terça-feira, 7 de abril de 2009

POLÍTICA E ECONOMIA NA REAL



G-20, uma excelente surpresa!

A reunião do G-20 na semana passada se constituiu na mais importante das últimas décadas no que se refere à economia mundial. Foi um sinal político essencial para que a atual crise comece a ser superada. Foi significativa a disposição dos mais importantes países do mundo para negociar e abrir mão de posições iniciais. Dois exemplos que ilustram o que estamos a dizer : os EUA se dispuseram a discutir a maior regulamentação dos mercados e a Inglaterra - de fato um dos maiores paraísos fiscais do mundo em função dos benefícios que dá aos milionários de toda estirpe - dispõe-se a discutir a maior fiscalização de tais mercados "obscuros". Estes foram pontos, digamos, políticos. Do lado mais "prático", a capitalização dos organismos multilaterais (FMI, BIRD, etc.) também mostrou convergência das lideranças no sentido de criar mecanismos mais "automáticos" para atender às demandas de capital, tão necessárias depois da eclosão da crise, sobretudo no caso dos países mais pobres. No mercado financeiro há diagnósticos variados sobre tal reunião. Há os que desprezam os atos políticos vinculados as estes difíceis momentos. Afinal, dizem existir apenas uma "realidade objetiva" e que as iniciativas políticas pouco servem. Há os que viram nesta reunião de Londres outro e importante passo para o aprofundamento das políticas já praticadas. De nossa parte, julgamos essencial que os políticos demonstrem a todos o que estão a propugnar e realizar. Neste momento de crise é preciso atuar intensamente sobre as expectativas. Positivamente. Foi isto que ocorreu nos arredores da Corte de St. James. Os mercados agradeceram apesar do ceticismo de alguns...

G-20: a dúvida – I

A grande incógnita para muitos é a capacidade dos líderes do G-20 de levar adiante o mundo de boas intenções e boa vontade contidos no documento da cúpula de Londres. Com razão: no mesmo dia em que Barak Obama com seus companheiros se comprometiam em novas práticas de controle financeiro, o governo americano mudava as regras contábeis para seus bancos, facilitando a arte de "mascarar" perdas. Não foi um bom exemplo.

G-20: a dúvida – II

A incapacidade do Conselho de Segurança da ONU de encontrar uma solução de consenso para "chamar a atenção" da Coréia do Norte por ter disparado um foguete, mostra perfeitamente na prática as dificuldades reais de qualquer tipo de coordenação mundial na prática, seja no campo da política, seja no campo da economia.

G-20: a dúvida – III

Foi mais do que vaga a referência, no documento de Londres, à retomada das negociações da Rodada Doha da OMC. Os G-20 (que, aliás, são mais de 20) nem marcaram data para a reabertura das conversas sobre a liberalização do comércio internacional. Em momentos de crise interna, não há clima para assumir compromissos definitivos que podem comprometer os arranjos políticos internos.

Lula, The Good Guy !

É certo que, se o presidente Lula não brilhou entre as paredes durante as reuniões do G-20, certamente o presidente brasileiro colheu excelentes frutos políticos externos na sua passagem por Londres. O Brasil tem conseguido aumentar a sua importância na política internacional. É fato. Há certa surpresa que isto tenha ocorrido de forma mais notória durante as duas administrações do presidente Lula. Afinal, se trata de um "presidente-operário" que faz prevalecer o simbolismo político e diplomático por detrás deste papel. É igualmente fato que no mundo complexo em que vivemos, a coisa funciona. Sobretudo, quando se está em ambiente onde a língua não é o português. (Que importam os tropeços gramaticais do Presidente?). Todavia, se fugirmos um pouco desta lógica midiática, veremos que o nosso presidente está muito bem enquadrado ao "sistema" que outrora ele rejeitou ou contra o qual protestou. Neste contexto, Lula avança a passos largos, mesmo porque é "útil" à dinâmica da política internacional. Representa muito bem o papel dos "outros" e, convenhamos, não dá nenhuma dor de cabeça. Nem tem armas nucleares. Não adianta a mídia criticar Lula em função do que esta acredita ser o papel do presidente. A identificação dele com o povo é fato – basta ver os seus índices de popularidade - e sua imagem internacional construída cuidadosamente sob uma retórica conveniente a todos. Lula não é ameaça ao "sistema". É parte integrante do "sistema". Um capitalista detentor de quotas do FMI !

Lula, a frustração

O Itamaraty nem o Palácio do Planalto jamais admitirão, mas foi grande a frustração dos brasileiros em relação a alguns pontos das decisões e promessas do G-20. Nada, ou quase nada de relevante das pregações de Lula anteriores ao encontro foi levado em consideração. E o que foi, foi sobre a ótica dos EUA e da União Européia. O mais fino exemplo é que nem se "cheirou" a tese do "Estado forte", carro-chefe das novas idéias de Lula para a economia global.

