sábado, 19 de maio de 2012

HOJE É O DIA DE SANTO IVO - O PADROEIRO DOS ADVOGADOS


No atual cenário conturbado que vive o mundo, mergulhado num ambiente crepuscular de guerras de cunho religioso e/ou político-econômico, ataques terroristas, e crise sem precedentes de valores morais, éticos e humanitários, as religiões exsurgem como verdadeiros últimos bastiões de esperança para a população, apesar de muitas vezes serem acusadas de "ópio do povo", instrumento de manipulação das massas, "muletas", etc.

Diante disso, pareceu-me oportuno escrever sobre Santo Ivo.

Num Estado laico e no qual a liberdade de culto religioso é garantia constitucional prevista no artigo 5º, VI, da Carta Magna vigente, sei que determinadas pessoas - inclusive vários advogados - não crêem em Santos, enquanto outras não professam qualquer sorte de fé. Portanto, o presente estudo não almeja ser laudatório nem peça de divergência ou querela religiosa entre as comunidades católicas, espíritas, judaicas, umbandistas, evangélicas, adventistas, presbiterianas, luteranas (e demais ramos protestantes), budistas, agnósticas e atéias nacionais.

Destarte, visa, pois este artigo apenas proceder a uma abordagem perfunctória da figura histórica daquele que é tido como o Santo patrono dos causídicos.

QUEM FOI SANTO IVO?

Todos os anos, no dia 19 de maio se comemora o Dia de Santo Ivo(1), o Santo padroeiro dos advogados.
Yves Hélory (Helori ou Heloury) era filho de Helori, lorde de Kermartin e Azo du Kenquis. Nasceu nas proximidades de Treguier, na Baixa Bretanha, conhecida região da França, no dia 17 de outubro de 1253. Era, pois de família da pequena nobreza e recebera apurada educação, humana e cristã. Sua mãe, dizia-lhe:

"Meu filho, procura viver sempre de tal maneira, que venhas a ser um santo".

Após a conclusão dos primeiros estudos em sua terra natal, sob a orientação de um jovem sacerdote, Ivo foi enviado em 1267, a tenra idade de 14 anos, à já prestigiada Universidade de Paris, onde estudou Artes Liberais e Teologia. Dentre os seus mestres estava o Doutor Angélico, o prodigioso Santo Tomás de Aquino. Ivo também presenciou conferências do grande São Boaventura, dele aprendendo o espírito franciscano. Posteriormente, o futuro santo foi para Orléans em 1277, onde se especializou em Direito Civil e Direito Canônico. Depois de anos de estudos, durante os quais brilhou entre seus colegas, voltou para Bretanha.
Em 1280, convidado a ser o conselheiro jurídico e juiz eclesiástico, trabalhou primeiramente como juiz episcopal na arquidiocese de Rennes, cidade capital do Ducado da Bretanha, por quatro anos, e depois em Tréguier. Competia-lhe julgar todo tipo de litígios, processos matrimoniais, de contratos e heranças, salvo os processos criminais. Em 1824, seu Bispo o convenceu de receber a Ordenação Sacerdotal, permitindo-lhe manifestar seus dotes de pregador e de reitor de igreja.

Concomitantemente funcionando como sacerdote, advogado e juiz (o que era possível naqueles tempos em virtude de não vigorar a atual estrita distinção funcional) Ivo multiplicava suas atividades, semeando sua fama, por toda a Bretanha, com um contingente crescente de pessoas que se socorriam a ele. Até milagres já eram atribuídos a ele em vida.

Em suma, a defesa intransigente dos injustiçados e dos necessitados deu a Ivo o título de "advogado dos pobres", título esse que continuou merecedor ao se tornar sacerdote, e ao construir um hospital, onde cuidava dos enfermos com suas próprias mãos. Eis outra faceta de Ivo: Frade Franciscano.

Alimentando-se apenas de pão e água, passando a noite em vigília de estudo e oração, não deixava, todavia de percorrer longos caminhos, para encontrar os que dele precisavam. Pregando, orientando, consolando, escutando, reconciliando, decidindo, distribuindo seu dinheiro aos pobres, atendendo os doentes, erigindo uma casa para abrigar os abandonados, levando à sepultura os mortos, Ivo conseguia a admiração, apreço e respeito dos seus contemporâneos.

Ivo de Kemartin morreu de causas naturais na França em 19 de maio de 1303, aos 50 anos de idade. Seu corpo foi sepultado na Catedral de Tréguier, onde é objeto de devoção do fiéis até hoje. A pedido de Bispos e autoridades civis e após minudente processo de investigação, o primeiro desse estilo e nessa seara, o Papa Clemente VI, com a solene Bula de 19 de maio de 1347, assinada em Avignon, proclamava Ivo inscrito no Catálogo dos Santos e Confessores, devendo ser venerado como Santo da Igreja Católica Apostólica Romana anualmente no dia 19 de maio.

