sábado, 16 de outubro de 2010

UM POEMA LEGAL!



Os Estatutos do Homem (Ato Institucional Permanente)
A Carlos Heitor Cony



Artigo I
Fica decretado que agora vale a verdade.
agora vale a vida,
e de mãos dadas,
marcharemos todos pela vida verdadeira.

Artigo II
Fica decretado que todos os dias da semana,
inclusive as terças-feiras mais cinzentas,
têm direito a converter-se em manhãs de domingo.

Artigo III
Fica decretado que, a partir deste instante,
haverá girassóis em todas as janelas,
que os girassóis terão direito
a abrir-se dentro da sombra;
e que as janelas devem permanecer, o dia inteiro,
abertas para o verde onde cresce a esperança.

Artigo IV
Fica decretado que o homem
não precisará nunca mais
duvidar do homem.
Que o homem confiará no homem
como a palmeira confia no vento,
como o vento confia no ar,
como o ar confia no campo azul do céu.

Parágrafo único:
O homem, confiará no homem
como um menino confia em outro menino.

Artigo V
Fica decretado que os homens
estão livres do jugo da mentira.
Nunca mais será preciso usar
a couraça do silêncio
nem a armadura de palavras.
O homem se sentará à mesa
com seu olhar limpo
porque a verdade passará a ser servida
antes da sobremesa.

Artigo VI
Fica estabelecida, durante dez séculos,
a prática sonhada pelo profeta Isaías,
e o lobo e o cordeiro pastarão juntos
e a comida de ambos terá o mesmo gosto de aurora.

Artigo VII
Por decreto irrevogável fica estabelecido
o reinado permanente da justiça e da claridade,
e a alegria será uma bandeira generosa
para sempre desfraldada na alma do povo.

Artigo VIII
Fica decretado que a maior dor
sempre foi e será sempre
não poder dar-se amor a quem se ama
e saber que é a água
que dá à planta o milagre da flor.

Artigo IX
Fica permitido que o pão de cada dia
tenha no homem o sinal de seu suor.
Mas que sobretudo tenha
sempre o quente sabor da ternura.

Artigo X
Fica permitido a qualquer pessoa,
qualquer hora da vida,
uso do traje branco.

Artigo XI
Fica decretado, por definição,
que o homem é um animal que ama
e que por isso é belo,
muito mais belo que a estrela da manhã.

Artigo XII
Decreta-se que nada será obrigado
nem proibido,
tudo será permitido,
inclusive brincar com os rinocerontes
e caminhar pelas tardes
com uma imensa begônia na lapela.

Parágrafo único:
Só uma coisa fica proibida:
amar sem amor.

Artigo XIII
Fica decretado que o dinheiro
não poderá nunca mais comprar
o sol das manhãs vindouras.
Expulso do grande baú do medo,
o dinheiro se transformará em uma espada fraternal
para defender o direito de cantar
e a festa do dia que chegou.

Artigo Final.
Fica proibido o uso da palavra liberdade,
a qual será suprimida dos dicionários
e do pântano enganoso das bocas.
A partir deste instante
a liberdade será algo vivo e transparente
como um fogo ou um rio,
e a sua morada será sempre
o coração do homem.


(Thiago de Mello, em Santiago do Chile, abril de 1964)

quinta-feira, 14 de outubro de 2010

OBSERVATÓRIO

Um casal amigo, que possui casa de veraneio na Serra da Guaramiranga, resolveu ir curtir por lá o feriado prolongado próximo passado. Em lá chegando, deparou-se com a família do caseiro, que tinha votado na Dilma no primeiro turno, agora exibindo propaganda do Serra. Seu Raimundo, o patriarca, foi inquirido pela patroa: - O que houve? Vocês mudaram o voto? A resposta: - É, doutora, nós estamos analisando... e, pensando bem, as propostas do homem são melhores. O salário mínimo de R$ 600,00, para o pobre, é excelente...

