sábado, 7 de julho de 2012

DOIS AMIGOS

sexta-feira, 6 de julho de 2012

PARABÉNS, CRATEÚS!

Seis de julho. Aniversário de Crateús. Cento e oitenta anos...

Minha tarefa, hoje, é prazerosa e desafiadora! Ao invés de lapidar uma crônica, devo compor uma canção. Sim! Badalar o sino da aurora, entoar um hino de luz, concatenar as partituras de uma música de vida. Da mesma fonte em que brota a modesta prosa, há que germinar a genuína poesia. É festa. É o natalício da cidade!

Mas... O que cantar? Os paupérrimos lares que povoam as entradas da nossa zona urbana ou a beleza das mulheres que caminham como que desfilando sobre uma passarela? A sensação de amplidão que as nossas largas ruas despertam ou a comoção no peito que os pequenos mendigos de mãos estendidas provocam? A paisagem exuberante preservada na Serra das Almas ou o leito desfalecido do rio Poty?

Crateús, lâmpada referencial, que foste ‘orgulho do Ceará, terra da luz’, neste aniversário em particular, devemos ao mesmo tempo acender a vela da tristeza e repartir o bolo da alegria, pois sob a força da luz e a hesitação das trevas se forjou a nossa história.

Pulsante terra dos índios Karatius – comemoravam tudo e celebravam com regozijo todos os passos da linha histórica, desde nascimento à morte – que nos legou a compulsão festiva. A diversão está impregnada em nossa alma e deita raízes em nossos primórdios!

Bucólica fazenda Piranhas no século XVIII, quando os índios rareavam e a ganância se alastrava, ocasião em que foste abiscoitada por uma baiana descendente da Casa da Torre, Luiza Coelho da Rocha Passos, que assumiu o comando destas paragens e enviou um administrador, João Ribeiro Lima (posteriormente homenageado com o nome de uma rua no bairro Fátima I), construtor da capela que abrigou a imagem do nosso Padroeiro, Senhor do Bonfim, vinda da Bahia nos ombros de escravos.

Vila Príncipe Imperial, pertencente ao município de Marvão, estado do Piauí, que no dia 22 de outubro de 1880 protagonizou uma cena de nobreza e abnegação: a fim de que o Piauí tivesse acesso ao ilimitado espaço do mar, aceitaste que o teu limitado território passasse a pertencer ao Ceará.

Cidade de Crateús desde 1911, imperscrutável pátria de afeto, dolorida caldeira de desejos, espelhado cômodo de sonhos – foste capaz de portentosas atitudes de grandeza e gestos quase imperdoáveis de mesquinhez. Pelos trilhos da tua ferrovia, inaugurada em 1912, correu o trem como único transporte que levava e trazia os mantimentos essenciais para os corpos famintos e para os espíritos sedentos.

É claro que deves pedir perdão, senhora reverente, permanentemente ajoelhada ante o altar da Serra da Ibiapaba, por teus equívocos mais evidentes, como o percalço durante a passagem da Coluna Prestes, que, esperando a calorosa mão estendida da hospitalidade, recebeu o fogo ardente das balas, disparadas das torres da Catedral.

Impossível não relembrar, ‘Crateús, terra querida’, o provocado ataque de amnésia sofrido durante a ditadura Vargas, quando a ação criminosa de alguns soldados levou à fogueira documentos históricos da mais alta relevância, atas e livros importantes, gerando uma perda parcial da nossa memória.

Perdeste um pouco ‘do teu porte real de fidalguia, majestosa princesa do oeste’, quando aceitaste essa escura e quente vestimenta asfáltica, que encobriu a beleza do teu charmoso paralelepípedo e tornou atual a exclamação de Cícero na primeira Catilinária: O tempora! O mores! (Ó tempos! Ó costumes!). Se bem que a pedra da resistência permanece irremovível, impermeável e reluzente. E as águas da nossa principal artéria, a via liquida onde ‘a pequenina cidade surgiu um dia’, o rio Poty, nossa veia vital, envolto em lama, clama zelo pelo leito, reclama uma atitude de respeito.

Nestes 180 anos, despertemos para a imensa tarefa que nos convoca a dura realidade, de tornar melhor esta terra, para o bem de todos! Parabéns gerais!

(Júnior Bonfim)

quinta-feira, 5 de julho de 2012

O PRAZER E A FELICIDADE


Eu escrevia um artigo sobre a felicidade como obrigação do mercado, quando li o texto de Contardo Calligaris na Folha, que citava uma pesquisa sobre o tema, chamada "Procurar a felicidade pode fazer as pessoas felizes?".

Diz um trecho da pesquisa: "Espera-se que aqueles que buscam a felicidade alcancem resultados benéficos. Não necessariamente (diz a pesquisa) porque quanto mais valorizam a felicidade, mais poderão se decepcionar."

Eu penso: que felicidade? A de ontem ou a de hoje?

Antigamente, a felicidade era uma missão a ser cumprida, a conquista de algo maior que nos coroasse de louros; a felicidade demandava "sacrifícios".

Hoje, o mercado demanda uma felicidade dinâmica e incessante, como uma "fast-food" da alma. O mundo veloz da internet, do celular, do mercado financeiro nos obriga a uma gincana contra a morte ou velhice. Ser deprimido não é mais "comercial". É impossível ser feliz como nos anúncios de margarina, é impossível ser sexy como nos comerciais de cerveja.

A felicidade hoje é "não" ver. Felicidade é uma lista de negações. Não ter câncer, não ler jornal, não olhar os mendigos na rua, não ter coração. A felicidade é ter bom funcionamento. Há décadas, McLuhan falou que os meios de comunicação são extensões de nossos braços, olhos e ouvidos. Hoje, nós é que somos extensões das coisas. Fulano é a extensão de um banco, sicrano comporta-se como um celular, beltrana rebola feito um liquidificador.

Felicidade é ser desejado, é entrar num circuito comercial de sorrisos e festas e virar um objeto de consumo.

Sem a promessa de eternidade, tudo vira uma aventura. Em vez da felicidade, temos o gozo rápido do sexo em vez do longo sofrimento gozoso do amor.

