O MÉDICO JOÃO IZIDRO
João Izidro, casado com Chiquinha, tia de Otacílio Cartaxo, secretário da Receita Federal, pai do amigo Carlos Alberto e do psiquiatra-escritor, Luis Carlos, era pediatra, clínico geral e sábio. Atendia famílias de todos os recantos dos fundões da Paraíba. Sua clientela incluía Luís Gomes, cidade do RN na fronteira com a PB, onde este escriba nasceu e de onde, do alto da serra, contemplava Uiraúna, terra de Luiza Erundina e do primo Zé Neumanne. João Izidro foi o médico de minha família e era padrinho de Boanerges, um dos meus irmãos.
Um dia, em Cajazeiras, sua cidade, atendeu a uma velhinha que se queixava de "incômodo em todo o corpo". Fez as perguntas tradicionais:
- A senhora tosse?
- Às vezes, sim, às vezes, não.
- A senhora tem dor de cabeça?
- Às vezes, sim, às vezes, não.
- A senhora sente febre?
- Às vezes, sim, às vezes, não.
Paciente, o médico botou os óculos e escreveu a receita:
- Pegue a receita, minha senhora. Pode ir, a senhora vai melhorar.
A velhinha pegou a receita e tascou a pergunta:
- Doutor, e esse remédio, hein, como é que eu tomo?
A resposta do João veio no mesmo tom da voz da velhinha:
- Tome o remédio às vezes, sim, às vezes, não.
O CORONEL JUCA PEBA
Desconfiado e matreiro, o coronel Juca Peba não era de muita conversa. Tinha dinheiro, e muito, guardado sob o travesseiro. Até o dia que inauguraram a Agência do Banco do Brasil, em Cajazeiras. A gerente foi procurar o coronel Juca Peba com o argumento:
- Coronel, bote o dinheiro no banco. Vai ser guardado, bem guardado, e vai render juros.
Depois de muita conversa, e muitos cafés no varandão da casa, o coronel, ainda desconfiado, foi ao banco. Com 100 contos numa bolsa de couro. Tirou devagar o pacote. Contou. Uma, duas, três vezes. Depositou. Matreiro, ficou na espreita, na calçada, olhando, espiando o movimento do banco. Para ver se aquele troço não era tramóia. A desconfiança aumentou. Entrou no banco. Foi ao Caixa. Ordenou:
- Quero os 100 contos que eu botei aqui. Já.
Aflito, o bancário foi buscar o dinheiro. O coronel pegou o maço. Conferiu. Uma, duas, três vezes. E devolveu, sob a expressão juramentada:
- Eu só queria mesmo conferir. Pode guardar.
LOW PROFILE
Lula pediu a Dilma Rousseff duas a três semanas de reclusão. Motivo: abrigar-se do bombardeio contundente que se expandiu na esteira do depoimento da ex-secretária da Receita Federal, Lina Vieira. Dilma deixou de aparecer, segunda à noite, na abertura do 2º Encontro Nacional de Siderurgia, para a qual era a autoridade mais aguardada. Nos últimos dias, aliás, cresceu a fofoca em torno de outro nome petista para o lugar de Dilma Rousseff, caso ela não decole: Antônio Palocci.
PALOCCI, A BOLA DA VEZ
Palocci é o petista mais prestigiado e admirado no seio do empresariado. O STF decidirá, nesta semana, sobre seu futuro. Caso seja absolvido – como se espera – o ex-ministro da Fazenda terá pavimentada a estrada para andar em direção ao futuro. Terá dois desvios: um, em direção ao governo de São Paulo, mais provável; outro, direcionado ao Palácio do Planalto. Os dois destinos não seriam nada fáceis. A candidatura do deputado ao governo de São Paulo ou de qualquer outro petista enfrentará a barreira, quase intransponível, do candidato tucano, seja ele Geraldo Alckmin ou Aloysio Nunes Ferreira.
PLANALTO MUITO ALTO
Quanto à candidatura ao Palácio do Planalto, trata-se de um pesadelo de inverno. Primeiro, será tarefa remover Dilma Rousseff, que é a candidata sagrada e consagrada do presidente da República. Segundo, se Palocci viabilizar seu nome, certamente sobre ele cairá o verbo duro do episódio do caseiro Francenildo. Ao argumento da absolvição pelo STF – se for confirmado – levantar-se-á o contra-argumento: o espaço eleitoral reabrirá a questão. Ficará, sempre, uma camada cinzenta ofuscando o perfil.
