sexta-feira, 20 de abril de 2012

DISCURSO DE POSSE DE CARLOS AYRES BRITTO NA PRESIDÊNCIA DO STF


“Eu disse à minha alma,
fica tranquila e espera.
Até que as trevas sejam luz,
e a quietude seja dança”
− T. S. Eliot

Quem já se colocou à testa de qualquer dos Poderes do Estado brasileiro certamente fez o que fiz ainda há pouco: prestar o solene compromisso de atuar sempre nos marcos da Constituição e das leis, assim, nessa ordem mesma. Com um registro especial para o ato de posse da presidente Dilma Rousseff, que, sob a mais respeitosa audição e o mais atento olhar da própria História, se tornou a primeira mulher a titularizar o cargo de presidente da República Federativa do Brasil. Ungida que foi, sua excelência, na pia batismal do voto popular.

Perguntarão os que me ouvem e veem: por que o compromisso de tais agentes do Poder é o de atuar nos marcos da Constituição e das leis, nessa imperiosa sequência? Resposta: porque na primacial observância da Constituição e na complementar obediência às leis do Brasil é que reside a garantia de um desempenho à altura da relevância dos respectivos cargos. É como dizer: basta cumprir fielmente a Constituição e as leis, com as respectivas prioridades temáticas, para se ter a antecipada certeza do êxito de tão honrosas, elementares e complexas investiduras.

É o que sente e pensa o próprio homem comum do povo, segundo pessoalmente comprovei com a vivência deste recente episódio que peço licença para contar: retornava eu de um almoço domingueiro, aqui em Brasília, na companhia da minha mulher e de um dos meus filhos, quando encontrei ao lado do nosso automóvel um homem que aparentava de 30 a 35 anos de idade. Apresentou-se como guardador de carros, mas eu já o conhecia, meio a distância, como morador de rua. Já o vi mais de uma vez, com uma rede estendida sob as árvores, a embalar o abandono dele. E assim me dirigiu a palavra: “ministro Ayres Britto, como o senhor vê, estou aqui tomando conta do seu veículo para que ninguém danifique o patrimônio da sua família”. Eu agradeci àquele homem que me conhecia até pelo nome e procurei nos bolsos algum trocado para recompensá-lo. Em vão. Nenhum dos três membros da família Britto portava dinheiro, nem graúdo nem miúdo. Disse então ao meu educado interlocutor: “como o senhor percebe, desta feita vou ficar lhe devendo”. Ele me fitou diretamente, profundamente, nos olhos e, altivo, respondeu: “ministro, o senhor não me deve nada. O senhor não me deve nada, ministro; basta cumprir a Constituição”.

Fecho o parêntese e faço nova pergunta: e por que tudo começa com o dever do fiel cumprimento da Constituição? Resposta igualmente fácil. É que esse documento de nome Constituição é fundante de toda a nossa Ordem Jurídica. Diploma inaugural do nosso Direito Positivo, portanto, e o supremo em hierarquia normativa.

Constitucionalista, eminente Michel Temer, dá lições primorosas quanto ao conceito de Constituição e Poder Constituinte. A Constituição é primeira e mais importante voz do Direito aos ouvidos do povo. Donde o seu caráter estruturante do Estado e da própria sociedade, a um só tempo. Certidão de nascimento e carteira de identidade do Estado, projeto de vida global da sociedade.

Daqui já se vislumbra o que mais importa: esse diploma jurídico de nome Constituição provém diretamente da nação brasileira, única instância de poder que é anterior, exterior e superior ao próprio Estado. Por isso que, pela sua filha unigênita que é a Constituição mesma, a nação governa permanentemente quem governa transitoriamente. E o faz, aqui nesta Terra Brasilis, pelo modo mais intrinsecamente meritório; pelo modo mais cristalinamente legítimo, pois o fato é que a menina dos olhos da nossa Constituição é a democracia. Democracia que nos confere o status de país juridicamente civilizado. Primeiro-mundista, pois os focos estruturais de fragilidade do País não estão em nosso arcabouço normativo, mas no abismo que se rasga entre a excelência da Constituição de 1988 e sua concreta incidência sobre a nossa realidade sócio-econômica e política.

Democracia, enfim, que se enlaça tão intimamente à liberdade de imprensa que romper esse cordão umbilical é matar as duas: a imprensa e a democracia.

Com efeito, o mais refinado toque de sapiência política da nossa última Assembleia Nacional Constituinte foi erigir a democracia como sua principal ideia-força. O pinacular princípio de organização do Estado e da sociedade civil, sabido que, de todas as fórmulas de estruturação estatalsocietária, somente a democracia é que se funda na soberania popular.

Democracia que toma o nome de Federação, quando vista sob o ângulo da divisão espacial do poder político; o nome de República, já sob o prisma da tripartição independente e harmônica dos Poderes estatais. Daí esses dois anéis de Saturno que são a indissolubilidade de laços e a autonomia política, em se tratando do condomínio federativo. Daí os princípios da eletividade dos governantes, da temporariedade dos respectivos mandatos, da responsabilidade jurídica pessoal, individual, de todo e qualquer agente público, do controle externo a que todos eles se submetem, em se tratando de República. Democracia, enfim, repito, que mantém com a “plena liberdade de informação jornalística” uma relação de unha e carne, de olho e pálpebra, de veias e sangue.

Claro que há muito mais a elogiar em nossa Constituição, mas não em um discurso de posse. Discurso que, pelo que vejo ao redor, nem se faz acompanhar de um bonito arranjo de flores para tornar a plateia menos indefesa. Por isso que tento abreviar as coisas, dizendo, em síntese, o seguinte: a nossa Constituição tem o inexcedível mérito de partir do melhor governo possível para a melhor Administração possível. A melhor Administração, porque regida pelos republicanos e cumulativos princípios da legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência (art. 37, caput). Dando-se que a moralidade tem na probidade administrativa o seu mais relevante conteúdo, pois sua violação pode acarretar a perda da função pública, suspensão dos direitos políticos, indisponibilidade dos bens e ressarcimento ao Erário, sem prejuízo da ação penal cabível e sob a cláusula de que tais ações de ressarcimento ao Erário são imprescritíveis (§§ 4º e 5º do mesmo art. 37); ou seja, a Constituição rima Erário com sacrário. Publicidade, a seu turno, como sinônimo perfeito de transparência ou visibilidade do Poder. Como princípio de excomunhão à ruinosa cultura do biombo, da coxia, do bastidor. A silhueta da verdade só assenta em vestidos transparentes.