O amor hoje é o cultivo da "intensidade" contra a "eternidade". Aí, a dor vem como prazer, a saudade como excitação, o instante como eterno.

Por isso, perdemos esperanças de plenitude e celebramos sonhos efêmeros. Bem - dirão vocês - resta-nos o amor... Mas, onde anda hoje em dia, esta pulsão chamada "amor"? O amor não tem mais porto, não tem onde ancorar, não tem mais a família nuclear para se abrigar. O amor ficou pelas ruas, em busca de objeto, esfarrapado, sem rumo. Não temos mais músicas românticas, nem "olhos de ressaca", nem o formicida com guaraná. É o fim do "happy end". Mas, mesmo assim, continuamos ansiando por uma felicidade impalpável.

Por isso, em vez da felicidade, cresce o império do prazer.

Mas o prazer pode nos dar culpa e a culpa pode dar prazer. Os masoquistas sabem disso: todo prazer será castigado. O prazer deixa muito a desejar, o prazer nos deixa insatisfeitos porque acaba logo. O prazer sempre demanda mais prazer, orgias mais perversas, drogas mais alucinantes. O prazer não quer ter fim. A felicidade é analógica e o prazer digital. A felicidade ficou chata, tem de ser administrada, e é feita também de sofrimentos e dúvidas. O prazer não; pega, mata e come. As caras das revistas ostentam uma gargalhada eterna. O prazer quer botar o mundo para dentro, sugar, comer a vida como um pudim, pela boca, por todos os buracos. Prazer é "cool". Felicidade é careta.

Mas o prazer (infelizmente) precisa da proibição. Antigamente, tínhamos pecados perfumando os prazeres, mas hoje ficou tudo no instante pleno, principalmente no sexo, para substituir frustrações políticas e sociais.

Nosso prazer anda muito exclusivista; o chamado "outro" não passa de um pretexto para nosso narcisismo masturbatório.

Aliás, o vício solitário é bem seguro. A punheta é onisciente e gira em todas as direções, é um caleidoscópio de mulheres ou de homens. Não me refiro à mera "coça na miúda", nem no "estrangulamento do pele-vermelha", mas à masturbação na alma, ao narcisismo de seres perdidos num deserto de possibilidades sem-fim. Em meio a tanta liberdade, nunca fomos tão solitários. A masturbação existe até no grande amor romântico, onde os dois narcisismos se beijam, se arranham, mas não se comunicam. Cada vez mais o parcial, o fortuito é gozoso. Só o parcial nos excita. Temos de parar de sofrer por uma plenitude que nunca alcançamos.

Não há mais "todo"; só partes. Não se chega a lugar nenhum porque não há onde chegar. A felicidade não é sair do mundo, como privilegiados seres, como estrelas de cinema, mas é entrar em contato com a falta de sentido de tudo. Usamos uma máscara sorridente, um disfarce para nos proteger desse abismo. Mas esse abismo é nossa salvação. A aceitação do incompleto é um chamado à vida. Temos de ser felizes sem esperança.

Mas aí, dirá o leitor mais sábio e, talvez, mais velho: "Sim, mas e a contemplação calma da natureza, os lagos dourados, as flores e as crianças correndo, e as auroras, os céus estrelados? E a arte? Isso não é prazer?" Sim, sim, mas por trás dessa calma contemplação de auroras e belezas, florestas e oceanos, há um ensaio para o fim, há o preparo para o maior prazer de todos, há a saudade oculta de algo que está mais além da vida, ou antes dela. Entre flores e lagos dourados contemplamos nosso fim. É uma saudade não sabemos de quê...

É um prazer além do prazer (v. Freud), é o prazer da matéria. A matéria quer paz. Nós somos um transtorno para a matéria que quer voltar a seu silêncio. A vida e o prazer enchem o saco da matéria que é obrigada a nos suportar. A matéria olha nossos arroubos de vida e espera pacientemente que acabe a valentia para voltarmos ao prado, à grama, à terra, ao sossego da tumba. Mais além do princípio do prazer, está a invencível vontade de morrer. Somos sonhados pela matéria da qual somos apenas um tremor, um despautério, uma agitação banal. A matéria nos sonha com tanta perfeição que pensamos que temos espírito.

O prazer da matéria é paciente. Só sentiremos um grande prazer quando não estivermos mais presentes.

(Arnaldo Jabor - em O Estado de S.Paulo)

quarta-feira, 4 de julho de 2012

CONJUNTURA NACIONAL

Bucéfalo

Esta historinha chegou aos meus ouvidos pela narração de um observador atento da política potiguar. Luís Gomes/RN, cidade onde este escriba nasceu. Década de 70. Cenário: plenário da Câmara Municipal. Aécio Batista, conhecido por Barichon de Giron (na linguagem dos ciganos que viviam na região), dentista e vereador, dispara contra o adversário um verbete desconhecido no plenário:

- Vossa Excelência é um bucéfalo.

Pego de surpresa, o adversário, ressabiado, retrucou:

- O que vossa Excelência quer dizer com esse termo? Se for adulativo, muito obrigado a vossa Excelência, com os meus cumprimentos à sua genitora e aos seus irmãos e irmãs; agora, se for atacativo, vá para a pqp, seu fdp.

O presidente da sessão mandou trazer um dicionário. Lá estava: "indivíduo ignorante, rude ou pouco inteligente". Era atacativo. Os dois se atracaram no plenário. Quase saiu tiro. A palavra bucéfalo foi abolida daquele Parlamento. Sob pena de risco de nova tragédia. Não consigo conter o riso.

Era uma vez...Mil vezes

Agradeço às amigas e amigos que compareceram ao evento de lançamento do meu livro "Era uma vez Mil Vezes...O Brasil de Todos os Vícios". A Livraria Cultura da av. Paulista estava cheia. Agradeço, igualmente, às autoridades que estiveram ali presentes, grandes amigos, a partir do vice-presidente da República, Michel Temer; governador de São Paulo, Geraldo Alckmin; prefeito da capital paulistana, Gilberto Kassab; e José Police Neto, Netinho, presidente da Câmara Municipal. Registro a presença de amigos empresários, a partir do presidente da FIESP/CIESP, Paulo Skaf. E a muitos que vieram de longe. Agradeço, ainda, ao José Mário e a Topbooks a magnanimidade pelo acolhimento ao livro, tão bem editado.