SEGUNDO TURNO

Via de regra, convencionou-se dizer que segundo turno é outra eleição. Em parte, sim. Prova é o que está acontecendo em nível nacional. A primeira pesquisa divulgada após o inicio deste segundo round trouxe números inimagináveis até bem pouco tempo. Uma diferença de apenas 07 (sete) pontos separa Dilma de Serra. E mais: o indicativo de uma onda verde-amarela. Serra está à frente da petista em todas as regiões do País, à exceção do Nordeste. Isto significa que teremos uma disputa acirradíssima.

O DEBATE

Exemplo maior dessa elevação de temperatura foi o debate promovido pela rede Bandeirantes no domingo passado. Diferentemente daquela mãezona doce e bem produzida, com ares de ternura e equilíbrio, Dilma estava surpreendentemente furiosa, tensa, agressiva. Segundo sondagem realizada pelo portal IG, Serra foi o vencedor do debate. 54% dos participantes da enquete disseram que o tucano teve desempenho melhor; 38% dizem que trocaram o voto para ele após o embate. O PSDB conquistou, no primeiro turno, os estados mais populosos e com maior fatia orçamentária da federação (São Paulo, Minas Gerais e Paraná). Isso deu ânimo novo aos seus aliados. Eleitos, ninguém teme mais o efeito Lula, que intimidou o País de ponta a ponta no primeiro turno.

CEARÁ

O Ceará foi um dos estados onde o efeito Lula se fez devastador. Ninguém discutiu a trajetória dos principais candidatos. O grande debate sobre a escolha dos nomes do Ceará no Senado foi de que não pode existir representante de oposição. Todos têm que estar alinhados, aliados do poder e dizendo amém ao governante maior. Essa precariedade do embate pode ser resumida em uma frase de Lula: “quem vota nium vota nioto, quem vota nioto vota nioto e num precisa mais votar em ninguém”. Com isso, desbancou Tasso – aquele que, na visão do governador Cid, “é o maior homem público do Ceará” – e elegeu a dupla Eunício-Pimentel.


CRATEÚS

O resultado da eleição em Crateús ficou aquém do esperado, tanto no campo da situação como na seara da oposição. O Prefeito Carlos Felipe, há dois anos, obteve 24.381 sufrágios, 63% dos votos válidos. Agora, só conseguiu transferir 8.077 votos (22,67%) para o seu candidato a estadual, doutor Pierre, e 5.493 votos (15,53%) para o federal, João Ananias. O PSDB, em que pese ter obtido o melhor desempenho – Domingos Neto, 7.707 votos (21,79%) e Nenen Coelho, 11.906 votos (33,42%) – ficou abaixo da expectativa. Hermínio Rezende – que correu por uma espécie de terceira via – abiscoitou 5.317 votos (14,92%). Todos, portanto, têm que realizar uma autocrítica, rever posturas e traçar novos rumos para o pleito municipal de 2012. Há uma sensação de esgotamento de todas essas repetitivas prédicas e práticas. Talvez seja o momento de reformularmos todos os modelos vigentes (vide Crônica abaixo).

ALERTA

Segundo o Jornal Diário do Nordeste da última terça-feira (12.10.10), “o quadro de Risco Dengue incluindo os 184 municípios do Ceará, divulgado pela Secretaria de Saúde do Estado (Sesa) classifica 46,7% das cidades com risco Alto e Muito Alto de transmissão da doença para 2011”. Dentre os municípios com risco muito alto está Crateús. O fato é muito preocupante e deve servir de alerta para as autoridades municipais.

CRÍTICAS

Sou crítico da Administração Municipal. Sem qualquer fresta de mágoa ou ressentimento, até porque meu coração nunca hospedou ódio. Sempre busco me despir de sentimentos menores. Faço observações e comentários independentes porque, imagino, seja esta uma forma diferente de contribuir com a cidadania da minha terra. Por isso esforço-me para juntar, a cada ponderação crítica, uma sugestão pertinente, um caminho propositivo.


PROCURADORIA E LICITAÇÃO

A Procuradoria Geral do Município e a Comissão Permanente de Licitação são dois setores que têm sido alvo de petardos na atual Administração. São duas áreas estratégicas, essenciais ao funcionamento governamental. A Procuradoria cuida do suporte jurídico, do balizamento legal da Administração. Pela Licitação passam todos os procedimentos para aquisição de serviços, compras e obras em geral. Ou seja, todos os negócios públicos. Resumindo: a Procuradoria é o altar onde se realiza a liturgia da legalidade; a Comissão de Licitação é a vidraça onde a população divisa se existe transparência na gestão.

