cheia), coração e cabeça.
Custos adicionais
As empresas de segurança privada estão preocupadas com os impactos da aprovação do PL 1033/03, que garante adicional de periculosidade de 30% sobre o salário dos vigilantes. Isso porque o custo operacional por posto de trabalho deve passar dos atuais R$ 12.257,67 para os R$ 14.129,74. Só nos cofres públicos, estimativas apontam um impacto adicional de R$ 187 mi por mês. "Não queremos deixar de pagar o adicional nem queremos demitir. Porém, precisamos conceder o benefício gradativamente para que não haja impacto negativo", argumenta João Palhuca, vice-presidente do Sesvesp (Sindicato das Empresas de Segurança Privada do Estado de São Paulo).
A vingança dos prefeitos
Não são poucos os homens públicos que merecem figurar no Portal da Indecência. São aqueles que se vingam contra o povo ao não se reelegerem ou não elegerem seus candidatos. Por perversidade, suspendem serviços básicos ou essenciais que eram prestados até o dia das eleições; relaxam na limpeza pública; exoneram professores e atravancam o calendário escolar; suspendem o transporte de alunos da rede municipal e até chegam a propor (escárnio...) que os servidores trabalhem como voluntários, sugerindo que peçam recontratação ao próximo prefeito. Vingadores. Indecentes. Merecem a navalha afiada do MP. E o desprezo dos eleitores nas eleições futuras. Só em Pernambuco, o MP enquadrou 45 prefeitos. Dentre eles, o ex-presidente da Câmara, Severino Cavalcanti, prefeito de João, alvo do TCE e do MP.
Conselho aos injustiçados
Esta coluna dedica sua última nota a pequenos conselhos a políticos, governantes, membros dos Poderes e líderes nacionais. Na última coluna, o espaço foi destinado aos membros dos Tribunais. Hoje, os conselhos vão para os injustiçados, aqueles com fome e sede de Justiça:
1. Procurem persistir em seus sonhos. Não se deixem abater pela onda de injustiças que bate à sua porta. Não desanimem. Avante. Tenham fé.
2. O grande Ruy já dizia: "A menor injustiça pode operar instantaneamente as mais sanguinosas comoções, como uma gota d'água poderá determinar o esboroamento de um dique fendido lentamente pelos anos, ou a mínima fagulha produzir uma conflagração num depósito subterrâneo de explosivos". Mesmo sabendo de tudo isso, procurem conter as fagulhas de sua alma. Na crença de que, um dia, a injustiça será sanada.
3. Rezem para que os instintos mais selvagens de figurantes da cena institucional voltem a se banhar nas fontes do Humanismo, da Caridade e da Justiça!
(Gaudêncio Torquato)
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