HISTÓRIAS E LENDAS

Numa de suas famosas defesas que entraram para a História, Santo Ivo logrou inocentar da prisão uma pobre e ingênua mulher, quando faltava tão-somente o veredicto final. Ela teria sido vítima de dois farsantes que haviam entregue à ela uma mala com ouro e dinheiro, para que a guardasse e somente a entregasse na presença dos dois. Decorridos alguns dias, os ladrões prosseguiram com o pérfido plano: o primeiro conseguiu que a mulher lhe entregasse a mala e o segundo a levou ao Tribunal, acusando-a de roubo. Sensibilizado, Santo Ivo foi ao Tribunal e asseverou que a mulher sabia onde se encontrava a mala e estava disposta a exibi-la. Pediram aí que ela a mostrasse. Santo Ivo acresceu: "Uma vez que a acusada somente pode devolver a mala na presença dos dois interessados, fica o demandante obrigado a apresentar o seu companheiro neste tribunal..."

Nessa esteira, reza a lenda que um pobre, não possuindo dinheiro para comprar comida, aproximava-se diariamente, na hora do almoço, da janela da cozinha de um restaurante e, com o saboroso odor inalado, dava-se por satisfeito. Uma ocasião, o dono do restaurante o interpelou sobre o seu repetido e suspeito comportamento e, ouvindo a cândida explanação do miserável, exigiu dele pagamento como se ele tivesse de fato comido uma refeição. Santo Ivo assumiu a defesa do pobre e, no Tribunal, fez soar aos ouvidos do acusador as moedas que exigia, dizendo-lhe: "Considera-te pago com o som dessas moedas".

Há relatos também de que o próprio Santo Ivo em pessoa buscava nos castelos os cavalos e carneiros tirados dos pobres sob o alegado pretexto de impostos não pagos.

SANTO IVO E A DEFENSORIA PÚBLICA

A criação da "Instituição dos Advogados dos Pobres" foi de inspiração de Santo Ivo, máxime para atender causas dos pobres, viúvas, órfãos e menos afortunados de modo geral. Os motivos históricos e a identidade das funções constitucionais da Defensoria Pública com a "Instituição dos Advogados dos Pobres", fundada pelo aludido Santo, bem como a sua relevante contribuição para o exercício de uma cidadania plena, inspiraram, a escolha eletiva da data de seu falecimento para instituir as comemorações do "Dia do Defensor Público".

Nesse sentido, Magna Carta Brasileira de 1988, no artigo 134 e parágrafo único, tornou realidade, de certa forma, o sonho de Santo Ivo, ao instituir pioneiramente no mundo a Defensoria Pública.

ANEDOTA

Santo Ivo é igualmente alvo de uma célebre anedota jurídica.

Nesse diapasão, e como uma singela forma de homenagear a figura sempre atual do Barão de Itararé, o qual em 29 de janeiro de 2007 estaria completando 112 anos de vida, peço vênia para transcrever na íntegra um trecho extraído do livro "Máximas e Mínimas do Barão de Itararé":

"Como entrou no Céu o primeiro advogado”.

Logo que Santo Ivo morreu, encaminhou-se ao Céu e bateu à porta, que São Pedro não se atreveu a abrir, subestimando as razões do bom santo. - Faço o que quiseres - repetia o porteiro do Céu -, mas não acho que deva permitir a entrada a um advogado, não só porque nem um tem assento entre os santos, mas também porque, muito ao contrário, juraria que se encontram no inferno todos os de tua profissão.

Santo Ivo não se desconcertou; antes, como bom advogado, teve tão convincentes razões para rebater as de São Pedro que este lhe permitiu finalmente entrar no Céu, mas com a condição de permanecer junto à porta.

O hóspede entrou calmamente, sentou-se no lugar indicado por São Pedro, que foi participar a Nosso Senhor o sucedido...
- Fizeste mal! Muito mal, Pedro! - respondeu Deus, quando acabou de escutá-lo. - Havia resolvido que nenhum advogado entraria no Céu, e tinha cá minhas razões para isso. Mas já que está, deixa ficar; sem embargo, não deixes que ele se misture com os outros santos, pois do contrário acabarão no Céu a paz e a boa harmonia. Não o deixes passar além da porta.

Aborrecido e cabisbaixo, voltou São Pedro aonde estava Santo Ivo e comunicou-lhe as ordens dadas pelo Senhor. O Santo advogado encolheu os ombros e, à guisa de passatempo, começou a entabular conversa com São Pedro.

- Que posto ocupas aqui no Céu?

- Não sabes? Sou o porteiro.

- Por quanto tempo?...

- Para todo o sempre.

- Deixa disso. Só se tiveres algum contrato firmado...

- Não há contrato nem coisa que o valha, e para dizer a verdade não há necessidade disso.

- Como assim? Então não estás vendo, grande ingênuo, que qualquer dia Deus pode ter a idéia de te destituir, sem mais nem menos, do cargo que com zelo vens desempenhando há tanto tempo, sem que possas fazer valer teus direitos?
São Pedro coçou a orelha, e, mais amofinado que antes, foi novamente falar com Deus.

- Vamos lá, que é que pensas?

- Preciso de um contrato em que se declare que sou o porteiro do Céu para todo o sempre. Até hoje temos deixado as coisas andar à vontade; mas se vos der na idéia, qualquer dia me destituís do cargo que com tanto zelo...

- Não te dizia eu? Tudo isso são trapaças daquele advogadozinho que tens na porta e que soube encher-te a cabeça.
E ajuntou depois, tomando uma resolução:

- Anda, Pedro, corre e manda-o entrar imediatamente, pois prefiro tê-lo perto de mim a vê-lo junto à porta.