PROCURADORIA E LICITAÇÃO II

Há poucos dias, o Procurador-Chefe foi exonerado, denunciando que há problemas nesse setor. Por outro lado, é voz corrente na cidade que existe direcionamento em determinados procedimentos licitatórios. Por via oblíqua um mesmo grupo controla essa área. Solução: 1. Para a Procuradoria, Concurso Público. Além de cumprir a Constituição, estaria se instituindo um quadro permanente e qualificado de Procuradores. Ganharia o município e, por conseqüência, a população. 2. A Comissão de Licitação, coração pulsante da coisa pública, deve ser melhor remunerada, para ficar imune às investidas escusas. Aliás, os membros da Comissão de Licitação, além de adequada capacitação, merecem ganhar equivalência salarial ao primeiro escalão, a fim de que ajam com independência e transparência.


PARA REFLETIR

“Quando o governo é formado de homens justos e honestos, o povo vive feliz.” (Livro dos Provérbios)


(Júnior Bonfim, na edição de hoje do Jornal Gazeta do Centro Oeste, Crateús, Ceará)

A RESSUREIÇÃO DA UTOPIA!

Admiro profundamente o músico brasileiro Milton Nascimento. Ele pertence a uma estirpe musical que soube aliar, com fulgurante talento, a boa música e o bom conteúdo. Letra e melodia se misturando em um baile de grandeza, itinerário telúrico, exercício reflexivo, eflúvio de excelência.

Dentre suas canções, tenho especial predileção por “Coração Civil”. Ela aborda um tema que me é caro: a utopia. Admiremos a letra, produto de uma parceria de Milton e Fernando Brant: “Quero a utopia, quero tudo e mais/ Quero a felicidade nos olhos de um pai/ Quero a alegria muita gente feliz/ Quero que a justiça reine em meu país/ Quero a liberdade, quero o vinho e o pão/ Quero ser amizade, quero amor, prazer/ Quero nossa cidade sempre ensolarada/ Os meninos e o povo no poder, eu quero ver

São José da Costa Rica, coração civil/ Me inspire no meu sonho de amor Brasil/ Se o poeta é o que sonha o que vai ser real/ Vou sonhar coisas boas que o homem faz/ E esperar pelos frutos no quintal/ Sem polícia, nem a milícia, nem feitiço, cadê poder?/ Viva a preguiça, viva a malícia que só a gente é que sabe ter/ Assim dizendo a minha utopia eu vou levando a vida/ Eu vou viver bem melhor/ Doido pra ver o meu sonho teimoso um dia se realizar”.

A Utopia – cujo berço etimológico é a união dos radicais gregos οὐ, ‘não’ e τόπος, ‘lugar’; portanto, o ‘não-lugar’ ou ‘lugar que não existe’ - tem como significado mais comum a idéia de um território ou mundo ideal, imaginário, fantástico – produto da usina de sonhos da mente humana. (O termo foi popularizado por Thomas More, pois serviu de título para uma de suas obras escritas em latim por volta de 1516. Segundo a versão de vários historiadores, More se fascinou pelas narrações extraordinárias de Américo Vespúcio sobre a recém avistada ilha de Fernando de Noronha, em 1503. Thomas More decidiu então escrever sobre um lugar novo e puro onde existiria uma sociedade perfeita.)

O fato é que vi com muita alegria, na recente disputa de primeiro turno da eleição presidencial, a ressurreição da utopia na política. A líder desse movimento pascal foi Marina Silva, a candidata do PV.

Marina é descendente de cearenses. Nasceu nas florestas do Acre e viveu na carne e na alma, no coração e na consciência, os estertores da extrema pobreza, os astres e desastres da vida pública. Sentiu no peito as flechas da adversidade, leu os signos das matas e adquiriu a noção mais correta de aldeia global. Descobriu no pulmão do planeta como construir uma proposta de oxigenação da política nacional.

