segunda-feira, 12 de janeiro de 2009

EM 12 DE JANEIRO NASCEU RUBEM BRAGA


"Sempre tenho confiança de que não serei maltratado na
porta do céu, e mesmo que São Pedro tenha ordem
para não me deixar entrar, ele ficará indeciso
quando eu lhe disser em voz baixa:
"Eu sou lá de Cachoeiro..."

Na noite de segunda-feira, 17 de dezembro de 1990, o escritor Rubem Braga reuniu um pequeno grupo de amigos, cada vez mais selecionados por ele, na sua cobertura em Ipanema. Foi uma visita silenciosa, mas claramente subentendida pelos amigos Moacyr Werneck de Castro, Otto Lara Resende e Edvaldo Pacote. Às 23h30 da noite de quarta-feira, sedado num quarto do Hospital Samaritano, Rubem Braga morreu, sozinho como desejara e pedira aos amigos.

A causa da morte foi uma parada respiratória em conseqüência de um tumor na laringe que ele preferiu não operar nem tratar quimicamente.

Rubem Braga, considerado por muitos o maior cronista brasileiro desde Machado de Assis, nasceu em Cachoeiro de Itapemirim, ES, a 12 DE JANEIRO DE 1913. Iniciou seus estudos naquela cidade, porém, quando fazia o ginásio, revoltou-se com um professor de matemática que o chamou de burro e pediu ao pai para sair da escola. Sua família o enviou para Niterói, onde moravam alguns parentes, para estudar no Colégio Salesiano. Iniciou a faculdade de Direito no Rio de Janeiro, mas se formou em Belo Horizonte, MG, em 1932, depois de ter participado, como repórter dos Diários Associados, da cobertura da Revolução Constitucionalista, em Minas Gerais — no front da Mantiqueira conheceu Juscelino Kubitschek de Oliveira e Adhemar de Barros.
Na capital mineira se casou, em 1936, com Zora Seljan Braga, de quem posteriormente se desquitou, mãe de seu único filho Roberto Braga.

Foi correspondente de guerra do Diário Carioca na Itália, onde escreveu o livro "Com a FEB na Itália", em 1945, sendo que lá fez amizade com Joel Silveira. De volta ao Brasil morou em Recife, Porto Alegre e São Paulo, antes de se estabelecer definitivamente no Rio de Janeiro, primeiro numa pensão do Catete, onde foi companheiro de Graciliano Ramos; depois, numa casa no Posto Seis, em Copacabana, e por fim num apartamento na Rua Barão da Torre, em Ipanema.

Sua vida no Brasil, no Estado Novo, não foi mais fácil do que a dos tempos de guerra. Foi preso algumas vezes, e em diversas ocasiões andou se escondendo da repressão.

Seu primeiro livro, "O Conde e o Passarinho", foi publicado em 1936, quando o autor tinha 22 anos, pela Editora José Olympio. Na crônica-título, escreveu: "A minha vida sempre foi orientada pelo fato de eu não pretender ser conde." De fato, quase tanto como pelos seus livros, o cronista ficou famoso pelo seu temperamento introspectivo e por gostar da solidão. Como escritor, Rubem Braga teve a característica singular de ser o único autor nacional de primeira linha a se tornar célebre exclusivamente através da crônica, um gênero que não é recomendável a quem almeja a posteridade. Certa vez, solicitado pelo amigo Fernando Sabino a fazer uma descrição de si mesmo, declarou: "Sempre escrevi para ser publicado no dia seguinte. Como o marido que tem que dormir com a esposa: pode estar achando gostoso, mas é uma obrigação. Sou uma máquina de escrever com algum uso, mas em bom estado de funcionamento."
Foi com Fernando Sabino e Otto Lara Resende que Rubem Braga fundou, em 1968, a editora Sabiá, responsável pelo lançamento no Brasil de escritores como Gabriel Garcia Márquez, Pablo Neruda e Jorge Luis Borges.

