segunda-feira, 22 de outubro de 2012

A VIDA ENSINA


Se você pensa que sabe; que a vida lhe mostre o quanto não sabe.

Se você é muito simpático mas leva meia hora para concluir seu pensamento; que a vida lhe ensine que explica melhor o seu problema, aquele que começa pelo fim.

Se você faz exames demais; que a vida lhe ensine que doença é como esposa ciumenta: se procurar demais, acaba achando.

Se você pensa que os outros é que sempre são isso ou aquilo; que a vida lhe ensine a olhar mais para você mesmo.

Se você pensa que viver é horizontal, unitário, definido, monobloco; que a vida lhe ensine a aceitar o conflito como condição lúdica da existência.

Tanto mais lúdica quanto mais complexa.

Tanto mais complexa quanto mais consciente.

Tanto mais consciente quanto mais difí­cil.

Tanto mais difí­cil quanto mais grandiosa.

Se você pensa que disponibilidade com paz não é felicidade; que a vida lhe ensine a aproveitar os raros momentos em que ela (a paz) surge.

Que a vida ensine a cada menino a seguir o cristal que leva dentro, sua bússola existencial não revelada, sua percepção não verbalizável das coisas, sua capacidade de prosseguir com o que lhe é peculiar e próprio, por mais que pareçam úteis e eficazes as coisas que a ele, no fundo, não soam como tais, embora façam aparente sentido e se apresentem tão sedutoras quanto enganosas.

Que a vida nos ensine, a todos, a nunca dizer as verdades na hora da raiva. Que desta aproveitemos apenas a forma direta e lúcida pela qual as verdades se nos revelam por seu intermédio; mas para dizê-las depois.

Que a vida ensine que tão ou mais difí­cil do que ter razão, é saber tê-la.

Que aquele garoto que não come, coma.

Que aquele que mata, não mate.

Que aquela timidez do pobre passe.

Que a moça esforçada se forme.

Que o jovem jovie.

Que o velho velhe.

Que a moça moce.

Que a luz luza.

Que a paz paze.

Que o som soe.

Que a mãe manhe.

Que o pai paie.

Que o sol sole.

Que o filho filhe.

Que a árvore arvore.

Que o ninho aninhe.

Que o mar mare.

Que a cor core.

Que o abraço abrace.

Que o perdão perdoe.

Que tudo vire verbo e verbe.

Verde. Como a esperança.

Pois, do jeito que o mundo vai, dá vontade de apagar e começar tudo de novo.

A vida é substantiva, nós é que somos adjetivos.


(Artur da Távola)

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