Já o melhor governo possível, porque não basta aos parlamentares e aos chefes de Poder Executivo a legitimidade pela investidura. É preciso ainda a legitimidade pelo exercício, somente obtida se eles, membros do poder, partindo da vitalização dos explícitos fundamentos da República (“soberania”, “cidadania”, “dignidade da pessoa humana”, “valores sociais do trabalho e da livre iniciativa”, “pluralismo político”), venham a concretizar os objetivos também explicitamente adjetivados de fundamentais desse mesmo Estado republicano (“construir uma sociedade livre, justa e solidária”, “garantir o desenvolvimento nacional”, “erradicar a pobreza e a marginalização (a maior de todas as políticas públicas) e reduzir as desigualdades regionais e sociais”, “promover o bem de todos, sem preconceitos de qualquer natureza”. Posição em que também fica o Poder Judiciário, estrategicamente situado entre os fundamentos da República e os objetivos igualmente fundamentais dessa República. Mas há uma diferença, os magistrados não governam. O que eles fazem é evitar o desgoverno, quando para tanto provocados. Não mandam propriamente na massa dos governados e administrados, mas impedem os eventuais desmandos dos que têm esse originário poder. Não controlam permanentemente e com imediatidade a população, mas têm a força de controlar os controladores, em processo aberto para esse fim. Os magistrados não protagonizam relações jurídicas privadas, enquanto magistrados mesmos, porém se disponibilizam para o equacionamento jurisdicional de todas elas. Donde a menção do Poder Judiciário em terceiro e último lugar (há uma razão lógica e cronológica) no rol dos Poderes estatais (primeiro, o Legislativo, segundo, o Executivo, terceiro, o Judiciário), para facilitar essa compreensão final de que o Poder que evita o desgoverno, o desmando e o descontrole eventual dos outros dois não pode, ele mesmo, se desgovernar, se desmandar, se descontrolar. Mais que impor respeito, o Judiciário tem que se impor ao respeito, me ensinava meu pai, João Fernandes de Britto, juiz de direito de carreira do Estado Sergipe e da minha cidade Propriá.

Numa frase, se ao Direito cabe ditar as regras do jogo da vida social, mormente as que mais temerariamente instabilizam a convivência humana (o Direito é o próprio complexo das condições existenciais da sociedade, como ensinava Rudolf Von Ihering), o Poder Judiciário é que detém o monopólio da interpretação e aplicação final do sistema de normas em que esse Direito consiste. É a definitiva âncora de cognição e aplicabilidade vinculativa do Direito, como uma espécie de luz no fim do túnel das nossas mais acirradas e até odientas confrontações (derramamento de bílis não combina com produção de neurônios). É o Poder que não pode jamais perder a confiança da coletividade, sob pena de esgarçar o próprio tecido da coesão nacional.

Pronto! Concluo este passar em revista a nossa Constituição para dizer que ela, sabendo-se primeiro-mundista, investiu na ideia de um Poder Judiciário também primeiro-mundista. Por isso que dele fez o único Poder estatal integralmente profissionalizado. Centralmente estruturado em carreira e sob os mais rigorosos critérios de investidura, assim no plano do conhecimento técnico quanto do comportamento ético (para os magistrados sempre vigorou a lei da ficha limpa).

Habilitou-o a melhor saber de si e dos outros Poderes, pois as respectivas linhas de competência funcional são por ele, Poder Judiciário, interpretadas e aplicadas com definitividade. A Constituição impôs aos juízes de primeiro grau a frequência e o
aproveitamento em cursos de formação e aperfeiçoamento técnico, até como pressuposto de promoção na carreira. Tudo isso de parelha com a imposição de bem mais rígidas vedações, de que servem de amostra a sindicalização e a greve, filiação a partido político, participação em custas processuais, acumulação de cargos (salvo uma função de magistério), percepção de horas extras, mesmo sabendo que nenhuma categoria funcional-pública supera os magistrados em carga de trabalho, inumeráveis que são as chamadas “ações judiciais”. Todos nós magistrados, quando vamos nos recolher à noite, para o merecido sono, dizemos mentalmente ou inconscientemente, “Senhor, não nos deixeis cair em tanta ação”. Enfim, a Constituição conferiu aos magistrados a missão de guardá-la por cima de pau e pedra, se necessário, por serem eles os seus mais obsessivos militantes (a adjetivação de “obsessivo” é da ilustrada jornalista Dora Kramer). Por isso que eles, os magistrados, fazem do compromisso de posse uma jura de amor. E têm que transformar seus pré-requisitos de investidura – como o notável saber jurídico e a reputação ilibada – em permanentes requisitos de desempenho.

Agora eu termino com a parte mais devocional da função judicante. Peço vênia para fazê-lo. Os magistrados julgam os indivíduos (seus semelhantes, frise-se), os grupos sociais, as demandas do Estado e contra ele, os interesses todos da sociedade. O Poder Legislativo não é obrigado a legislar, mas o Poder Judiciário é obrigado a julgar. Tem que fazê-lo com a observância destes requisitos mínimos:

I - com um tipo de preparo técnico ou competência profissional que vai da identificação dos dispositivos, e às vezes são tantos aplicáveis ao caso, à revelação das propriedades normativas deles (os textos jurídicos a interpretar são ondas de possibilidades normativas, para me valer de expressão cunhada pelos físicos quânticos do início do século XX e a propósito das partículas subatômicas dos prótons,
elétrons e nêutrons);

II - com serenidade ou equilíbrio emocional, pois é direito subjetivo fundamental do jurisdicionado saber que o seu processo está sob os cuidados de um jurisdicionante sereno, equilibrado, calmo. Calma, porém, que não se confunde com lerdeza, tendo em vista o direito constitucional “à razoável duração do processo”, com os meios “que
garantam a celeridade de sua tramitação” (inciso LXXVIII do art. 5º);

III - sem confundir jamais o papel de julgador com o de parte processual, pois o fato é que juiz e parte são como água e óleo: não se misturam;

IV – tratando as partes com urbanidade ou consideração, o que implica o descarte da prepotência e da pose. Permito-me a coloquialidade da vez: “Quem tem o rei na barriga um dia morre de parto”.