Eis como entrou no Céu o primeiro advogado."

Essa mesma piada também pode ser contada de outra forma:

"Quando Ivo morreu, apresentou-se ele a São Pedro no mesmo instante em que o faziam também diversas monjas. Ao advogado, Pedro fez grandes festas e proporcionou uma vibrante recepção no Céu. As monjas foram também admitidas, mas sem muita festa. Quando elas perguntaram a Pedro o porquê de tal diferença, tiveram esta resposta: "Minhas irmãs: é porque monjas entram aqui diariamente; mas esse advogado é o primeiro que alcançou a entrada do Céu".

CONCLUSÃO

Patrono dos advogados, Santo Ivo dedicou sua vida e obra à defesa dos pobres, fracos e oprimidos, contra os ricos e poderosos, notabilizando-se, máxime, por colocar a sua erudição à defesa nos Tribunais, de toda a classe de desafortunados, ofertando seus emolumentos aos pobres para que fossem utilizados em sua defesa. Com sua sabedoria, imparcialidade e espírito conciliador desfazia as inimizades e conquistava o respeito até dos que perdiam a contenda judicial.

Como se vê, Santo Ivo arrebatou a estima e apreço de todos pela integridade e retidão de vida e pela imparcialidade de seus juízos.

Além de Santo padroeiro dos advogados, Santo Ivo é patrono das crianças abandonadas e da Bretanha.

Assim, na sociedade superficial, materialista e consumista que vivemos, onde as perspectivas de certos advogados no mercado de trabalho não é mais mudar o mundo (como sonhavam os jovens idealistas acadêmicos do passado, que atualmente parece cada vez mais distante e sem volta), mas sim as próprias contas bancárias, só nos resta ficar com algumas das sábias e dadivosas palavras de Santo Ivo, as quais nos ensinam, ainda hoje, a refletir sobre o real significado de "caritas" (termo em latim para caridade), compaixão e amor ao próximo:

"Jura-me que sua causa é justa e eu a defenderei gratuitamente".

Eis, um modelo exemplar e inspirador a ser seguido por nossos doutos juízes e advogados.

(Por Francisco Carlos Távora de Albuquerque Caixeta)

quarta-feira, 16 de maio de 2012

CONJUNTURA NACIONAL

A circulação do dinheiro

Numa pequena cidade, os habitantes endividados passam um momento vivendo às custas de crédito. A sorte chega com um gringo. Que procura o único hotel. O gringo saca uma nota de R$ 100,00, deposita-a no balcão e pede para ver um quarto. Enquanto o turista sobe ao quarto, o gerente do hotel sai correndo com a nota de R$ 100,00 e vai até o açougue pagar suas dívidas ao açougueiro. O açougueiro pega a nota e vai até o criador de suínos a quem deve. Paga tudo. O criador, por sua vez, pega a nota e corre ao veterinário liquidar sua dívida. O veterinário, com a nota de R$ 100,00 em mãos, decide ir à zona pagar o que devia a uma prostituta. Expliquemos: em tempos de crise, a categoria trabalha a crédito. A prostituta sai com o dinheiro em direção ao hotel, onde levava os clientes. Ultimamente, deixara de pagar pelas acomodações. Liquida a conta de R$ 100,00. Nesse momento, o gringo chega novamente ao balcão, pede sua nota de R$ 100,00 de volta, agradece e diz que o hotel não correspondeu às suas expectativas. Sai do hotel e vai embora da cidade. Ninguém ganhou um vintém! Mas todos saldaram suas dívidas. E, assim, mais felizes, começam a ver o futuro com confiança! Moral da história: quando o dinheiro circula, não há crise! (Historinha de Luis Costa em Leia Comigo)

Tempos nublados

A definição para esses meados de maio pode ser esta: tempos nublados. Se a observação cai bem sob o aspecto do clima - entre 16ºC a 18ºC - e das nuvens plúmbeas fechando os céus do Sudeste e do Sul, também pode ser usada para definir a temperatura política. Vivemos tempos cinzentos. Não se tem clareza sobre o que poderá advir. Há uma CPI em pleno curso, que ainda não deixa ver limites e horizontes. Além de Demóstenes, alguns deputados, Cachoeira - de onde poderá fluir uma torrente de águas poluídas - a indagação persiste: os governadores Marconi Perillo (PSDB/GO), Agnelo Queiroz (PT/DF) e Sérgio Cabral (PMDB/RJ) serão chamados a depor? E os braços da Delta em Mato Grosso e outros Estados serão apertados pela CPI?

Grandes dúvidas

Os tempos nublados fazem emergir grandes dúvidas: afinal de contas, qual será o impacto das revelações e apurações da CPI das Águas Correntes sobre o processo eleitoral? E mais: que impacto - influência - poderá ter a CPI sobre o julgamento do mensalão? Os ministros do STF tenderiam a se sensibilizar com as ondas de indignação que se formam no seio da Opinião Pública, por ocasião das CPIs que ganham alta visibilidade na mídia? Algumas situações podem ser interpretadas. Este consultor oferece algumas pistas.

