quinta-feira, 9 de outubro de 2014

OBSERVATÓRIO

Se compararmos o processo eleitoral com uma partida de futebol, o segundo turno significa a prorrogação do jogo. O eleitor, ainda não totalmente convencido, resolve pedir um tempo para refletir melhor. Foi o que fez, este ano, o votante na esfera do estado do Ceará e em âmbito nacional. Quais os possíveis desdobramentos dessa nova etapa/momento da disputa?

PT X PSDB

Será reeditada uma polarização já conhecida no Brasil: PT e PSDB, que é artificial. Escorados em orientações de marqueteiros, petistas e tucanos se demonizam mutuamente. (Em um breve passeio pelas redes sociais se atesta quão virulentos são os ataques). Vendem-se muito diferentes, embora não o sejam. Quem analisa sem parcialidade, constata que os dois principais partidos brasileiros se detestam com a mesma intensidade com que se invejam. Analistas falam que os principais líderes das duas agremiações, Fernando Henrique e Lula, encarnam e simbolizam essa relação de amor e ódio, de paixão e emulação. Esse contraditório sentimento poderia ser assim resumido: Lula almejaria possuir o charme acadêmico do sociólogo; FHC sempre sonhou possuir a sedução popular do ex-metalúrgico. Um já votou no outro e vice-versa: em 1978, FHC foi candidato a Senador e um dos seus apoiadores era Lula; no segundo turno de 1989, FHC votou em Lula para Presidente.

PT X PSDB II

No pós campanha, os discursos mudam. Quando Presidente, por várias vezes FHC sinalizou no sentido de uma aproximação com a turma da estrela. Um dos seus principais parceiros dialogais era Tião Viana, petista do Acre. Noutro giro, cumpre indagar: quem, no primeiro mandato, Lula nomeou para a Presidência do Banco Central? O então deputado federal tucano Henrique Meireles. Quando sentado na cadeira presidencial, um dos governadores com interlocução freqüente junto a Lula era... o mineiro Aécio Neves. Por sua vez, Governador de Minas, Aécio mantinha uma relação de cordial intimidade e frutífera ação com então prefeito petista de Belo Horizonte, Fernando Pimentel. Trocando em miúdos: esse discurso ácido, irracional e corrosivo de um contra o outro já está saturado. Esperamos que neste segundo turno predomine um debate qualificado, com olhos propositivos para o futuro.

CEARÁ

O que foi esposado no plano nacional vale para o estadual. Só que, no caso da eleição para governador, há um aditivo mais relevante: os dois rivais que contendem no segundo turno eram aliados e amigos até poucos meses. Camilo e Eunício são partes de um mesmo grupo que se dividiu. Portanto, ao invés da guerra autofágica, deveriam realizar uma disputa mágica: mostrar quem pode retirar mais coelhos da cartola ou cartas da camisa para a solução dos graves desafios que ainda remanescem em nosso sofrido Ceará. É o que esperamos.

CRATEÚS

A eleição em Crateús consolidou algumas conclusões. Uma delas: está superada a velha dicotomia que reinava na política municipal entre dois grandes blocos. A bipolaridade foi superada pela multipolaridade. Não temos mais duas grandes forças, mas uma variedade de grupos e facções políticas, cada um com peso específico. São retalhos distintos compondo a velha colcha da política local. Vejamos: a votação de Gorete Pereira, obtendo o primeiro lugar para Deputada Federal, denuncia a força do grupo de Elder Leitão, que pode assumir a posição que quiser na eleição de 2016. O grupo de Genecias Noronha, segundo colocado, também. Guimarães, como terceiro colocado, revela a posição do Prefeito Mauro Soares. Chico Lopes, o quarto, expõe o peso do ex-prefeito Felipe e do PCdoB. Domingos Neto, o quinto, de parte da oposição. Isso significa que, para a eleição municipal, tudo fica no terreno da incógnita.

DESTAQUES

À primeira vista, o grande destaque foi Carlos Felipe, campeão de votos. Aparentemente, Felipe fez uma campanha simples, sem ceder à compra de votos ou sem grandes dispêndios do próprio bolso. Sucede que contou com dois fatores que o favoreceram: a desistência de Nenen Coelho e o apoio da Prefeitura. Sem Nenen como concorrente, Carlos Felipe teve o campo aberto, enquanto a máquina municipal não parou de trabalhar em seu benefício. O custo direto e indireto do apoio da Prefeitura é incalculável. Os outros principais contendores de Felipe – Aderlânia, Jeová Mota e Walter Cavalcante – também foram eleitos. Isso é bom, pois significa mais gente para ser cobrada e para trabalhar pela nossa terra.

