quinta-feira, 27 de novembro de 2008

O SUCESSO DOS TRATAMENTOS DO CÂNCER DEPENDE DA UNIÃO ENTRE A PREVENÇÃO E O DIAGNÓSTICO PRECOCE

Para os médicos, ela consiste em um desafio. Para os pacientes, uma provação. O câncer é a segunda maior causa de morte no mundo e uma das doenças mais temidas pela sociedade. Durante anos, nem mesmo a pronúncia do nome “câncer” era ouvida, o tema era tabu. Hoje, mais do que desvendar os processos orgânicos que desencadeiam a doença, os médicos tentam romper as barreiras da desinformação e do medo, que impedem o diagnóstico precoce e a cura.

Para dissociar a idéia de sentença de morte à incidência do câncer, a diretora do Instituto de Prevenção do Câncer do Ceará, Tânia Veras, afirma que é preciso investir na prevenção. “O foco agora é a educação continuada, que começa nas escolas e com os profissionais de saúde que devem provocar os gestores a dar acesso aos aparelhos de saúde”, explica a médica. Apesar de já serem conhecidos mais de 100 tipos diferentes de câncer e de muitos estarem associados a fatores genéticos, ainda assim é possível dificultar o aparecimento da doença com os cuidados voltados para fatores externos.

A orientação é simples. Sol em demasia causa o câncer de pele; cigarro, de pulmão; ingerir bebida alcoólica em excesso, câncer de esôfago ou faringe, por exemplo. De acordo com o Instituto Nacional de Câncer (Inca), o câncer de pulmão encabeça a lista dos que mais levam a óbito homens e mulheres e, justamente ele, é provocado por fatores previsíveis, como o tabagismo. Essa realidade mostra como o investimento em prevenção pode diminuir não só a incidência da doença, mas principalmente a mortalidade.

Vida longa

Promover uma maior sobrevida para os pacientes é a grande missão da oncologia na atualidade. Mas, para que eles possam deixar as enfermarias hospitalares saudáveis, sem data de retorno, é necessário que o prontuário tenha sido aberto cedo, antes de se descobrir um tumor em estado avançado. A estudante Luana da Cruz Batista, de 14 anos, não esperou o caroço que surgiu na sua perna aumentar para ir ao médico.

Com muitas dores e um tumor com o diâmetro de uma laranja, a adolescente veio de Martinópolis para Fortaleza em busca de uma biópsia no Hospital Infantil Albert Sabin (Hias). “Ela fez sete sessões de quimioterapia e no dia cinco de dezembro fez uma cirurgia e mais três sessões de quimioterapia”, conta a mãe Neuza Alves da Cruz Gomes. Luana está em tratamento há um ano e no início da semana passada foi submetida a um novo procedimento cirúrgico para a retirada de nódulos no tórax.

A vida tranqüila de cidade interiorana que a adolescente levava foi, de repente, trocada por idas e vindas a hospitais, exames clínicos e uma enxurrada de nomes e informações complicadas. “Eu não sabia nem o que era câncer, quando o médico me disse eu perguntei se era aquela doença feia”, lembra Neuza Gomes. Como a mãe de Luana são a maioria dos pacientes que chegam ao Hospital do Câncer/ Instituto do Câncer do Ceará (ICC).

A médica oncologista Rosane Santana observa que o descaso com a própria saúde é o que faz com que vários pacientes procurem a unidade com tumores em estágio avançado. “Com um diagnóstico precoce, o paciente consegue maior índice de cura, evita mutilações e não precisa se submeter a tratamento sistêmico (quimioterapia/radioterapia)”, afirma a médica. O medo de descobrir a doença acaba afastando os pacientes dos consultórios e só procuram o médico quando as dores são insuportáveis.
Perfil do câncer
• É uma doença em que há o crescimento desordenado de células que invadem os tecidos e órgãos, podendo espalhar-se (metástase) para outras regiões do corpo
• É a segunda maior causa de morte no mundo
• Há mais de 100 tipos diferentes de câncer catalogados
• Os tipos de câncer que mais provocam o óbito em homens são: pulmão, próstata e estômago
• Nas mulheres, o de mama, pulmão e intestino são as principais razões de óbitos
• 80% dos casos de câncer estão relacionados a fatores de risco como tabagismo, alcoolismo, hábitos alimentares, remédios etc.
• 70% dos diagnósticos de câncer são feitos por médicos não-cancerologistas
• Fonte: Inca - Instituto Nacional de Câncer
HÁ VIDA APÓS A DOENÇA - Telmo venceu o linfoma de Hodgkin

O câncer é uma doença que pode parecer impiedosa, mas para os que têm fé, seja em Deus ou na Medicina, é apenas mais uma barreira a superar. Aos 21 anos de idade, Telmo de Lima Nunes se considera um vencedor por ter superado o seu desafio: um linfoma de Hodgkin. Aos oito anos de idade ele deu entrada no Hospital Infantil Albert Sabin.

A doença se tornou um fardo pesado demais para a sua mãe, que não o acompanhou durante o período de internação. Telmo ficou sob a responsabilidade das enfermeiras, que ele hoje considera suas “mães de coração”. Aos 15 anos de idade teve alta definitiva e pôde iniciar um novo modo de viver.

