domingo, 2 de novembro de 2008

COLUNA OBSERVATÓRIO

No primeiro semestre de 2000, eu e o então Prefeito Paulo Nazareno estávamos em Brasília fazendo gestões visando a liberação de convênios para o município de Crateús. A administração estava de vento em popa. Ancorada no slogan Trabalhar faz bem, com muitas realizações e premiações, reconhecimento nacional e até internacional, havia números exitosos a exibir em todos os setores da gestão. Paulo já estava decidido: seria candidato à reeleição. Certa manhã, após receber os dados de uma pesquisa feita pela Revista ISTOÉ sobre as perspectivas eleitorais daquele ano, ele franziu a testa e me fez um desabafo: - “Olha aqui o resultado dessa pesquisa. Será que compensa tanto empenho e dedicação?! Os nossos adversários estão quase dez pontos na nossa frente”. (Falava dos ex-prefeitos Zé Almir e Nenzé, que o enfrentariam naquela refrega). Eu ponderei que talvez faltasse uma melhor comunicação com o povo. Quem sabe isso poderia ser superado começando logo a campanha. Se estávamos em desvantagem, devíamos nos antecipar. E assim o fizemos. Mudamos o Trabalhar faz bem para “Faz. E faz bem”. Botamos o bloco na rua e nos distritos. Sob uma bem elaborada estratégia de marketing, foi massificada a idéia do gestor operoso, competente e realizador, cuja mão estava em todo lugar por onde se andasse. Resultado: vitória espetacular! Paulo obteve quase cinco mil votos de maioria.


O EFEITO

Como tudo nessa vida, a vitória é uma moeda de duas faces. Paulo julgou que o respaldo popular o credenciara a fazer uma assepsia na sua base de sustentação. Rompeu com antigos aliados e, às voltas com problemas familiares, olvidou de estancar as explosões de divergências internas no seio da administração. Na última hora, lançou um candidato que, apesar de ter um bom currículo, era nome pouco conhecido nos meios políticos e em grande parte da população. O efeito: Zé Almir, que muitos julgavam morto pelo resultado da eleição anterior, ressuscitou triunfante. O resto da história todos conhecem...


O ENSINAMENTO

As últimas eleições vêm demonstrando, à saciedade, que o eleitorado experimenta um irreversível e progressivo processo de evolução na escolha dos seus representantes. Parece que aplica o que assentou Eça de Queiroz: “Políticos e fraldas devem ser trocados de tempos em tempos pelo mesmo motivo”. O avanço tecnológico, simbolizado pelo estopim avassalador da internet e sua disponibilização da informação automática, está produzindo um eleitor mais exigente, que está analisando o candidato e o contexto político antes de apertar a tecla confirme na urna eletrônica. Diferentemente de alguns anos atrás, é cada vez mais diminuto o número de eleitores que votam por fidelidade partidária ou por vinculação a determinada liderança. Os cidadãos de uma maneira geral estão se tornando mais independentes e auscultando antes de tudo a voz íntima da consciência. E é esse o principal recado das urnas: MAIS DO QUE EM PESSOAS, O ELEITOR ESTÁ VOTANDO EM IDÉIAS. SE A IDÉIA SE CONCRETIZA, QUEM A VIABILIZOU RECEBE A CONFIRMAÇÃO POPULAR. DO CONTRÁRIO, ANÁTEMA.

O ESPECTRO

Quando analisamos o espectro político que emerge das urnas este ano, fica evidente que alguns eleitos receberam um expressivo apoio do povo votante. Na nossa região destacou-se, em primeiro lugar, o Prefeito de Parambú, Genecias Mateus Noronha, eleito com 77,35% dos votos válidos. Em segunda colocação, o jovem Aderson Pinho Magalhães, consagrado por 68,54% do eleitorado de Poranga. E, em terceiro lugar, Carlos Felipe Bezerra, de Crateús, sufragado por 63,16% dos votantes. Genecias surfou na onda de um governo realizador, que povoou o município com benesses e realizações. Aderson viveu os extremos da glória e da dor. Nos dois primeiros anos, foi ovacionado pelo aplauso popular. Depois, experimentou enorme calvário, chegando a amargar forte ameaça de cassação. Renasceu das cinzas, deu a volta por cima e, num notável exemplo de superação, foi reconduzido sob a aura da popularidade. Carlos Felipe é, desse triunvirato que compõe o topo da consagração regional, o único estreante. Sobre ele repousa um arsenal de esperanças de incalculáveis proporções. Qualquer crateuense de bom senso e impregnado do mínimo de espírito público, torce para que o gestor eleito palmilhe a vereda do acerto.


A ENCRUZILHADA

No entanto, governar é, sobretudo, fazer opções, administrar interesses, resolver problemas, transitar por encruzilhadas. Passada a ressaca da vitória, Carlos Felipe já começa a sentir os primeiros influxos das pressões internas, que se diga an passant respondem pela mais delicada das questões. Há, pelo menos, quatro grupos que estão no entorno do prefeito eleito. O primeiro é dos amigos de primeira hora, aqueles que estão desde o início. Dele faz parte o núcleo familiar e gente como o doutor Nonato Melo, dentre outros. O segundo é composto por aqueles que, por feeling político, apostaram no projeto e se aliaram há algum tempo, coisa de dois anos atrás. Personificam esse grupo Elder, Ernane Leitão e Luizinho Sales. O terceiro é formado por aqueles que se coligaram no começo do período eleitoral, já este ano. Aí estão o PT e outros partidos aliados. E, por último, a turma que embarcou na onda da campanha e aderiu por alguma insatisfação (como é o caso do doutor Nenzé) ou porque viu ali uma maior perspectiva de vitória (esse bloco é numeroso e sem um líder específico). Esses grupos estão juntos, embora não estejam unidos. Podem atuar conjuntamente, mas cada um luta por seu espaço específico.

PARA REFLETIR

“Como o burrico mourejando à nora
A mente humana sempre as mesmas voltas dá...
Tolice alguma nos ocorrerá
Que não a tenha dito um sábio grego outrora...”
(Mário Quintana)

Publicado no Jornal Gazeta do Centro Oeste (Crateús - Ceará)

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