DESTAQUES II

Merece destaque o resultado exibido pelo dirigente político Enivaldo Corisco, que apoiou Moses Rodrigues e Gomes Farias. Garantiu um lugar à mesa da sucessão. Seu peso político, algo ao redor de dois mil votos, é decisivo em qualquer pleito municipal.

DESTAQUES III

Dos Prefeitos da região foi Toinho Contábil o que abocanhou o troféu de maior eficiência no processo de transferência de votos. Deu maioria a todos os seus candidatos, inclusive a Mauro Filho.

REGISTROS!

Nossos efusivos votos de parabéns para o jornalista e editor César Vale, pelo natalício festejado dia 07, terça-feira passada... E para a senhora Maria José Pinto, que saboreia a fruta do centenário... Nossas condolências à família de Maria Lindomar Bezerra. Depois de uma vida de labuta em que registrou o nascimento de muita gente, atestamos aqui o seu falecimento na última segunda-feira (06.10.14).

PARA REFLETIR

“Nada é tão admirável em política quanto uma memória curta”. (John Galbraith)

(Júnior Bonfim, na edição de hoje do Jornal Gazeta do Centro Oeste, Crateús, Ceará)

quarta-feira, 8 de outubro de 2014

CONJUNTURA NACIONAL

Coronel, eis as urnas...

O coronel Lucas Pinto, que comandava a UDN no Vale do Apodi/RN, não dormia em serviço. Quando o Tribunal Eleitoral exigiu que os títulos eleitorais fossem documentados com a foto do eleitor, mandou um fotógrafo "tirar a chapa" do seu rebanho, aliás, do seu eleitorado. Numa fazenda, um eleitor tirava o leite da vaca quando foi orientado a posar para a foto. Não teve dúvida: escolheu a vaca como companheira do flagrante. Mas o fotógrafo, por descuido, deixou-o fora. O coronel Lucas Pinto não teve dúvida. Ao entregar as fotos aos eleitores, deparando-se com a vaca, não perdeu tempo e ordenou ao eleitor: "prega a foto aí, vote assim mesmo, na próxima eleição, nós arrumamos a situação". Noutra feita, o coronel levou as urnas de Apodi para o juiz, em Mossoró, quase 15 dias após as eleições. Tomou uma bronca.

- Coronel, isso não se faz. As eleições ocorreram há 15 dias.

- Pode deixar, "seu" juiz. Na próxima, vou trazer bem cedo.

Não deu outra. Na eleição seguinte, três dias antes do pleito, o velho Lucas Pinto chegava com um comboio de burros carregando as urnas. Chegando ao cartório, surpreendeu o juiz:

- Taqui, seu juiz, as urnas de Apodi.

- Mas coronel, as eleições serão daqui a três dias.

- Ah, seu juiz, não quero levar mais bronca. Tá tudo direitinho. Todos os eleitores votaram. Trouxe antes para não ter problema.

Idos das décadas de 50/60. Não havia grandes empreiteiras financiando campanhas. A empreitada ficava mesmo a cargo dos coronéis.

A voz de SP

Primeiro, vale ressaltar a onda da razão. Ela veio e empurrou Aécio para o segundo turno. E veio de onde este escriba previa há bastante tempo: de SP, onde reside o eleitorado mais racional do país. Há um mês, no meu artigo dominical no Estadão, eu dizia que SP, com seus maiores agrupamentos especializados, deveria sinalizar o segundo turno, eis que no Estado se concentra a maior oposição ao PT. SP é um território à parte. A voz crítica se faz ver até nos municípios que são berço do PT, como São Bernardo do Campo e em outros do ABC paulista, onde Aécio teve mais votos que Dilma.

