terça-feira, 21 de junho de 2011

POLÍTICA & ECONOMIA NA REAL

Condições externas e o Brasil


As razoáveis condições econômicas da economia brasileira escondem da opinião pública a percepção sobre o quanto os riscos externos podem afetar o desempenho doméstico. Na semana passada, esta coluna esteve reunida com economistas e analistas de dois bancos internacionais que recentemente realizaram apresentações para investidores no exterior. Resumidamente eis o conteúdo destas conversas nas notas abaixo.


Riscos de crédito


Os problemas de crédito da Grécia podem ter um efeito dramático sobre toda a Europa. As condições da Espanha são tão deterioradas quanto da Grécia, mas o seu endividamento afeta muito mais os bancos europeus, em especial os alemães, que necessitariam de novas capitalizações para bancar os ativos de seus balanços. O default grego trará consequências, além de suas fronteiras, muito mais sérias que se imaginava há meses.


Riscos de investimento


De forma geral, os gestores de recursos estão muito mais restritivos à exposição de riscos. Com isso, estão reduzindo posições em ações e títulos de renda fixa de países emergentes, incluindo o Brasil, a África do Sul e a Rússia.


Câmbio


Os temores de desvalorizações "competitivas" entre os países voltaram com força. A ausência de competitividade de importantes setores econômicos dos EUA e da Europa não tem condições de competir com a China e a Índia e outros países do sudoeste asiático. Com isso, apenas a desvalorização da moeda pode conter este processo no curto prazo. Resultado : as pressões políticas envolvendo a taxa cambial destes países competitivos vão aumentar e as suas consequências são sempre perigosas, sobretudo no que tange à inflação e ao volume do comércio internacional.


Brasil


O país deixou de ser o "queridinho" dos investidores. A percepção que está prevalecendo atualmente é que o "Brasil está melhor que o resto". Desta forma, os indicadores de riscos brasileiros, expressos nas cotações de títulos de renda fixa privados e soberanos, sinalizam uma "preferência" e não confiança absoluta no desempenho do país. O baixo crescimento endógeno do país comparativamente à Índia e à China, os riscos políticos e a ausência de reformas não favorecem o momentum dentre os emergentes. Pesa como fator essencialmente positivo a confiança na solvência externa, o que não é pouco.


Coalizão, colisão e chanchada


Nem boi solitário anda dormindo mais com uma simples conversa, precisa de um calmante. O que quer dizer que uma boiada inteira (no sentido figurado, com todo o respeito), como a bancada governista no Congresso, sempre está pronta para um estouro se o ambiente não agrada. E este é exatamente o pé em que estão os governistas da Câmara e do Senado, mais os primeiros, um pouco mais de uma semana depois da presidente Dilma ter começado a rearranjar seu esquema político. Por razões diferentes, ninguém está feliz.


Prazo fatal e curto


Dilma ganhou esta semana de graça, em virtude do feriado de Corpus Christi de quinta-feira e do São João de sexta-feira, que deixaram Brasília ao sabor dos ventos. É o prazo para dizer como, na prática, vai atender os desejos de seus aliados, nos pantanosos terrenos das verbas e dos empregos. Prazo curto : até o dia 15 de julho para o dinheiro das emendas e diariamente no "Diário Oficial" com uma velocidade de atendimento digna de um Ayrton Senna.


Prazo de aliado


Para o bem e para o mal, o PMDB faz absoluta questão de lembrar do "prazo fatal" todos os dias, o governo tem aliados que querem partilhar o poder. E suas benesses e, quem sabe até, algumas agruras. É este o desafio da presidente: conciliar parceiros inconciliáveis e famélicos sem passar a imagem de que se rendeu ao fisiologismo e que não tem como impor seus princípios e normas. O dito "presidencialismo de coalizão" no Brasil pode descambar celeremente para um "presidencialismo de colisão" com grandes pitadas de chanchada.


Em loja de louças


Depoimento de parlamentares de diferentes partidos: a presidente Dilma precisa urgentemente dar um treinamento para a ministra Ideli Salvatti e colocar nas mãos dela algum poder de decisão antes que ela comece a quebrar todo o estabelecimento político. A impressão das raposas é de que Ideli precisa com rapidez de um bambolê igual aquele com o qual o PMDB presenteou Dilma durante a campanha do ano passado. E que a presidente ainda não aprendeu a usar totalmente.


A voz dos oráculos


Por contas das arestas que ainda ficaram da crise exposta pela revelação das super consultorias de Palocci, a presidente Dilma pediu uma mão aos chefões oficiosos do PT e do PMDB. Lula, em seu estilo mais teatral, já tratou de dar um puxão de orelhas público nos petistas de São Paulo. Meio esfinge, Temer resvala nos bastidores. A expectativa é que falarão esta semana o "oráculo de São Bernardo" e o "oráculo do Jaburu". Quando voltarem de suas festas juninas, os parlamentares chegarão um pouco mais esquentados pelas queixas dos prefeitos.


Incúria oficial


O Brasil já sabia desde 2007 que seria sede da Copa do Mundo de 2014. Aliás, as autoridades esportivas e os governos - Federal, estadual e municipal - esforçaram-se como poucas vezes fazem para que o evento da FIFA viesse para o país. Não tem desculpa de falta de tempo para preparar as estruturas necessárias. A correria agora, com liberação de licitações e outras escandalosas liberações, é apenas mais um retrato em todas as dimensões de nossa incúria gerencial pública e da tendência tupiniquim de se comprazer a criar facilidades para quem quer ganhar um dinheirinho fácil. E que dinheirinho!