Sua maior contribuição, ao nosso sentir, não foi a de trazer ao púlpito do debate eleitoral a imperiosa agenda da compatibilidade do desenvolvimento com respeito ao equilíbrio do meio ambiente. Seu mais importante contributo foi, indiscutivelmente, o da higienização da prédica política. A necessidade premente e a importância cardeal da eliminação desse discurso tóxico “entre PT e PSDB, agredindo-se mutuamente, sem conseguir ver mérito em nada um no outro; é a política velha, de ter de destruir o outro, ter de desqualificá-lo”.

Esse respeito pelo outro, embora suas idéias sejam absolutamente contrárias às nossas, é uma das principais facetas daquilo que se convencionou chamar de ética. Marina entrou e saiu da disputa sem recorrer ao desespero, ao vale-tudo, à máxima de que ‘em política, o feio é perder’. Em verdade, o feio – na política e na vida – não é perder uma batalha, mas abrir mão da dignidade, da construção de princípios, do culto aos valores essenciais.

Na nossa Crateús, como em quase todas as urbes do território nacional, ainda prevalece esse modo corrosivo de agir político. Porém, impende questionar: - Por que, para me eleger, tenho que explorar os defeitos do outro ao invés de apresentar minhas qualidades?... - Por que, ao assumir o poder, tenho que seguir a mesma rota obsessiva de buscar desqualificar os antecessores?...

Embora já tenhamos todos transigido com essa prática, julgo que podemos dela nos libertar e construir alternativas. Há algum tempo suscitei esse debate íntimo e bradei em outra crônica: ‘Abramos as pálpebras embaçadas, sacudamos a poeira das decepções, revigoremos o espírito, desbravemos novos caminhos, recuperemos a utopia, lancemos um outro olhar sobre o fazer político e marchemos na rota de uma cidade que cultue a justiça e a fraternidade. Crateús merece!’

Alguém pode dizer que isto é sonho, devaneio, utopia! Pode ser. Mesmo assim, prefiro seguir na mesma estrada de Eduardo Galeano: “A utopia está lá no horizonte. Aproximo-me dois passos, ela se afasta dois passos. Caminho dez passos e o horizonte corre dez passos. Por mais que eu caminhe, jamais alcançarei. Para que serve a utopia? Serve para isso: para que eu não deixe de caminhar”.


(Júnior Bonfim, na edição de hoje do Jornal Gazeta do Centro Oeste, Crateús, Ceará)

quarta-feira, 13 de outubro de 2010

EM NOTA, DAVID ZYLBERSZTAJN REFUTOU DILMA ROUSSEFF

Convertido por Dilma Rousseff em em personagem involuntário da peça eleitoral, David Zylbersztajn veio à boca do palco na terça (12).

Ex-diretor da Agência Nacional do Petróleo na era FHC, Zylbersztajn foi aos lábios de Dilma no debate de domingo, na Bandeirantes.

Ela o apresentou como “principal assessor energético” de José Serra. Em tom acusatório, acusou-o de defender a “privatização do pré-sal”.

Em nota, Zylbersztajn esclarece que nem é assessor de Serra nem defende a venda da riqueza pré-saleira à iniciativa privada.

“A candidata (ou quem a assessora) delira, talvez motivada por assombrações que lhe assomam, vendo uma privatização a cada esquina”, anotou.

No último parágrafo da nota, Zylbersztajn serve-se de uma expressão do livro Crime do Padre Amaro, de Eça de Queiroz.

Escreve que o autor atribui confusão análoga à “má fé cínica ou obtusidade córnea”.

Zylbersztajn diz suspeitar que, no caso de Dilma, sucede um misto dos dois fenômenos. Vai abaixo a nota:

“Durante o debate da Rede Bandeirantes, ocorrido no último domingo, dia 10, a candidata do Partido dos Trabalhadores, sra. Dilma Rousseff referiu-se a mim de forma inverídica e tendenciosa, induzindo, deliberadamente, o eleitor ao erro. A mesma afirmação tem sido repetida nos programas eleitorais.

Em primeiro lugar refere-se a mim como assessor do candidato do PSDB, José Serra. Devo esclarecer que não sou, nem nunca fui assessor do candidato.

