Se pudesse, queria que, ao invés de um texto, destas letras brotassem mãos, mãos estendidas, mãos fraternais para lhes afagar com um abraço de amizade, oferecer-lhes o ósculo da paz e lançar as sementes de boas novas. Só isso!
Mas a magnitude deste momento, misto de uma imbricação de angústias conceituais com redescobertas de trilhas, nos impulsiona a compartilhar com vocês uma breve reflexão.
Como bem sabeis, o pontal simbólico é um estandarte que atravessou os séculos graças à auréola das significações que o acompanham. A linguagem simbólica visa tornar mais fácil o entendimento das mensagens.
Não por acaso Jesus, em sua peregrinação terrena, disse que falava por parábolas. Porque ficava incomodado com o fato de, nas suas prédicas, as multidões olharem e não enxergarem, ouvirem e não escutarem, apreenderem e não entenderem.
Para nós, os símbolos têm o significado que a etimologia original, do grego clássico, elucidou: sim (junto) e bailein (lançar). O sentido é lançar as coisas de tal modo que permaneçam juntas.
Pois bem. Como no universo do simbolismo nada ocorre por acaso, fico perquirindo por que somos protagonistas de um momento histórico tão carregado de pinhos e espinhos, de fortunas e infortúnios, de flores e dores, de astres e desastres!
O invisível bonde que nos transporta convida permanentemente para um ágape fraternal, a fim de nos banquetearmos saboreando as nossas raízes. Ou melhor, extrairmos a seiva dos nossos radicais e oferecermos um contributo frutífero às gerações presente e futura. Resgatarmos nosso passado heroico! Afinal, como nos ensinaram os latinos, ‘Historia magistra vitae est’, ou seja, “a história é a mestra da vida”.
Com efeito, é hora de lembrarmos de que a nossa existência constitui um ritual de passagem, do qual devemos recolher e internalizar as lições emanadas do forno da sabedoria dos nossos antepassados. Observarmos o córrego que banhou os grandes mestres do território complexo das ciências, os que bailaram no emaranhado fonético do salão das letras, os que percorreram o jardim florido das artes.
Permitam-me que saliente três exemplos que povoam as enciclopédias universais.
Cito Benjamim Franklin, elétrico patriarca das Américas, inventor contumaz, criador do para-raios, dos óculos bifocais, dentre inúmeras outras criações da sua mente prodigiosa. É exemplo de humano empreendedor.
A história registra o caso, por exemplo, de uma mulher, doente mental, casada com um homem desequilibrado em todos os sentidos. Alcoólatra e desocupado, estava longe de ser pai modelar ou marido referencial. Esse casal, no entanto, teve quatro filhos: o primeiro, doente mental; o segundo, paralítico; o terceiro, acometido de outra enfermidade séria; o quarto também deficiente. Mesmo com todo esse histórico de tragédia, a mulher estava grávida pela quinta vez. E esse quinto filho, que tudo apontaria para ter também uma vida desventurada, foi Ludwig Van Beethoven, um dos maiores gênios musicais da humanidade. Varão das artes. Gênio perpétuo e inolvidável.
Outro, no campo das letras, foi François-Marie Arouet, o francês Voltaire. Incondicional amante da liberdade, foi advogado dos oprimidos e escritor magnífico. Deixou frases insuperáveis em defesa da liberdade de opinião, como essa: “Não concordo com uma única palavra do que dizeis, mas defenderei até a morte o vosso direito de dizê-la.”
É disso que estamos precisando: para um País abatido por sucessivas tormentas ao longo de seus anos, a aura empreendedora de um Benjamin Franklin; para uma Pátria abalada por solavancos de temor quanto ao futuro, a audácia do exemplo de um Beethoven; para um Povo que se engalfinha em discussões estéreis, que tem dificuldade de conviver com a opinião alheia, que enxerga no pensamento divergente uma razão para se render à inutilidade da cólera e alimentar uma irracional divisão interna, o exemplo libertário de um Voltaire.
É disso que precisamos. Este o nosso desafio: estarmos à altura do que nos cobra este momento histórico. Que sejamos instrumentos dessa força revolucionária, capaz de sacudir as frágeis colunas dos nossos egoísmos e nos fazer enxergar o universo mágico da verdadeira vida, da existência que importa.
Enfim, queria que deste texto pudessem emergir mãos, mãos de labor e luz, que segurassem a trolha aplainadora das diferenças e nos convocassem para a magnifica e magnânima prática da tolerância e do amor!
(Júnior Bonfim)
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