V - promovendo a abertura das janelas dos autos para o mundo circundante, a fim de conhecer a particularizada realidade dos seus jurisdicionados e as expectativas sociais sobre a decisão objetivamente justa para aquele tipo de demanda. Juiz não é traça de processo, não é ácaro de gabinete, e por isso, sem fugir das provas dos autos nem se tornar refém da opinião pública, tem que levar os pertinentes dispositivos jurídicos ao cumprimento de sua, pouco percebida, mediata ou macro-função de conciliar o Direito com a vida. Não apenas de sua imediata ou micro-função de equacionar conflitos entre partes nominalmente identificáveis, exigindo-se-lhe, no entanto, fundamentação rigorosamente científica;

VI – outro papel do magistrado contemporâneo, distinguir entre normas que fazem o Direito evoluir apenas por modo tópico ou pontual, à base de modestos critérios de conveniência e oportunidade, e normas decididamente ambiciosas quanto à matéria por elas conformadas, pois, agora sim, ditadas por critérios de imperiosa necessidade. Normas, estas últimas, que, infletindo sobre a cultura mesma de um povo para qualitativamente transformá-la com muito mais denso teor de radicalidade, fazem do Direito um mecanismo de controle social e ao mesmo tempo um signo de civilização avançada. Por isso que demandantes, essas normas, de interpretação ainda mais objetivamente fundamentada, pois vão além da simples introdução de novos comportamentos sociais para mudar mentalidades e assim transformar as pessoas. E nós sabemos que há pessoas que experimentam imensa dificuldade para enterrar ideias mortas. A exemplo daquelas normas que, na Constituição mesma, consagram políticas públicas de enfrentamento dos fatores de desigualdades sociais, aqui embutidas as que democratizam o acesso das pessoas economicamente débeis à Justiça e que prestigiam o aparelhamento das Defensorias Públicas. Ou as normas de cerrado combate à improbidade administrativa e complementarmente propiciadoras das ações de ressarcimento ao Erário. As promocionais da inata dignidade das mulheres, dos negros, dos sofredores de deficiência física ou mental e as chamadas “lei da ficha limpa”, “Maria da Penha”, “Estatuto da Criança e do Adolescente”, “Código de Defesa e Proteção do Consumidor”, “PROUNI” ou universidade para todos, Lei de Acesso à Informação, comentada ainda há pouco em um diálogo franco com a eminente presidenta da República, Dilma Rousseff. Normas ainda definidoras de um desenvolvimento nacional em que a livre iniciativa exerce um papel de vanguarda, conciliatoriamente com os valores sociais do trabalho, fortalecimento do mercado interno, criação e refinamento de tecnologias nacionais, proteção e preservação do meio ambiente (nunca podemos esquecer que as matas virgens são as que mais procriam);

VII - manejar, diante do caso ou das teses em confronto, os dois conhecidos hemisférios do cérebro humano. Esse é um papel atualíssimo, contemporâneo, dos magistrados. Os dois hemisférios são categorizados como tais pela física quântica e pela neurociência. Manejar o lado direito do cérebro, no qual se aloja o sentimento. O lado esquerdo, lócus do pensamento. No sentimento, a geração da energia a que chamamos de intuição, contemplação, imaginação, percepção, abertura para o outro e também para a sociedade em geral, disposição para dialogar com a própria existência, presentificar a vida e assim compartilhar a experiência que Heráclito (540/480) traduziu com a máxima de que “o ser das coisas é o movimento”. “Ninguém entra duas vezes nas águas de um mesmo rio”, pois o fato é que na vida tudo muda, menos a mudança. Só o impermanente é que é permanente, só o inconstante é que é constante, de sorte que a única questão fechada dever ser a abertura para o novo. Embora não devamos confundir o novo com o fashion. Se tudo é incerto, é porque é certo mesmo que tudo seja incerto. Se tudo é teluricamente inseguro, que nos sintamos seguros na telúrica insegurança das coisas. É o nosso lado emocional, feminino, artístico, amoroso, sensitivo, corajoso, por saber que quem não solta as amarras desse navio de nome coração corre o risco de ficar à deriva é no próprio cais do porto. Que é a pior forma de ficar à deriva. Lado do cérebro mais sanguineamente irrigado, a ciência comprova isso, o lado feminino, e que tanto nos catapulta para o mundo dos valores (bondade, justiça, ética, verdade e estética, sobretudo), quanto nos livra das garras da mesmice. Com a virtude adicional de abrir os poros do pensamento ou inteligência dita racional para que ela se faça ainda mais clara, mais profunda e mais alongada no seu funcionamento. Já o hemisfério esquerdo do cérebro, este é o lócus do pensamento, conforme dito há pouco. A nossa banda neural da técnica e da Ciência. Matriz de uma outra modalidade de energia vital, multitudinariamente designada por ideia, conceito, silogismo, teoria, doutrina, sistema e todo o gênero de abstrações que estamos aptos a fazer como seres dotados de razão. Logo, pensamento que é sinônimo de inteligência racional ou lógica ou intelectual ou reflexiva ou cartesiana, responsável por um tipo de conhecimento que se obtém, não de chapa, não de estalo, como um raio que espoca no céu, porém por metódicas aproximações de um objeto necessariamente isolado ou fechado em si mesmo. O cientista é aquele que sabe cada vez mais sobre cada vez menos. À guisa de parte sem um todo (no sentimento é o contrário, um todo sem partes). Por isso que chamado o científico de conhecimento indireto ou discursivo ou especulativo, assim como quem se aproxima de um campo minado ou fortaleza inimiga. Lado, enfim, que nos leva a idolatrar a segurança, tanto quanto o hemisfério direito nos conduz à justiça. É o nosso hemisfério viril, não sendo por acaso que o Direito seja uma palavra masculina, enquanto a justiça, uma palavra feminina. Também não sendo por coincidência que o substantivo sentença venha do verbo sentir, na linha do que falou esse gênio da raça que foi o sergipano Tobias Barreto: “Direito não é só uma coisa que se sabe, mas também uma coisa que se sente”. Precedido por Platão (...) e seguido por Max Scheler, numa linha mais filosófica e holista, a saber: Platão (427/347 a.C.) - “Quem não começa pelo amor nunca saberá o que é filosofia”; Sheler – “O ser humano, antes de ser um ser um ser pensante ou volitivo, é um ser amante”;

X – entender, o juiz, que é justamente desse casamento por amor entre o pensamento e o sentimento que se pode partejar o rebento da consciência. Terceira categoria neural que nos unifica por modo superlativo ou transcendente dos pólos primários do sentimento e do pensamento. Consciência que já corresponde àquele ponto de equilíbrio que a literatura mística chama de “terceiro olho”. O único olho que não é visto, mas justamente o que pode ver tudo. Holisticamente, esfericamente, sabido que no interior de uma circunferência é que se fazem presentes todos os ângulos da geometria física, e, agora, da geometria humana. Consciência, em suma, que nos leva a transitar do sensível para o sensitivo e do humano para o humanismo. E que nos habilita a fazer as refinadas ou sutis distinções entre reflexão e percepção, entendimento e compreensão, conhecimento e sapiência, segurança e justiça, Estado e sociedade civil, sociedade civil e nação. Esta última como realidade tridimensionalmente temporal, porquanto enlaçante do passado, do presente e do futuro do nosso povo. Laço que prende a ancestralidade, a contemporaneidade e a posteridade da nossa gente.

