"Seu filho não passa"
Abro a coluna com a cultura mineira.
Em 1922, Noraldino Lima era diretor da Imprensa Oficial de MG. Jornalista e professor. Personalidade marcante na política mineira. Com audiência marcada, Noraldino recebe em seu gabinete um coronel, chefe político no interior de Minas, acompanhado de um rapazinho, e um pedido de emprego irrecusável: o aval do governador. Noraldino conversa com o filho do coronel, com o objetivo de verificar a capacidade intelectual do jovem. Terminado o vestibular, diz Noraldino:
- Coronel, seu filho está colocado. Vai ser assistente no meu gabinete. Amanhã sai a nomeação no Minas Gerais.
- Mái doto Norardino, tenta argumentar o coronel, o minino num tem preparo, só dá pra contíno...
- Vai ser assistente de gabinete, coronel, insiste Noraldino.
E antes que o coronel surgisse com outro argumento, Noraldino encerra a audiência:
- Para contínuo, caro coronel, existe concurso... e no concurso, seu filho não passa.
(Historinha contada por José Flávio Abelha em A Mineirice)
Pessimistas x otimistas
A cada dia, fica mais patente a querela entre pessimistas e otimistas. Os primeiros são adeptos da deterioração da economia brasileira e os segundos apostam no cavalo econômico sob cabresto, mesmo que este se esforce para se livrar da pressão. Os pessimistas crêem que a economia, às margens eleitorais de 2014, darão às oposições condições reais de entrar no segundo turno eleitoral e, naquele momento, se unirão para derrotar a candidata Dilma Rousseff. Os otimistas vêem o cenário menos perturbador, mesmo com inflação entre 6% e 7%. Se o bolso das margens sociais continuar garantindo a geladeira abastecida, a barriga cheia empurrará a satisfação para o coração. Que, agradecido, mandará a cabeça votar na presidente Dilma.
2º turno
Analisemos os eventuais quatro candidatos, a partir da premissa de que Marina Silva conseguirá formar a sua Rede Sustentabilidade até 5/10. Teremos: Dilma, Marina, Aécio e Eduardo Campos. Sob esses quatro nomes, a possibilidade de a campanha entrar no segundo turno é bem viável, algo entre 50% a 60% numa medida de 100%. No segundo turno, o governismo conta com a vantagem de uso das estruturas : governos de situação, candidatos da base, espaços governativos que funcionam como feudos, cabos eleitorais. É o que se chama de máquina. As oposições terão também as suas estruturas, a partir de governos importantes, como os de SP e PR. Mas o situacionismo no Brasil é um rolo compressor maior.
Chances
Dilma continua sendo a favorita. Hoje, conta com 35% dos votos. Mas poderá subir nos próximos meses, na esteira de uma economia sob controle e continuidade da operação bolsa família. Marina é a grande incógnita. Hoje, com 25% dos votos, tenderia a crescer? Vai depender do clima ambiental, a situação da economia, a indignação social, a maré dos movimentos. Ela é a que mais ganha com a perda de governantes inseridos no baú da velha política. Mas terá pequena visibilidade na campanha. E seus recursos financeiros, escassos, poderão afogá-la antes mesmo de chegar à praia. A depender dos ventos (suaves, fortes?) da primavera de setembro de 2014. Já Aécio Neves tem dificuldade de encarnar o manto da novidade. A jovialidade do perfil não encobre a camada da matreira mineirice, extensão do conservadorismo. Eduardo Campos, mais que Aécio, tem potencial de crescimento. É possível, porém, que lhe falte apoio dos próprios correligionários do PSB, a partir dos irmãos Gomes, do CE.
Por pouco
Estas primeiras projeções, sujeitas a chuvas e trovoadas, jogariam o candidato no segundo turno a poucos metros da vitória. Ou seja, o quadro indica hoje uma disputa ferrenha. Uma eventual vitória da candidata à reeleição se daria por margem bem menor que a da primeira eleição.
Uma união
"Toda a vida (ainda das coisas que não têm vida) não é mais que uma união. Uma união de pedras é edifício: uma união de tábuas é navio: uma união de homens é exército. E sem essa união, tudo perde o nome e mais o ser. O edifício sem união é ruína: o navio sem união é naufrágio: o exército sem união é despojo. Até o homem (cuja vida consiste na união de alma e corpo) com união é homem, sem união é cadáver". Padre Antônio Vieira (1608-1697)
E Serra, hein?