História de ontem

A fumaça espessa começa a se diluir. Não ainda de modo a permitir distinguir com clareza a linha do horizonte. Refiro-me aos interesses do PSB e do PT. Faço esta reflexão. Historicamente, os dois partidos têm atuado juntos. Consideram-se unidos pelo cordão de esquerda. Logo, irmanam-se no ideal de manter a integração de suas bandeiras, até porque sentem que não chegou o momento de entregar a rapadura às oposições. Esse é o primeiro ditame. Vamos ao outro: Eduardo Campos, poderoso mandachuva do PSB, neto de Miguel Arraes, e Luiz Inácio Lula da Silva consideram-se irmãos. Nos ideais, lutas, anseios e expectativas. Terceiro argumento: ambos são nordestinos e pernambucanos. Lula despejou um caminhão de dinheiro em Pernambuco durante os 8 anos de seu mandato. Pernambuco perdia o lugar de líder do Nordeste para o Ceará. Com os altos investimentos, recuperou a liderança.

História de hoje

Portanto, Eduardo Campos é uma espécie de irmão mais novo de Lula. A cada momento crítico, corre para ouvir seu guru. E Lula vai administrando as querelas, dando conselhos, mostrando os caminhos. Mas a política tem curvas. Nem sempre as retas traçadas podem ser seguidas. O PSB, então, quer mudar o percurso. Sua meta é tomar o lugar do PMDB como parceiro preferencial do PT. Isto é, indicar o vice de Dilma em 2018. Que seria o próprio Eduardo Campos. A condição pode ser definida pelo ditado: cresça e apareça. Por conseguinte, o PSB quer fazer uma baciada enorme de prefeitos. Se fizer bonito no campo eleitoral, habilita-se a tomar o lugar do PMDB. É isso que explica o fato de o PSB ter candidatos em 11 capitais. Em 2008, tinha candidatos em apenas 7.

"Nenhum deles tem caráter: o que se podia fazer? Tiveram de roubar um". (Friedrich Nietzsche)

Rompimento simbólico

É evidente que para ter performance mais competitiva adiante, o PSB precisa expandir seu cacife. Nesse momento, a interlocução de irmãos não funciona entre Campos e Lula. Importa, agora, é agir com pragmatismo. Em Belo Horizonte, por exemplo, rompe-se o acordo entre os dois partidos. Aécio Neves, que apoia a reeleição de Marcio Lacerda, não aceitou a coligação entre PT e PSB para o chapão de vereadores. PT caiu fora da aliança e quer, agora, indicar o vice-prefeito, Roberto Carvalho. Ou, em seu lugar, Patrus Ananias. Resumo : PT e PSB procuram fazer suas arrumações pensando, cada qual, em 2014. Lula gostaria que o vice da Dilma fosse Eduardo Campos. Que já internalizou a ideia: para isso, precisa ter cacife.

"Quem não tem nada para fazer, um nada já lhe dá o que fazer". (Friedrich Nietzsche)

PMDB olha de soslaio

O PMDB está atento aos movimentos do PSB. Sabe que se conseguir eleger a maior planilha de prefeitos, será, mais uma vez, a noiva cobiçada. Terá candidatos em 2.800 municípios. Se consolidar sua posição de maior partido, será difícil Eduardo Campos querer pleitear posição na chapa petista. Ademais, os acenos de Eduardo Campos na direção do tucano Aécio Neves começam a incomodar núcleos do petismo. Sabe-se que Campos e Neves mantêm uma sólida amizade, construída lá atrás quando os avôs de ambos, Miguel Arraes e Tancredo Neves, tricotavam o tecido político. Também se sabe que a relação entre Campos e Dilma é muito diferente - e distante - da relação que o governador de Pernambuco mantinha com o pernambucano Luiz Inácio.

"Quem sempre se cuidou muito acaba ficando doente de tanto cuidado". (Friedrich Nietzsche)

Bicos tucanos rachados

Está ficando muito difícil a convivência entre as alas de Geraldo Alckmin e José Serra, com prejuízo na linha de frente do engajamento na campanha para a prefeitura. Tudo porque Serra aceitou a indicação do PSD do prefeito Kassab: Alexandre Schneider como vice de Serra. A indicação tem lógica: o ex-secretário de Educação da prefeitura é um perfil que se contrapõe ao perfil jovial de Haddad, do PT. Entende do "riscado" da Educação, podendo, dessa forma, ser uma voz autorizada a falar sobre o tema. Ademais, o PSD, com a conquista do tempo eleitoral obtida no STF, cederá mais de 2 minutos de mídia eleitoral ao PSDB. Tem lógica a escolha de Serra.

Câmaras inchadas

Este ano, o país ganhará mais 5.070 vereadores, pulando de 51.748 para 56.818. O aumento do número de vereadores se deve à EC 58, aprovada em 2008, pela qual o número de cadeiras nas Câmaras em 2012 seria calculado com base na população aferida pelo IBGE em 2011.

Dilma no auge

Recorrente questão a que respondo em entrevistas sobre a crescente popularidade da presidente Dilma: 1º) o eleitor expressa opinião de acordo com a geografia do voto - bolso, estômago, coração, cabeça. Bolso com a grana do Bolsa-Família significa geladeira cheia, estômago saciado, coração agradecido e cabeça simpática ao patrocinador; 2º) Conceitos abstratos - que incluem ameaças de crise econômica - não batem no sistema cognitivo do eleitor. A não ser que esvaziem seu bolso; 3º) Eventuais efeitos de crise na frente econômica chegam ao bolso do eleitor muito tempo depois; 4º) Perfil técnico de Dilma passa ao cidadão a imagem de perfil asséptico, moral e ético.