A batalha de SP

O artigo sobre SP abria assim: Non ducor, duco. "Não sou conduzido, conduzo". O lema do brasão da cidade de SP, criado em 1916 pelo prefeito Washington Luiz, que veio a assumir, depois, a presidência da República, expressa de modo adequado a importância do Estado mais poderoso da Federação no pleito eleitoral deste ano. Ancorando a hipótese, há uma densa lista de superlativos: cerca de 32 milhões de eleitores; as mais populosas classes sociais, com destaque para três contingentes de classe média (A, B e C) e super-povoadas margens sociais; os maiores conglomerados de categorias setoriais, abarcando trabalhadores e profissionais liberais; centrais sindicais e entidades de áreas produtivas; movimentos organizados, que promovem intensa mobilização e abrem a locução das ruas; núcleos em defesa de direitos humanos, minorias e igualdade de gêneros; e, para dar vazão às demandas dessa gigantesca teia de representação, SãP dispõe de vigorosa tuba de ressonância, cujo eco se faz ouvir em todo o território nacional.

O meio da lagoa

Mais adiante, arrematei: "costuma-se dizer que o pleito será decidido pela passagem do transatlântico eleitoral pelo Triângulo das Bermudas, constituído por SP, MG e RJ, os três maiores colégios. Ou ainda que Minas é quem decide, sob o argumento de que o Estado do Sudeste é uma encruzilhada que representa a síntese do país. Ora, quando há na disputa dois candidatos mineiros (Aécio e Dilma), a tese parece fraquejar. O fato é que SP possui os maiores exércitos da guerra eleitoral. As ondas de seu mar costumam empurrar para longe os eventos que geram: protestos, denúncias, discursos positivos/negativos, avaliações de candidatos, percepções sobre o cotidiano. Na simbologia da pedra jogada no meio da lagoa (associada à classe media), o Estado é a força centrípeta que faz as marolas chegarem às margens... a batalha de SP será decisiva".

Marina desconstruída

Marina sofreu os efeitos do bombardeio. Não resistiu, conforme também apontávamos em entrevista no programa Entre Aspas, da Globo News, há um mês e meio. Não tinha estrutura, seu discurso passou a mudar, o programa de governo ganhou uma bateria de críticas. E até foi flagrada em contradição forte ante a questão do voto que deu contra a CPMF. Magoada com o tiroteio mais retumbante da candidata Dilma, apoiará Aécio Neves, no que será seguida pela família de Eduardo Campos. É claro que exigirá colagem de programas e ajustes principiológicos, particularmente no que diz respeito à sustentabilidade e ao mandato de cinco anos, sem reeleição, nos cargos ao Executivo.

Triângulo das Bermudas

Este consultor volta a dizer: a decisão do segundo turno passará pelas fortes correntezas que se desenvolvem no Triângulo das Bermudas : SP, MG e RJ. Em SP, Aécio poderá aumentar a margem de mais de quatro milhões de votos de maioria que obteve sobre a presidente Dilma, caso consiga a participação e o empenho dos tucanos, a partir do governador eleito, Alckmin. Como se sabe, este já está sendo apontado como o candidato tucano em 2018. Como Aécio defende um mandato de cinco anos, sem reeleição, a receita cai bem no colo de Alckmin. Em Minas, Aécio precisa trabalhar com a mineiridade e vencer de ponta a ponta, não apenas no sul do Estado. Mas terá contra ele o governador eleito, Fernando Pimentel.

Briga de foice no escuro

Em Minas, veremos uma briga de foice no escuro. Aécio e Anastasia, de um lado, com seus sabres ensarilhados, e de outro, Dilma e Pimentel, guerreando para evitar que os mineiros se reúnam em torno do tucano. Dilma até poderá cantar: quem conhece Aécio não vota nele, toada que Pimentel já anuncia não ser boa. Em SP, Lula fará o que Maquiavel soprar no seu ouvido para aumentar a votação de sua pupila. Ele se mostra surpreso com a grande votação de Aécio, mas ele próprio é, em parte, responsável por esta situação, quando dá força ao slogan "nós contra eles", sem perceber que esse mote não bate bem na cabeça da poderosa classe média do Estado.

O Nordeste

Já na região nordestina, a candidata Dilma continuará a ter sua principal fortaleza, que abriga os milhões de famílias sob o teto da Minha Casa, Minha Vida, e diante do pão sobre a mesa, garantido pelo gigantesco programa Bolsa Família. Dilma quer ter mais de 60% dos votos na região para compensar eventual perda de votos no Sudeste do país. Em PE, por exemplo, deverá intensificar a mobilização, eis que Marina ganhou no Estado e a família Campos deverá fazer campanha para Aécio. Ela conta com um forte reduto na BA, onde o governador Jaques Wagner, mais uma vez, vira a campanha e coloca o PT na dianteira.