MARTA, CIRO?
A verdade é que o PT não dispõe de quadro para enfrentar, em condições de ganhar o pleito, uma candidatura tucana em São Paulo. Há uma predisposição negativa no contorno do PT e seus quadros, mesmo que alguns deles sejam palatáveis – e bem palatáveis – para núcleos de elite, como o próprio Palocci. Mas a transformação do PT em geléia partidária – repartindo com os demais o ônus da pasteurização – tira suas condições de competitividade. Marta Suplicy continua tendo o maior recall. Mas é antipatizada pelas classes médias. Ciro Gomes poderia ser o candidato, indicado por Lula, e apoiado pelo PT. Tiraria boa fatia de votos. Mas não ganharia a eleição. O PT está enrolado em SP.
FECHANDO AS ALIANÇAS
Lula chamou Michel Temer para um almoço e pediu a ele que começasse a organizar com Ricardo Berzoini o mapa das alianças para 2010. O PMDB, por boa maioria, tenderá a fechar apoio à candidatura do PT, ou seja, à Dilma. Mas parcela do partido fechará com José Serra, como o PMDB paulista, sob domínio de Orestes Quércia, e o pernambucano, controlado pelo senador Jarbas Vasconcelos. Quércia, um dos mais ricos do Brasil, quer voltar a ser senador. Tem vaga garantida na chapa paulista. Mas as urnas tendem a não lhe ser favoráveis. Quércia, como Maluf, exibe um dos maiores índices de rejeição da política brasileira. A partir de Pernambuco, Jarbas espera abrir bons espaços para Serra no Nordeste.
RS, PARÁ E BAHIA
No RS, Pará e Bahia, será bastante difícil a aliança entre PT e PMDB. Pois nesses Estados o PT não quer ceder a cabeça de chapa ao PMDB. Jader Barbalho pretende voltar ao governo do Pará, Geddel quer sentar no lugar de Jaques Wagner, na Bahia, e Tarso Genro quer disputar contra qualquer candidatura no Sul, mesmo que a de um peemedebista, como o prefeito Fogaça, de Porto Alegre. No Paraná, as negociações caminham bem, mas Requião tem canal aberto com Serra.
ENCONTRO DE CABEÇAS
O 2º Encontro Nacional de Siderurgia, promovido pelo Instituto Aço Brasil (IABR, novo nome para o Instituto Brasileiro de Siderurgia), realizado terça-feira, em São Paulo, proporcionou um encontro de algumas das melhores cabeças do país. Pelo tom geral das apresentações e debates, o mundo começa a virar a página da crise e o Brasil, que fez a lição de casa em matéria macroeconômica, fará o exercício mais rapidamente.
BRICS e BC
Antônio Palocci, médico que expressa com facilidade um economês palatável, exibiu franco entusiasmo pelo futuro do Brasil. Chegou, mesmo, a profetizar: dos BRICs (Brasil, Rússia, Índia e China), sobrarão dois – Brasil e China. Mais ainda: com uma vantagem para nosso país. Porque o Brasil tem um escopo institucional e democrático de alta respeitabilidade, fator considerado estratégico para posicionamento das Nações no ranking da boa fama. E a China, como se sabe, tem muito a aprender nesse campo.
DELFIM, SAPIÊNCIA E OTIMISMO
Delfim Netto continua dando um show de sapiência e otimismo. Para ele, o Brasil tem todas as condições de superar as dificuldades e despontar como uma grande Nação. Não é tão entusiasta sobre o futuro da China – argumentando que os EUA continuarão a ser o maior mercado consumidor do planeta – para voltar à tese de que nossas terras tupiniquins são realmente abençoadas.
CADÊ A CARTA DO BARALHO?
Ao contrário de certos pensadores, Delfim aponta a miscigenação de raças como um dos nossos mais ricos patrimônios. A pluralidade étnica e cultural é o fermento para a convivência, a harmonia e a criatividade. Delfim tira do colete o chiste: imaginem que só o Brasil é capaz de reunir, num mesmo salão, judeus, maometanos, católicos, evangélicos de credos variados, em uma grande confraternização. Se alguém quiser saber a razão do barulho que eles fazem no salão, é só abrir a porta e verificar: estão todos em torno de um baralho, discutindo, para saber quem foi que escondeu o coringa por baixo da mesa. "Que outro país do mundo poderia fazer isso?", indaga o mestre Delfim, para gargalhada geral da platéia.