Aprender a suportar

"É preciso aprender a suportar o que não é possível evitar. Assim como a harmonia do mundo, nossa vida é composta de coisas contrárias, e de diversos tons, doces e ásperos, pontudas e chatas, moles e duras. Que poderia exprimir o músico que só gostasse de um tom ? É necessário que saiba utilizar a todos e misturá-los; do mesmo modo nos cabe fazer com os bens e os males que são inerentes à nossa vida. Nosso ser não subsiste sem essa mistura, em que cada parte é tão imprescindível quanto a outra...". (Montaigne)

O escudo do governo

Ponto um. A imagem da presidente Dilma tende a continuar imune aos abalos e impactos por eventos na frente política. Do alto de sua aprovação, não terá a imagem chamuscada. A população a distingue como governante preocupada em dar eficiência à máquina. Ademais, firmou o conceito de "faxineira ética". Ponto dois. É possível, isso sim, que a agenda do Executivo sofra atrasos em função da CPI ou por conta de desdobramentos nas relações com o Parlamento: liberação de recursos, etc. Ganha força, porém, a ideia de que não haverá veto da Câmara ao veto da presidente ao Código Florestal, se isso efetivamente ocorrer. O próprio PMDB estaria disposto a mudar seu posicionamento.

O escudo dos governadores

Como deixar de convocar um governador e convocar outro? Cristaliza-se a tendência de posição homogênea. Se um governador for convocado, outros também o serão. Ou seja, o pau que bate em Chico bate em Francisco. Nesse caso, até Cabral poderá ser convocado a depor, se Perillo e Agnelo entrarem no envelope da convocação. Mais uma projeção: os partidos que integram a Comissão tendem a absolver os comandantes dos Executivos estaduais.

O escudo do procurador

O procurador-geral, Roberto Gurgel, não deverá ser convocado. Depois do ímpeto inicial do PT, animado e liderando a ideia, constata-se certo arrefecimento. Não seria de bom tom. Ademais, a questão poderia bater no STF e esta Corte tende a abrigar o procurador sob seu escudo com o argumento de que as funções que lhe competem asseguram o direito de não dar depoimento à CPI. O mesmo argumento é usado para evitar a ida de sua mulher, Cláudia Sampaio, subprocuradora da República.

A gravidade do senador

"Apareça o pregador: se a natureza lhe deu uma voz rouquenha e feições estranhas, se o barbeiro não o barbeou direito, se além disso o acaso ainda o salpicou de manchas, por maiores que sejam as verdades que ele esteja pregando, eu aposto na perda da gravidade do nosso senador." (Blaise Pascal)

O escudo de Demóstenes

Quebrado. Eis como se apresenta o escudo do senador Demóstenes. E, por isso mesmo, estará sujeito às chuvas e trovoadas da CPI. Deverá ser arrastado pela correnteza que jorra das águas correntes da (o) Cachoeira. Mas o senador vai lutar até a última gota de sangue. Tem DNA de promotor. É perito na arte de acusar e, claro, de colocar curvas em quem o acusa. No mais, ver-se-á um denso acervo no entorno do Direito.

Amor próprio

Um maltrapilho dos arredores de Madrid pedia esmolas com grande dignidade. Um transeunte lhe disse: "Não tem vergonha de exercer essa infame atividade quando pode trabalhar?" - "Senhor, respondeu o mendigo, peço-lhe esmola e não conselhos"; e tendo dito isto, deu-lhe as costas, com toda a empáfia castelhana. Era um mendigo orgulhoso esse; pouca coisa bastava para ferir-lhe a vaidade. Por amor de si mesmo pedia esmola; e ainda por amor de si mesmo não permitia que lhe fizesse qualquer reprimenda. (Voltaire)

CPI no momento errado?

Dizem que a CPI nasceu sob a vontade do ex-presidente Lula. Que desejava dar uma sinuca de bico em Demóstenes e Marconi Perillo, mesmo sabendo que poderia sobrar veneno na água de Agnelo Queiroz. O fato é que as oposições, até então sem discurso e sem ação, ganharam um copo de vitamina com essa CPI. Se Perillo, do PSDB, está na dança, Agnelo, do PT, está no centro da roda. Ademais, essa CPI cria um clima de indignação que tende a fazer pressão indireta a favor de apurações de ilícitos em todos os campos. Nessa moldura, entra o mensalão. Que estará na pauta do STF logo mais. Não há como protelar a decisão de julgá-lo. O momento é propício. O clima ambiental sugere aperto de parafusos. Condenação a culpados. A impunidade gera revolta no meio da pirâmide.

Venda da Delta

Até agora é inexplicável a venda da empreiteira Delta ao grupo JBS. A empresa está sendo considerada inidônea. Como o governo dá cobertura - via BNDES - a esse empreendimento ? Um dos acionistas do JBS garantiu que a venda se fez com o endosso do governo. Mais um caso a entrar no rol das explicações.

A verdade da comissão

Nem bem foi instalada, a Comissão da Verdade já debate sobre as veredas a seguir. Um dos integrantes, o advogado José Carlos Dias afirma que a Comissão apurará questões de todos os lados. Outros integrantes defendem a tese de que o grupo vai apurar os desmandos e os crimes cometidos pela Ditadura Militar. O outro lado, alegam, foi assassinado. Já o Clube Naval vai formar uma Comissão Paralela da Verdade. Militares da reserva vão fazer algum barulho.