A ovelha tosquiada

Uma ovelha que estava sendo tosquiada desastradamente disse ao tosquiador: "Se é a minha lã que tu queres, corta mais alto; porém se é a minha carne que tu desejas, então mata-me de uma vez, e para de me torturar aos poucos". Esta fábula é adequada àqueles que exercem desajeitadamente o seu ofício. (As fábulas de Esopo)

Aécio na moita

Quem deu uma encolhida na mídia foi o senador Aécio Neves. Mas os olheiros passam a informação: passou aqui, foi ali, esteve acolá. Sempre às escondidas. O fato é que está fazendo articulação. Procura reforçar laços com o PSB, de Eduardo Campos.

E o PSD, hein?

Mais uma vez, o prefeito Gilberto Kassab deu ampla demonstração de competência. Criou, em tempo recorde, um partido com mais de 50 deputados. Diziam que esse ente não sobreviveria por não ter chances de ganhar mídia eleitoral e recursos. Ganhou uma coisa e outra. O partido, mesmo apoiando Serra em São Paulo, integrará a base de apoio do governo Dilma. O prefeito tem com ela uma boa relação de respeito e cordialidade. Lula também tem boa relação com Kassab. Qual o futuro desse partido?

Fusão ou bloco?

Fusão, nem pensar. O partido poderá, isso sim, pensar na formação de um bloco. Tudo vai depender dos resultados de outubro. Há quem fale bastante na formação de um bloco com o PSB, de Eduardo Campos. Difícil ocorrer. O prefeito Gilberto Kassab mantém intensa interlocução com o vice-presidente da República, Michel Temer. No futuro, se os projetos de Michel e Eduardo entrarem em choque, este analista não tem dúvidas: Kassab se inclinará pelo projeto do presidente licenciado do PMDB.

A vida é breve

"O fato é o seguinte: não recebemos uma vida breve, mas a fazemos, nem somos dela carentes, mas esbanjadores. Tal como abundantes e régios recursos, quando caem nas mãos de um mau senhor, dissipam-se num momento, enquanto que, por pequenos que sejam, se são confiados a um bom guarda, crescem pelo uso, assim também nossa vida se estende por muito tempo, para aquele que sabe dela bem dispor". (Sobre a Brevidade da Vida - Sêneca)

Grecca

Rafael Grecca, candidato do PMDB a prefeito de Curitiba, é um dos mais criativos perfis da administração pública brasileira.

D'Ávila

Manuela D'Ávila abre boas possibilidades em Porto Alegre. Perfil afável. E não tem medo de gastar sola de sapato.

Chalita

Desenvolto, gastando sola na periferia paulistana, o deputado Gabriel Chalita abre bons espaços em sua pré-campanha. Irradia simpatia.

Haddad

Fernando Haddad, por sua vez, continua apartando as querelas entre alas petistas. E a responder questões polêmicas ligadas à Educação. Agora, parte para a briga com o vice de Serra, Alexandre Schneider. Que jogou uma isca na direção dele. Fisgada.

Russomano

Se Celso Russomano/PRB conseguir segurar o índice de 20% até meados de setembro, será uma grande surpresa. Escolheu um vice denso, preparado e fluente: Luiz Flávio Borges D'Urso/PTB.

PMDB e PT nas capitais

O PMDB terá candidatos em 12 capitais; em 2008, tinha candidatos em 13. PT terá candidaturas em 17; em 2008, disputava em 19.

No Rio

No Rio de Janeiro, uma parte do PT deverá apoiar o candidato do PSOL, deputado Marcelo Freixo. Também uma ala do PDT, ligada ao Movimento de Resistência Leonel Brizola, já anunciara apoio ao deputado estadual.

DER e os lotes

O DER de São Paulo vai contratar, selecionadas por técnica e preço, 14 empresas para fiscalizar 14 lotes de obras rodoviárias. As notas técnicas já foram publicadas. 14 empresas diferentes tiveram as maiores notas. As mesmas 14 tiveram notas menores nos outros 13 lotes em que não obtiveram a maior nota. Surpreende que a competência de cada empresa se manifeste apenas em 1 lote de 14! A velha competência - ou se tem ou não. É isso?

Brizola Neto

Setores de serviços estão agradavelmente surpresos com o desempenho do deputado Brizola Neto no comando da Pasta do Trabalho. Têm sido bem acolhidos pelo ministro.

Como iria eu sabê-lo?

Cassado pelos militares na primeira lista do golpe de 64, Jânio passou longas temporadas na Europa, sobretudo Londres. Um dia, ia pela Champs Elysées, em Paris, um grupo de turistas brasileiros o viu. Um deles perguntou:

- Presidente, o senhor sabe quem sou eu?

Jânio ficou com ódio, arregalou os olhos:

- Ora, meu caro, se você, que é você, não sabe quem você é, como iria eu sabê-lo?

E seguiu em frente. ( Da verve do Sebastião Nery)

Conselho ao governador Campos

Esta coluna dedica sua última nota a pequenos conselhos a políticos, governantes e líderes nacionais. Na última coluna, o espaço foi destinado aos marqueteiros. Hoje, sua atenção se volta ao governador de Pernambuco, Eduardo Campos:

1. Quem tudo quer tudo perde. Não vá com muita sede ao pote. A impressão é de que você, no intuito de alargar a avenida de 2014, passa com a moto-niveladora por cima de tudo (acordos) e de todos (inclusive parceiros).

2. Cada coisa no seu tempo. A política obedece a um ciclo de cinco fases: lançamento de uma ideia (perfil), crescimento, consolidação/maturidade, clímax e declínio. Muitos declinam antes do clímax. Um perigo.

3. A coerência ainda é uma virtude da política. Procurar preservá-la continua a ser um bom conselho. Tenha mais cautela. Afinal, cautela e caldo de galinha não fazem mal a ninguém.