Mais grave, afirma que declarei ser a favor da privatização do pré-sal! A candidata (ou quem a assessora) delira, talvez motivada por assombrações que lhe assomam, vendo uma privatização a cada esquina.

As declarações recentes sobre o assunto (e que encontram-se devidamente registradas em áudio e vídeo) foram dadas em seminário realizado pela Revista EXAME, no Rio de Janeiro, há cerca de uma semana.

Na qualidade de expositor, defendi a manutenção do atual sistema de concessões também para as futuras licitações, sejam elas no pré-sal, ou fora dele. As áreas do pré-sal, contém, como seria de se esperar, petróleo e gás, os mesmos existentes nas áreas fora do pré-sal.

O modelo de partilha proposto, na minha opinião, é danoso aos interesses do país, por motivos diversos, que não cabem explicar em detalhes neste momento. O pior deles refere-se à criação de uma estatal para comprar e vender petróleo.

Além do mais, a proposta é danosa à Petrobras, que, queira ou não, será obrigada a participar de todos os campos do pré-sal, seja isto de seu interesse, ou não.

Por fim, nunca é demais lembrar que o exitoso modelo de concessões foi implantado a partir da Lei do Petróleo, a partir de 1999. Durante o governo FHC foram realizados 4 leilões sob este regime (num dos quais foram licitadas as áreas do pré-sal). No governo do PT foram 6.

Ou seja, se este é um modelo privatizante, foi aplicado de forma bem sucedida e permanente pelo governo do qual fazia parte a candidata Dilma, inclusive na qualidade de Ministra de Minas e Energia.

Por fim, este episódio faz-me lembrar de um trecho da introdução do "Crime do Padre Amaro", de Eça de Queiroz, onde para uma situação semelhante, o autor afirmava tratar-se de ‘má fé cínica ou obtusidade córnea’. Neste caso, suponho tratar-se de ambas. Esta é a verdade”.

David Zylbersztajn



(Do blog do Josias, da Folha de São Paulo)

terça-feira, 12 de outubro de 2010

FELIZ CUMPLEAÑOS, PABLO!




HOJE É O NATALÍCIO DE PAULO NAZARENO SOARES ROSA!

Conheci o Paulo Nazareno no inicio da década de mil novecentos e oitenta.

Realizávamos uma reunião em prol do pré-candidato a prefeito de Crateús José Fernandes da Silva, médico sisudo e de bom coração, alagoano que se fez crateuense e capitão da resistência democrática na nossa terra.

Alguém anunciou a presença do jovem cirurgião Paulo. Silhueta magérrima e vasta cabeleira. Estilo hippie e olhar profundo.

O projeto que sonhávamos para a cidade foi abortado em 1982, mas veio à tona alguns anos depois. Eleito prefeito – com menos cabelos na cabeça e uns quilos a mais no corpo - Nazareno me convidou para integrar sua equipe.

Gestou-se entre nós, a partir do desenho de um projeto inovador para a cidade, um processo de cumplicidade espontânea. Laboramos grandes idéias, desenvolvemos arrojadas iniciativas. As pessoas experimentaram debates que incluíam a integração da equipe (intersetorialidade) e a transferência do poder ao povo (empoderamento). A cidade respirou uma auspiciosa aura de oxigenação em todas as áreas.

Depois, o ar voltou a se poluir pela contaminação do submundo da política. E a urbe, outra vez, involuiu.

A nossa convivência, que se iniciou no oceano da política, terminou por nos aproximar nas outras praias da vida. Conheci o ser sensível e profundo, endoscopista de almas, amante da natureza, aviador natural, apreciador da boa música, estudioso dos grandes temas, visionário trabalhador.

Jamais consegue ser morno. É sempre gelo ou brasa. Adora viver perigosamente, escalar as montanhas dos desafios, palmilhar as trilhas adversas. Saboreia intensamente cada prato que o restaurante da vida lhe oferece.

No entanto, ao longo da nossa convivência, tive a oportunidade de identificar a mais original das suas facetas: no lençol freático desse homem aparentemente duro, há um poço profundo de ternura.

Coincidentemente, nasceu no dia 12 de outubro. Talvez por isso seja, no mais recôndito de si mesmo, uma criança: brinca e briga, preza e reza, chora e ri, sofre e sonha.