Acesso à informação

O Brasil dá, hoje, mais um passo no território da Cidadania. Começa a valer a lei de acesso à informação. A Constituição prevê que todos os cidadãos têm direito a receber dos órgãos públicos informações do seu interesse particular, ou de interesse coletivo ou geral, que serão prestadas no prazo da lei, sob pena de responsabilidade. A lei estabelece obrigações para os órgãos e entidades do poder público quanto à gestão da informação e define os tipos de informação que podem ser solicitadas. Uma das novidades é a obrigação de cada órgão da administração pública criar uma Comissão Mista de Reavaliação de Informações, responsável pela implementação da norma.

Maus modos

"É indecente expressar com intensidade as paixões que se originam de certa situação ou disposição do corpo, pois não se pode esperar que quem está conosco, não possuindo a mesma disposição, simpatize com elas. Fome intensa, por exemplo, embora em muitas ocasiões seja não apenas natural, mas inevitável, é sempre indecente; e comer vorazmente é universalmente visto como demonstração de maus modos." (Adam Smith)

Ficha Limpa no executivo

Mais um passo nas veredas da moralização. O executivo quer barrar na administração pública perfis maculados de sujeira. Nos próximos dias, deverá ser produzida a norma para cercear a inserção de pessoas sem ficha limpa nas malhas da administração. Tem lógica a decisão. Se uma pessoa nessas condições não pode ser candidata, da mesma forma deverá ser afastada da função de cuidar da res publica.

Tolerância zero: álcool

Deve-se mesmo acreditar na hipótese de que o Brasil começa a andar nos trilhos da racionalidade. A defesa da tese de que o cidadão tem liberdade para consumir doses de álcool, evitar o flagrante da embriaguez por meio da recusa do uso do bafômetro, não resistiu a uma audiência no STF, presidida pelo ministro Luiz Fux. Os depoimentos dos convidados fecharam com a posição: tolerância zero para consumidores de álcool que decidem dirigir veículos.

E Haddad, hein?

Entremos, mais uma vez, no túnel da campanha de São Paulo. Para uns, o túnel está ainda muito escuro, a essa altura. A escuridão não deixa ver se Fernando Haddad, candidato de Lula e do PT à prefeitura, chegará ao final da jornada eleitoral. O PT abriu, ontem, uma bateria de inserções publicitárias para alavancar o candidato. Somará 15 minutos nos próximos dias. Lula e Dilma aparecerão nos spots. Este consultor acredita que Fernando Haddad chegará aos 25 pontos percentuais, margem que lhe dá condições de entrar no segundo turno. Claro, seu adversário será José Serra. Que contará com o empuxo das máquinas estadual e municipal. Entre 0 a 10, Serra tem 8 pontos na chance de ser um dos disputantes do segundo turno.

Testando identidade e imagem

Candidato precisa ter forte identidade. Que significa seu conceito. O tronco da árvore. Que lembra semente, história de crescimento, tradição, valores, princípios, caráter. A imagem que projeta é resultante desta identidade. Tênue, a imagem será frágil. Forte, a imagem será clara, retilínea. Que imagens, eleitores, têm os candidatos a prefeito de sua cidade ? Vamos oferecer alguns parâmetros: experiência, conhecimento, força política, tradição partidária, inovação, compromisso com cidade, proximidade do eleitor, firmeza religiosa, apoio de entidades e grupos, arrojo, coragem, honestidade/desonestidade, moral/ética, assepsia, conservadorismo, ficha suja, infidelidade, oportunismo, populismo. Esse acervo serve para enquadrar um perfil.

Royalties, Dilma

A presidente Dilma foi vaiada e aplaudida, ontem, em Brasília, por prefeitos participantes da 15ª Marcha a Brasília em Defesa dos Municípios. Que queriam cobrar sua posição sobre os royalties do petróleo. A presidente irritou-se com os gritos e mandou ver: "Vocês não vão gostar do que eu vou dizer. Não acreditem que vocês conseguirão resolver a distribuição de hoje para trás. Lutem pela distribuição de hoje para a frente". Encerrou o discurso abruptamente. Prefeitos se dividiam entre aplausos e vaias.

Trens para a Copa

A CAF Brasil, subsidiária da espanhola Construcciones y Auxiliar de Ferrocarriles, está na frente na disputa para execução da obra do Veículo Leve sobre Trilhos (VLT) em Cuiabá e Várzea Grande/MT visando a Copa do Mundo de 2014. A empresa é uma das integrantes do consórcio VLT Cuiabá, que apresentou o seu projeto ontem à Comissão de Licitação no valor de R$1,4 bilhão. A decisão sairá daqui a 10 dias.

Aécio apagado

Grande decepção. É assim que muitos enxergam a figura do senador Aécio Neves. Por onde se passa, ouve-se: trata-se de uma figura apagada. Sem brilho. Sem discurso. Uma estrela cadente. Este consultor acha que o senador está perdido no mar. Um naufrago à procura de uma tábua de salvação.

Um truque do Padre Vieira

O Padre Antônio Vieira, o célebre pregador, escritor, político e diplomata jesuíta, subindo certa vez ao púlpito, iniciou estranhamente o seu sermão exclamando:

- Maldito seja o Pai!... Maldito seja o Filho!... Maldito seja o Espírito Santo!...

