domingo, 25 de janeiro de 2009

COMÍCIO DAS DIRETAS JÁ NA SÉ SEGUE VIVO NA LEMBRANÇA DOS MANIFESTANTES






Evento que reuniu 300 mil pessoas no centro de SP completa 25 anos.


Festa cívica foi o primeiro grande passo rumo à democratização do país.


Há exatos 25 anos, a Praça da Sé, no Centro de São Paulo, era palco de mais uma festa. Não uma festa de aniversário qualquer, mas uma comemoração cívica jamais vista anteriormente no país, que se transformou em um marco na luta pela redemocratização.


Em 25 de janeiro de 1984, quando a capital paulista completava 430 anos, 300 mil pessoas foram prestigiar mais um comício da campanha das Diretas Já, um movimento suprapartidário que reivindicava a aprovação da eleição direta para presidente do Brasil. O país já tinha presenciado outros atos pelas Diretas, mas o primeiro grande passo rumo à redemocratização ocorreu naquele dia.


A festa foi inesquecível para as 300 mil pessoas que lotaram a Sé. Na luta pelo restabelecimento da democracia, estavam engajados, lado a lado, políticos, trabalhadores, intelectuais, artistas, jogadores de futebol, idosos, jovens.


ONDA MÁGICA


“Foi uma coisa fabulosa”, sintetiza a cantora Fafá de Belém, ao relembrar do comício da Sé, então o seu maior “público”. A convite de Teotônio Vilela, Fafá participou de todos os comícios da campanha. Fazendo jus à condição de “Musa das Diretas”, ela abria os comícios puxando o Hino Nacional e, durante o evento, interpretava a canção “Menestrel das Alagoas”, composta por Milton Nascimento e Fernando Brant em homenagem a Teotônio Vilela.


Para a cantora paraense, que recepcionou, antes dos comícios, muitos políticos em sua residência em São Paulo, “nada igual havia acontecido antes”. “Além do público, dos populares, havia todas aquelas pessoas que estavam por ali no palanque, como Fernando Henrique Cardoso (sociólogo e então senador pelo PMDB), Chico Buarque e outros ícones da minha adolescência. Todo mundo motivado por uma onda mágica”, disse.

Fafá relembrou dos comícios das Diretas Já ao assistir pela TV à cerimônia de posse de Barack Obama. “Vi nas expressões dos rostos dos americanos aquela mesma felicidade, aquela mesma expectativa por mudanças que havia nos rostos dos brasileiros. Eu chorei na posse do Obama”, revelou.

Apesar de a emenda Dante de Oliveira não ter passado no Congresso, Fafá de Belém não pensa duas vezes para afirmar que faria tudo de novo. “Sim, porque hoje vivemos em um estado democrático. Foi impossível deter a caminhada”, afirmou.



CAMINHADA DE ANÔNIMOS


A caminhada só foi em frente devido à mobilização popular de milhões de pessoas por todo o país. Anônimos como a servente de escola Filomena Conceição Militão, na ocasião com 58 anos, o sindicalista Luís Carlos de Oliveira e a estudante de história da USP Anna Crisitina Camargo Moraes Figueiredo.


Mais ou menos engajados politicamente, todos aderiram à campanha com um propósito bastante claro: restabelecer o processo democrático e votar para presidente.


Filomena Conceição, aos 83 anos, puxa pela memória para relembrar daqueles dias. “Não perdia um comício, eu ia em todas as passeatas. Eu lembro que era cada um levando a sua bandeira. Era uma festa cívica, como se fosse uma escola de samba. A gente lutou para mudar, mas não mudou”, relatou, com uma ponta de frustração.


Já para Luís Carlos, o Luisinho, segundo tesoureiro do Sindicato dos Metalúrgicos de São Paulo, além da redemocratização, estava em jogo também a possibilidade de legalização do Partido Comunista Brasileiro (PCB). “Já estava militando pelo partido na época da ditadura, que era algo que revoltava a gente. Aquilo que estava acontecendo era um sonho inacreditável, de que a gente podia mudar e acabar com a ditadura. A gente se emocionava muito”, lembrou.


Anna Cristina, por sua vez, com apenas 21 anos, participava dos comícios sem ter noção da real dimensão do evento para a história. “Eu não era tão politizada. Ia mais por ter uma visão meio glamorosa do pessoal da década de 1960, da possibilidade de ser presa, tomar porrada da polícia”, contou. Mesmo assim, as lembranças estão vivas na cabeça. “Lembro da Fafá cantando o hino, das pessoas chorarem, havia um sentimento de unidade. A maior parte do tempo ficávamos andando, gritando palavras de ordem”, disse.


O clima de confraternização na Praça da Sé favoreceu até mesmo o início de um relacionamento em pleno comício. “Eu era candidata à presidência do Centro Acadêmico do curso de História e fui junto com o Marcelo, diretor do Diretório Estudantil da USP. Demos o primeiro beijo com a Fafá cantando o hino”, relembrou.


O namoro durou durante toda a campanha das Diretas Já, mas tinha data certa para acabar. “Terminamos o namoro quando foi votada a emenda Dante de Oliveira (em 25 de abril de 1984). Creio que a frustração foi muito grande e decidimos acabar”, afirmou. Um verdadeiro anticlímax nacional, mas, a partir daí, começa uma outra história...


(Marcelo Mora, em São Paulo)

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