segunda-feira, 28 de julho de 2014

DISCURSO DE POSSE NA PRESIDÊNCIA DO ROTARY CLUBE DE FORTALEZA DUNAS

Autoridades que compõem a mesa,
Senhoras e Senhores:
Boa noite!

Principio pelo filete originador, a nascente fecundante, o veio germinal: o rio. Antes de nascer, ele já tinha me atomizado. Somos água, o planeta é água. Tudo o mais é exceção. No entorno dos rios nasceram os aldeamentos humanos, as primeiras polis, os salões civilizatórios.

Fui gerado na costela de um rio, o indígena Poty. Dele me recordo e, em especial, daqueles que se fizeram instrumento para que eu pisasse as babugens de maio ou rolasse pelos barrancos da vida: meus genitores. Por eles conheci o choro da alegria. Meu pai, um José que a fraternidade convivencial preferiu rebatizar de Jesomar; e Rosária, uma fórmula floral que era pura radiação amorosa. Foram eles que me ensinaram soletrar as primeiras sílabas do alfabeto mitológico do servir. Como olvidar o arrojo dispositivo do meu pai, despertando no sereno da madrugada para transportar doentes ao hospital? Ou, nos domingos ensolarados, recebendo os amigos em torno da mesa para compartir o pão do companheirismo? (Aliás, no platô etimológico, companheiro é aquele comparte o pão). Antes de conhecer o dístico “dar de si antes de pensar em si”, testemunhei a Notre Dame da minha infância lançando à terra as sementes da doação. Minha mãe foi uma alma poética sob a forma de alameda estética na aridez sertaneja. Viveu radicalmente a experiência da entrega à família e ao próximo.

Depois, passei pelas veredas das artes, o trivium e o quadrivium das capoeiras, até aprender andar tranquilo pela noite desprovida de luzes, sobretudo de estrelas. Nesse fascinante itinerário cruzei o portal da amizade, uma legião de rostos, resinas e rótulos, que me agraciaram com a essência da existência.

O leito da vida me trouxe, balsa sedenta de novidade, até estas mágicas formações de grãos de areia acariciadas pelo sol e pelo mar: as dunas. Ednardo ensinou que, os cearenses, nos originamos “das dunas brancas, onde queríamos ficar, deitando os olhos cansados, por onde a vista alcançar. O velho píer apagado, o novo píer espantado, olhando a vida espalhou, luzindo na madrugada, braços, corpos suados e a praia falando amor”.

As Dunas são a testemunha ocular da razão de ser da grandeza marítima: a humildade. A superioridade do mar, esse monumento aquático tão querido e temido, provém não da arrogância, mas da humildade. O mar é grande não porque possui um exército de vassalos, um batalhão de séquitos, uma multidão de empregados a lhe obedecer. O mar é grande porque, humildemente, serve: serve de esteio para todos os rios, caudatário das águas de todas as fontes.

Bem aventurada, pois, a ideia de nomear este Clube Rotário como “Dunas”. Mais venturosa ainda é a causa que movimenta sua denteada rotatória: o servir. Nada pode ser mais belo e sublime na paisagem humana do que orvalhar a vida com o bálsamo do servir. Servir é a superior e sagrada prática do amor. Prova de amor maior não há que doar a vida pelo irmão, proclamou o Rabi dos 33 anos, Jesus Cristo.

Recebo o martelo e o sino deste Clube de nome sedutor fazendo uma profissão de fé nos valores permanentes e estimuladores da rotação evolutiva da humanidade, que se amalgamam em uma palavra: amor!

É sob o estandarte do amor que vos peço, companheiras e companheiros de Clube, alguns gestos de tolerância.

O primeiro é que não desejo criar expectativas, porque elas carregam em si o vírus de frustração, que me enche de temeridade.

Segundo: permitam-me ser apenas o agricultor do clube. O amante da terra onde exerce o lavor, aquele que zela com carinho as sementes, pois são todas selecionadas; aquele que ara o solo fértil dos vossos corações, lança a água do estímulo e vibra com a germinação fecundante.

Terceiro: Prescreve o nosso arcabouço normativo que, a cada ciclo anual rotário, se desenhem metas. E este clube, registre-se, atingiu o ápice de cumprimento de metas na gestão do Presidente Levi. Sucede que tenho dificuldades de lidar com metas. Elas tendem a nos aprisionar, nos deixar obcecados pelo seu atingimento. É que em meu peito, vez por outra, pousa o pássaro da poesia. E quem recebe um passe no centro espiritual lírico do mitológico Orfeu fica ferrado por uma marca luminosa chamada liberdade. Poeta adora asa, sonho, amplitude e vôo. E, sobretudo, rende-se ao encantamento de apreciar a paisagem no caminho, curtir o itinerário. Identificar as manifestações da beleza que se nos apresenta a gratuidade da natureza. Como bem expresso na música estrada de Canindé, do primoroso Humberto Teixeira, ao revelar que “o pobre vê na estrada, o orvalho beijando a flor, vê de perto o galo campina, que quando canta muda de cor, vai molhando os pés no riacho, que água fresca, nosso Senhor, vai olhando coisa a grane, coisas que pra mode vê, o cristão tem que andar a pé”.

A ressalva às metas não significa que não as encaremos, muito menos que descuremos dos nossos objetivos primordiais. O plano de vôo todos conhecem: é em direção ao território invisível e sagrado onde está erigida a nossa pirâmide histórica, com seus três vértices que eu costumo chamar de tripé místico do ROTARY: o labor ético, o serviço profético e o companheirismo estético.

Não quero reinventar a roda. Acho que nossa denteada rotatória não precisa ser reinventada, mas lubrificada. Precisamos dizer o mesmo com novas palavras. Ter a clara compreensão da nossa razão de ser, da importância de contribuirmos com o conserto do mundo, a concertação planetária, missão tão bem resumida pelo nosso fundador Paul Harris que, em agosto de 1916, publicou na Revista The Rotarian a seguinte frase: “O Rotary continuará a ser caridoso, mas pode fazer mais do que isso; façamos com que o Rotary extermine a causa que torna necessária a caridade”.

É a pira olímpica dessa extraordinária e apaixonante instituição que nos compete segurar! Parafraseando os jovens revolucionários que sacudiram a Paris dos anos 60, digamos: Sejamos razoáveis, sonhemos apenas com o impossível. Façamos o Rotary brilhar e mudemos o mundo!

Muito obrigado!

(Júnior Bonfim, por ocasião da Solenidade de Posse na Presidência do Rotary Clube de Fortaleza Dunas, em 17.07.2014, no Ideal Clube)

Um comentário:

Anônimo disse...

Caro primo e amigo Júnior Bonfim,

Parabéns pela posse na Presidência do Rotary Clube Fortaleza Dunas.
Felicito-o, ainda, pelo belíssimo e luzente discurso de posse.
Ninguém foge do que está traçado pelo destino.
Você nasceu com o privilégio de encontrar – e em tenra idade encontrou - o veio da poesia, o âmago da bela escrita; enfim, a essência da literatura, como afirmou alhures nosso querido e comum amigo, o grande poeta, professor e escritor, Juarez Leitão.

Deus continue iluminando seu caminho na busca incessante de servir ao outro.

Um forte e afetuoso abraço, extensivo à sua linda e abençoada família.

Boaventura Joaquim Furtado Bonfim
Fortaleza, Ceará, Brasil.