Segundo o crítico Afrânio Coutinho, a marca registrada dos textos de Rubem Braga é a "crônica poética, na qual alia um estilo próprio a um intenso lirismo, provocado pelos acontecimentos cotidianos, pelas paisagens, pelos estados de alma, pelas pessoas, pela natureza."

A chave para entendermos a popularidade de sua obra, toda ela composta de volumes de crônicas sucessivamente esgotados, foi dada pelo próprio escritor: ele gostava de declarar que um dos versos mais bonitos de Camões ("A grande dor das coisas que passaram") fora escrito apenas com palavras corriqueiras do idioma. Da mesma forma, suas crônicas eram marcadas pela linguagem coloquial e pelas temáticas simples.
Como jornalista, Braga exerceu as funções de repórter, redator, editorialista e cronista em jornais e revistas do Rio, de São Paulo, Belo Horizonte, Porto Alegre e Recife. Foi correspondente de "O Globo" em Paris, em 1947, e do "Correio da Manhã" em 1950. Amigo de Café Filho (vice-presidente e depois presidente do Brasil) foi nomeado Chefe do Escritório Comercial do Brasil em Santiago, no Chile, em 1953. Em 1961, com os amigos Jânio Quadros na Presidência e Affonso Arinos no Itamaraty, tornou-se Embaixador do Brasil no Marrocos. Mas Braga nunca se afastou do jornalismo. Fez reportagens sobre assuntos culturais, econômicos e políticos na Argentina, nos Estados Unidos, em Cuba, e em outros países. Quando faleceu, era funcionário da TV Globo. Seu amigo Edvaldo Pacote, que o levou para lá, disse: "O Rubem era um turrão, com uma veia extraordinária de humor. Uma pessoa fechada, ao mesmo tempo poeta e poético. Era preciso ser muito seu amigo para que ele entreabrisse uma porta de sua alma. Ele só era menos contido com as mulheres. Quando não estava apaixonado por uma em particular, estava apaixonado por todas. Eu o levei para a Globo... Ele escrevia todos os textos que exigiam mais sensibilidade e qualidade, e fazia isto mantendo um grande apelo popular."

Bibliografia:

CRÔNICAS:

- O Conde e o Passarinho, 1936
- O Morro do Isolamento, 1944
- Com a FEB na Itália, 1945
- Um Pé de Milho, 1948
- O Homem Rouco, 1949
- 50 Crônicas Escolhidas, 1951
- Três Primitivos, 1954
- A Borboleta Amarela, 1955
- A Cidade e a Roça, 1957
- 100 Crônicas Escolhidas, 1958
- Ai de ti, Copacabana, 1960
- O Conde e o Passarinho e O Morro do Isolamento, 1961
- Crônicas de Guerra - Com a FEB na Itália, 1964
- A Cidade e a Roça e Três Primitivos, 1964
- A Traição das Elegantes, 1967
- As Boas Coisas da Vida, 1988
- O Verão e as Mulheres, 1990
- 200 Crônicas Escolhidas
- Casa dos Braga: Memória de Infância (destinado ao público juvenil)
- Uma fada no front
- Histórias do Homem Rouco
- Os melhores contos de Rubem Braga (seleção Davi Arrigucci)
- O Menino e o Tuim
- Recado de Primavera
- Um Cartão de Paris
- Pequena Antologia do Braga

ROMANCES:

- Casa do Braga

ADAPTAÇÕES:

- O Livro de Ouro dos Contos Russos
- Os Melhores Poemas de Casimiro de Abreu (Seleção e Prefácio)
- Coleção Reencontro Audiolivro - Cirano de Bergerac - Edmond Rostand
- Coleção Reencontro: As Aventuras Prodigiosas de Tartarin de Tarascon Alphonse Daudet
- Coleção Reencontro: Os Lusíadas - Luis de Camões (com Edson Braga)

TRADUÇÃO:

Antoine de Saint-Exupéry - Terra dos Homens.