Encerro o discurso. Fazendo-o, proponho aos três Poderes da República a celebração de um pacto. O que me parece mais simples e ao mesmo tempo necessário, e, ao fazê-lo, tenho certeza de que estarei falando em nome de todos os ministros desta Casa de Justiça, que é um pacto do mais decidido, reverente e grato cumprimento da Constituição. Um pacto pró-Constituição, portanto. Pelo que, simbolicamente, anuncio que, ministro Joaquim Barbosa e eu estaremos distribuindo aos presentes, por ocasião dos cumprimentos formais, um exemplar atualizado dela mesma, Lei Fundamental do País. Impresso por atenciosa autorização do presidente do Senado Federal e do Congresso Nacional, senador José Sarney, a meu pedido. Senador a quem agradeço e formulo votos de pronta recuperação de saúde.

Senhora Presidente Dilma Rousseff, receba os meus respeitosos e carinhosos cumprimentos pela sua presença a esta solenidade de minha posse e do ministro Joaquim Barbosa nos cargos de presidente e vicepresidente, respectivamente, do Conselho Nacional de Justiça. Também assim o vice-presidente da República, Michel Temer, amigo pessoal desde os anos 70 do século passado. Cumprimento que ainda estendo ao Presidente da Câmara Federal, deputado Marco Maia, à senadora Marta Suplicy, ora respondendo pela presidência do Senado da República, todos na honrosa companhia do Exmo. Sr. Procurador Geral da República, Roberto Gurgel Santos, e do presidente da Ordem dos Advogados do Brasil, Ophir Cavalcante, a quem emocionadamente agradeço, Dr. Roberto e Dr. Ophir, pela afetiva e até mesmo cativante saudação que me dirigiram. O século XXI é o século da afetividade. Sem afetividade não pode haver efetividade do Direito. A mim e ao ministro Joaquim Barbosa. Vou além para dizer aos queridos servidores da Casa, com quem passarei a trabalhar com toda honra, e mais a tantas respeitáveis autoridades e amigos tantos
que se deslocaram para este recinto. Em especial, permito-me citar alguns nomes, sem a pretensão de excluir absolutamente ninguém. Refiro-me a Daniela Mercury, artista e cidadã admirável, simpatia de gente, que nos regalou com uma interpretação maravilhosamente personalizada do hino nacional. Refiro-me a Roberto Dinamite, ídolo vascaíno de sempre, Romário, Dora Kramer, Ziraldo, Leda Nagle, Milton Gonçalves, Antônio Carlos Ferreira.

Cinco últimos e breves registros: o primeiro, para saudar à distância Celso Antônio Bandeira de Mello e Fábio Comparato, queridos amigos, referências de preparo científico, ética e cidadania, que não puderam estar presentes a esta nossa posse. O segundo, para agradecer as palavras do ministro Celso de Mello, essa enciclopédia jurídica e cultural da nossa Casa, palavras tão repassadas de desvanecedora amizade e reveladoras de uma inexcedível qualidade literária, tão própria de Sua Excelência. O
terceiro, para dizer ao ministro Peluso que é uma honra sucedê-lo na presidência do Supremo e do CNJ; ele, ministro Antônio Cezar Peluso, que tão ilustra os anais desta nossa Instância Suprema e ao mesmo tempo Tribunal Constitucional com o seu denso estofo cultural, inteligência aguda, raciocínio tão aristotélica ou cartesianamente articulado quanto velocíssimo, técnica argumentativa sedutora e vibrante a um só tempo.

Tenho a honra de ser seu colega e de sucedê-lo na presidência. A quarta anotação vai para o ministro Joaquim Barbosa, também paradigma de cultura, independência e honradez, com quem partilharei mais de perto a dupla gestão que ora me é confiada. O quinto e último registro é para a minha família. Inicialmente, meus oito irmãos aqui presentes, com seus esposos e esposas, meus cunhados, mais um irmão que não pôde se deslocar da minha querida Propriá, e outro irmão que está aqui, sim, no meio de nós, mas substituindo seu belo e alegre corpo físico pela feérica luz do seu amoroso espírito: Márcio. Feérica luz que neste local também se esparrama por efeito da eternal lembrança do meu pai, João Fernandes de Britto, e de minha mãe, Dalva Ayres de Freitas Britto, ícones desta minha vida terrena e de outras vidas que ainda terei, porquanto aprendi com eles dois que o nada, o nada não pode ser o derradeiro anfitrião de tudo. Em sequência, saúdo meus cinco amados filhos, Marcel, Adriana, Adriele, Tainan, Narinha, na companhia dos meus igualmente amados netos Bruninha, Lucas, João Paulo e Davi, além dos meus estimados genros e noras. Por último, ponho meus olhos nos olhos de Rita, mulher com quem durmo e acordo, e que também é a mulher dos meus sonhos. Mulher a quem digo que tinha mesmo que ser abril o mês desta minha posse. Pois abril foi o mês em que nos conhecemos. O dia 9 foi a cereja do bolo. Rubra como a pele das manhãs ainda no talo das madrugadas. Doce como o gosto da minha vida, Rita, ao seu lado desde então.

Obrigado a todos.

Brasília, 19 de abril de 2012.

Carlos Ayres Britto
Presidente do STF e do CNJ

quinta-feira, 19 de abril de 2012

LINDO, IMPRESSIONANTE, MAGNÍFICO!

Nicolas Besnard (ex-Cirque du Soleil) e Booth Shenea (duas vezes Campeã do Mundo de esporte acrobático).

Acompanhe a graça e a leveza, a harmoniosa emoção que emana desse espetáculo!

quarta-feira, 18 de abril de 2012

CONJUNTURA NACIONAL

Vendendo aspirador de pó

A dona de casa, em um vilarejo, ouve alguém batendo palmas em sua porta...

- Ó de casa, tô entrando! Ela se depara com um homem que vai entrando na casa e joga esterco de cavalo em seu tapete da sala.

A mulher apavorada pergunta:

- O senhor está maluco? O que pensa que está fazendo em meu tapete?

Sem deixar a mulher falar, o vendedor deita o verbo:

- Boa tarde! Eu estou oferecendo ao vivo o meu produto; e vou provar pra senhora que os nossos aspiradores são os melhores e mais eficientes do mercado, tanto que vou fazer um desafio: se eu não limpar este esterco em seu tapete, eu prometo que irei comê-lo!

A mulher se retirou para a cozinha sem falar nada. O vendedor curioso, perguntou:

- A senhora vai aonde? Não vai ver a eficiência do meu produto?

