quinta-feira, 4 de dezembro de 2008

CRÔNICA DA CIDADE

SOBRE NATAL E PODER...


Júnior Bonfim

Habemus dezembro, o mês da festa primordial, o mês cristão do Natal.

No agrupamento de dias seguinte à virada do ano, a nossa urbe, como as demais cidades brasileiras, terá novo comando. Outros dirigentes assumem o local poder.

(Digo “poder” porque, na dicção constitucional, “todo poder emana do povo e em seu nome será exercido”. O verdadeiro poder é, pois, aquele que brota da seiva popular, aquele que emerge das raízes cidadãs, aquele que se alimenta do fruto legítimo do sufrágio universal).

Mas, que relação guarda o natalino último mês do ano com o exercício do poder, esse arrebatador e quase inexplicável explosivo desejo que toma conta da grande maioria das pessoas? Que lição o jovem Galileu, nascido num dezembro da história, pode oferecer a quem recebe delegação de mando sobre outrem?

Diz a sabedoria popular que, se quiser alguém conhecer, se lhe dê dinheiro ou poder. Abraham Lincoln, o mais estimado estadista americano, dizia que “quase todos os homens conseguem enfrentar a adversidade; mas se quiserdes testar a capacidade de alguém, dê-lhe o poder”. Na Prússia, o bigodudo filósofo Friedrich Nietzsche concluiu: “Onde quer que encontrei vida, lá encontrei vontade de ter poder”.

Pois bem. A grande interrogação que se nos retorna é sempre a mesma: o que é e para que serve o poder?

A nosso juízo, no universo da política, o poder é essa delegação emanada da coletividade a fim de que alguém gerencie o que é comum em sintonia com a aspiração de todos. Nessa esteira lógica, se aproxima daquilo que proclamou Jesus: “Maior é o que serve!” Eis o sentido e a razão de ser do poder: servir aos outros. Tradução daquilo que, em profundo sentido, vem a ser o amor: doar-se pelos outros.

O problema é que, uma vez com os instrumentos simbólicos de poder à disposição, os homens se transformam. R. Kurz afirmou: “O poder torna as pessoas estúpidas e muito poder, torna-as estupidíssimas”. É como se inebriassem com um hipotético elixir de vida eterna. É como se uma indecifrável cegueira tomasse conta das pessoas e as fizessem esquecer-se da transitoriedade da vida.

Dois grandes vultos históricos personificaram essa paradoxal e binária distinção nas últimas décadas: o cubano Fidel Castro e o sul africano Nelson Mandela. O primeiro, malgrado ter liderado um movimento emancipatório popular da sua pátria, quis se eternizar no comando do país. O segundo, sob os auspícios da sabedoria, tinha consciência de quão efêmero e transitório é o poder, deixou seu recado à história e abriu caminho para outras figuras.

Maior é o que serve. Ah! Se todos entendessem o alcance e a profunda dimensão dessa expressão. Ah! Se as pessoas se apaixonassem pela causar do servir e não pelo ímpeto de se sentir servidas.

É hora de recordar o famoso líder norte-americano, pavimentador do terreno para que o mulato Obama entrasse pela porta principal da Casa Branca, Martin Luther King, que resumiu o sentido transcendental do poder: “Todas as pessoas podem ser grandes porque todas podem servir. Não é preciso ter um diploma universitário para servir. Não é preciso fazer concordar o sujeito e o verbo para servir. Basta um coração cheio de graça. Uma alma gerada pelo amor”.

Que neste mês que antecede ao ingresso de novos gestores torçamos para que aquele que arquitetou o universo desperte em nós o real sentido do poder, expressão de despojamento, reverência ao amor, doação ao outro, cultivo permanente do serviço.

(Publicado no Jornal Gazeta do Centro Oeste, de Crateús, Ceará)

Nenhum comentário: