sábado, 20 de outubro de 2012

NO DIA DO POETA, AUTOPSICOGRAFIA - DE FERNANDO PESSOA


O poeta é um fingidor.
Finge tão completamente
Que chega a fingir que é dor
A dor que deveras sente.

E os que lêem o que escreve,
Na dor lida sentem bem,
Não as duas que ele teve,
Mas só a que eles não têm.

E assim nas calhas de roda
Gira, a entreter a razão,
Esse comboio de corda
Que se chama coração.


(Fernando Pessoa)

DESCOBRI QUE TE AMO DEMAIS - ZECA PAGODINHO

quarta-feira, 17 de outubro de 2012

CONJUNTURA NACIONAL

Abro a coluna com duas historinhas da Paraíba.

Cancelo chuvas

A seca era medonha. A Paraíba em desespero, o governador aflito. Um dia, caiu uma chuva fininha no município de Monteiro. Inácio Feitosa, o prefeito, correu ao telégrafo:

"Governador José Américo: chuvas torrenciais cobriram todo município de Monteiro. População exultante: Saudações, Feitosa".

Os comerciantes da cidade, quando souberam do telegrama, ficaram desesperados. O município não ia mais receber ajuda. Ainda mais porque a mensagem era falsa e apressada. Feitosa correu de novo ao telégrafo:

"Governador José Américo: cancelo chuvas. População continua aflita. Feitosa, prefeito".

Sinceridade e sagacidade

Zé Cavalcanti, ex-deputado paraibano, conta em seu livro "A Política e os Políticos", que um coronel do sertão, ao passar o comando de seus domínios para o filho, aconselhou:

- Meu rapaz, se queres ser bem sucedido na política, cultiva estas duas verdades: a sinceridade e a sagacidade.

- O que é sinceridade, meu pai?

- É manter a palavra empenhada, custe o que custar.

- E o que é sagacidade?

- É nunca empenhar a palavra, custe o que custar.

Tucano bica, petista rebate

A campanha paulistana adentra o segundo turno sob bicadas do tucano Serra no candidato petista Fernando Haddad. As bicadas ocorrem em diferentes graus de contundência, pegando coisas da gestão do ex-ministro Haddad na Pasta da Educação como o Kit Gay, as provas vazadas do Enem, etc. O petista rebate com o argumento de que Serra destila ódio. E mais, lembra que o DNA do mensalão é mineiro. Serra espera que os ataques que faz consigam desconstruir a imagem do petista. E este acha que o revide acabe engolfando a imagem de Serra. Ora, nem um nem outro conseguirão induzir o eleitorado com suas estocadas recíprocas. O efeito é bem diferente do que esperam.

O efeito

Tenho lembrado, em muitas oportunidades e textos, que a desconstrução da imagem de candidatos só é eficaz quando o foco é o plano das ideias. Ou seja, quando se procura atacar as posições dos adversários sobre questões que afligem as massas eleitorais, desde grupamentos conservadores a contingentes abrigados nas margens. Exemplo dessa situação ocorreu com Celso Russomano, que recebeu uma paulada de Fernando Haddad quando defendeu custo mais alto de passagens para viagens mais longas. O pobre que mora nos confins da periferia de SP acabaria pagando o pato. Foi tiro e queda. Caiu Russomano. Coisas semelhantes podem ocorrer na esfera da defesa do aborto e de outros temas polêmicos.

Reforço de posições

Portanto, as campanhas negativas que procuram desconstruir perfis são, feitas as exceções, perniciosas aos candidatos que as patrocinam. No fundo, apenas reforçam posições e pontos de vista já firmados por eleitores já definidos de partidos e candidatos. E se isto é o que recomendam os manuais de marketing eleitoral, por que candidatos continuam a insistir em lições obsoletas? Velha resposta: porque os assessores de marketing querem testar todas as possibilidades. Ademais, há um grupo de porta-vozes informais que pensam na verdade da hipótese da desconstrução. Quando a diferença entre um candidato e outro ultrapassa a marca dos dois dígitos a vontade de encurtar a distância com a tática da guerra de guerrilha emerge com mais força.

O que se pode esperar?

Essa é a pergunta que fazem diariamente a este consultor. Que responde com o mantra: não tenho bola de cristal. Mas pode-se apontar tendências. Eis algo que parece platitude: quem saiu muito de baixo para chegar a um alto índice encarna a posição de candidato ascendente; a recíproca é verdadeira, ou seja, quem saiu de um alto índice e chega menor no segundo turno encarna o perfil descendente, em queda. Outro sinal é dado pelo índice de rejeição. Alta rejeição sinaliza alto risco; a recíproca é verdadeira. São duas abordagens a se considerar. Que o leitor/eleitor faça sua própria leitura.

Muita sede ao pote

A ambição na política é um fator de oportunidades. Quem tem ambição abre caminhos de determinação e persistência. Se um político ambiciona ser um alto cargo, bem mais alto do que o que exerce, precisa buscar os meios e instrumentos para viabilizar sua meta. Até aqui, tudo bem. Mas a meta precisa ser compatível com os meios que o político dispõe ou poderá dispor. Vamos dar nome à hipótese: Eduardo Campos, governador de PE, quer ser candidato à presidente da República. Se não vingar a ideia, diz-se que pleiteia ser candidato a vice na chapa encabeçada pela presidente Dilma à reeleição. Tem chances? Vejamos. O PSB teve um aumento de 53% em seu território municipal. Podendo crescer ainda mais. Foi o partido que mais ganhou com o processo eleitoral. Mas continua a ser menor do que o PT e o PMDB. Portanto, a meta é ambiciosa, mas o cacife é menor do que o governador de PE procura sinalizar.

O que pode acontecer?

Portanto, a parceria para 2014, em termos de presidência da República, deverá continuar envolvendo PT e PMDB. Edu Campos poderia se aliar à Aécio Neves e sair com ele numa chapa casando PSDB e PSB? Pode. Ele é um político pragmático. Nesse momento, deixará a amizade e o respeito que tem por Lula em segundo plano. Essa hipótese só vingará se a economia brasileira estiver capengando nos pastos de 2014. A economia será o termômetro da corrida de Campos. Que poderá cair na vala que ameaça colher políticos que querem dar um passo maior que as pernas. A ambição é importante, conforme ensina a lei; a ambição desmesurada mata.

Lula, o ideólogo

Para quem tem ainda alguma dúvida, eis a resposta : Lula não será mais candidato a nada. Basta refletir. Veio do andar mais baixo e subiu o mais alto. Comandou o país durante oito anos. Fez um governo de consolidação da base econômica de fortalecimento dos braços sociais do Estado. O maior programa de distribuição de renda da atualidade. Elegeu a presidente Dilma. Curou um câncer. Tirou do bolso candidaturas jovens, como as de Fernando Haddad, em SP, e Marcio Pochman, em Campinas. Pode eleger esses dois. É o guru do PT. O mais admirado político da atualidade. Tem carisma. Com toda essa bagagem, precisaria reforçá-la, ainda mais, com uma volta à presidência? Aqui pra nós, depois de pairar no Olimpo, descer à terra não seria retroceder?

Sociedade condenada

"Quando você perceber que, para produzir precisa obter a autorização de quem não produz nada; quando comprovar que o dinheiro flui para quem negocia não com bens, mas com favores; quando perceber que muitos ficam ricos pelo suborno e por influência, mais que pelo trabalho; que as leis não nos protegem deles mas, pelo contrário, são eles que estão protegidos de você; quando perceber que a corrupção é recompensada e a honestidade se converte em auto-sacrifício, então poderá afirmar, sem temor de errar, que sua sociedade está condenada". (Ayn Rand)

Eduardanas Cabralinas

Eduardo Paes mais parece um moço de recados de Sérgio Cabral. Nos últimos dias, tem dado entrevistas sobre a candidatura do governador Cabral para a vice da presidente Dilma em 2014 tirando da chapa Michel Temer. Que, aliás, está no auge de sua performance como articulador. Michel costurou o apoio do PMDB ao PT em diversos municípios, a partir de SP. A presidente Dilma, com quem tem estreitado as conversações, encontrou em seu vice o perfil do negociador e diplomata, dando a ele muitas representações no exterior. Pois bem, nesse momento de alto prestígio do vice, o prefeito Paes, cristão novo no PMDB, decidiu fustigá-lo e, de maneira deselegante, inventa a candidatura do seu amigo de boemia, Cabral, como vice de Dilma.

Indignação

O fato indignou o corpo peemedebista. Geddel Vieira Lima, que não tem papas na língua, lembrou que Paes, sem voz no partido, quer resgatar a República dos Guardanapos. Estocada para lembrar a farra parisiense do governador com Fernando Cavendish, todos dançando e envergando guardanapos na cabeça. Cavendish é personagem da CPI em andamento no Congresso. E assim, o tiro de Paes começa a entrar pela culatra. Os personagens de Paris à Meia Noite ameaçam voltar ao palco iluminado. Sob lembrança das bicadas ferozes que Eduardo Paes, ex-tucano de bico alto, dava em Lula. Nos bastidores, a indignação se expande : Paes troca de opinião e partido como troca de poeta. Dia desses, proclamou não ser PMDB, mas RJ. Se não é PMDB, por que tanto interesse em defender candidaturas como alto prócer do PMDB? Ou essa operação casada foi apenas um balão de ensaio?

Duda Mendonça

Esta coluna manifesta a sua satisfação pela absolvição de Duda Mendonça. E reconhece nesse profissional grandes qualidades como publicitário que escreveu seu nome em algumas das mais criativas e eficazes campanhas eleitorais do país.

Vereadores

A planilha de vereadores no Brasil ficou assim: PMDB, 7.964 (tinha 8.475); PSDB, 5.248 (tinha 5.897); PT, 5.164 (tinha 4.168); PP, 5.164 (tinha 5.128); PSD,4.6639 (não existia em 2008); PDT, 3.654 (tinha 3,523); PTB, 3.566 (tinha 3.934); PSB, 3.566 (tinha 2.956); DEM, 3.275 (tinha 4.801); PR, 3.190 (tinha 3.534). Outros: 12.135 (tinham 9.487).

Propaganda, à guisa de história

A propaganda política, ensinava Jean-Marie Domenach, professor francês de Humanidades e considerado um dos papas dessa ciência, "faz o povo sonhar com as grandezas passadas e com as glórias do futuro". Para "vender" esta miragem, a propaganda tem usado uma combinação de quatro impulsos - combativo, alimentar, sexual e paternal/maternal - que movem os seres vivos. Cada um desses instintos exerce uma função na estratégia de motivar e engajar a sociedade, mas os dois primeiros ganham ênfase por mexer com a conservação e a sobrevivência dos indivíduos. O uso da propaganda tem sido intenso não apenas nos ciclos dos grandes movimentos de massas - revoluções francesa e russa, I e II guerras mundiais - mas no dia a dia da política, transformando-se em eixo central das estratégias de marketing.

Correia de transmissão

Nos sistemas autoritários, é a correia de transmissão para dizer "a verdade dos governantes", enquanto nos regimes democráticos, passa a ser o anzol para pescar o voto dos eleitores e, ainda, o cabo de guerra para animar os exércitos das campanhas. A revolução francesa de 1789 pode ser considerada o marco da propaganda agressiva nos termos em que hoje se apresenta, inclusive neste nosso aguerrido segundo turno da campanha presidencial. Ali, os jacobinos, insuflados por Robespierre, produziram um manual de combate político, recheado de injúrias, calúnias, gracejos e pilhérias que acendiam os instintos mais primitivos das multidões.

Os americanos

Na atualidade, é a Nação norte-americana que detém a referência maior da propaganda agressiva, mola da campanha negativa. Este formato, cognominado de mudslinging pelos norte-americanos, apresenta efeitos positivos e negativos. No contexto dos dois grandes partidos que se revezam no poder - democrata e republicano -, diferenças entre perfis e programas são mais nítidas e a polarização sustentada por campanhas combativas ajuda a sociedade a salvaguardar os valores que a guiam, como o amor à verdade, a defesa dos direitos individuais e sociais, a liberdade de expressão, entre outros. Mesmo assim, nem sempre a estratégia de bater no adversário gera eficácia. Na campanha ao Senado, em 2008, a republicana Elizabeth Dole atacou a rival Kay Hagan, veiculando um anúncio que insinuava ser ela ateia. A democrata reagiu vigorosamente dizendo ser professora, religiosa e que Dole queria, na verdade, desviar a pauta econômica - eixo da crise financeira. Ganhou a disputa por uma margem de nove pontos. Já Lyndon Johnson, em 1964, detonou o republicano Barry Goldwater, associando-o à ameaça de uma guerra nuclear.

Conselho aos dois candidatos da campanha paulistana

Esta coluna dedica sua última nota a pequenos conselhos a políticos, governantes e líderes nacionais. Na última coluna, o espaço foi destinado aos candidatos que disputam o segundo turno. Pois bem, hoje a atenção se volta aos candidatos do maior pleito do Brasil, o da capital paulista:

1. Suas estocadas recíprocas - mensalão petista, mensalão mineiro, Kit Gay, falta de experiência, aborto - não fazem parte do menu apreciado pelo eleitor médio. Apenas reforçam pontos de vista de eleitores tradicionais dos partidos e candidatos.

2. Procurem apresentar propostas e ações para as diversas zonas e regiões que compõem a anatomia da capital. A partir das demandas mais urgentes e prioritárias.

3. Clareza, objetividade, concisão, precisão, proximidade. Eis alguns conceitos que podem servir de moldura aos programas. Falem com a expressão de suas crenças e com o ardor de suas convicções.

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(Gaudêncio Torquato)

terça-feira, 16 de outubro de 2012

OBSERVATÓRIO

04 de outubro de 2012. Três dias antes das eleições. O Jornal O POVO estampou matéria paga noticiando o resultado de uma pesquisa realizada em Crateús fazia mais de uma semana. Resultado: Carlos Felipe – 52,3%; Ivan - 38%. 05 de outubro de 2012. Sessenta mil panfletos haviam sido confeccionados em uma gráfica da cidade e estavam sendo distribuídos por todo o município. A peça publicitária induzia as pessoas a assimilarem que a pesquisa era do dia 04.10. E que Felipe venceria as eleições com uma maioria de 6.800 votos. No dia anterior, uma decisão judicial havia proibido a divulgação de outra pesquisa, realizada na semana da eleição, apontando a vitória de Ivan por uma pequena vantagem. Resultado: Carlos Felipe foi reeleito com uma diferença de 1.900 votos. Deve isso a três fatores: o embuste das pesquisas, a exclusividade da utilização da última noite de campanha (carreata de sábado) e o uso da máquina. Em todas as épocas, a máquina sempre foi usada a serviço da candidatura oficial. Agora não foi diferente (os contratados que o digam).

PESQUISAS

As eleições deste ano comprovaram que pesquisas – apesar do rigor científico e da eficácia metodológica - também são permeáveis a manipulações e fraudes. Por sua força indutiva sobre a população, as pesquisas têm enorme peso sobre o resultado das urnas. Há um considerável contingente de votantes que só se define na semana da eleição. Em se tratando de disputas acirradas, esse percentual do eleitorado que é adepto do voto útil (ou que “não quer perder o voto”) acaba sendo decisivo. Foi o que se deu em Fortaleza com a candidatura de Heitor Férrer. E em Crateús, com Ivan. Tivessem sido divulgados os números da última pesquisa, certamente estaríamos diante de outra realidade.

CANDIDATOS

Todos os cinco postulantes à Prefeitura de Crateús merecem registro, reconhecimento e encômios. Eduardo Machado representou a ousadia individual de um cidadão simples que, mesmo passando ao largo dos cânones gramaticais, deu o seu recado. Massaroca realizou o sonho pessoal de concorrer à Chefia do Executivo e, apesar dos contratempos, manteve a bandeira içada até o final da batalha. Adriana delimitou o território do idealismo, dos que fazem política bronzeados pelo sol da utopia. Ivan foi a grande revelação do pleito. Em apenas três meses catalisou a insatisfação popular e se viabilizou como alternativa de poder. Carlos Felipe garantiu a continuidade do seu projeto. Foi o vitorioso e ganhou mais quatro anos à frente da municipalidade.

AS LIÇÕES

No mês passado registramos nesta Coluna: “que ninguém seja tomado pelo espasmo da admiração se candidaturas oposicionistas, em grande número, obtiverem êxito nas próximas eleições. Domínios de várias décadas estão sob o signo da ameaça. Dia sete de outubro as urnas revelarão um novo cenário”. De fato a previsão se confirmou. Na região, vários municípios corroboraram esse prognóstico: Quiterianópolis, Independência, Ipaporanga, Ararendá... Essas eleições inauguraram uma nova fase na vida política. Um eleitor diferente – atento e exigente – está se gestando. Este novo eleitor tende a ser intolerante com o caciquismo duradouro. Há um ambiente propício à alternância de poder. Ninguém quer mais um mesmo grupo ou cacique mandando a vida toda. Novo Oriente escapou dessa onda porque o grupo da situação, inspirado na sensibilidade política de Nenen Coelho, resolveu se compor com um segmento da oposição. Agora, o Prefeito eleito Godô deverá dar uma oxigenada na gestão.

AS LIÇÕES II

Em Crateús, a candidatura de Ivan deixou um legado positivo. O candidato do PMDB fez uma campanha inovadora. Não se rendeu ao modelo tradicional. Fez compromissos simples, claros e exequíveis. Registrou-os em Cartório, a fim de que não ficassem como palavras ao vento, conforme faz a maioria dos candidatos. Como oposicionista, foi combativo sem resvalar para a irresponsabilidade. Só aceitou fazer denúncias de irregularidades que podia comprovar documentalmente. Cumpriu todas as obrigações pactuadas com os aliados, até porque só deu passos proporcionais às próprias pernas. Do ponto de vista financeiro, racionalizou custos, fez uma campanha modesta, sem abuso de poder econômico. Não cedeu a pressões grupais. Deixou nítido que estava ali para cumprir uma missão. Sempre alimentou o sonho de servir à sua terra. Estava preparado para dar o seu contributo. Dentre os nomes disponíveis no segmento político que compunha, revelou-se o mais talhado para o embate neste momento. Sai da arena de luta pela porta da frente. Está de parabéns!

AS LIÇÕES III

Carlos Felipe deverá fazer uma análise amiúde da campanha. Há quatro anos, saiu consagrado por mais de 60% dos votos. Agora, obteve menos da metade dos votos válidos. Ou seja, mais de 50% do eleitorado não quis lhe sufragar. Noutras palavras: se a oposição tivesse marchado de maneira unificada, teria ganhado a eleição. Isto significa que Felipe começa seu segundo mandato sem o carimbo da legitimidade majoritária do povo. Portanto, se pretender se reconciliar com a maioria, é indiscutível que há necessidade de fazer alterações. Terá o médico Prefeito a coragem de pegar no bisturi da burocracia prefeitural e realizar a devida cirurgia? Só o tempo dirá.

PARA REFLETIR

“Nada é permanente, exceto a mudança”. (Heráclito)

(Júnior Bonfim, na edição de hoje do Jornal Gazeta do Centro Oeste, Crateús, Ceará)

segunda-feira, 15 de outubro de 2012

À MESTRA ROSA, NO DIA DO PROFESSOR!


Ao tempo em que estava à frente da Secretaria de Educação de Crateús, convidei o Professor Celso Antunes para proferir uma palestra para a comunidade escolar. O longevo mestre, cabelos flor de algodão, distribuidor de sorrisos, olhar penetrantemente delicado, com o magistério da própria experiência encheu a nossa alma de graça e encantamento.

Contou-nos, dentre outros fatos, que, em missão cultural ao Japão, foi levado pelo Ministro da Educação daquele País para um encontro com o Imperador. Ao adentrar no salão do monarca, viu uma cena inusitada: o nobre se curvou, com litúrgica solenidade e reverente respeito, ante a presença dos dois professores. Ficou intrigado. Na saída, indagou ao Ministro o motivo daquele gesto. E ele respondeu: - Se o perguntássemos, ele responderia que presta reverência aos professores porque foram eles que o formaram.

Com essa citação, o mestre Antunes queria deixar registrado que nalguns rincões do planeta os professores estão colocados no lugar que merecem: sobre o púlpito do respeito social, no altar da admiração coletiva.

Talvez para provocar nossa capacidade alterativa ou, simplesmente, como uma cândida lamparina de referência, ainda existem remanescentes – raros, é bem verdade – de uma época áurea da educação, em que os que lideravam as salas de aula estavam, ao lado do Padre e do Juiz, entre as figuras que ocupavam a tribuna de honra da deferência comunitária.

Entre esses nomes, e com indiscutível destaque, está o da crateuense ROSA FERREIRA DE MORAES. Escrevo o seu nome em negrito e com letras maiúsculas porque as palavras que o compõem formam um ternário biográfico.

A sua artística porção ROSA desabrocha permanentemente, como uma flor de roseira, no jardim invisível do seu coração, em especial quando, de posse de um pincel, nos chama a atenção para detalhes pouco perceptíveis do cotidiano, através de quadros pintados com acurado esmero e fina sensibilidade.

Dentre os presentes que esta vida me deu está o privilégio de ter sido aluno desta FERREIRA. De ferro, mesmo. Com seu jeito austero, com sua imponente compleição física, com sua voz grave e seu olhar severo, ensinou-nos os benefícios da férrea disciplina, da dedicação inflexível, do cumprimento do objetivo delineado, da satisfação do dever cumprido. Recordo como era comum, em suas aulas, quando identificava desvios de conduta nos alunos, a realização de paradas bruscas na transmissão dos conteúdos a fim de que pudéssemos ouvir exortações sobre os caminhos da retidão e do bem, verdadeiras lições de moral, preciosos sermões sobre as virtudes de cultuarmos princípios de vida.

Outro dia, ela me confidenciou que seu saudoso pai sempre escrevia MORAES com E ao invés de I porque, no entendimento dele, Morais com “i” era plural de moral. Para mim, esse MORAES deita raízes na palavra mora, não no sentido comercial de retardamento do devedor no pagamento de uma dívida, mas no profundo sentido espiritual da palavra demora, que se resume na rara capacidade de saber o tempo certo de cada coisa, de não atropelar o curso natural da existência, de não queimar etapas na caminhada da vida.

Em suas mais de oito décadas de vida, ROSA FERREIRA DE MORAES tem reluzido. Se pudesse, mudaria o seu nome para ROSA FERREIRA ESTRELA DE MORAES, pois é isto que ela é: uma pétala resplandecente que há iluminado gerações.

(Júnior Bonfim, in "Amores e Clamores da Cidade")