SOBRE O AUTOR:

- Na Cobertura de Rubem Braga - João Castello
- Rubem Braga - Jorge de Sá
- Rubem Braga - Um cigano fazendeiro do ar - Marco Antonio de Carvalho

No volume publicado, também de crônicas, "As Coisas Boas da Vida", em 1988, Rubem Braga enumera, no texto que dá título ao livro "as dez coisas que fazem a vida valer a pena". A última delas: "Pensar que, por pior que estejam as coisas, há sempre uma solução, a morte — o assim chamado descanso eterno".

(Dados obtidos em sítios da Internet, livros do autor e em trabalhos realizados por Luciano Trigo e João Máximo no jornal "O Globo").



QUEM FOI RUBEM BRAGA EM 20 PEQUENAS LIÇÕES

1 - EXCEÇÃO - Há mulheres tão lindas e estranhas que só acontecem pela madrugada em um grande aeroporto internacional.

2 - SILVA - Algumas pessoas importantes usaram e usam o nosso nome. É por engano. Os Silvas somos nós. Não temos a mínima importância. /A família Silva e a família de Tal são a mesma família. / Até as mulheres que não são de família pertencem à família Silva. / Nossa família faz pedra, faz telhas, laça os bois, levanta os prédios, conduz os bondes, o tapete do circo, enche os porões dos navios, dinheiro dos bancos, faz os jornais, serve no Exército e na Marinha. Nossa família é feito Maria Polaca: faz tudo

3 - CALÚNIA - Falar do inferno, por exemplo, é mau. Dante e outros espalharam muitas notícias falsas a respeito, e a pior delas é que para lá vão os culpados.

4 - DEFINIÇÃO - Entendo por vida o fato de um homem viver fumando nos três primeiros bancos e falando ao motorneiro.

5 - ATRAÇÃO - Nunca precisei usar sistematicamente o bonde Praia Vermelha, mas sempre fui simpatizante.

6 - DESENCONTRO - Quando vier a grande hora do nosso destino nós teremos saído há uns cinco minutos para tomar café. Vamos. Vamos tornar um cafezinho.

7 - DISCUSSÃO - Discutir com adjetivos é muito fácil.

8 - EGOCÊNTRICA - Ligue para minha casa, pergunte se eu estou, se não estiver diga que já vou, e se estiver diga para eu não sair.

9 - ESCOLHA - Devo confessar preliminarmente que, entre um conde e um passarinho, prefiro um passarinho. (Motivou o rompimento – empregado e patrão – entre Rubem e Chatô. O conde era o multimilionário Matarazzo)

10 - FRUSTRAÇÃO - Não sou cangaceiro por motivos geográficos e mesmo por causa do meu reumatismo.

11 - FÉ - Glória ao padeiro, que acredita no pão.

12 - INTIMIDADE - A gente sempre sabe, de um casal de amigos, um pouco mais do que cada um dos membros do casal imagina.

13 - MADRUGADA PAULISTANA - Boceja na rua o último cidadão que passou a noite inteira fazendo esforço para ser boêmio.

14 - OUTSIDERS - Eu e o Oceano Atlântico fazemos algum ruído e funcionamos fora dos horários civis.

15 - POLIGLOTA - Falo francês como quem cospe pedras.

16 – RISCO - Sempre corro o perigo de cumprimentar efusivamente, quando encontro, de súbito, um desafeto qualquer: antes de me dar conta de quem se trata, eu o saúdo porque é uma cara conhecida.

17 - TESE - Filosofar é, antes de tudo, cuspir.

18 - TENTAÇÃO Nesta varanda alta, sobre os veículos e os transeuntes matinais, tenho a vontade insensata de fazer um discurso.

19 – CONTÁGIO - Devia ser com certeza uma dessas doenças que a gente adquire lendo Seleções e tem um nome tão interessante que dá vontade de mandar botar na cartão de visitas.

20 – DIPLOMACIA - Tomei o partido de falar pouco, beber muito e exprimir os tradicionais laços de amizade que ligam Cachoeiro de Itapemirim à Casa Branca.

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