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(Gaudêncio Torquato)

terça-feira, 3 de julho de 2012

POLÍTICA & ECONOMIA NA REAL

Europa Unida? I

A reunião dos líderes das 17 nações que compõe a UE na semana passada levou a conclusão óbvia de que sem ajuda ao sistema financeiro e na ausência de medidas mínimas de estímulo econômico a zona do euro iria explodir ou passar por uma longa estagnação. Uma vitória de quase todos os países contra a burra teimosia da alemã Angela Merkel. Apesar da decisão, há que se observar as "regras" desta ajuda, as quais devem estar prontas no próximo dia cinco. Neste campo, os germânicos terão mais instrumentos para mostrar seu poder e novamente as nações em crise estarão à mercê dos debates. Dois outros pontos também são relevantes: (i) o tamanho do pacote de ajuda (150 bi de euros), se este será suficiente e (ii) as regras de união fiscal e o monitoramento centralizado no Banco Central Europeu do sistema financeiro. Neste último item houve de fato um avanço mais significativo de vez que se superou a visão excessivamente nacionalista dos membros da UE.

Europa Unida? II

Enquanto os líderes europeus buscavam a solução para seus gigantescos problemas comuns, Bruxelas divulgava a taxa de desemprego nas 17 nações, 11,1%, a mais alta deste o início da série. A Espanha bateu o recorde de 24,6% e a Grécia, 23%. Neste contexto, o risco político permanece elevado e as possibilidades de que a longa duração da crise contamine as decisões recentes são muito elevadas. Nesta semana, o FMI estará visitando Atenas e cobrará mais resultados dos cansados gregos. Na Espanha e Itália os leilões de dívida pública darão o tom dos mercados e os ingleses estão debatendo se saem da UE. Como se vê, será preciso algum tempo para se verificar se a Europa conseguiu de fato um ponto de convergência ou se adiou os conflitos por mais algum tempo. Começa o período de férias no Velho Continente. Haverá descanso ?

Os mercados respiram

A reunião da UE e a decisão da Suprema Corte norte-americana que validou juridicamente o plano de universalização do setor de saúde proposto por Obama foram fatores suficientes para a euforia do mercado ao final da semana passada. A probabilidade maior é que exista certa calma no mercado nos próximos dias e, até mesmo, semanas. Todavia, a tendência estrutural é que os investidores mantenham-se cautelosos e que as oscilações de humor retornem com o tempo. Serão precisas constatações mais veementes de que o auge da crise foi superado para que haja uma reversão de expectativas no cenário do mercado financeiro e de capital ao redor do mundo. Até lá, haverá muita observação, mesmo porque as apostas num cenário negativo são as que prevalecem no momento.

Número que assusta

De todas as revisões a respeitos de suas perspectivas para a economia brasileira este ano, a mais assustadora feita pelo BC em seu último Relatório Trimestral de Inflação é a dos investimentos privados : saltou de um crescimento de 4,7% em relação ao ano passado para apenas 1%. Pior ainda diz o IBRE, da FGV: será zero o incremento dos investimentos em 2012. Assim, não há crescimento sustentável forte também em 2013.

O PIBinho do BC

Não foi muito ao gosto do governo a iniciativa do BC de reduzir de uma cartada só, de 3,5% para 2,5% seu prognóstico de inflação para este ano e de aumentar de 4,4% para 4,7% a previsão de inflação. A observação contra é de que o BC foi na onda do "mercado" e pode influenciar negativamente a decisão de investidores. Contudo, tudo indica que Alexandre Tombini e seus diretores estavam preocupados em perder crédito de confiança com os agentes econômicos, tal a defasagem entre as perspectivas deles e as do BC. Em matéria de crescimento da economia, por exemplo, a maioria das previsões, tanto dos "mercadistas", como dos homens dos negócios, gira em torno de 2% - esta semana a previsão na mediana do Boletim do BC ficou em 2,05%. Há um mês estava em 2,72%. Daí para baixo. A confiança sobre os efeitos das medidas constantes de aceleração do crescimento do ministro Guido Mantega são limitadíssimas. A impressão generalizada é que o governo peca por falta de ousadia, por limitações de ordem gerencial e de ambiente político.

PT: o adversário é outro I

O PT acreditava que os adversários a serem batidos em 2012, com vistas ao jogo principal de 2014, eram o PSDB e o PMDB, os dois únicos que poderiam, segundo a ótica petista, ameaçar seus sonhos de hegemonia na política nacional e de controle do poder para uns bons anos futuros, até 2018 ou, quem sabe, para além deste período. Os tucanos por razões óbvias são a oposição de fato e de direito, embora confusa, e os únicos que, teoricamente, podem ameaçar a permanência do PT no poder Federal. Por isso, até, o empenho superior para derrotar o PSB em seu berço - agora, na prefeitura da capital paulista, com uma preparação para tomar o Palácio dos Bandeirantes em 2014. O PMDB por seu tamanho, sua capilaridade, é um parceiro incômodo por seu apetite e suas exigências e que, como um pêndulo, pode mudar os rumos de sua aliança e fazer o negócio da política pender para outro lado. A ideia é enfraquecer o PMDB e substituí-lo por outra legenda como parceiro preferencial nos próximos anos de poder.

PT: o adversário é outro II

De repente, não mais que de repente, o PT começou a desconfiar que o verdadeiro adversário pode ser outro, exatamente aquele que ele estava cevando para futuras alianças prioritárias: o PSB do governador Eduardo Campos. As manobras políticas do neto do ex-governador de Pernambuco Miguel Arraes na condução das alianças municipais despertaram nos petistas a certeza de que Campos, político jovem, simpático, e bem avaliado governante, está armando voos próprios que não passam necessariamente pelas asas do PT.

PT: o adversário é outro III

O rompimento das alianças com os petistas em Recife e em Fortaleza foram os primeiros sinais de alerta. A demora da definição em SP e depois as confusões causadas por Luiza Erundina em SP também levantaram suspeitas. Finalmente, veio no fim de semana a decisão do PSB de BH de não aceitar coligação para a eleição de governadores, levando ao rompimento da aliança entre os dois partidos para reeleger Marcio Lacerda. Mesmo que a crise de Minas seja contornada, pois ainda há tempo, a desconfiança ficou. Para os petistas, Campos só quer vantagens, só cede mesmo onde seu partido não tem interesse ou está fraco. O fantasma da traição ronda a mente de muitos petistas. O problema é o que fazer, uma vez que o PMDB não é de incentivar ninguém a pôr a mão no fogo por sua fidelidade. O PT começa a ficar isolado politicamente. Um tanto por sua própria culpa, por seu próprio apetite. Quem com hegemonia fere, corre o risco de ser ferido com traições.