Fatos e mercados

Dois sinais muito importantes e positivos surgiram no horizonte nas últimas semanas, a saber, o plano de capitalização das instituições financeiras norte-americanas e a reunião do G-20 acima comentada. Enquanto estes sinais não criam uma nova dinâmica, ainda estamos colhendo os frutos da tsunami da crise financeira que contaminou o mundo real desde o final de 2007. O desemprego nos EUA chegou ao patamar de 8,5% (5,0 milhões de pessoas). O crédito continua a se contrair. Para se ter uma noção, a maior parte das operações de crédito interbancárias no mercado internacional, segundo dados do BIS, têm prazo máximo de três meses. Quase todas as instituições financeiras multinacionais ainda estão reduzindo ativos – na média entre 20%-30% do total de ativos registrados ao final de 2008. Na Europa, os preços industriais caíram 0,5% em fevereiro, a maior queda em 10 anos. Em relação ao mesmo período do ano passado, os preços estão 1,8% menores. Trata-se de uma perigosa deflação entre os setores mais organizados da Europa e que simboliza a fragilidade da economia neste momento crucial. No segmento de consumo as vendas na zona do euro caíram em fevereiro 0,6% em relação a janeiro e 4% em relação ao mesmo mês do ano anterior. Estes são exemplos para nos lembrar que o processo de alastramento da crise está menos intenso, mas ainda não há evidências que apontem para uma contenção efetiva da queda da atividade econômica. Os mercados estão a viver do paradoxo entre o curto prazo muito incerto e negativo e as melhores notícias para o desempenho de longo prazo dos ativos. É o mercado internacional que dará o tom da recuperação econômica. Estamos numa crise severa dos países centrais. Para o Brasil, localizado na periferia do sistema, a crise tem contornos mais suaves, mesmo que muito relevante. Deve continuar assim, desde que a política econômica combine doses de coragem combinada com doses de sabedoria e responsabilidade. Até agora, no geral, a política econômica tem rumo certo no sentido de estimular a atividade econômica. Todavia, os riscos estão também à solta: a falta de transparência sobre o custo fiscal daquilo que está sendo gasto pelo setor público e a ausência de quaisquer reformas estruturais. A letargia do Congresso é sinal evidente do atual momento de ausência de reformas.

Bom sinal para a indústria

A produção industrial brasileira cresceu em nove das 14 regiões pesquisadas em fevereiro ante janeiro deste ano, na série com ajuste sazonal, segundo dados do IBGE. Apesar da queda em relação ao ano anterior ser muito significativa (-17%), a estabilização da produção industrial é uma boa notícia para o país. Trata-se de um sinal de que as políticas anti-crise estão a funcionar. A dúvida é se se trata de um processo sustentável de dois pontos de vista: (i) no que diz respeito às finanças públicas e (ii) perante o cenário externo, ainda em queda.

Recado aos investidores

Nestas próximas duas semanas o otimismo que prevaleceu nas últimas semanas, fruto da maior intervenção do governo dos EUA (novo plano de resgate de ativos dos bancos) sobre os mercados e da reunião do G-20, será testado. Inicia-se a temporada mundial de resultados das empresas negociadas em bolsa. A nossa visão é que muitos resultados ainda trarão surpresas negativas. Será um período de alta volatilidade, especialmente para o setor financeiro. Os ativos devem ter suas cotações ajustadas para baixo.

Fundos de Private Equity : com liquidez, mas poucos negócios

Um dos segmentos que menos sofreram durante a atual crise foram os fundos de private equity que normalmente investem no capital de empresas de capital fechado. O objetivo destes fundos é de obter retornos no longo prazo, normalmente depois de incrementada a posição financeira e a governança corporativa das empresas investidas. Apesar dos fundos terem disponibilidade de capital o que está a ocorrer é que os vendedores de posições, normalmente os empreendedores do negócio, estão paralisados – não querem vender suas posições a preços baixos (quando não baixíssimos). O mercado está travado à espera de um cenário mais confortável para ambas as partes.

Frase de banqueiro

A coluna esteve com um banqueiro de investimento na semana passada, daqueles versados em fazer bons negócios e com muitos diplomas de prestígio na parede. Frase ouvida e que dá a precisa imagem da crise no setor:

"Nunca fiz tão poucos negócios. E estes nunca foram tão banais. Simplórios. O capital está tão escasso que até operação de desconto de duplicatas está complicado. Além disso, os executivos do banco estão mais preocupados em manter o próprio emprego do que operar para o banco..."

A face explícita do protecionismo

Lobistas estão tentando barrar a proposta de Obama de taxar os lucros obtidos no exterior das empresas multinacionais norte-americanas. Há nesta medida do presidente norte-americano a clara intenção de encarecer os investimentos das empresas no exterior. Assim, em tese, Obama espera aumentar a taxa de investimento nos EUA a qual está muito baixa em função da baixíssima taxa de poupança do país. Esta medida per se evidencia os intentos nacionalistas do atual governo instalado na Casa Branca. A justificativa dos mentores econômicos da Casa Branca (e dos sindicatos) é que muitos países não taxam os lucros das multinacionais, logo criam uma desigualdade tributária que traz sérios efeitos para a competitividade americana. Pense no seguinte: se todos os países começarem a agir igual a Obama o que será dos investimentos transnacionais ? Este é um risco muito sério para a recuperação mundial. Todavia, há muitos flertando com este tipo de medida.