José Serra, é o que comenta nos últimos dias, teria decidido permanecer na floresta tucana. Tanto que se recusou a participar de eventos importantes do PPS, comandado pelo deputado Roberto Freire. José Serra é um perfil experiente. O mais experiente tucano, com exceção de Fernando Henrique. Saindo do PSDB, teria a imagem fragmentada. Seria uma saída sem brilho. Candidato à presidência, contaria com estruturas parcas e frágeis conjuntos eleitorais. Campanha é guerra. Sem arsenal, qualquer candidato morre logo no início da primeira batalha. José Serra deve levar em consideração seus potenciais, pontos fortes e pontos fracos.
São Paulo, interior
A esperança do governador Geraldo Alckmin, candidato à reeleição, é o interior de SP. O governador padece de um conjunto de problemas: 1. Não formou uma forte identidade, ao longo de seu tempo na política; 2. Não há um eixo forte na administração capaz de imprimir uma marca, um símbolo, uma ideia-força ao governo tucano; 3. O PSDB paulista sofre com o fenômeno desgaste de material. 20 anos de administração corroem a imagem. É inegável que o governador é um gentleman, educado, atencioso, bem-humorado, respeitador. Valores que o engrandecem como pessoa. Mas e as qualidades da gestão? Quem consegue distinguir o eixo da administração geraldina?
Mais médicos
É evidente que a administração Dilma, ao levar adiante o programa Mais Médicos, teve como inspiração as pesquisas. Nada se faz no governo sem a lupa sobre as ruas. O povão vai aprovar a estratégia de botar médicos nos fundões do país. E mais: esse poderá ser o algo mais que Dilma carecerá, no segundo semestre de 2014, para ganhar mais um diferencial sobre os outros candidatos.
Eixo das oposições
Qual será o eixo dos candidatos oposicionistas? Uma visão nova na economia? Um choque na infraestrutura? Que estratégias para crescimento auto-sustentado defenderão? Eis o dilema oposicionista. O país quer ver um projeto para a Nação. Um plano estratégico de desenvolvimento de longo prazo. Algo mais que fazer oposição por oposição, criticar por criticar. Campanhas precisam de discursos substantivos, não de paixões adjetivas.
Faxineira é metalúrgica?
O projeto 4330 sobre terceirização é um avanço para o país. Que abriga cerca de 15 milhões de trabalhadores terceirizados e temporários na esteira das tendências internacionais. Esse contingente tem os mesmos direitos dos trabalhadores normais. E as empresas prestadoras de serviços, os mesmos deveres nas frentes de impostos, tributos e benefícios aos trabalhadores. O que empaca é a questão dos recursos. A CUT quer multiplicar seu cofre de Tio Patinhas. Como ? Fazendo com que uma copeira, um limpador, uma faxineira, uma cozinheira que trabalhem numa metalúrgica sejam considerados metalúrgicos. Representados pelo sindicato dos metalúrgicos.
O cabo de aço do atraso
Ou seja, a CUT quer que a representação sindical seja feita por um de seus sindicatos. Ora, o maior sindicato dos terceirizados é o Sindeepres, que reúne 280 mil filiados. Ligado à UGT. A CUT, com seus sindicalistas, e apoio de alguns (poucos) deputados petistas, também sindicalistas, ao lado de conhecidos assessores que trabalham na Secretaria do ministro Gilberto Carvalho, agem como cabos de aço para amarrar o Brasil à árvore do passado. Manjaram a questão ? Grana, pecúnia. Pior: há um grupo que ameaça deputados que não votarem conforme sua orientação. Esse é o pano de fundo da República sindicalista, que aufere milhões do Estado para fazer vingar um pérfido neo-peleguismo, ainda vivo e agindo nos bastidores.
Renovação congressual
É arriscado dizer, hoje, que a renovação do Congresso Nacional será muito elevada, ou seja, algo como 2/3. Pergunta básica: quantos parlamentares, entre os atuais 513 deputados, partirão para a reeleição? Quantos candidatos a senadores sairão do atual conjunto de 81? Se não houver um número suficiente de perfis jovens e identificados com o eco das ruas, a composição congressual não passará por grandes renovações. O eleitorado terá de votar nas listas de que dispõem. E acabará votando em parcelas dos tradicionais perfis. A conferir.