E quando a assistência, horrorizada, pensava que o grande orador houvesse enlouquecido, ele tranquilamente prosseguiu:

- Essas, meus irmãos, são as palavras e as frases que se ouvem com mais frequência nas profundezas do inferno.

Houve um suspiro de alívio no templo, mas com esse recurso teve Vieira despertada e presa a atenção dos fieis como poucas vezes, por outra via, houvera conseguido. (Narrado por Luis Costa em Leia Comigo)

Conselhos aos candidatos

Esta coluna dedica sua última nota a pequenos conselhos a políticos, governantes e líderes nacionais. Na última coluna, o espaço foi destinado aos membros da CPI das águas. Hoje, sua atenção se volta aos candidatos: atenção, candidatas e candidatos. Se quiserem receber a atenção do eleitorado, se empenhem em arrumar os traços de sua identidade para que sua imagem possa ser bem recebida. Atentem para estes aspectos:

1. Procurem compor um acervo de valores, princípios e ideias. E sempre que possível tentar expressar tal acervo.

2. Estabeleçam um denso e abrangente programa de ações, contemplando regiões, bairros, classes sociais e categorias profissionais.

3. Identifiquem as lideranças e as organizações sociais que mobilizam e animam as comunidades regionais. Tentem fazer parcerias com os elos da organicidade social.

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(Gaudêncio Torquato)

terça-feira, 15 de maio de 2012

OBSERVATÓRIO

Os próximos dias serão decisivos para a pugna eleitoral de outubro vindouro. Semana passada o PMDB definiu o nome do seu pré-candidato a Prefeito: Ivan Monte Claudino. O Vereador Márcio Cavalcante, que disputava com Ivan, votou em si mesmo. Dois outros membros do Diretório se abstiveram. Os demais sufragaram o nome de Ivan. A expectativa em torno dessa escolha é justificável porque, nas Oposições Unidas, há um consenso: a cabeça da chapa deverá ficar com um partido da base aliada do Governo Estadual. Como o PSB, agremiação do Governador, e o PSD, linha auxiliar imediata, estão sem quadros disponíveis para o embate no momento, a escolha recairá sobre o nome do PMDB. A Comissão Coordenadora encaminhará, de agora em diante, os passos para a escolha da chapa completa.

O CAMINHO

Desde o início, houve um entendimento para que a definição da chapa oposicionista ocorresse democraticamente, ou seja, de baixo para cima. Os líderes maiores respeitaram isso. Não há um registro sequer de interferência dos Deputados Domingos Neto, Hermínio Rezende ou Nenen Coelho – que apóiam o movimento – no sentido de direcionar a escolha. O vice-governador Domingos Filho, o ex-Deputado Antonio dos Santos e outros líderes de expressiva influência no município também deixaram os aliados à vontade, a fim de que ninguém pudesse argumentar que houve imposição.

MORAR EM CRATEÚS

É óbvio que, até chegar a ser escolhido pré-candidato, Ivan teve que enfrentar resistências. Alguns oposicionistas argumentaram que o candidato deveria ser alguém que reside em Crateús. Esse debate deve ser respeitado e enfrentado. Para alguém ser candidato no Brasil tem que preencher as chamadas “condições de elegibilidade”. Estas são condições legalmente exigidas para todo cidadão que se proponha a exercer cargo público eletivo. Estão dispostas no artigo 14, § 3º, da Constituição Federal. Vejamos: Art. 14. A soberania popular será exercida pelo sufrágio universal e pelo voto direto e secreto, com valor igual para todos, e, nos termos da lei, mediante: (...) § 3º - São condições de elegibilidade, na forma da lei: I - a nacionalidade brasileira; II - o pleno exercício dos direitos políticos; III - o alistamento eleitoral; IV - o domicílio eleitoral na circunscrição; V - a filiação partidária; VI - a idade mínima de: (...) c) vinte e um anos para Deputado Federal, Deputado Estadual ou Distrital, Prefeito, Vice-Prefeito e juiz de paz; d) dezoito anos para Vereador.

MORAR EM CRATEÚS II

Resumindo: para postular uma candidatura a pessoa há que preencher os seguintes requisitos: nacionalidade brasileira, o pleno exercício dos direitos políticos, o alistamento eleitoral, o domicílio eleitoral na circunscrição, a filiação partidária e a idade mínima exigida. A pergunta é: o senhor Ivan Monte Claudino preenche esses requisitos legais? Sim. Então, do ponto de vista da lei, ele pode ser o candidato. Agora tratemos das razões políticas. Nos últimos quarenta anos só tivemos duas pessoas à frente da Prefeitura que nunca moraram fora de Crateús: Lionete Camerino e Leandro Martins. Antonio Lins, prefeito que antecedeu Lionete, era bancário no Maranhão quando foi convocado para ser o candidato. Após o Leandro Martins, tivemos Sérgio Morais, Zé Almir, Nenzé, Paulo Nazareno e Carlos Felipe. Sérgio Morais, figura leve e agradável, em verdade tornou-se crateuense por laços de trabalho e matrimônio. Zé Almir, Nenzé, Paulo Nazareno e Carlos Felipe tiveram que residir alguns anos fora de Crateús para obterem as respectivas formaturas. Portanto, não é o fato de residir na cidade que vai garantir se a pessoa poderá ter um bom ou mau desempenho como Prefeito. Vínculos afetivos, umbilicais, históricos e sociais com a cidade todos têm. O que sinalizará se o candidato pode oferecer um contributo à altura do que a comunidade espera é o seu preparo pessoal, sua visão de mundo, seus traços de caráter, a sua capacidade de traduzir o anseio popular.