GERDAU, CAIXEIRO VIAJANTE?
Jorge Gerdau é o nosso empresário-símbolo. Discorre facilmente sobre vasto escopo: câmbio, juros, custo Brasil, reformas tributária e política, preço do aço nos mercados interno e externo, exportações, petróleo, etanol, custo Brasil, competitividade. Defende posições – como reformas no campo tributário, político e educacional – pede situações isonômicas para que o aço brasileiro possa melhorar sua competitividade ante o aço chinês, por exemplo, é um duro crítico sobre algumas posições governamentais, mas exibe otimismo ante o futuro. Gerdau é sempre um grande expositor. Modesto, pergunta: "que achou?" Diante dos elogios, recolhe-se à modéstia: "fiz apenas o papel de caixeiro viajante". Que vende seu produto com a força da convicção.
DE JEITO NENHUM
Tempos turvos aqueles eram do AI-5. Dezembro de 68. Fechamento dos legislativos e as sub-CGIs nos Estados exigindo que todos os parlamentares fizessem uma declaração de bens dos dez anos anteriores. João Batista Botelho, conhecido na Assembléia paulista como "João Cuiabano", preparou o seu dossiê. Quando ia enviá-lo a quem de direito, alguém adverte:
- Nobre deputado, Vossa Excelência tem de dar a eles também o seu currículo.
João Cuiabano, homem de poucas letras, mas corajoso e decidido, virou uma fera:
- Isto eu não vou dar de jeito nenhum. Só conseguirão se passarem sobre meu cadáver.
Quem conta história é o incomparável Sebastião Nery.
BENJAMIN E SEU "MAS"
Benjamin Steinbruch não tem tanta certeza de que a crise já passou. Intercala sua fala com alguns pares de "poréns, mas e todavias". Se o Brasil tem boas perspectivas pela frente, não significa que deveremos nadar de braçada. Calma com o andor, pede o presidente da CSN. Será que os governos do mundo tirarão mais trilhões de seus caixas para sustentar as condições de governabilidade? O governo brasileiro – que colocou 20 milhões de pessoas no mercado de consumo e cobriu 40 milhões com o cobertor da proteção social – vai ter de despejar toneladas de dinheiro para sustentar a harmonia social e o consumo. Terá condição de fazer isso? Benjamin, como este escriba, continua a por dúvidas no ar das certezas.
GODOY E O DESENHO INSTITUCIONAL
Já Paulo Godoy, presidente da ABDIB, com sua costumeira eloqüência, discorre sobre nossas riquezas e fragilidades. Sua expressão recorrente é: o desenho institucional. Godoy acredita que o Brasil tem tudo para ser uma das Nações mais prósperas da humanidade. Mas precisa vencer o monumental desafio: arrumar o modelo institucional. As instituições precisam acompanhar o cheiro do tempo. Focar para resultados. Eliminar as teias corruptivas. Melhorar os níveis de representação. Agilizar o aparelho do Estado. Paulo Godoy prega um choque de gestão. Os gastos públicos precisam entrar na planilha da racionalidade.
FLÁVIO E O AÇO BASIL
Flávio de Azevedo, presidente do Instituto Aço Brasil, tem na ponta da língua um panorama sobre a indústria siderúrgica brasileira, uma das mais competitivas do mundo, e que emprega 110 mil pessoas. Indústria que ganha, agora, um Instituto com novo nome e uma nova logomarca: três traços que se cruzam formando um A, de aço, apontando para o alto (visão de futuro), sob as cores azul (alta tecnologia), verde (ambiente, Brasil).
CONSELHO AO PT PAULISTA
Esta coluna dedica sua última nota a pequenos conselhos a políticos, governantes e líderes nacionais. Na edição passada, o espaço foi destinado ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Hoje, volta sua atenção ao PT paulista:
1. Faça uma seleção de nomes e uma pesquisa para saber o perfil de maior viabilidade eleitoral;
2. Tente explicar as razões e argumentos de tantas mudanças ocorridas no partido;
3. Apresente uma Proposta de refundação do partido. E submeta a proposta às bases partidárias. Eis ai uma base mínima para o lançamento de uma candidatura petista em São Paulo.
(Por Gaudêncio Torquato)
Nenhum comentário:
Postar um comentário