Hoje completa mais um ano. Assopra velas. Apaga o que ficou para trás. Mira o futuro. E reparte o bolo da amizade.

Como dizem os latino-americanos, feliz cumpleaños!

(Por Júnior Bonfim)

SUA EXCELÊNCIA, TIRIRICA!

Enquanto candidato, Tiririca foi pichado por quase todos da mídia e da política tradicional por ser um palhaço e em razão dos seus slogans satíricos de campanha. Ele sempre foi um palhaço de fato e fazer piadas fazia parte de seu ganha-pão. Quando fazia gracejos em sua campanha estava sendo coerente. Somente por ter a profissão de palhaço, Tiririca nem é pior nem melhor do que nenhum concorrente profissional da política.

O festival de imagens de doutos engravatados enchendo literalmente os bolsos com dinheiro de corrupção, nas meias e nas bolsas, que enlamearam as telas deste país, desautorizaria as críticas ao palhaço. Essas imagens forçaram a renúncia de Joaquim Roriz, candidato favoritíssimo ao governo do Distrito Federal. Pior do que alguns fatos são algumas justificativas. Esse doutor justificara um empréstimo suspeito de dois milhões de reais, que seria para a compra de uma bezerra. Nem que fosse de diamantes, custaria tanto. Mas, esse gado de pelo de ouro passou a ser a salvação dos políticos ideais. Renan Calheiros, político por excelência, senador da República, utilizou da nova raça de gado de ouro para justificar o pagamento de pensão alimentícia por funcionários de empresa privada e outras dinheiramas de seu patrimônio “billgateano”. Sua gente o salvou da cassação, inclusive com apoio incondicional de Mercadante.

Episódios dessa natureza têm se repetido nos últimos anos, que passa a sensação de ser requisito inerente à gestão pública. Um pouco antes, o notável Severino Cavalcanti criara o mensalinho, que consistia em cobrar propina de proprietários de restaurantes localizados na Câmara dos Deputados. O ex-governador do Distrito Federal, José Roberto Arruda, renunciou ao cargo por ter sido filmado embolsando dinheiro. Ele e vários deputados. Pelos mesmos motivos, também foram presos e são acusados os governadores do Amapá e de Mato Grosso do Sul, além do prefeito de Dourados. O reeleito governador do Ceará passeou pela Europa com a sogra com dinheiro da viúva. O uso de celular de serviço pela filha do senador Tião Viana.

Essas mesmas condutas são praticadas diariamente pelo cidadão ao pagar propina em troca da relevação de falhas. No Rio de Janeiro, dois policiais não deram a mínima para o coordenador do grupo Afro Reggae agonizando, cena repetida pelos que liberaram os rapazes que mataram o filho da atriz Cissa Guimarães. Isso também é rotina para evitar as multas de trânsito, além dos cafezinhos para aprovação nos testes para aquisição da carteira nacional de habilitação. E até pelos vendedores de qualquer coisa para adentrarem nos ônibus coletivos.

Além dessas condutas de cunho mais restrito aos políticos, existem as práticas generalizadas. Todo dia vem acusação dos milhões pagos em horas extras no Senado e na Câmara dos Deputados, inclusive quando os parlamentares estão em férias. Acho que os brasileiros já esqueceram, mas não custa relembrar a farra das passagens aéreas pelos parlamentares federais; a filha do Excelentíssimo senador Tião Viana gastou 14,7 mil em ligações do telefone do Senado em passeio pelo México. Para fechar essa pequena célula desse jeito brasileiro de boa cidadania e representantes ideais do povo, a Folha de São Paulo estampou na capa do dia 4 de outubro de 2009 que 17 milhões de brasileiros admitiram ter vendido o voto na eleição de 2008.

Todos esses citados aparecem engravatados e se tratam respeitosamente por excelência, mesmo para mandarem tomar em qualquer lugar, quando mandam para a mãe tomar conta ou quando range os dentes para intimidar e ameaçar colegas, como costuma fazer o excelentíssimo senador Fernando Collor de Mello.

