sábado, 14 de novembro de 2009

COISAS QUE SE FORAM



De vez em quando me debruço sobre o passado para sentir a saudade das coisas boas que se foram e que não mais voltarão. Há pouco, próximo à estação de trem, lembrei-me do movimento intenso que víamos ali todos os dias. O vai e vem de carroças, caminhões e carreteiros levando tudo para o trem cargueiro. À noite, principalmente quando o trem de Fortaleza atrasava, grande movimento se fazia nas mercearias do seu Raimundo Carlos e Belmiro Venâncio, ali no beco da cachaça, ou no quiosque do Chico Soldado, iluminados pela luz forte de petromax, visto que a luz da Prefeitura só iluminava a cidade até as 22 horas.

Ouvia-se o barulho do trem durante as manobras se posicionando para a viagem do dia seguinte. Lembrei-me das bancas de café da dona Chaguinha e do seu Carneiro que vendiam panelada, café e cachaça, iluminadas por faróis e lamparinas e ali permaneciam por toda a noite. Fecho os olhos e lembro-me de um bule de café no fogareiro, a panelada servida à freguesia e, no ofício de carregar bagagens os carreteiros Gabriel, Antônio Pequeno Chagas Roldão, Lira, Cipriano e Marcelino. Eles também atuavam como despertadores das pessoas que iam viajar . Acordavam os clientes e conduziam suas bagagens à estação.

O silêncio da noite era quebrado pelo sino da estação anunciando as horas. Antes das quatro da madrugada eram acionadas as caldeiras da velha Maria Fumaça, abriam-se as bilheterias da estação, e o telegrafista Ananias iniciava a comunicação com outras estações utilizando o código morse. O movimento na estação ferroviária aumentava na proporção em que chegavam os viajantes para fazer o embarque de malas, caixões de madeira sacos, etc. Quando se abriam as portas dos vagões de primeira e segunda classe, os passageiros se posicionavam em poltronas ou cadeiras que se modificavam e permitiam que o passageiro viajasse olhando para frente ou para trás, conforme preferisse.

O trem fez história e trouxe o progresso para nós e para todas as cidades por onde passava. Em qualquer estação, proporcionalmente, o movimento era o mesmo, intenso e divertido. Até o início da década de 1960 a única alternativa de transporte para Fortaleza era o trem, pois não havia linha de ônibus aqui, e as rodovias eram carroçáveis e sem pontes, o que provocava atrasos nas viagens empreendidas por caminhões que, durante o inverno perdiam tempo esperando as águas dos rios baixarem para poder passar quando não se metiam em atoleiros.

O tempo passou e o progresso aos poucos foi chegando, trazendo facilidades e encurtando caminhos, porém, não se acaba em nós a saudade do trem tradicional que fez história em Crateús, como também em todo o País, desde os tempos do Visconde de Mauá.


(Por Flávio Machado, da Academia de Letras de Crateús)

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