Dilma: os adversários são os mesmos

Não é uma divisão ainda clara, nem admitida, mas é visível nos corredores da política que já há um PT de Dilma e um PT de Lula. Enquanto Dilma e os seus, ainda muito minoritários, estão cada vez mais dilmistas, boa parte do PT é cada vez mais lulista, o que necessariamente não quer dizer a mesma coisa, embora o abrigo de ambos seja a mesma sigla. A desconfiança dos lulistas é que a presidente age cada vez mais, sem rupturas, para deslocar o eixo de poder no partido. Alguns não ousam nem pensar, mas a eleição presidencial de 2014 está neste jogo.

A quem interessa? I

Lula promete federalizar a eleição municipal de SP. Será bom para Fernando Haddad ? Afinal, ele terá de se haver com discussões sobre temas com os quais nem ele e nem a cidade tem nada a ver, como o mensalão e o caso dos aloprados. Ou podem ser temas bons para Lula que quer manter um discurso nacional e ainda rever algumas das histórias de seu governo. Pode ser bom para Dilma que poderá ter algumas de suas políticas contestadas em palanques físicos e eletrônicos pela oposição ou para Lula que não aceita, de forma alguma, um papel secundário nas discussões políticas e econômicas nacionais. De qualquer modo, a presidente tem demonstrado não estar interessada em se envolver diretamente e com força na campanha municipal. Nem ela nem seus ministros de mais confiança - estes talvez com exceção de suas áreas de interesse eleitoral.

A quem interessa? II

Quem também parece muito interessado na "federalização" do debate eleitoral é o senador Aécio Neves. Sem estar diretamente envolvido na disputa, com uma situação mais ou menos tranquila em MG, apesar do último arrufo na aliança PSB/PSDB/PT em BH, ele quer aproveitar a campanha para se tornar nacionalmente mais conhecido e firmar suas diferenças tanto com Dilma, Lula e o PT, mas também com José Serra, ainda seu maior - e talvez único - adversário no tucanato. Com Serra restrito a SP e tendo de se defender dos ataques que receberá de todos os adversários, Aécio estará mais ou menos livre para voar pelo Brasil, ajudando tucanos e outros aliados possíveis. Terá tempo livre até para tentar dar uma ajudazinha aos tucanos de SP - se for solicitado.

Diagnóstico correto, mas incompleto

Da ministra Cármen Lúcia, do STF, e presidente do TSE, ao votar contra o pedido do PSD de Gilberto Kassab, aprovado por seus pares, de ter mais tempo de TV na propaganda eleitoral obrigatória: "Eu diria que aos partidos novos falta povo. Eu não conheço democracia sem povo". Na realidade, cada vez mais falta "povo" aos partidos brasileiros de um modo geral, não apenas aos novos, agremiações de caciques e meros dutos eleitorais.

A nova herança maldita - capítulo I

Semanas atrás informávamos que nos bastidores oficiais de Brasília já se começava a rosnar sobre certa "herança maldita" - uma "nova", é claro, distinta daquela que Lula atribuía ao ex-presidente FHC sempre que alguma dificuldade aparecia a sua frente em seus oito anos de Palácio do Planalto. Agora, já não muito discretamente, esta nova herança começa a ser explicitada. O primeiro foco foi a Petrobras, com a revisão de seus planos de investimentos para os próximos cinco anos. Cortando daqui e dali, a presidente da empresa, Graça Foster, disse, sem citar seu antecessor, José Sergio Gabrielli, que as metas anteriores eram irrealistas, que projetos eram aprovados a esmo, sem estarem prontos e daí por diante. Graça e sua comandante no Palácio do Planalto estão jogando para o alto facas para que estão caindo em suas próprias cabeças : Lula era o presidente dessa fase de irrealismo, mas Dilma foi ministra das Minas e Energia e, portanto, chefe da Petrobras durante uma parte desse período. Durante todo o mandato de Lula, foi presidente do Conselho de Administração da empresa, só sendo substituída por Guido Mantega quando saiu para se candidatar à presidência da República. Por que só Gabrielli paga toda a responsabilidade por uma gestão de claro viés político na maior estatal brasileira ?

E por falar em política

A revisão feita nos investimentos da Petrobras gerou sérios ruídos políticos com aliados preferenciais e complicados de Dilma : a suspensão da construção das refinarias do CE e do MA, dois compromissos político-eleitorais de Lula, acendeu a irritação dos suscetíveis e agressivos irmãos Gomes - Ciro e Cid - e o discreto (nas reações), porém não menos agressivo quando se trata de defender seus feudos, senador José Sarney. Sobrou para o ministro das Minas e Energia, Edison Lobão, tourear as feras. Logo ele, Lobão, que de sua pasta é sempre um dos últimos a saber das coisas.

A nova herança maldita - capítulo II

Há muitas outras línguas coçando em Brasília, além das da Petrobras vindas diretamente do RJ. Das mais inquietas é a área educacional. Mas que está forçada a sofrer calada para não prejudicar o candidato Delfim à prefeitura de SP, Fernando Haddad. Mesmo assim, possivelmente como reflexo da greve dos professores universitários, que além de reivindicarem um plano de carreira, propugnam também por melhores condições de trabalho, a presidente Dilma baixou um decreto, pouco comentado esta semana, tornando mais rígidas as regras para aberturas de novas universidades públicas federais: "A implantação de novas unidades de ensino e o provimento dos respectivos cargos e funções gratificadas dependerá da existência de instalações adequadas e de recursos financeiros necessários ao seu funcionamento". Um dos orgulhos da dupla Dilma-Haddad é exatamente a criação de uma série de novas escolas federais. Em tempo : essas histórias sobre a nova herança maldita terão ainda muitos capítulos.

Ambiente conturbado

Amplia-se o clima de greve entre o funcionalismo Federal diante da quase indiferença - os líderes sindicais dizem que é má vontade e intransigência - dos negociadores oficiais. As conversas quase todas estão obstruídas ou ocorrem em escalões sem poder de decisão e não há sinais de que alguma solução possa estar a caminho, mesmo no longo prazo.