A mulher responde:

- Vou pegar uma colher, sal e pimenta e um guardanapo de papel. Também uma cachaça para te abrir o apetite, pois aqui em casa não tem energia elétrica!

Moral da história: conheça o seu cliente antes de oferecer qualquer coisa.

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A CPI de águas turbulentas

A CPI do Cachoeira vai inundar muitos espaços. À guisa de lembrança, o jorro d'água abrirá alguns braços formando: 1) o rio Demóstenes; 2) o lago Perillo; 3) a lagoa Agnelo; 4) o arquipélago Delta; 5) os riachos da Câmara e 6) ramificações aqui e acolá. O senador Demóstenes Torres, com grande experiência no Ministério Público, vai usar tudo que sabe do campo das letras jurídicas. Os governadores Marconi Perillo e Agnelo Queiroz contarão com boas estruturas de defesa. O arquipélago Delta tem um arsenal insuperável para brigar. Os parlamentares envolvidos da Câmara poderão ser acolhidos no abrigo do corporativismo. A CPI vai ferver água durante boa parte do ano.

A tormenta do mensalão

Há, ainda, dúvidas sobre as águas que rolarão da montanha do mensalão. Não se sabe se virá um tufão ou um tsunami. Na incerteza, pode-se apostar em tormenta. Claro, se o julgamento começar neste semestre. Carlos Ayres Britto, que assumirá a presidência do STF amanhã, pensa em iniciar o julgamento agora em junho. Tudo depende da liberação do processo para análise do plenário da Corte. Liberação que está nas mãos do ministro Ricardo Lewandowski. Ainda há gente querendo apor novo conjunto de provas. O advogado Tolentino, ex-sócio de Marcos Valério, é o autor deste novo capítulo.

Visão técnica e visão política

Começa a guerra de grupos, facções, núcleos e partidos. Distingue-se, por parte do PT, o interesse em pressionar os membros do Supremo para que analisem o mensalão sob a exclusiva ótica técnica. Os implicados que integram o PT acreditam que, sob os parâmetros da técnica, o STF não encontrará provas da existência do mensalão. Ora, mas esse processo, pelo que se sabe, não pode ser apartado da visão política - que implica conluios, rede de interesses manobrada por recursos financeiros, pressões partidárias. O fato é que intermediação política foi comprovada. A engenharia jurídica deverá encontrar meios para demonstrar a existência do fenômeno. Agora, dizer que o mensalão foi apenas o uso de caixa dois é - como se diz - substituir a versão pela verdade.

O caldo geral

O que sairá do caldeirão onde estarão sendo cozidos os condimentos do mensalão e da CPI mista do Cachoeira? Pergunta difícil de responder. Mas é possível alinhar o pano de fundo para eventuais respostas. Primeiro: o governo irá colaborar para deixar a água ferver e transbordar, queimando quem deve ser queimado, ou deverá se esforçar para acender um fogo lento? A água fervente transbordando poderá prejudicar o fluxo parlamentar e, consequentemente, a carruagem administrativa. Segundo: as insatisfações da base parlamentar serão administradas? Se a indignação continuar, o risco de o governo ser prejudicado é real. Particularmente no que diz respeito à principal empreiteira do PAC, a Delta, que teria recebido cerca de 800 milhões de reais. Terceiro : as investigações podem trazer revelações bombásticas e, nesse caso, os horizontes serão escuros como trevas.

E as eleições?

Costumo lembrar que o eleitorado brasileiro, bombardeado todos os dias por denúncias de desvios e corrupção, fará uma distinção entre a deterioração política generalizada e as demandas que afligem seu cotidiano. Ou seja, o discurso local predominará sobre o discurso abrangente. A micropolítica suplantará a macropolítica. As necessidades dos bairros e regiões - creches e escolas, transporte, estabelecimentos hospitalares, alimentos baratos, segurança e proteção - influenciarão mais os eleitores que as maracutaias e redes de corrupção.

Jogo partidário

PT e PMDB disputam a possibilidade de fazer o maior número de prefeitos. O PT é mais fechado, o PMDB mais aberto; aquele olha mais para si; este vê também os outros. PSB, por sua vez, olha para a esquerda e para a direita, abrindo brechas por todos os lados. PDT, PTB, PR terão menores chances. E as oposições? O PSDB tende a perder espaços, com exceção de São Paulo, Paraná e Goiás. O DEM é quem mais perderá. Até poderá fazer bonito em algumas - poucas capitais e cidades médias. O PSD vai depender do tempo de TV e rádio.

DEM e PMDB

As conversações em torno de eventual e futura fusão entre PMDB e DEM estão avançadas. PMDB é mais preferido pelo DEM que PSDB para efeito de fusão.

Prestígio de Dilma

A presidente Dilma atingiu o maior pico de aprovação popular já alcançado por um presidente nas últimas quatro décadas: 76%. Colada à imagem a tinta da faxina ética. A crise que abate atores políticos não chega nem perto à imagem presidencial. Com essa bagagem de apoio, ela faz o que pensa e quer. A base governista teme fazer represálias quando não se sente atendido em suas demandas. Espera que o tempo traga algum desgaste à presidente. O fato é que sob o escudo de alto prestígio, a presidente Dilma tem definido a pauta que quer e escolhido o roteiro de percurso sem dar muita bola às pressões.

PMDB contido

O PMDB é um partido que contém seu ímpeto. Não está satisfeito com a conduta do governo, que diz governar com o PMDB. Este partido sabe que não é verdade. Diminuiu seu espaço na administração em mais de 40% quando comparado ao espaço que detinha no governo Lula. Ideli Salvatti é a ministra mais repudiada pelo partido.

O jantar de Ideli

Na noite em que o PMDB comemorava seus 46 anos, com a presença do vice-presidente da República, Michel Temer, Ideli jantava com um grupinho de peemedebistas descontentes. É claro que o "ágape idelístico" gerou indigestão em estômagos do partido. Por um bom tempo, o líder Henrique Alves deixou de atender telefonemas da ministra, que queria se desculpar. Panos quentes foram jogados sobre a mesa.

EMTUpidas...!

Há alguma coisa confusa na EMTU. Foram divulgadas as exigências para as empresas que fariam a supervisão e fiscalização da construção e reforma das subestações elétricas de um corredor de ônibus, aliás, um importante investimento para a melhoria do transporte urbano. O estranho é que a única empresa a atender todas as exigências foi uma especializada em Saneamento e não no objeto da licitação. Onde estamos, a que país pertencemos?

Gestão comunicante?

A CPTM criou um setor de "Gestão de Meio Ambiente". Parabéns. Agora, colocar este setor sob a direção de um comunicólogo não é arriscado? Será que, em uma mesma diretoria, engenheiros, biólogos e comunicólogos falarão a mesma linguagem? A intenção parece boa. Mas, o tempo é o senhor da razão. Veremos como funcionará.

