domingo, 22 de maio de 2016

LIÇÕES DE UMA ACADEMIA!


Dignidades que ornam a mesa,
Cavalheiros e Damas,
Mocidade aqui presente: meu cordial boa noite!

Se no princípio foi a palavra, antes da palavra foi o silêncio. E no âmago de ambos, do silêncio e da palavra, o estalido da alegria, que neste início de ano nos caiu como uma luva através da milagrosa chuva, que faz explodir o verde, os reservatórios transbordarem, as pessoas resplandecerem. É sob esse entusiasmo benfazejo e contagiante que vos falo...

Orienta o protocolo desses eventos de transmissão de cargo que o sainte preste contas. Perdoem-me se a isso me oponho: é que o acho enfadonho. Suplico, assim, a vossa generosidade compreensiva para, espancando o couvert do formalismo, fazer uma concessão à amenidade, realizar um breve convescote familiar, pronunciar algumas sílabas de intimidade e desenvolver uma conversação de camaradagem.

Não vou debulhar o milho da nossa safra literária ou desfiar o nosso rosário de ações, tampouco listar as realizações deste Sodalício que, em apenas um decênio, já se firmou como um lampadário respeitado na Terra da Luz. Apesar de ainda faiscar os olhos com as estrelas da infância, a AMLEF já caminha com elegância e galhardia pela trilha madura do aprendizado de Sofia.

Pretendo repartir convosco breves lições que aprendi e apreendi neste biênio que se encerra hoje, lições que cimentaram indelevelmente o singelo pórtico da minha alma.

Desde quando descobri que agradecer agrada ao ser, resolvi reposicionar a bússola do meu existencial curso, lançar mão de outros recursos e refazer percursos. Permitam-me nesta noite que apenas abra as modestas janelas do meu coração, a fim de que, por elas, se esparramem os galhos do meu flamboyant de emoção. Por isso uma palavra, soletrada como a melodia de uma canção, é o emblema desta ocasião: a doce gratidão.

Grato sou a cada um de vocês. Distingo, por impulso da gratuidade, aquele que me indicou e o aço dessa indicação significou uma campanha (a primeira em minha vida) em que fui eleito sem pedir votos: Seridião Correia Montenegro! Neste mandato tudo foi breve, porque o suposto fardo se quedou leve, graças à conjunção de mentes e mãos, prédicas e práticas, intenções e gestos protagonizados por nosso colegiado de artesãos literários.

Acho que os Catalães foram radiosamente felizes quando batizaram o órgão executivo das suas municipalidades de ‘ayuntamiento’ (ajuntamento, entre nós). Essa palavra resume a nossa Arcádia. Esta uma inolvidável lição: para nós, gestão é sinônimo de agregação. Bombeadores do oxigênio cerebral, constituímos um mosaico militante de trovadores contra as trevas, arco-íris de carpinteiros das palavras edificadoras. Ao invés do culto à personalidade, cultivamos o elogio à coletividade. Substituímos a exaltação da individualidade pelo louvor à pluralidade.

A tarefa de um sementeiro das letras é a aproximação dos seres. Neruda ensinava que “o primeiro dever do humanista e a tarefa fundamental da inteligência é assegurar o conhecimento e o entendimento entre todos os homens”. Conhecimento e entendimento não se esgrimam; ao contrário, rimam! De nada adianta os dispêndios com o cumular de compêndios se não mitigarmos os humanos vilipêndios. Despiciendo aplaudir a eloquência se descuramos da benevolência.

Com efeito, mais do que comemorar a façanha de termos atravessado o oceano para ser a primeira arcádia cearense a lançar a Antologia UM DEDO DE PROSA, OUTRO DE POESIA no Salão Internacional do Livro de Genebra, na Suíça, quero celebrar o fato de, sucessivamente, batermos recordes no aumento do nosso IDF - Índice de Desenvolvimento Fraterno. Nossas reuniões mensais - assim como nossas redes virtuais, que antes de tudo são reais - constituem pequenos banquetes de afeto, festas de integração. Destaque merecem as nossas parcerias humanitárias e sociais com a Casa de Afonso e Maria, a ALASAC (Academia de Letras e Artes da Sociedade de Assistência aos Cegos) e a Secretaria de Justiça, com quem conveniamos para a consecução do Projeto “Remição pela Leitura nos Estabelecimentos Penais”. E por que esse relevo? Porque, como já mencionei em outra oportunidade, a razão de ser do escritor – e dos seus coletivos organizados, que são as academias – é a de contribuir para que as galinhas se transformem em águias, é fomentar a proliferação de vaga-lumes nos obscuros túneis do tempo, é ser fresta de luz na caverna platônica, é proclamar a civilização da claridade e o império do amor.

Antes dos Titãs cantarem “a gente não quer só comida, a gente quer bebida, diversão e arte”, o Jovem Jesus já havia proclamado que “não só de pão vive o homem”. Eis, Senhoras e Senhores, a aspiração oracular da literatura: reabrir diariamente a padaria espiritual e lançar o fermento sobre a massa do pão da eternidade, o único capaz de mitigar a nossa fome de altruísmo, o vácuo de caráter e a ausência de conteúdo.

Felicito a Diretoria que assume, coesa na busca da fertilidade literária exposta ao brilho do sol e ao sal da terra. Saúdo todos na figura fidalga, de sofisticada simplicidade e energia radiante, da Presidente entrante Grecianny Carvalho Cordeiro.

Diva da iniciativa, instrumento do talento, a nossa Grace - como a outra Grace, de Mônaco – nasceu para percorrer a alameda das grandezas e segurar o facho prodigioso do estrelato. O Carvalho que irrompe do chão do seu nome é o mesmo da raiz latina, ‘robur’, sinônimo de robustez e majestosidade – garantindo-lhe a performance essencial que controla trovões e tempestades. A porção Cordeiro, que ela incorporou do esposo Helder, haverá de transferir para os seus confrades, porque doravante ‘cordeiros’ seremos nós, seus liderados; e ela, a nossa Pastora. Namastê – o Deus que habita em mim saúda o Deus que habita em você!

(Júnior Bonfim - discurso proferido na Solenidade de Posse da nova Diretoria da AMLEF – no auditório da Procuradoria Geral de Justiça, em 28.01.2016)

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