OAB

A carência de magistrados e servidores na comarca de Crateús será discutida em audiência pública a ser realizada hoje, às 9 horas, no auditório do Conselho Regional de Engenharia e Arquitetura (CREA) do município, na Rua Auton Aragão. O vácuo da ausência de prestação jurisdicional gera um enorme sentimento de abandono nas pessoas. Nos últimos conflitos entre administradores e administrados, notadamente nas negociações entre Servidores e Prefeitura, os munícipes têm sido salvos pela atuação firme, corajosa e altiva do Ministério Público, através do doutor José Arteiro Soares Goiano. Às vésperas de mais uma eleição municipal – via de regra acirrada – é inconcebível que uma cidade do porte de Crateús padeça de magistrados.

BARROS PINHO

No próximo dia 25 de maio José Maria Barros Pinho completaria 73 anos. Era um pescador de sonhos da bacia Poty-Parnaíba. Nasceu no Piauí, mas pertencia ao mesmo redemoinho telúrico fluvial nosso. Tinha na pele a marca das jitiranas do Crateús. Deixou-nos 12 belíssimas obras literárias. Membro da Academia Cearense de Letras, vereador, deputado estadual, prefeito de Fortaleza, secretário de Cultura do Estado, presidente do Instituto de Previdência do Município de Fortaleza e, por último, presidente da Fundação de Cultura de Maracanaú. Era barro e era pinho! Tinha a força germinal da terra e o lirismo contagiante dos pinheiros. Era barro e era pinho!

PARA REFLETIR

“Na antífona com que abre o seu livro “Circo Encantado”, publicado em 1975, Barros Pinho anuncia a chegada do encantamento na vereda das águas/ na poeira do sol. E, ao fechar o livro, parte com o que restou do espetáculo: aqui vai o circo/trapézio quebrado/areia nos pés/palhaços na rua. Agora, ainda sob o impacto de sua partida inesperada, tropeçamos nos destroços do ciclone emocional que caiu sobre nós. O circo encantado de sua poesia, o aconchego de sua convivência, sua visão crítica do mundo e os demais exercícios de inteligência com que nos brindava na tribuna do parlamento, na academia e na mesa do bar se espalham por todos os cantos da memória aflita e dolorosa de seus companheiros”. (Juarez Leitão)

(Júnior Bonfim, na edição de hoje do Jornal Gazeta do Centro Oeste, Crateús, Ceará)

MANOEL MELO CAVALCANTE



Sábado passado, apresentando mais um livro do poeta Dideus Sales, ensaiei uma resposta sobre a tarefa de um poeta. Relembrei aquele episódio ocorrido com o poeta Olavo Bilac. O dono de um pequeno comércio, amigo, abordou-o na rua: - Sr. Bilac, estou precisando vender o meu sítio, que o senhor tão bem conhece. Poderá redigir o anúncio para o jornal? Olavo Bilac apanhou um papel e escreveu: "Vende-se uma encantadora propriedade, onde os pássaros cantam ao amanhecer no extenso arvoredo, cortada por cristalinas e mareantes águas de um ribeiro. A casa, banhada pelo sol nascente, oferece a sombra tranquila das tardes, na varanda." Meses depois se reencontraram. O poeta perguntou se o amigo havia vendido o sítio. - Nem pense mais nisso, disse o homem. Quando li o anúncio foi que percebi a maravilha que tinha.

Eis a tarefa de um poeta: revelar a beleza escondida nas coisas, nos lugares e nas pessoas!

Semelhante missão têm aqueles que abraçaram a apaixonante e sacerdotal causa do magistério. Ser educador é deslizar na correnteza da sabedoria, perscrutar talentos, retirar poeira de diamante. Não é entregar a isca e o anzol, mas desenvolver o gosto pela pesca. Não é oferecer a faca e o queijo, mas despertar a vontade de comer. Educar não é lançar, mas extrair, retirar de dentro.

Dos meus tempos de aluno do então “Ginásio Pio XII”, em Crateús, lembro da silhueta de um amante do magistério. Alto e sereno, reservado e narigudo, aristocrático e silencioso. Era inimaginável que aquele corpo esguio escondesse um glutão compulsivo, incorrigível devorador de letras, voraz consumidor de livros. Pois Manoel Melo Cavalcante, nos anos do decênio iniciado em 1970, já havia engolido mais de mil livros. Aprendera com um mestre Taoista que passar três ou quatro dias sem ler causava debilidade nas palavras, fraqueza na memória, deficiência no cérebro.

Hoje, exilado em Fortaleza, revisita as páginas que protagonizou no álbum da própria existência. Recompila o capítulo em que, com asas de sonho, pousou na Capital para estudar no Colégio Cearense. A alimentação irregular, em hotéis e restaurantes, provocou a abertura de uma ferida no estômago e forçou o retorno à terra natal no início da década de 1960.