Troca-troca na CPI

Para aquecer a CPI Cachoeira-Delta e não deixar que ela morra desmoralizada, os partidos concordaram com a convocação do dono da Delta, Fernando Cavendish. Até porque divergências entre os aliados tornam inevitável tal procedimento. Todavia, chamar para depor uma testemunha bomba como o ex-diretor geral do DNIT, Luiz Antonio Pagot, continua fora de propósito. Para livrar Pagot do foco do PSDB e da oposição, os governistas ameaçaram convocar também Paulo Vieira de Souza, ex-diretor de engenharia da Dersa, conhecido como Paulo Preto, e acusado de fazer caixa dois para campanhas tucanas. O jogo ficará, então, no momento, empatado.

Pânico supremo

As circunstâncias que levaram o ministro Lewandowski a entregar seu parecer sobre o processo do mensalão num prazo que, confessado por ele, ofendeu seus desejos e princípios, criaram um pavor maior ainda entre os mensaleiros e seus defensores de que eles não deverão ter dias muito tranquilos depois do dia 2/8. Já há entre as defensorias quem já esteja fazendo contas de possíveis penas. E ninguém estranhe que, no desespero, eles comecem a se estranhar, uns acusando outros para se defenderem. Será cada um por si e nenhum por todos.

Isenção do STF

O STF está abalado pelas pressões de todos os lados para julgar os envolvidos no tal do mensalão. O voo raso do supersônico que quebrou as janelas do "Palácio da Justiça" é, inusitadamente, bastante simbólico do momento por que passa a Suprema Corte. Cabe-lhe por dever de ofício ter isenção nos seus julgamentos. A necessária transparência dos juízes vem dos autos, representação maior e quiçá única da honestidade e decência que se espera de qualquer juiz, sobretudo daqueles que integram o STF. Ocorre que o excesso de exposição da mídia dos ministros, suas opiniões sobre o trabalho dos colegas e a incômoda liberdade dos advogados nos corredores da Corte acabam por intrigar quem olha de fora o trabalho do STF. Estarão os togados a praticar a melhor Justiça? Veremos.

Substituição no STF

Vai ser igualmente interessante verificar como será a atuação da presidente Dilma na substituição dos dois ministros do STF que se aposentam após o julgamento do mensalão, no caso, Peluso e Ayres Britto. O midiático ex-ministro Márcio Thomaz Bastos está restrito em suas ações por conta de sua clientela caudalosa, sobretudo a acusada de jogatina e corrupção e outras coisas mais. De outro lado, a presidente Dilma estará a formar a Suprema Corte possivelmente para além de seu próprio mandato. O momento do STF é especial e seu destino no médio prazo dependerá muito de eventos importantes no curto prazo.


(por Francisco Petros e José Marcio Mendonça)

segunda-feira, 2 de julho de 2012

BACAMARTE INTRÉPIDO



Tornou-se um persistente hábito, ao passar em frente à Catedral do Senhor do Bonfim, olhar displicentemente para o lado esquerdo da Igreja da Matriz e enxergar um vistoso busto no meio da praça. Nós somos aquilo que fazemos, repetidamente, de um raro uso a um costume, do hábito ao vício, há muito sei disso. Mas ao vê-la, a singela praça, me sinto um simples ser metálico atraído por um poderoso imã. Apuro mais a vista e o busto de um poeta não mais vejo, mas enxergo ao longe, uma líquida resignação como um lago descansando no fim de tarde assombreada, sereno, sentado numa cadeira disposta na calçada, um monumento vivo. Convido-me e vou prosear com o longevo historiador Ferreirinha, um patrimônio cultural da cidade, assim, sorvo mais um pouco a Praça José Coriolano e desfaço minhas inquietações, lendo nas folhinhas amareladas de quem guardou na mente privilegiada o conhecimento, a sabedoria e as experiências obtidas no livro do tempo.

A praça foi um dos arrebatados assuntos de nossa conversa e com uma lembrança autêntica, ele me disse:

- Professor, quando o meu amigo e poeta Gerardo Melo Mourão esteve recebendo o título de cidadão crateuense na Câmara dos Vereadores, neste prédio aqui ao lado, ele olhou longamente para a praça e notei que o seu semblante mudou. Súbito, dirigiu-se aos políticos, ali presentes, demonstrando uma reflexiva decepção. Ergueu os braços, em desespero, rumo ao espaço e bradou firme: “Meu povo, cadê o José Coriolano!?”

Sempre que proseio assim, com os mais velhos, com meus olhos de sofreguidão, os meus ouvidos de aprendiz e um amplo desejo de revivência, saio com uma cidade antiga renovada no peito e a nova cordialmente amadurecida.

Ao chegar em casa, ainda ruminando o poeta Melo Mourão, que além de ter sido amigo de Pablo Neruda era também parente de José Coriolano e do “Coronel” José de Barros Mello, mais conhecido por “O Cascavel”, que morreu ao lado do seu intrépido bacamarte, passo direto para os livros da estante, e estão todos lá: O País dos Mourões, Peripécia de Geraldo, Rastro de Apolo e A invenção do Mar, todos do poeta Gerardo que passara parte da infância em Crateús, guardando na pueril memória a violenta beleza dos rifles papo-amarelo, nas últimas estripulias sangrentas de um clã, o tropel dos cangaceiros e a aventura da coluna Miguel – Prestes, quando sob as chuvas de balas, recolhia com sua mãe, os revolucionários mortos na calçada. No País dos Mourões delicio-me, mentalmente: “Apalpa, meu amor, meu rosto apalpa, / não tombei: / sou eu. / Como venho dos mortos nem eu sei, / mas sei que na partilha me tocou / a herança de sobreviver.”