O RJ

No RJ, Dilma terá dois grandes palanques: o de Pezão e o de Crivella. Mas Aécio, que tem uma banda carioca no perfil, poderá aumentar a sua fatia, surfando na "onda da razão", que pega principalmente eleitores do meio da pirâmide.

Rolo compressor

O rolo compressor das máquinas tende a favorecer os candidatos situacionistas. É o que se viu, aliás, na última semana do primeiro turno, quando os candidatos governistas encostaram e alguns ultrapassaram os oposicionistas. Neste caso, urge sinalizar a força da candidata Dilma no segundo turno, apesar de se constatar a forte máquina tucana, que poderá beneficiar Aécio, a partir de SP e PR, onde dois tucanos erguem a bandeira da vitória.

Debates e desconstrução

É previsível um cenário de defesa forte de programas e ideias, mas não se descarta a probabilidade da continuação da campanha negativa. De um lado, o pano de fundo serão os escândalos e a corrupção, de outro, "os fantasmas" do passado, como crava a presidente Dilma, mostrando os traumas na economia no segundo ciclo FHC. Aécio deve retrucar, resgatando o Plano Real e mostrando os "monstros" de hoje. Será uma luta sangrenta. Ou tudo ou nada para os dois lados.

Congresso fragmentado

Teremos um Congresso mais fragmentado: as 22 siglas na Câmara passarão para 28 e das 16 no Senado, teremos 18. O rolo compressor governista será até maior, eis que os partidos da base elegeram 304 deputados Federais, mais que o dobro dos 138 deputados eleitos pelas 10 siglas que apoiaram o oposicionista Aécio Neves. Mas isso não significa alinhamento automático. Muitos poderão sair de seu lado e aderir a outro.

Congresso conservador

O Congresso será mais conservador, bastando ver os números : de 220, o número de empresários passará para 280 ; os sindicalistas diminuem de 83 para 46, ou seja, 44%; e os ruralistas sobem de 130 para 160, e, aumento de 23%. 46% - esse é o índice de renovação na Câmara, mas não significa compromisso com a "nova política", eis que muitos pertencem aos quadros tradicionais da política regional. A religiosidade também se expande : pastores e bispos aumentam para 20.

Pesquisas erram?

Em nove Estados, as pesquisas apresentaram índices diferentes dos resultados: CE, PE, BA, RS, MG, DF, RJ, SP e PR. Alguns furos: Garotinho não vai ao segundo turno, conforme os Institutos de Pesquisa anunciavam; Camilo Santana, do PT do CE, teve quatro pontos a mais que os índices de pesquisas; Padilha, em SP, também teve cinco pontos a mais; Rui Costa, na BA, idem, com cinco pontos a mais. Os Institutos precisam aumentar suas amostras e fazer controles mais rígidos.

Posições radicais

Posições radicais deram alta visibilidade a seus porta-vozes, que ganharam uma montanha de votos. Jair Bolsonaro teve 465 mil votos; o delegado Eder Mauro teve 266 mil votos no PR; no RS, Luiz Carlos Heinze teve 162 mil votos; em GO, o delegado Waldir foi o mais votado, com 275 mil votos; o coronel da reserva, Alberto Fraga, no DF, ganhou 155 mil votos.

Midiáticos e religiosos

Celso Russomano, do PRB, liderou com 1.524.361 votos; Tiririca, do PR, abocanhou 1.016.796; pastor Eurico, do PSB, 233.762; pastor Marco Feliciano, 398.087; Paulinho da Força, do SD, 227.186.

Maior perda

A maior perda absoluta na Câmara é do PT: 18 deputados. PT fica com 70 (tinha 88) e o PMDB terá 66 (tinha 71). A terceira bancada será a do PSDB, com 54 deputados (tinha 44); a quarta bancada será a do PSD, com 37 (tinha 45) e a quinta será a do PP, com 36 (tinha 40).

Um voto

Alguns candidatos não tiveram um voto sequer, como acabo de ver na lista de deputados estaduais do RN. Mas Selma Silva, do PHS, teve um voto. Um. Donde se conclui que deve ter sido o dela. Merece destaque. Os outros podem até ter desistido. Selma, não.

Marina, na quinta

Marina anunciará seu apoio na quinta-feira. Tudo indica que acompanhará Aécio Neves.


(Gaudêncio Torquato)