ABSESP

Nesta quarta-feira, a Associação Brasileira dos Sindicatos e Entidades de Segurança Privada, fundada em 2010 e presidida pelo empresário José Adir Loiola, inaugura sua sede em Brasília/DF. Há tempos o segmento de segurança privada carecia de uma representação nacional que correspondesse à altura de sua importância econômica. A ABSESP vai representar mais de 80% do mercado de segurança privada em 18 estados brasileiros. No Brasil, o efetivo da segurança privada é de 540 mil vigilantes trabalhando em 1.500 empresas autorizadas a funcionar pela Polícia Federal.

PSD e a decisão TSE

O PSD do prefeito Gilberto Kassab tem esperança de ganhar tempo de mídia eleitoral. TSE julga o caso. O DEM argumenta que o tempo de TV e rádio e os recursos partidários são estabelecidos a partir das cotas alcançadas pelos partidos nas eleições. O PSD alega que, ao ser criado dentro da lei e das regras eleitorais, deve receber não apenas os migrantes partidários, mas os direitos que eles detinham. Se o parlamentar deixa legalmente um partido deve carregar com ele todos os direitos que tinha.

Haddad avançará?

Dúvida no ar : Fernando Haddad avançará ? Hoje, tem 3% de intenção de voto. Este consultor avalia que o candidato petista tende a alcançar os 30% que o PT, historicamente, alcança na capital.

Chalita e Serra

Se, por um acaso, não for Haddad e sim Gabriel Chalita o opositor de José Serra, no segundo turno, o tucano tem grandes chances de.... perder o pleito.

Tipologia eleitoral

1. O continuista - Candidato à reeleição na prefeitura, máquina a serviço da candidatura, cabos eleitorais multiplicados, o continuista tem grandes vantagens sobre outros. Particularmente se construiu forte identidade junto à comunidade. Pontos fortes: ações e obras a mostrar. Pontos fracos: mesmice e eventuais denúncias de corrupção/nepotismo, etc.

2. O oposicionista - Deve encarnar situação de mudança, troca de peças velhas na máquina administrativa. Para ter sucesso, precisa captar espírito da comunidade, auscultar demandas, fazer um corpo a corpo, deixar-se mostrar, ganhar confiança do eleitor. Pontos fortes : alternativa à velha ordem; encarnação do espírito do novo. Se for um perfil já conhecido, impregná-lo com o verniz da renovação. Pontos fracos : pequena visibilidade; estruturas de apoio mais tênues.

3. A terceira via - O candidato da terceira via apresenta-se como perfil para quebrar a polarização entre situação e oposição. Para angariar apoio de todos os lados, carece organizar um discurso moderado, ouvindo todos os segmentos, buscando uma linha intermediária. E demonstrar que tem melhor programa do que os dois candidatos. Pontos fortes: bom senso, alternativa à polarização acirrada entre grupos, inovação. Pontos fracos: falta de apoios das estruturas.

Estratégias e táticas

Candidatos de todos os partidos ganham mais força quando estabelecem planejamento de suas campanhas. Pequenos conselhos:

- Buscar o apoio de entidades organizadas da municipalidade - sindicatos, associações, federações, clubes, movimentos, núcleos;

- Montar sistema de aferição (pesquisa) de modo a mapear demandas e interesses dos bairros e regiões;

- Estabelecer um programa abrigando ações e projetos específicos para as áreas e elegendo como focos determinados setores da sociedade (mulheres, crianças, jovens, etc.);

- Criar agenda de eventos - pequenos eventos, bem articulados, com pequenos grupos, de forma a estabelecer forte interação entre os interlocutores; mais eventos pequenos funcionam melhor que eventos grandes;

- Criar forte identidade - eleger dois ou três grandes eixos que possam identificar rapidamente o candidato, de forma a estabelecer um diferencial em relação a outros;

- Escolher um grupo de conselheiros entre os nomes mais respeitados da comunidade e que sirva de referência;

- Estabelecer um fluxo de comunicação para a campanha, obedecendo aos ciclos : lançamento do nome; crescimento da campanha; consolidação da visibilidade; maturidade; clímax da campanha e declínio. Deixar volumes maiores para as últimas fases;

- Formar ampla rede de apoiadores/cabos eleitorais de confiança, fazendo com que cada eleitor seja, ele mesmo, um cabo eleitoral;

- Formar uma teia de divulgadores/trombetas de campanha, pessoas que começam a falar das virtudes e qualidades do candidato, de modo natural, conquistando, assim, a simpatia dos ouvintes. Sem demonstrar arrogância;

- Planejar o dia D. Dia das Eleições. Logística, visibilidade/publicidade (controlada), sistemas de articulação/mobilização/apuração, etc.

Conselho aos membros da CPI

Os componentes da CPI mista, a ser criada para investigar as denúncias envolvendo Carlinhos Cachoeira, serão muito pressionados por partidos e sistemas de forças. Por isso, precisam se guiar por um conjunto de princípios e ideias, dentre os quais:

1. Definir de maneira criteriosa a pauta da CPI, nomes e estruturas a serem investigadas.

2. Estabelecer um prazo para finalização dos trabalhos.

3. Evitar tumultos e balburdias que possam vir a prejudicar o andamento dos trabalhos e a comprometer a própria CPI.

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(Gaudêncio Torquato)

terça-feira, 17 de abril de 2012

POLÍTICA & ECONOMIA NA REAL

"A CPI que todos apoiam e ninguém quer"

O título acima é de uma reportagem do jornal "Valor Econômico" de sexta-feira e define com perfeição os rumos que o pedido de investigação das estripulias financeiras do "corretor zoológico" Carlinhos Cachoeira no Cerrado (Goiás e Brasília) e, provavelmente, alhures. Depois do entusiasmo inicial, os governistas, principalmente o PT, estão procurando agora uma forma de evitar a CPI ou, ao menos, torná-la inócua. E a oposição, que seria, segundo cálculos iniciais dos petistas, a grande vítima da Comissão, e somente aceitou a investigação porque, como minoria, não tinha outra saída, agora olha o circo governista pegar fogo.