Tudo isso, para enfatizar a idéia de que corrupção é uma prática generalizada na política brasileira de há muito tempo, para a qual Tiririca não contribuiu em nada com sua candidatura e eleição, além de sua campanha ter ficado longe de descer a esse nível. Sua tão criticada baixa escolaridade o credencia a pleitear a Presidência da República na próxima eleição.

Ainda que fosse acusado de alguma falha grave, o Palhaço não chegaria ao patamar de bondades desses nobres. Portanto e literalmente, Tiririca é apenas uma pessoa simplória, um palhaço de fato que, por si só, não merecia tratamento depreciativo. Agora, se fizer alguma coisa positiva, será melhor do que muitos; se não fizer nada, empata com quase todos. Mas, se ele empregar parentes; se seus filhos fizerem lobbie para empresa de amigos; ou se tornarem bilionários do dia pra noite, o Palhaço teria grande chance de se tornar ministro da Casa Civil, pois se enquadraria no perfil brasileiro de fazer política. Daí se concluir que, se ele não corromper ou for corrompido até o final do mandato, Sua Excelência já teria sido melhor do que grande parte dos parlamentares brasileiros.



Pedro Cardoso da Costa – Interlagos/SP.

Bel. Direito

domingo, 10 de outubro de 2010

OS SETE PONTOS. OU: OS MISTIFICADORES JÁ PERDERAM A ELEIÇÃO!


Eu continuo sem saber quem vai ganhar as eleições. O que sei é que o resultado nunca esteve tão indefinido, desta feita até para aqueles que deram a disputa como resolvida. Os arquivos dos jornais estão por aí. Faziam-se crônicas sobre o triste destino de Serra; tratava-se a divisão de cargos do “governo Dilma” como um dado da realidade. A opinião dos jornalistas — com raras, raríssimas exceções mesmo! — era soprada por potentados morais acima de qualquer suspeita como Marcos Coimbra, do Vox Populi, ou Ricardo Guedes, do Sensus. Aqueles um pouquinho mais exigentes buscavam Carlos Augusto Montenegro. Os que pretendiam chutar com muita credibilidade só decretavam a vitória de Dilma no primeiro turno depois de ouvir Mauro Paulino, do Datafolha. E havia, finalmente, os que somavam todos esses — indo de Paulino, num extremo do possível, a Coimbra, no outro extremo — para tirar uma média…

A pratica foi inaugurada na redação de São Paulo do Estadão. Um dia esse jornal há de ter, na totalidade, a qualidade técnica de seus editoriais ou a coragem e percuciência de Dora Kramer! Esta é uma predição benigna, um bom augúrio! Outros augúrios, para outros veículos, não prodigalizo porque me atenho ao que é possível…

E, no entanto, está aí: segundo o Datafolha, sete pontos separam o tucano José Serra (41%) da petista Dilma Rousseff (48%). Sete! Numa eleição de segundo turno, valem 3,5 pontos. No mesmo instituto, há três semanas, a diferença entre os dois era de 22 pontos: 57% a 35%. Em 21 dias, o tucano teria ganhado 8 milhões de eleitores, e Dilma teria perdido 12,15 milhões. Possível? Pode ser. A quatro dias do primeiro turno, no dia 29, o Ibope apontava nada menos de 23 pontos de distância. Agora, dadas as margens de erro, ela pode ser de meros três pontos. Será o eleitorado tão inconstante assim?

Quero reiterar: eu não sei quem vai ganhar as eleições. “Eles”, estes de que falo (que não vão mudar de ramo, claro; continuarão a buscar motivos novos para justificar seus erros), é que sabiam. Decretavam, com fatalismo cínico: “O povo quer é consumir; ninguém está nem aí para escândalos”. Será que não? Tamanha “mudança” do eleitorado terá se dado só por causa do debate sobre a descriminação do aborto (já falo sobre o assunto e sobre a demofobia de Elio Gaspari)?

A vigarice intelectual ganhava ares de ciência. Números comprovadamente errados — basta ver o resultado das urnas — geravam infográficos que tingiam o Brasil de vermelho, no que não era uma onda, mas uma verdadeira tsunami tóxica, que a tudo contaminava. Era a realização de uma predição que vinha de priscas eras: com mais de 70% de popularidade, Lula fará a sua sucessora, e não há política que possa mudar isso. Afinal, como era mesmo, “é a economia, idiota!” Ela certamente conta. Mas “será sempre a política, idiota!”.