Sob intervenção?


Alguma coisa muito estranha está acontecendo com a Petrobras. Em um mês ela teve seu plano estratégico de investimentos 2011/2015 recusado pelo governo, com voto do ministro da Fazendo, Guido Mantega, presidente do Conselho de Administração da empresa. Ao mesmo tempo, não teve autorizado o aumento pretendido de 10% no preço da gasolina na refinaria, pois implicaria em reajuste também na bomba para o consumidor final ou então redução da CIDE, e o Tesouro Nacional não pode perder arrecadação. Parece evidente que a Petrobras - assim como outras estatais (Eletrobras, os bancos oficiais, a rediviva Telebrás) - deve sujeitar-se à política econômica de Brasília. Assim sendo, não tem autonomia gerencial.


Visão externa da Petrobras


De um experiente analista de investimento de um banco inglês sobre a Petrobras: "não há mais nenhuma razão para recomendar as ações da Petrobras como opção de compra. Antes, os riscos eram enormes, mas previsíveis. Agora os riscos são imprevisíveis e gigantescos."


Deixe-se de sonhar


O ministro Guido Mantega pode enfiar no saco a viola da reforma tributária, mesmo fatiada, no curto prazo. Ela já joga os governadores do Norte e do Nordeste contra os do Sul e do Sudeste, oposição que só será vencida se o Tesouro Nacional tiver um baú muito recheado de recursos que todos pedirão para "compensar as perdas" com as mudanças no ICMS. O que, apesar dos acenos fazendários de que é possível, sabem todos que não é. Na Carta de Brasília lançada na semana passada, os governadores nortistas e nordestinos deixaram claro o preço da adesão deles ao imaginado pelo Ministério da Fazenda.


Só uma coisa une


Além dos discursos da simplificação tributária e do fim da guerra fiscal, está mais para estrangeiro ver, um único ponto une as partes estaduais em oposição : a mudança no índice de correção das dívidas estaduais para reduzir a contas deles de juros. O governo Federal está dizendo que topa, para ganhar em outros pontos. É operação complicada : como compensar o Tesouro com a perda do dinheiro desses pagamentos do serviço da dívida. A própria desoneração da contribuição das empresas para a previdência social, anunciada várias vezes pelo ministro Mantega para "os próximos dias" subiu na cobertura pela mesma razão. O cobertor da arrecadação é grande e bem pesado e, mesmo assim, é curto e não aquece todos os beneficiários dos impostos.


Para complicar - I


Voltou a guerra pela distribuição dos royalties do petróleo, pondo todos os Estados contra o Rio de Janeiro e o Espírito Santo, mais de 5 mil prefeitos no Brasil todo contra pouco mais de 100 prefeitos fluminenses e capixabas.


Para complicar - II


Ainda há o caso isolado do Amazonas e da Zona Franca, já pintados também para um embate com todos. Dizem os manauaras que a mudança no ICMS, como foi proposta pelo Ministério da Fazenda, mata a economia industrial da região. Além disso, já estão em pânico com os incentivos fiscais concedidos à produção dos tablets. Caso não consigam barrar a MP, vão exigir que a lei defina o tamanho das telas de tablets, para evitar que as indústrias do sul possam usar a brecha da lei para produzir aparelhos de TV de 30 polegadas ou mais como se fossem esses novos "brinquedinhos" digitais. Se continuar nessa batida, o governo Dilma vai conseguir tirar de José Serra o "troféu de político brasileiro mais odiado em Manaus e adjacências", posto que o tucano conquistou quando foi ministro do Planejamento e teve a Zona Franca sob suas asas.


Apagão digital

Anatel, Congresso e o Ministério das Comunicações não se entendem sobre as novas regras para o setor de telecomunicações e informática no Brasil. A nova lei do cabo está parada no Senado. O novo Plano Geral de Metas e Universalização é objeto de disputa entre o setor público e o setor privado. E nada avança na lei geral de telecomunicações. A Telebrás foi ressuscitada para tocar o Plano Nacional de Banda Larga, mas até agora não explicou porque voltou a existir e o projeto, menina dos olhos eleitoral de Lula e Dilma, já sofreu vários adiamentos e redução de metas. Mais da R$ 10 bi do Fust, criado para financiar a universalização dos serviços de telecomunicações, está parado nos cofres do Tesouro Nacional para engordar o superávit primário enquanto o governo gasta em outras coisas muito menos importantes, especialmente com aumentos de salários e despesas de custeio. É o Brasil do século 21 em marcha acelerada para ficar parado no século. Num "apagão tecnológico" que pode retardar em algumas décadas a nossa tão sonhada (e não a atualmente apenas sonhada) entrada no universos das nações verdadeiramente desenvolvidas e com qualidade de vida para seus cidadãos. Como advertiu recentemente o presidente da União Internacional de Telecomunicações, Hamadoun Touré, que estará no Brasil participando da Futurecom, de 12 a 15 de setembro, "se não forem feitas profundas modificações no sistema regulatório do setor de telecomunicações, em cinco anos poderemos ter uma crise pior do que a financeira". Para Touré, as normas existentes estão ultrapassadas, não acompanharam a evolução da tecnologia de telecomunicações e de informática. A do Brasil ainda nem descobriu a convergência digital.


(José Marcio Mendonça e Francisco Petros)

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