A CPI e o Planalto

Dilma já espalhou sua proverbial irritação por todos os lados depois que percebeu que: (1) as investigações podem tumultuar o Congresso e prejudicar votações importantes na Câmara e no Senado; (2) os aliados insatisfeitos podem aproveitar o momento para jogar combustível na fogueira e ainda fazer suas prosaicas cobranças (vulgo chantagem); (3) um dos prováveis alvos da CPI, a Construtora Delta, queridinha de Cachoeira, é queridinha também das obras do PAC; (4) O PT, com o governador Agnelo Queiroz, também está na roda, ou seja, a bomba não deve estourar apenas nas mãos do PSDB (Marconi Perillo) ou do DEM (Demóstenes Torres) e companhias belas. A estratégia agora será ir segurando o quanto der a instalação da Comissão. Para isso, foi providencial o período que o senador Sarney passará internado em SP. A esperança é que, com esse jogo morno, dê tempo para a Comissão de Ética do Senado propor e o plenário cassar Demóstenes e a punição deixar a opinião pública satisfeita e relaxada.

Lembranças de outra CPI

Muitos dos que alertam para os riscos do governo da CPI lembram-se de um episódio que poderia ter mudado os rumos do governo Lula, ocorrido na CPI do Correios, a que desvendou o mensalão : acuado, o publicitário Duda Mendonça confessou que havia recebido parte do dinheiro por seus serviços prestados da campanha presidencial de 2002 em dólares e no Exterior. Foi quase o fim do mundo. Quem estava em Brasília e no Congresso aquele dia viu petistas com lágrimas nos olhos de desespero. Poderia ter sido o fim do governo Lula. E o ex-presidente, para evitar um provável processo de impeachment, chegou até a admitir a possibilidade de não se candidatar à reeleição no ano seguinte. A oposição, não se sabe bem por quais razões se acomodou - diz-se que esperava Lula sangrar sem precisar que ela brigasse. É o que dizem: se um publicitário escolado como Duda escorregou diante dos parlamentares, o que pode acontecer com gente mais inexperiente ou com contas a ajustar com o governo, nesta CPI do Cachoeira?

O medo baixou

Segundo uma analista com trânsito nos meios político e jurídicos, com a decisão da semana passada autorizando o aborto de fetos anencéfalos, o STF deu mais uma demonstração de que, em questões de grande relevância (ou no "atacado"), não "decepciona". Foi assim, também, na confirmação da validade da Lei Ficha Limpa. Pode até vacilar no "varejo", porém não titubeia no essencial. Foi essa percepção, que não passou despercebida no mundo político, que levou parte dos governistas a considerar totalmente inoportuna uma fala do presidente do PT, Rui Falcão, tentando ligar a CPI do Cachoeira ao mensalão. No dia seguinte à divulgação da gravação de Falcão, ele mesmo tentou explicar que não era bem assim e petistas de escol cuidaram de dizer que uma coisa não tem nada com a outra coisa. Baixou o medo de que tal posição pudesse irritar os ministros do Supremo, pois pode parecer uma tentativa de pressionar o tribunal no julgamento do caso dos mensaleiros. Tudo que não se quer nos meios governistas é um Supremo irritado. Aliás, o que o PT quer mesmo é evitar qualquer julgamento do mensalão este ano. Para isto é que estão trabalhando os advogados dos mensaleiros, principalmente o ex-ministro da Justiça, Márcio Thomas Bastos. Aliás, Thomas Bastos, por coincidência, também é advogado de Carlinhos Cachoeira.

Demasiado desumano

É certo que Lula não sabe ficar quieto, e tem comichões quando vê um palanque. Mas quem viu a participação dele no evento do PT sábado em São Bernardo do Campo, quando o ex-presidente teve de suspender seu discurso por um acesso de tosse, percebeu que não são nada corretas as exigências que o PT está fazendo a seu principal líder para participar das campanhas municipais desde agora. O tratamento a que Lula se submeteu exige que ainda passe por um período de repouso quase absoluto.

Notícias do manicômio tributário - I

Na coluna da semana passada, lembramos que, a partir do momento em que as dobras do mais recente pacote de incentivo à indústria lançado pela presidente Dilma fossem desvendadas, outros aumentos de impostos poderiam aparecer, além do reajuste no IPI dos cigarros e mais Cofins nas importações. Pois bem, já apareceu um. Na MP 563, estão embutidos possíveis aumentos no IR e CSLL das empresas, como registra a exposição de motivos que acompanha a MP : "Como algumas das alterações introduzidas pelos artigos 38 e 40 da MP podem implicar aumento do tributo (grifo nosso), em atenção ao princípio da anterioridade foi estabelecido que a produção de efeitos ocorreria em 2013".

Notícias do manicômio tributário - II

Depois da leitura mais acurada da MP 563, da troca da contribuição previdenciária de 20% sobre a folha de salários por um percentual de 1% a 2% sobre o faturamento de 15 setores da indústria, as empresas começam a descobrir que a operação será tão confusa que em muitos casos pode até não compensar a mudança. E que vai encarecer os serviços contábeis fiscais das companhias. Só um exemplo : uma mesma empresa pode ter produtos desonerados e outros não, o que exigirá que ele faça separação dos custos com a folha para cada produto, pois uns continuarão recolhendo 20% e outros 1% ou 2%.

A dona dos juros

Quem define o tamanho dos juros no Brasil é a presidente Dilma. O ministro Guido Mantega é o transmissor do fato consumado e o BC o executor, quando é o caso. Na "guerra" do spread o BC continua calado. Aliás, o ministro da Economia de Dilma é...Dilma Rousseff.

A reunião do Copom

No contexto atual a queda dos juros é possível em função da tranquilidade cambial e da inflação. Assim sendo, uma queda de mais 0,75% da taxa básica para 9% ao ano é provável. Os elementos analíticos do BC devem reforçar a tendência declinante dos juros, mesmo porque a recuperação da demanda doméstica não será tão rápida quanto se imagina, algo além deste ano.

O limite dos juros básicos

Há dois limites que devem ser obedecidos ex ante pelo governo no atual contexto de redução de juros. O primeiro é a inflação controlada, a qual não se pode fazer maiores previsões altistas. Os fatores de elevação da inflação estão quase todos controlados. Apostar em alta contínua dos preços neste momento é de alto risco. O segundo é o risco do país, representado pela diferença entre os juros dos títulos do Tesouro dos EUA e a remuneração dos títulos soberanos do país. Este spread gravita atualmente ao redor de 3,5% ao ano. Logo, se somarmos uma inflação anual prevista de 4,5% com o risco país, a taxa de juros doméstica presumivelmente "neutra" do país seria de 8%. Este nos parece o limite da taxa de juros básica no atual contexto.