Obrigo-me a reler outros trechos, de mais três livros, ali ao alcance da mão: Meus Avós de Raimundo Raul Correia, Geneagrafia dos Melos de Irismar de Melo Torres e o esclarecedor Bacamarte dos Mourões de Nertan Macêdo, que foi um dos ocupantes da cadeira Nº 7 da Academia Cearense de Letras, cujo patrono é Clovis Bevilaqua.
Sinto um avermelhado cheiro de sangue, saído daquelas páginas amarelas, a saturar minhas narinas alérgicas. No começo do Século XIX, quando as cidades ainda surgiam ao redor das fábricas fervilhando de trabalhadores, nos sertões de Crateús ebulia o ímpeto guerreiro dos Melos Mourões e no inclemente agreste dos Inhamuns, se excitavam impacientes por lutas, os Feitosas. Constituíam um único clã familiar que se disseminou por boa parte do Ceará e Piauí, formando o país dos Mourões. Povoaram uma imensidão, todos denodadamente valentes e violentos, todos intrépidos, lavrando a terra, criando gado, matando e morrendo, em lutas que se tornaram memoráveis. Alexandre da Silva Mourão (IV), num dia de inclemente sol, subiu a Serra dos Tucuns no meio de 200 praças para abafar a Balaiada, a primeira revolta genuína, uma façanha de pobres contra os ricos, no estado do maranhão.

No livro, Meus Avós, leio: 1847 a 1851 – enfrentam-se Mourões e Melos nos sertões de Crateús. Estas famílias se uniam e depois se intrigavam. O destemido Alexandre Mourão, um homenzarrão habituado a rijeza do sertão, de quem emanava uma crueldade pelos olhos azuis, foi perseguido implacavelmente com sanha e fúria, pelo Pe. Martiniano de Alencar, pai de José de Alencar. Alexandre bateu pernas, em desesperada fuga, pelo sertão a semear Mourões nas raparigas em cio, ao som dos trovejantes bacamartes e dos famigerados papo-amarelo, dando murro em ponta da faca, como ele dizia, fugindo do padre benze-cacête, o mão-de-ferro, o filho da primeira mulher heroína do Brasil, Bárbara de Alencar, que ousou proclamar a República do Crato, no Ceará.

Numa época agitada e impetuosa, repleta de falsas patentes de coronéis e tenentes, compradas por fazendeiros e pistoleiros, um caso curioso foi o assassinato do Pe. Inácio Viera de Melo. Na comarca Príncipe Imperial (no Piauí) onde duas famílias se revezavam no poder, uma chefiada pelo Padre colado (nomeado) da Freguesia do Senhor do Bonfim, Francisco Ferreira Santiago, do Partido Conservador (Os Muquecas) e a outra era do Partido Liberal, Os Melos, liderados pelo Pe. Inácio, homem inteligente e destemido. Viviam em constantes lutas mortais, por vinganças pessoais e prestações de contas. O Cascavel, irmão do Pe. Inácio, pistoleiro audacioso e turbulento, atacava a ferro e fogo, sem dar folga aos adversários.

Após as eleições gerais, em 1849, os Muquecas contra-atacam visando exterminar o malévolo Mourão, que escapa alertado pelo estrondo de um espalhafatoso bacamarte boca de sino, pois o disparo, num tiro frande carregado com grosso chumbo e pregos, errara o alvo. Mas para um verdadeiro Mourão, vingança não é prato que se come frio. O revide acontece no povoado de Pelo Sinal (cidade de Independência), José de Barros aniquila um subdelegado, um capitão e o sobrinho do Vigário adversário. Uma das testemunhas, assim disse: O Cascavel trajava uma sobrecasaca parda, chapéu de couro na cabeça, com um brilhante clavinote na mão e ainda deu uma descarga em frente a igreja, com vivas à Senhora de Santana.

No poder na Vila Príncipe Imperial, os Muquecas, controlam até a justiça. Instauram um processo contra os autores do crime de Pelo Sinal, incluindo Pe. Inácio, para liquidá-lo politicamente. Para escapar da emboscada, intencionalmente armado pelos Muquecas, o padre viaja para a província da Paraíba, a procura do Juiz de Direito de Piacó (lugar onde tombou o corpo do bandeirante/sertanista Domingos Jorge Velho, um grande aniquilador de índios, me confirma o padre historiador Geraldinho), que vinha dar um jeito na anarquia dominante, na região. Munidos de uma precatória para efeito de prisão, os inimigos do Pe. Inácio, saem determinados e respirando ódio e sangue, em sua perseguição e o alcançam em Pedregulho, a meia légua de Souza, na Paraíba.
Quando é para ser até os ventos contrários perdem as forças, e no enfadonho cansaço os viajantes consentem um descanso à sombra de frondosas oiticicas convidativas, na margem de um riacho. Esquecera o padre que a hora do sim é o descuido do não. A comitiva os alcança.

Os assassinatos foram com requinte de muita perversidade humana, que se pode ler com os mínimos detalhes, na página 100 do livro do Centenário de Crateús, um artigo do acadêmico historiador Flávio Machado. Só escapou daquele horroroso e cruel morticínio um menor, de nome José, sobrinho bastardo do Pe. Inácio e filho legítimo do famigerado Cascavel.

A comemoração da chacina foi com um memorável banquete, na casa do Pe. Muqueca, Francisco Ferreira Santiago, que deve ter sido celebrada assim: Tiveste sede de sangue, eu de sangue te encho! Como uma conclusão para um clã que horrorizou uma longa época nos sertões de Crateús, e para que saibam que, de todas as lutas do patriarca Alexandre, ele perdeu todos os filhos e o próprio velho caiu assassinado, tendo o direito de, agora, descansar em paz.

Foi uma época que, em Crateús, se fazia política sem promessas, sem discursos, sem festas populares, ela era feita no sangue e ferro e, por incrível que pareça, por homens de fé.

Alguém uma vez me disse que: “Não há uma ideia nascida do espírito humano que não tenha feito correr sangue sobre a Terra.” Meu Deus!

Para encerrar essa (in)conveniente e sanguinolenta crônica, só faço uma perguntinha: Se toda história nos traz lições que devem ser copiadas ou um passado que não deve e não pode ser repetido, como o horrível holocausto dos judeus, por que a nossa história, mesmo ensanguentada, não estão nos livros didáticos de nossas crianças?

Raimundo Candido