sábado, 22 de agosto de 2009

UMA SILVA SUCESSORA DE UM SILVA?



Não estou ligado a nenhum partido, pois para mim partido é parte. Eu como intelectual me interesso pelo todo embora, concretamente, saiba que o todo passa pela parte. Tal posição me confere a liberdade de emitir opiniões pessoais e descompromissadas com os partidos.

De forma antecipada se lançou a disputa: Quem será o sucessor do carismático presidente Luiz Inácio Lula da Silva?

De antemão afirmo que a eleição de Lula é uma conquista do povo brasileiro, principalmente daqueles que foram sempre colocados à margem do poder. Ele introduziu uma ruptura histórica como novo sujeito político e isso parece ser sem retorno.

Não conseguiu escapar da lógica macro-econômica que privilegia o capital e mantém as bases que permitem a acumulação das classes opulentas. Mas introduziu uma transição de um estado privatista e neoliberal para um governo republicano e social que confere centralidade à coisa pública (res publica), o que tem beneficiado vários milhões de pessoas. Tarefa primeira de um governante é cuidar da vida de seu povo e isso Lula o fez sem nunca trair suas origens de sobrevivente da grande tribulação brasileira.

Depois de oito anos de governo se lança a questão que seguramente interessa à cidadania e não só ao PT: quem será seu sucessor? Para responder a esta questão precisamos ganhar altura e dar-nos conta das mudanças ocorridas no Brasil e no mundo. Em oito anos muta coisa mudou. O PT foi submetido a duras provas e importa reconhecer que nem sempre esteve à altura do momento e às bases que o sustentam. Estamos ainda esperando uma vigorosa autocrítica interna a propósito de presumido “mensalação”. Nós cidadãos não perdoamos esta falta de transparência e de coragem cívica e ética.

Em grande parte, o PT viou um partido eleitoreiro, interessado em ganhar eleições em todos os níveis. Para isso se obrigou a fazer coligações muito questionáveis, em alguns casos, com a parte mais podre dos partidos, em nome da governabilidade que, não raro, se colocou acima da ética e dos propósitos fundadores do PT.

Há uma ilusão que o PT deve romper: imaginar-se a realização do sonho e da utopia do povo brasileiro. Seria rebaixar o povo, pois este não se contenta com pequenos sonhos e utopias de horizonte tacanho. Eu que circulo, em função de meu trabalho, pelas bases da sociedade vejo que se esvaziou a discussão sobre “que Brasil queremos”, discussão que animou por decênios o imaginário popular. Houve uma inegável despolitização em razão de o PT ter ocupado o poder. Fez o que pôde quando podia ter feito mais, especialmente com referência à reforma agrária e a inclusão estratégica (e não meramente pontual) da ecologia.

Quer dizer, o sucessor não pode se contentar de fazer mais do mesmo. Importa introduzir mudanças. E a grande mudança na realidade e na consciência da humanidade é o fato de que a Terra já mudou. A roda do aquecimento global não pode mais ser parada, apenas retardada em sua velocidade. A partir de 23 de setembro de 2008 sabemos que a Terra como conjunto de ecosissitemas com seus recursos e serviços já se tornou insustentável porque o consumo humano, especialmente dos ricos que esbanjam, já psssou em 40% de sua capacidade de reposição.

Esta conjuntura que, se não for tomada a sério, pode levar nos próximos decênios a uma tragédia ecológicohumanitária de proporções inimagináveis e, até pelo final do século, ao desaparecimento da espécie humana. Cabe reconhecer que o PT não incorporou a dimensão ecológica no cerne de seu projeto político. E o Brasil será decisivo para o equilíbrio do planeta e para o futuro da vida.

Qual é a pessoa com carisma, com base popular, ligada aos fundamentos do PT e que se fez ícone da causa ecológica? É uma mulher, seringueira, da Igreja da libertação, amazônica. Ela também é uma Silva como Lula. Seu nome é Marina Osmarina Silva.


(Por Leonardo Boff)

quinta-feira, 20 de agosto de 2009

NAS CALÇADAS DO BARROCÃO

Saudades de Crateús,

Que caloroso sertão!

Mágicas noites vividas

Ao som de um violão.

A juventude enlevada

As cadeiras espalhadas

Nas calçadas do Barrocão.


Entre uma água de coco,

Um beijo e uma paixão,

Kakin cantava Hey Jude,

Dos Beatles bela canção

Espalhando a felicidade

No auge da mocidade

Nas calçadas do Barrocão.



Rosina também cantava,

E dedilhava um violão.

E assim se alternavam

Os Bonfim e os Aragão

Naquela bonita cantoria

Tão contagiante e sadia

Nas calçadas do Barrocão.



Hoje o trem de passageiro,

Já não pára naquela estação.

Os amigos já não estão lá

Mas habita em meu coração

Uma saudade gritante

Das noites interessantes

Nas calçadas do Barrocão.



Sei que esta mesma saudade

Que reside em meu coração,

Também faz morada no peito

De quem viveu a mesma emoção,

E certamente fez jus

As noites de Crateús

Nas calçadas do Barrocão.



Se eu fosse falar de todos

Com certeza encheria o vagão.

Que deixou de passar na linha

Para estacionar em meu coração.

Quem diz tudo isso é Dalinha,

Que sua cadeira mantinha

Nas calçadas do Barrocão.



Poema de Dalinha Catunda.


Uma Homenagem ao amigo "Kakin" de Crateús e a família Bonfim que sempre nos recebeu com carinho e alegria.

terça-feira, 18 de agosto de 2009

NA REAL

A SUCESSÃO EMBARALHADA

A pesquisa DataFolha divulgada no domingo ainda serve para indicar as possibilidades reais da candidatura Marina Silva de angariar votos e estragar os prazeres de adversários. Foi realizada ainda quando as especulações sobre sua entrada na disputa ainda estavam muito frescas. O levantamento, além de praticamente reproduzir, para os três principais nomes – Dilma, Serra e Ciro – a mesma situação de maio, traz, contudo, dois dados que merecem melhor análise:

1. As intenções de voto da ex-senadora Heloísa Helena: quase totalmente ausente da grande mídia nacional, a líder do PSOL alcançou 12% da preferência dos pesquisados, apenas 4 pontos a menos do que Dilma e 3 pontos abaixo de Ciro. Sinal de que há uma significativa orfandade eleitoral que nem Serra, nem Dilma, nem Ciro conseguiram ainda preencher.

2. Quando Ciro é retirado da disputa, numa das simulações, Dilma salta de 16% para 19%, enquanto Serra pula de 37% para 44%. Ou seja, mais votos de Ciro vão para Serra do que para Dilma. Isso reforça o argumento de Ciro e do PSB de que a candidatura dele é importante para evitar uma vitória tucana no primeiro turno.

Porém, o fato que ainda está "agitando a pança" é o "fator Marina", cujo destino partidário deverá ser definido esta semana.

SUBIU NO TELHADO

Evoluía com fluidez a escolha do vice na chapa de Dilma em direção a uma solução peemedebista. Com a entrada na arena da senadora Marina Silva e o novo assanhamento do PSB e de Ciro Gomes, tivemos uma espécie de "parada técnica". É possível que haja necessidade de usar o lugar antes reservado ao PMDB para acomodar Ciro. E ainda ter alguém à mão para evitar que Dilma se confronte diretamente com a senadora do Acre. Ciro faria este papel. É bom prestar atenção nas reações do PMDB da Câmara, comandado por Michel Temer, para ver como essa facção peemedebista está vendo tais articulações. O PMDB na Câmara tem sido um "doce" até agora, mesmo insatisfeito com a não liberação das emendas dos parlamentares. Não gostaria de ser preterido.

Índia: para se prestar atenção!

Neste último sábado foi o Dia da Independência da Índia. Em um marcante discurso o primeiro-ministro indiano Manmohan Singh afirmou que fará mais esforços para retomar a taxa de crescimento média dos últimos cinco anos do PIB (9%). A previsão de crescimento para este ano é de 6%, mas os analistas estão revendo suas projeções para algo ao redor de 7%. A crise mundial afetou a Índia em menor magnitude, assim como o Brasil, na medida em que o país é relativamente fechado no comércio exterior e o seu sistema financeiro pouco internacionalizado. O déficit público que era antes da crise ao redor de 3% do PIB mais que dobrou (para 6,2%) e supriu parte da demanda perdida com as exportações de produtos e serviços. A inflação do país permanece controlada e os maiores riscos neste item estão relacionados com o setor agrícola, ainda muito subdesenvolvido e dependente do regime de chuvas da região (monções). Manmohan Singh recentemente teve uma importante vitória nas eleições parlamentares na medida em que seu governo se tornou mais centrista do ponto de vista político e mais reformista do ponto de vista econômico. A Índia pode e provavelmente será a maior concorrente por capitais dentre os emergentes. Talvez se torne a grande estrela dos BRICs. Além da novela das oito...

MEIRELLES, ENTRE A ESPECULAÇÃO E O FATO


Há meses especula-se sobre a candidatura do presidente do BC Henrique Meirelles ao governo de Goiás, sua terra natal. Nesse tempo, o chefe da autoridade monetária negou que fosse disputar a cadeira de governador. Sem ênfase, é verdade. Na última sexta-feira, o presidente Lula, como sempre empolgado com seus discursos, afirmou que "se Meirelles conduzir a economia de Goiás como ele conduziu (sic) o Banco Central, Goiás só tem a ganhar." Ora, Meirelles ainda é o presidente do BC, mas o presidente já anunciou a sua candidatura. Ademais, de sua parte, Henrique Meirelles disse : "não estou pensando em partido agora. Até março o foco é no BC." Como se vê, intrinsecamente o presidente do BC admite a candidatura. De fato, é candidato. Isto lhe retira a imparcialidade para conduzir o BC. Deveria sair já. Até mesmo pela existência de claros conflitos de interesse entre a condução de um cargo de Estado e a política partidária visando um governo.

NÃO COMBINA

A política partidária, ainda mais para um quase neófito como Meirelles, implica em "negociações", concessões, liberações... A presidência do BC exige firmeza, dureza... Alguém consegue imaginar, por exemplo, Ben Bernanke filiado ao Partido Democrata e candidato ao governo do Texas e ao mesmo tempo comandando o Fed?

NÃO SAI MESMO

A popularidade de Lula não mexeu um milímetro nos últimos dois meses, apesar de seu temerário engajamento na crise do Senado. Assim, o mandato de Sarney e sua permanência na presidência do Senado estão totalmente garantidos.

FATURA EM DIA

O filho do senador Renan Calheiros ganhou mais uma concessão de rádio para Alagoas na semana passada. Tomou posse ontem na BR Distribuidora, subsidiária da Petrobras, o até então secretário de Petróleo e Gás do Ministério de Minas e Energia, José Lima de Andrade Neto. É homem de confiança do ministro Edison Lobão, que por sua vez é do staff político de Sarney e Renan. José Eduardo Dutra está trocando a BR Distribuidora para disputar a presidência nacional do PT. Justifica o sacrifício por ser homem de partido. Certamente não ficará ao relento, caso Dilma Roussef seja eleita. Derrotado ao governo de Sergipe em 2002, foi escalado pelo governo Lula para presidir a Petrobras. Derrotado ao Senado também por Sergipe em 2006, foi chamado por Lula para presidir a BR Distribuidora.

DESATENÇÃO JURÍDICA

Está sendo muito pouco discutida a proposta de "enxugamento" da CF/88 que está sendo preparada pelo deputado paulista Régis de Oliveira por encomenda do presidente da Câmara, Michel Temer. Não é "flor do recesso". É para valer. Temer quer deixar uma marca própria nessa sua passagem pelo cargo, possível alavanca para voos mais altos. Além do mais, a sugestão é sedutora. E que, deixada solta, pode se prestar tanto para o bom como para o péssimo.

REFORMA DA SAÚDE NOS EUA

O plano de reforma do setor de saúde de Obama tem por objetivo reduzir o largo déficit do governo na área e, caso o presidente norte-americano tenha sucesso em implementá-lo, haverá mais conforto com a situação fiscal do governo no médio prazo. O papel do governo na saúde será reduzido por meio de um modelo que estimula a competição e a livre escolha de médicos e hospitais. Algo mais avançado daquilo que tentou Clinton em meados dos anos 90. Um modelo liberal. (O que acharia a esquerda brasileira sobre estes planos do "esquerdista" Barack Obama?) Do ponto de vista do mercado esta reforma é decisiva para o curso das cotações das ações e, sobretudo, dos títulos do Tesouro norte-americano.

QUANTO VALE?

O PMDB tem 5 minutos e 45 segundos no horário eleitoral obrigatório no rádio e na televisão na corrida presidencial. Tanto o PT quanto o PSDB gostariam de se apossar dessa fortuna.

(Por José Marcio Mendonça e Francisco Petros)

EXPRESSÕES LATINAS

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Ubi bene, ibi patria – "Onde (me sinto) bem, minha pátria é aí." - Ditado baseado num trecho de Cícero.
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Ubique patriae memor – "Lembrado da pátria por toda parte." – Divisa do Barão do Rio Branco.
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Ubi solitudinem faciunt, pacem appellant – "Onde fazem o deserto, dizem (que estabelecem) a paz." – Tácito.
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Ultimam time – "Teme a última (hora)." – Inscrição de relógios.
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Ultima ratio regum – "O último argumento dos reis." – Lema inscrito nos canhões de Luís XV, da França.
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Ultima Thule – "A longínqua Tule." – Virgílio.
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Ultra equinoxialem non peccavi – "Não pequei além do Equador." – Afrânio.
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Ultra petita – "Além do solicitado", "mais que o solicitado." – Expressão forense.
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Ultra vires – "Além dos poderes." – Expressão forense.
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Umbra mea vita sit – "A sombra seja a minha vida."
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Una domus non alit duos canes – "Uma só casa não alimenta dois cães." – Provérbio.
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Una hirundo non efficit ver – "Uma andorinha não faz primavera", "Uma andorinha não faz verão." – Provérbio.

domingo, 16 de agosto de 2009

Deu na ÉPOCA: MORENA MARINA, VOCÊ SE PINTOU


Marina, você faça tudo, mas faça o favor. Não mude o discurso da ética, que é só seu. Marina, você já é respeitada com o que Deus lhe deu. O povo se aborreceu, se zangou, e cansou de falar. Lula e Dilma estão de mal com você e não vão perdoar. Mas o eleitor não poderia arranjar outra igual para embaralhar o jogo sonolento da sucessão em 2010. Ao menos num dos turnos, vamos discutir princípios e fins. E principalmente os meios.

Nem em suas orações diárias Maria Osmarina Marina da Silva Vaz de Lima sonharia provocar tanto medo antes mesmo de decidir trocar o PT pelo PV. Nascida no Acre, filha de seringueiros migrantes cearenses, analfabeta até os 16 anos, aprendeu a ler quando trabalhava como empregada doméstica. A mãe tinha morrido. Pelo Mobral, fez em quatro anos o primeiro e o segundo graus. Contraiu cinco malárias, duas hepatites. Formou-se em história. Queria ser freira, mas virou marxista. Hoje é evangélica. Tem quatro filhos. Foi a mais jovem senadora do Brasil, aos 35 anos.

Lula a nomeou ministra do Meio Ambiente. Cinco anos depois, saiu derrotada e desgastada. Ao pedir demissão, citou a Bíblia: “É melhor um filho vivo no colo de outro”. O filho era a política ambiental. Ela tinha brigado com outra mãe cheia de energia, a do PAC.

Católicos como Frei Betto e Leonardo Boff receberam telefonemas de Marina na semana passada. Ela falou de desenvolvimento sustentável, de vida, de humanidade, da terra.

O mais forte cabo eleitoral de Marina, neste agosto, se chama José Sarney – e tudo o que ele representa. O país ficou desgostoso com o presidente do Senado, suas mentiras inflamadas na tribuna, seu sorriso bonzinho de avô da República – e com o apoio incondicional de Lula ao maranhense. O nome Marina, sussurrado, ganhou a força da natureza no olho do furacão em Brasília.

O ex-ministro José Dirceu escreveu que o mandato da senadora “pertence ao PT”. Marina disse que já enfrentou madeireiros, fazendeiros, cangaceiros: “Com certeza o Zé (Dirceu) não fez isso para me intimidar; não faz parte do caráter dele”.

O outro forte cabo eleitoral de Marina é a ministra Dilma Rousseff, pela falta de carisma. Marina não ameaçaria tanto se a ministra do crescimento tivesse conquistado o país ou ao menos seu próprio partido. Não se nega o valor pessoal de Dilma, mas seu nome foi imposto. Lula botou na cabeça que vai eleger seu poste. “Da campanha da Dilma cuido eu”, teria dito a um cacique do PT paulista.

As baratas todas voaram. Quem tem amigos como o deputado federal Ciro Gomes não precisa de inimigos. Lula chegou a apostar nele para o governo em São Paulo. Mas Ciro quer outros voos: foi o primeiro a dizer que Marina “implode a candidatura de Dilma”... “uma persona política em formação”...“que foi obrigada a defender Sarney”.

Dilma pediu a Marina que ficasse. “Estou triste. Preferia que ela continuasse no PT porque é uma grande lutadora.” Vocês acreditam? A ministra já esqueceu as rixas com a ambientalista que botava areia nas hidrelétricas? Depois, Dilma mudou o tom: “Eu sempre acho que quanto mais mulher melhor”. É mesmo?

Dilma é vista como “a mulher do Lula” – a massa ainda não conseguiu decorar seu nome. Lula ergueu a mão da mãe do PAC nos palanques país afora e disse que o Brasil está preparado para “uma mulher na Presidência”.

Lula só não esperava que uma sombra austera de saias emergisse da floresta. Com seu fundamentalismo, a fé, as convicções, a integridade, a coerência em 30 anos de PT. Sem dedo em riste. É muita ironia. E na mesma semana em que Lula dá uma rádio para o filho de Renan Calheiros, outro senador que “obra e anda” para a opinião pública.

O maior trunfo de Marina não é ser mulher nem petista de raiz ou defensora do verde. Ninguém supõe hoje que ela possa ser eleita presidente sozinha, contra as duas máquinas. Mas sua biografia e as frases recheadas de atitude – “perco o pescoço mas não o juízo” – entusiasmam os desiludidos.

Marina Silva obriga tanto Dilma quanto o tucano José Serra a se perguntar: como combater quem fala, baixo mas firme, a sua própria verdade?

(Por Ruth de Aquino)