Serra estava liquidado, e, entanto, na largada do segundo turno, perder mesmo, segundo o Datafolha, ele só perde no Nordeste (62% a 31%). No Sul, está cinco pontos à frente (43% a 48%); no Sudeste, três (41% a 44%) e, no Norte Centro-Oeste, 2.

“O Reinaldo critica pesquisas, mas fala sobre elas para dizer que Serra melhorou?” EU NÃO CRITICO PESQUISAS. Repito o que já escrevi aqui e falei em vídeo na VEJA online: critiquei o “interpretacionismo”; os que usam números para antever resultados e decretar o fim antecipado do processo eleitoral. Jornais, revistas, sites noticiosos etc passaram a considerar que os institutos substituíam os eleitores. E eles não substituem. Não sei quem vai ganhar a eleição. Caso Serra seja o vitorioso, algumas penas deveria silenciar de vergonha. Mas não o farão porque não poderão usar o que não têm.

Mas o que moveu essa gente? Há os venais de sempre, e nada há a dizer a respeito deles porque são convictos como um táxi — não os de Nova York, que só aceitam levar a gente para um determinado lugar se também estiverem indo para lá, hehe… Há os ideológicos, que buscam o mesmo resultado dos vendidos, distorcendo a verdade por convicção; acreditam que a canalhice, quando crença ou ideologia, se torna uma virtude. E há os covardes de sempre — talvez sejam os piores, já digo a razão —, que temem a patrulha e emprestam substantivos e adjetivos novos ao consenso. Então se deixam engravidar pelo ouvido.

Resultado: o segundo turno está aí, ninguém pode mais “prever” o resultado, e alguns dados da equação até contam em favor do candidato tucano: o PSDB elegeu governadores em primeiro turno, por exemplo, nos dois maiores colégios eleitorais do país: São Paulo e Minas — além de Paraná e Tocantins; disputa o segundo em cinco outros. Como Serra vinha da “derrota certa”, sua candidatura ressurge revigorada; como Dilma vinha da “vitória certa”, sua candidatura deu sinais de fadiga, o que não quer dizer que não possa se recuperar.

À diferença do que sugerem as cheerleaders da candidatura Dilma, que se comportam agora como viúvas ressentidas e, obviamente precoces, o segundo turno é um sinal de vitalidade da democracia: não basta Lula mandar para acontecer. No mínimo, o eleitor pede mais esclarecimentos. E está aí em razão de conjunto de fatores — a polêmica sobre o aborto é uma delas, mas certamente não será a única. Quem sabe a própria imprensa fique melhor diante dessa realidade e aprenda, quando menos, a ser prudente, por mais difícil que seja. E fácil não é mesmo.

Relembrando: na pesquisa de hoje, Dilma aparece com 48%, e Serra, com 41%. No texto em que trata dos números, escreve Fernando Rodrigues na Folha:
“No dias 1º e 2 de outubro (…), Dilma teria 52% contra 40% de Serra (…) Dilma perdeu quatro pontos percentuais. A petista teve uma oscilação na margem de erro máxima da pesquisa”.

Está errado! Duvido que Mauro Paulino, o chefe do Datafolha endosse essa afirmação do redator. Ela não teve “oscilação” coisa nenhuma! Teve queda mesmo, FORA DA MARGEM DE ERRO, que é de dois pontos para mais ou para menos.

Esse quadro pode mudar depois de uma semana de propaganda na TV? Pode, sim. Meus textos compreendem essa possibilidade. Não faço antevisões, previsões, predições, maldições, nada. “Eles” fizeram — e estou certo de que acharão este texto muito parcial… Alô, analistas! Comecem a ouvir menos o João Santana e a ouvir mais o povo…

O segundo turno está aí, indefinido! Por pouco as urnas não foram seqüestradas pela associação entre marqueteiros, pesquiseiros e “analistas”. Pode dar Serra, pode dar Dilma. Em qualquer dos casos, os mistificadores da “análise” já perderam a eleição vergonhosamente.

(Por Reinaldo Azevedo)