A reforma que não reforma

É comovente, como nesta segunda-feira em SP, num debate da Fecomércio, ver a convencimento do senador Marco Maciel sobre a possibilidade de aprovação da reforma política este ano. É um crédulo. O tema está voltando à baila por obra e graça dos presidentes da Câmara, Michel Temer, e do Senado, José Sarney, e o incentivo do Palácio do Planalto. Foi ressuscitado, na verdade, para fazer um pouco de fumaça e desviar a atenção da mídia e da opinião pública de assuntos mais espinhosos para eles. Na Câmara e no Senado, as denúncias de desvios de conduta. No governo, as dificuldades econômicas e as divergências que começam a pipocar na base governista por causa das disputas regionais. Na realidade, como já afirmamos várias vezes, se alguma coisa passar, não será de boa qualidade. É provável que venha a tal da "janela para infidelidade" para permitir trocas de partido, hoje quase totalmente barradas por decisão da justiça. Além disto, aproveitando os rescaldos da operação da PF na Camargo Corrêa, pode-se empurrar goela abaixo do eleitorado o financiamento público de campanha, sem regras que impeçam e punam os financiamentos ilegais, o caixa 2. Se pode piorar, vai piorar.

O PMDB na berlinda

Esta coluna esteve recentemente em Brasília e percebeu uma coisa: em algumas rodas peemedebistas, há séria apreensão com a situação do partido. Ele se expôs demais, humilhou alguns adversários em excesso e tornou-se, por isso, uma vidraça muito sensível. Não é à toa ou a esmo o tiroteio que atinge o Senado e o presidente da Casa, José Sarney. Espera-se para breve novas revelações abrangendo também o partido na Câmara. Quem conhece os bastidores do Congresso, garante que munição não falta. A trégua que o presidente Lula ordenou para ser celebrada entre o PT e o PMDB, os dois principais litigantes na história, não funcionou. E o PMDB está perdendo um pouco a arrogância que adquiriu nos últimos meses.

Arquivos vivos

Até hoje, a não ser em um ou outro caso excepcional, o Senado não efetivou, de fato, a demissão dos primeiros 50 diretores em excesso na casa. Alegam-se razões de ordem burocrática. Há outra, menos prosaica: os servidores do Senado, assim como da Câmara, são um repositório de informações sobre os parlamentares, boas, não muito boas e nada boas. Não é prudente provocá-los. Muitos estão se sentindo traídos, apontados como culpados únicos por coisas que fizeram a mando ou pelo menos com o conhecimento de seus superiores. E outros se sentindo injustiçados, pois nada têm a ver com as irregularidades, cumprem suas obrigações e estão sendo amontoados no mesmo saco. O vazamento das informações sobre o uso indevido e indecente que o senador Tasso Jereissati faz das verbas de passagem aérea, além de envolver a "vestal" oposição nos podres do parlamento, foi também um recado para todo mundo que o armário tem esqueletos para todos os gostos. O único diretor do Senado demitido realmente até agora foi o da área de Comunicações: providenciou por conta própria a lista dos gastos telefônicos de todos os senadores. Foi uma dessas balas perdidas que atingiu o senador Tião Viana com o celular emprestado à filha numa viagem dela ao México. O clima no Congresso é de tensão e desconfiança.

Rebelião à vista

É muito maior do que se imagina a insatisfação dos prefeitos com a situação do caixa das prefeituras, atingido, ao mesmo tempo, por uma queda geral das arrecadações federal, estaduais e municipais por causa da crise econômica e por efeito das "bondades" praticadas pelo governo federal com o IPI e o IR. Dos protestos locais eles vão passar a um protesto nacional em Brasília. Lula voltou a prometer que vai arranjar dinheiro para os mais necessitados. Já sabemos que não será fácil: as contas fiscais federais também estão no fio da navalha. E na esteira dos prefeitos, virão os governadores com suas reivindicações. Lula quer soluções urgentes porque sabe o peso eleitoral dos prefeitos. Há mais: as áreas mais atingidas são as cidades com menos de 20 mil habitantes, onde se situa o maior e mais fiel manancial de votos governistas. No embate entre eleições e responsabilidade fiscal há riscos sérios de a primeira vencer, apesar dos discursos em contrário do presidente e de seus ministros. O principal projeto de Lula e seus aliados hoje é fazer o sucessor dele e preparar o caminho para a grande volta em 2014.

Pergunta indiscreta

Alguém, por acaso, viu por aí a oposição ao governo federal e suas propostas para combater a crise? Quem tiver notícias, favor escrever para esta coluna.

Mandato a salvo

Pelo andar da carruagem – e pelo "empenho" de seus pares, a começar pelo comando da Câmara – o deputado castelão Edimar Moreira não tem com que se preocupar. Por conta das estripulias que cometeu, vai ficar uma hora de castigo de cara virada para a parede e depois 15 minutos ajoelhado no milho. E não se fala mais nisso.

"Política & Economia NA REAL" é coluna assinada pela dupla José Márcio Mendonça e Francisco Petros.

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