Foi quando resolveu descer do berço da própria solidão e espalhar sobre o chão de giz o óleo do amor à leitura. Lecionou inicialmente na Escola Técnica de Comércio Padre Juvêncio, onde foi Vice-Diretor de 1968 a 1975.

Em 1976, por influência do Deputado Antonio dos Santos – na época, líder absoluto no município – vira Vice-Prefeito da chapa encabeçada pela primeira mulher a chefiar o Executivo Municipal, Lionete Camerino. Aceitou a missão com a alma fervilhando de projetos. Imaginava que, em algum momento, seria instado a colaborar ativamente no comando da cidade. Aquele mar de sonhos, no entanto, virou um martírio. Se pudesse, eliminaria as páginas que tratam dessa estação...

Após esse período, se deixou embalar pelas ondas do rádio, dirigiu o Colégio Regina Pácis e prestou serviços na Delegacia Regional de Educação. A bandeira da educação empunhou até o dia em que recebeu a carta de aposentadoria.

Atualmente reside em um dos pontos mais altos de Fortaleza, próximo das principais torres de TV da cidade, no cosmopolita bairro Dionísio Torres. Ali, entrega-se a uma tarefa cada vez mais rara: recuperar molduras factuais sob a precisão das datas. Por isso esquadrinha o tabuleiro da história e recompõe a cronologia da ribeira em que nasceu, que pretende exibir em formato de livro.

No mais, nota-se uma invisível trava de melancolia nas cercanias de sua alma. Diz que a aposentadoria equivale a ser um vagabundo mal remunerado. Sente-se só. E, sobre os ombros, o peso das barras de ferro do abandono. Porém, quando o indago se ainda é capaz de sentir o silvestre perfume do original torrão, desaparece a lamentação e faz irromper uma canção. Rejuvenesce o poeta, que abre o coração:

Crateús, oh! Terra boa,
E prá que seja sempre assim
Protege minha pessoa
Nosso Senhor do Bonfim!


(Júnior Bonfim, na edição de hoje do Jornal Gazeta do Centro Oeste, Crateús, Ceará)

domingo, 13 de maio de 2012

NÃO HÁ QUEM FAÇA POR MIM AS COISAS QUE MAMÃE FEZ

O ser mãe é diferente
De todos os outros seres
Dona de múltiplos saberes
Fonte que dá vida a gente
Sente o que ninguém mais sente
Não cultiva insensatez
Ela nunca será “ex”,
Pois seu amor é sem fim.
Não há quem faça por mim,
As coisas que mamãe fez.


Minha mãe é igualzinha
A todas as outras mães,
Ama os filhos como os cães
Amam seus donos, sem rinha,
Tem nobreza de rainha
Em tudo tem altivez
Desde a sua gravidez
Até hoje é sempre assim.
Não há quem faça por mim,
As coisas que mamãe fez.


Escondeu minha viola
Para papai não quebrar
Quando eu comecei cantar
Lá na nossa fazendola,
Me mandou para escola
Eu já grande, aos dezesseis
Papai não era freguês
De música, cultura, enfim,
Não há quem faça por mim,
As coisas que mamãe fez.


E quando papai brigava
Por alguma danação,
Mamãe dava proteção
E em mim ninguém tocava,
Nos braços me aconchegava
Dava um beijo, dois ou três,
E papai por sua vez
Virava um estopim...
Não há quem faça por mim,
As coisas que mamãe fez.


Não é que eu goste mais
Da mamãe que do papai,
Por que nada subtrai
Meu amor pelos meus pais,
Mas os dois não são iguais,
Podem ser perante as leis,
De papai ouvi “talvez”,
De Mamãe só ouvi “sim”.
Não há quem faça por mim,
As coisas que mamãe fez.


Mamãe, mulher decidida,
Desvelada e coerente,
Defensora intransigente
Da sua prole querida,
Me fez enxergar a vida
Com muito mais nitidez,
Seu carisma e lucidez
Me lapidaram assim.
Não há quem faça por mim,
As coisas que mamãe fez.


Toda mãe que ao filho mima
Dá amor e diversão,
Pra que eu fosse a um chitão
Na casa de minha prima
No sítio Várzea de Cima,
Minha mãe com gosto fez
A camisa de xadrez
E a calça curta de brim.
Não há quem faça por mim,
As coisas que mamãe fez.


Ela soube me ensinar
Caminhar no rumo certo,
Seu exemplo, um livro aberto
Ricas lições a me dar,
Até para reclamar
Falava com polidez,
Expunha com sensatez
Tudo, tintim por tintim.
Não há quem faça por mim,
As coisas que mamãe fez.


Dizia-me com brandura
Quando eu saía do trilho,
Tenha cuidado meu filho,
Não ande em vereda escura,
Mantenha sempre lonjura
De boêmio e de burguês,
Não quero vê-lo freguês
De balcão de botequim.
Não há quem faça por mim,
As coisas que mamãe fez.


Minha mãe tinha grandeza
Em não demonstrar ressábios,
Sorvi seus conselhos sábios
Dados com delicadeza,
Parecia uma princesa
No porte, na intrepidez,
Imprimia altivez
Com doçura de alfinim.
Não há quem faça por mim,
As coisas que mamãe fez.


(Dideus Sales e Tião Simpatia)