Seis anos depois, ele estuda, trabalha e tem uma rotina moderada, mas não muito diferente da de qualquer outra pessoa da sua idade. “Eu sou um vencedor, sou um sortudo mesmo”, conta Telmo. O rapaz foi um dos primeiros pacientes a participar dos projetos da Associação Peter Pan, na qual ele hoje trabalha. Ao lado de outros funcionários e voluntários, Telmo leva às crianças em tratamento um exemplo de que é possível superar a doença e levar uma vida normal.

Essa visão esperançosa e não apocalíptica do câncer é difundida pela Associação Peter Pan, mas como ressalta a diretora da instituição Olga Maia, para que as crianças e os familiares tenham a certeza de que podem superar as internações, sessões de quimioterapia, recaídas e cirurgias, é preciso estimular a realização do diagnóstico precoce da doença. “Sendo descoberta com antecedência, a probabilidade de cura da doença é ainda maior”, afirma a diretora da Peter Pan.

Mesmo atuando no apoio ao tratamento dos pacientes e no suporte para os familiares, a instituição está agora empenhada em incentivar o diagnóstico precoce.

As vantagens de se descobrir o câncer com antecedência vão desde à eficácia no tratamento à diminuição do tempo de hospitalização. “Hoje as crianças sofrem menos”, avalia Telmo de Lima.

REDE PRIMÁRIA - Eficácia depende do trabalho em redes

Da unidade básica de saúde ao hospital especializado, o caminho dos pacientes é muito longo. A incapacidade de muitos profissionais em fazer o diagnóstico e a falta de centros para a realização dos exames são os principais entraves para a identificação precoce do câncer.

Os pacientes vindos do Interior realizam uma verdadeira peregrinação para ter acesso a consultas e exames. A dona-de-casa Mônica Nascimento vem do município de Russas em busca de tratamento na Capital. Somente neste mês de junho, ela teve que fazer o percurso duas vezes para as consultas de rotina. Mônica se recupera de uma histerectomia (retirada do útero) realizada em dezembro do ano passado.

Seu estado de saúde é bom, mas, como ela mesma frisa, poderia ser melhor se o acompanhamento pudesse ser feito na cidade onde mora ou em outra vizinha. O acesso a uma rede de saúde capacitada é primordial para a realização do diagnóstico precoce. “Só um hospital de câncer não é suficiente para interferir nessa área, é preciso que eles tenham acesso a um sistema de saúde”, frisa a oncologista Rosane Santana.

Compartilha com essa idéia a diretora do Instituto de Prevenção do Câncer, Tânia Veras. Ela avalia que a incidência, no Ceará, do câncer de cólo de útero, que pode ser evitado com a realização do exame “papanicolau”, só não diminuiu mais porque muitas mulheres não têm acesso aos serviços preventivos. Segundo Tânia Veras, equipar a rede secundária é importante, mas é preciso também intensificar ações na rede primária, com o apoio do Programa de Saúde da Família.

“Nós podemos diminuir a incidência do câncer de cólo de útero a níveis irrisórios, enquanto no de mama pode ser reduzida a mortalidade”, afirma a médica. Em se tratando da prevenção do câncer de mama, a visita regular ao especialista é essencial, principalmente em se tratando de pacientes com casos na família e de mulheres que apresentem um histórico de puberdade precoce; menor pausa tardia ou primeira gravidez tardia.

Além do auto-exame que a mulher pode realizar, é preciso a contrapartida do sistema de saúde, com a disponibilidade de mamógrafos para a realização de exames. O número reduzido de aparelhos nas regiões do Interior é o que motiva muitos pacientes a procurarem o IPCC na Capital.

TECNOLOGIA - Novos tratamentos fortalecem esperanças

A luta contra o câncer vem se fortalecendo graças aos avanços da tecnologia médica. Há 20 anos, os tratamento eram mais agressivos e a sobrevida dos pacientes menor. Hoje, com novas descobertas e o desenvolvimento de pesquisas cada vez mais completas, o quadro de morte anunciada está dando lugar ao de convivência com a doença. Mais tempo de vida e menos efeitos colaterais compõem os benefícios dos métodos terapêuticos disponíveis, como observa o oncologista Duílio Rocha Filho.

A quimioterapia adjuvante e as terapias-alvo são a grande aposta dos profissionais na busca de respostas mais rápidas ao tratamento e da extinção das células cancerosas. Duílio Rocha explica que a quimioterapia adjuvante, por exemplo, foi um método que começou a ser utilizado a partir dos anos 90. Consiste em aplicações de quimioterapia após a realização da cirurgia para evitar as metástase, ou seja, a ramificação do câncer para outras áreas. Segundo Duílio Rocha Filho, a administração da quimioterapia adjuvante aliada ao tratamento com medicamentos reduz em até 50% as chances do câncer se manifestar novamente.

Os resultados dessas novas formas de tratamento apontam para um aumento da sobrevida seis vezes maior que os obtidos há 30 anos atrás. Mas a grande expectativa da oncologia moderna, como aponta o médico, são as terapias-alvo. Esse tratamento é realizado com medicamentos que atingem apenas as células cancerosas, poupando as células saudáveis de agressões químicas. Elas são aplicadas simultaneamente ao tratamento quimioterápico e especialistas acreditam que, em breve, as terapias-alvo substituirão a quimioterapia.

Fonte: Diário do Nordeste

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