Movimento das commodities e fundos hedge

Sabidamente, uma das razões para a tranquilidade da macroeconomia brasileira diante dos colapsos financeiros dos últimos anos nos países de capitalismo central é o fluxo expressivamente positivo advindo do segmento das commodities. Pois bem: há um discreto movimento dos denominados hedge funds reduzindo posições nesta categoria de ativos. Dados da Commodity Futures Trading Commission, entidade fiscalizadora dos EUA, mostram que desde o final do ano passado os contratos de commodities detidos pelos fundos hedge caíram quase dez por cento. Em alguns casos, a queda das posições foi acentuada, como no caso do cobre (-84%). Este movimento pode se acentuar em função da expectativa de redução da atividade econômica da China. Eis um dado para ser observado atentamente. É crucial para o Brasil.

A primeira vítima

A "guerra" do spread já fez sua primeira vítima: o presidente da Febraban, Murilo Portugal. Ex-dirigente do FMI, Portugal não deverá perder o emprego, mas perdeu a utilidade para os banqueiros : não é mais interlocutor aceitável para o governo Federal. Em 2006, quando o mesmo Guido Mantega, nesse caso em apoio de Lula, como o que está tendo de Dilma, começou um movimento, via bancos oficiais também, para reduzir o spread bancário, o então economista-chefe da Febraban, Roberto Luis Troster, deu uma entrevista criticando a medida, dizendo que ela não daria certo. Pelo que se vê seis anos depois, nessa nova investida do governo, os juros persistem elevados. Troster, porém, perdeu o lugar. Há quem diga que Portugal vai para a geladeira por ter enfraquecido a posição dos bancos particulares.

Erro de cálculo

Muitos dos que se incomodam hoje com algumas ofensivas, na área política e econômica da presidente Dilma, como agora do spread bancário, não imaginaram o que sempre estava na cara : a presidente é diferente de seu protetor, o ex-presidente Lula. Enquanto Lula é dado a acomodações, negociações e conciliações, Dilma tem menos "cintura", é muito mais ideológica e mais determinada a fazer acontecer aquilo que acredita.

A CUT e o imposto sindical - a farsa

Não deve ser colocada no rol das coisas sérias a campanha da CUT contra o imposto sindical. No fundo ela retoma um mote do Lula sindicalista, dela mesmo e do PT antes de apearem no Palácio do Planalto. Só seria meritória se enterrasse de vez esta herança do getulismo e forçasse os sindicatos e suas centrais a sobreviverem apenas da contribuição voluntária de seus associados. Também associados voluntários. Não é bem isto o que a CUT prega. Ela defende a substituição do imposto por outra contribuição disfarçada do trabalhador, também compulsória, para filiados e não filiados. Muda-se o nome para permanecer tudo como está.

O tempo político de Aécio

Um voo sobre a sucessão presidencial, do lado da oposição, visto da terra das Alterosas:

1. Não passa pela cabeça do senador Aécio Neves outra coisa que não ser o candidato tucano à Presidência, com o apoio dos atuais aliados do PSDB, PPS e DEM e, provavelmente, com incorporação de outros parceiros - PSB, PDT, PP, PTB e, se vingar, o PSD de Kassab.

2. Não adianta cobrar agora do ex-governador mineiro uma oposição agressiva ao governo da presidente Dilma. Primeiro, porque não é o estilo dele, mais voltado para o modelo do avô, Tancredo. Depois, porque é contraproducente num momento de alta popularidade da presidente.

3. O momento de Aécio é procurar alianças e firmar sua imagem fora do circuito Minas - Rio de Janeiro - Brasília. Fará cada vez mais viagens para outros Estados, para conquistar tucanos e apresentar-se ao eleitorado.

4. Agora, ele fará apenas críticas no "atacado", procurando mostrar os equívocos da política econômica e em outras políticas como de saúde, educação. Chama-se a atenção para discursos que tem feito no Senado nesta linha e artigos semanais na "Folha de S.Paulo". Por aí vai formando uma espécie de plataforma de campanha. Acredita-se que Dilma começará a fraquejar quando a economia entrar em dificuldades. Será, então, a hora de atacar. Não antes do ano que vem, nem antes dele próprio Aécio se firmar como candidato com visibilidade.

Sempre a imprensa

Em entrevista ao jornalista Fausto Macedo, do "Estadão", o novo presidente do TRF da 3ª região, Newton De Lucca, usando expressões como "jornalismo trapeiro", "bandoleiros de plantão", "niquices", "meandros de certos poderes midiáticos no Brasil" e que tais, defender a criação de um "habeas mídia" no Brasil, lançado em seu discurso de posse. Apesar do estilo e do linguajar, De Lucca não consegue disfarçar sua verdadeira intenção que é de criar um instrumento capaz de constranger o livre exercício da liberdade de imprensa. Nesse item ele corre na mesma linha de parcelas do PT que nunca deixaram de sonhar com algum tipo de "controle social da mídia" e pensam aproveitar uma possível CPI do Cachoeira para voltar ao ataque a jornalistas e meios de comunicação. Em tempo: De Lucca é poeta, autor dos livros "Pintando o Sete" e "Odes e Pagodes".

(por Francisco Petros e José Marcio Mendonça)

segunda-feira, 16 de abril de 2012

PAULO FREIRE - PATRONO DA EDUCAÇÃO BRASILEIRA


LEI Nº 12.612, DE 13 DE ABRIL DE 2012.


Declara o educador Paulo Freire Patrono da Educação Brasileira.

A PRESIDENTA DA REPÚBLICA Faço saber que o Congresso Nacional decreta e eu sanciono a seguinte Lei:

Art. 1o O educador Paulo Freire é declarado Patrono da Educação Brasileira.
Art. 2o Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.

Brasília, 13 de abril de 2012; 191o da Independência e 124o da República.

DILMA ROUSSEFF
Aloizio Mercadante

Este texto não substitui o publicado no DOU de 16.4.2012

A CHUVA E O MEU CANTO


O Serrote está branquinho,

Já começou a trovejar,

- Menino vai trazer lenha!

Ouvia mamãe gritar.

- Tira a roupa do varal

Lá se vem um temporal

E corre pra não molhar!

*

Era a fartura das águas

Um festival de alegria,

Menino enchendo pote,

Lata de vinte e bacia,

Era grande a animação

Alagando meu sertão

Que encharcado sorria.

*

E a meninada corria

Pra se banhar nas biqueiras.

Nos quintais e nas calçadas,

Choviam as brincadeiras.

Eita gostosa lembrança,

Dos meus tempos de criança

Na cidade de Ipueiras.

*

O barquinho de papel

Sumia na correnteza,

Diante do meu olhar

Que em tudo via beleza

“Cai chuva de lá do céu”

“Cai chuva no meu chapéu”

Eu cantava a natureza.

*

Só sei que viro menina,

Quando volto ao meu recanto.

Pois minha alma nordestina

Vai se vestindo de encanto.

Lá tudo me contagia,

Vou aspirando magia

E transformando-a em canto.

*

Texto e foto de Dalinha Catunda