Bancadas corporativas
Já a tendência de fortalecimento das bancadas corporativas é mais provável. A sociedade brasileira ganha, a cada dia, mais organicidade. Que se caracteriza pelo nucleamento de setores, grupos, alas. A crise da democracia representativa - e consequentemente o distanciamento entre o eleitor e sua representação política - propicia o adensamento dos grupos sociais. Daí a miríade de sindicatos, associações, federações, clubes, movimentos. Essas frentes constituem o aríete que faz pressão sobre as Casas Congressuais. Por isso, as bancadas que as representarão sairão fortalecidas em 2014.
O novo, cadê o novo?
Haverá muita procura pelo Novo, pelo perfil que se identifique com o avanço. Os novidadeiros serão prestigiados. Vamos ver onde serão encontrados.
Pros e Solidariedade
Um tal de Partido Republicano da Ordem Social e o Partido Solidariedade, este de Paulinho da Força, deverão ser criados mesmo antes da Rede Sustentabilidade, de Marina. Significará fuga em massa de parlamentares de um partido para outro. Partidos que ameaçam ver parlamentares fugindo: PDT, PDS, PP, PTB e outros menores.
Dúvida
Gilberto Kassab será candidato a governador, a senador ou a deputado? Trata-se de um dos mais hábeis articuladores políticos do país. A conferir.
Foro São Paulo
Informação de bastidor: a movimentação que tem tomado as ruas do país começou na esfera do Foro SP, espaço onde as esquerdas se refugiam para traçar suas estratégias. Diz-se que a ideia nasceu lá, animada pela visão de que o socialismo deveria ganhar as ruas sob o eco do povo. Mas o Foro perdeu o controle da situação. Os movimentos saíram de sua égide e patrocínio. Partidos políticos passaram a ser mal vistos. O Foro deu com os burros n'água. Estão pensando como rebobinar o fio do novelo.
Embargos infringentes
Se o STF aceitar julgar os embargos infringentes, a pizza da Alta Corte será motivo para aumentar o grito das ruas. Este consultor não aposta nessa hipótese. A conferir os passos do Supremo nesta semana.
Petróleo de libra
Se os americanos fizeram a espionagem sobre a Petrobras, é evidente que sabem tudo sobre o campo de petróleo de Libra. As empresas americanas vão participar do processo? E se ganharem? Serão carimbadas com a impressão de "cartas marcadas". O governo garante que não vai adiar esse leilão. Cada qual com seus segredos. Ou arremedos.
Caças americanos
Depois da espionagem voltada para os interesses econômicos e estratégicos, este consultor fica com a impressão de que a compra dos "caças americanos" pela Força Aérea subiu ao telhado. Os caças franceses e os suecos passaram a ter chances novamente?
Classe média
Atentem para o conjunto das classes médias: 100 milhões de eleitores. Definirão o futuro do país.
Solidariedade malandra
Fecho a Coluna com mais uma historinha de Carlos Santos, em Só Rindo 2:
Candidato a vice-prefeito da também enfermeira Fafá Rosado em 2000, Galba Silveira (irmão do então deputado Francisco José) é conhecido por sua permanente verve. Caminhando num corpo a corpo em favela da cidade ao lado da candidata, ele é atalhado por uma senhora maltrapilha, olhos fundos, couro e osso, desfiando lamúrias:
- Seu Galba, aqui a gente não tem nada. (...) Hoje ninguém comeu ainda. (...) Os bichinhos estão cheios de pereba e esse lamaçal não tem quem aguente...
À espera de um alento ($) ou alguma panacéia para tantos sofrimentos, ela ganha a "solidariedade à miséria" do candidato de outra forma:
- Como é que a senhora aguenta viver aqui? Mulher, se mude.
Conselho aos parlamentares
Esta coluna dedica sua última nota a pequenos conselhos a políticos, governantes, membros dos Poderes e líderes nacionais. Na última coluna, o espaço foi destinado aos governantes. Hoje, dedica sua atenção aos parlamentares:
1. Nas próximas semanas, deverá ser votado o PL 4330 sobre terceirização. Trata-se de lançar as bases das relações do trabalho do amanhã. Significa modernização e empregabilidade. Mas há forças retrógradas que lutam para amarrar o Brasil à árvore do passado.
2. Senhores deputados, tomem consciência dos aspectos inovadores, avançados que embasam o projeto 4330. E não se deixem levar por ameaças que, frequentemente, a CUT e outras forças fazem sobre o conjunto parlamentar. Chegou a hora de começar a fazer a reforma trabalhista.
3. Ao presidente da Câmara, Henrique Eduardo Alves, cabe não ceder às pressões de alas retrógradas que procuram semear o neo-peleguismo nas largas frentes das relações de trabalho no país.
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(Gaudêncio Torquato)
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