quarta-feira, 9 de dezembro de 2009

CONJUNTURA NACIONAL


DISCURSO

Grande festa em Santa Maria do Suassui, em Minas Gerais. O deputado Nassip Raidan cumprira a promessa: chegava lá com o governador Bias Fortes. Em nome da cidade, subiu ao palanque o vereador Geraldo Lima, para o discurso de saudação:

- Exmo. Senhor governador Bias Fortes. Exmo. Senhor deputado Nassip Raidan.

Tossiu, todo cheio de si, olhou os quatro cantos da praça superlotada, enfiou a mão no bolso para tirar o discurso. Não achou. "Cadê o discurso? Não é possível. Tô ferrado". Remexeu os bolsos, ficou em pânico, o discurso tinha sumido. Viu a mulher lá longe, ainda mais aflita, gritou rouco:

- Donana, o que é que eu faço? Donana, pelo amor de Deus, o pronunciamento...o pronunciamento caiu no vaso do banheiro. O que eu faço o que eu faço, Donana?

A galera em coro:

- Fala, fala, fala.

O vereador saiu pelos fundos do palanque, inventando um acesso incontrolável de tosse. Sob as vaias da multidão.

PESQUISA... AÇÃO

Essa mania de pesquisa mais atrapalha que ajuda. Todas as vezes em que uma pesquisa aparece no mercado, o mundo da política entra em polvorosa. Quem sobe um pouco – este é o sentimento de muitos – está quase ganhando as eleições. Quem desce, já perdeu. Pois bem, pesquisa de opinião na seara eleitoral, nesse momento, é pura especulação. É jogo lúdico para dourar a pílula nas conversas e articulações. Pesquisa, agora, apenas mede recall, lembrança do nome de uma pessoa. Nada mais que isso.

SERRA E DILMA SOBEM?

Dizer, por exemplo, que o governador José Serra e a ministra Dilma Rousseff subiram, nesta última pesquisa CNI/IBOPE, é um exagero. Serra saiu de 35% para 38%, três pontinhos dentro da margem de erro. Dilma deixou os 15% para ficar com 17%, dois pontinhos a mais, o que nada significa. Mais importante é anotar que a popularidade de Luiz Inácio continua a aumentar, chegando, agora, aos 83%. E dizer também que Ciro está em franco declínio (baixou de 17% para 13%) é precipitação. Ninguém, por enquanto, saiu em campanha. A encenação de pré-campanha ainda é vaga na cabeça do eleitor.

O QUE SE MEDE?

O que se mede, então? Mais uma vez: mede-se a força do nome na cabeça do eleitor. Mede-se o comprimento de onda que o nome da pessoa fabrica no sistema cognitivo dos eleitores. Comprimento de onda significa a régua do tempo, espaço em que prováveis candidatos desenvolveram um conhecimento público, a partir de pleitos anteriores, visibilidade na mídia, histórico pessoal, atual cargo público etc. A pesquisa do momento não afere comparações entre competências, preparo, experiência, compromisso com propostas (que ninguém sabe ainda quais são), apoio de patrocinadores etc.

AÉCIO PUXA A CORDA

A novidade não é o resultado de mais uma pesquisa, mas a pressão que o governador de Minas Gerais começa a imprimir ao processo decisório na floresta tucana. Neves vai se encontrar, nesta sexta-feira, em Teresina, com seu companheiro José Serra. Dirá: "Serra, você terá meu irrestrito apoio, pode contar com meu esforço, mas não toparei ser vice em sua chapa; prefiro ser senador. Agora, se você declinar da candidatura, me dê a vaga. Eu topo ser candidato. Mas você tem de decidir logo. Tem que ser, no máximo, até final de janeiro. Não pode ser em março como você quer. Fica tarde pra mim".

RESPOSTA DE SERRA

Serra vai contra-argumentar: "Aécio, tenha um pouco de paciência. Vamos ver como ficará essa crise que assola o DEM. Nem sei de onde tirar, hoje, o vice. Arruda foi bombardeado. Zé Agripino, do RN, pouco agregará à chapa. Você seria o ideal. Se você topasse, eu aceitaria ser o candidato agora mesmo. Você tem condições de fechar Minas Gerais em torno de nossa chapa. E eu carregarei São Paulo, com uns 5 a 6 milhões de diferença. Nesse caso, poderemos enfrentar a vantagem de Dilma/Lula no Nordeste. Pense bem, Aécio. Não me deixe só".

AÉCIO RETRUCA

O mineiro diz: "meu avô Tancredo me ensinou. Meu filho, não ande em cavalo cansado. O cavalo de março chegará cansadinho na minha porta. Não, Serra, prefiro um cavalo novo, um cavalo de janeiro, sela nova, arreios brilhando, o bicho doido para correr na estrada. Topo não. E mais, não gosto de garupa. Gosto de guiar a montaria".

E ASSIM...

E assim, José Serra ficará com a brocha na mão. Promete a Aécio pensar. Pensar mais um pouco. Noctívago, vai curtir a solidão noturna dos amplos corredores do Palácio dos Bandeirantes. Olhando para as obras dos artistas que chamam sua atenção, todas as madrugadas em que carece de um pouquinho mais de profundo silêncio.

"O fruto participa da qualidade das árvores." (Machado de Assis)

FICHAS SUJAS

Este consultor é favorável ao projeto que veta a participação dos chamados fichas sujas em campanhas eleitorais. Por reconhecer que há ainda muita perseguição e vingança por parte de juízes de primeira instância, defende a ideia de que os fichas sujas precisam ser condenados na segunda instância, após serem submetidos à decisão de um colegiado. Nesse caso, o ficha suja não foi condenado por apenas um juiz, mas por uma corte de justiça. Ficam mais preservados os valores que alicerçam a Justiça: a independência, a imparcialidade, a pluralidade.

PT DIVIDIDO

O PT sai do processo eleitoral interno bastante fracionado. No Rio, a banda que apoia a reeleição de Sérgio Cabral ganhou a eleição com a vitória do deputado federal Luiz Sérgio. Mas o prefeito Lindberg Farias, de Nova Iguaçu, vai resistir. Promete confusão. Ele não fechará posição com o partido. Quer ser candidato na marra. Em Minas Gerais, a banda de Fernando Pimentel levou a melhor. Garantindo sua candidatura ao governo. A possibilidade de acordo entre as alas é, porém, maior que no Rio.

CHESTERTON E A IMPRENSA

Em 1912, Chesterton definiu a imprensa, ainda com um resto de romantismo, como a arte de dizer que Lord Jones morreu a quem nunca soube que Lord Jones existiu. Com o tempo, ela passou a ser também o ofício de indistintamente dizer que Lord Jones disse tudo o que Lord Jones disse, ou dizer que Lord Jones disse o que Lord Jones nunca disse, ou não dizer que Lord Jones disse o que Lord Jones disse, ou fazer de conta que nunca existiu um Lord Jones, a um público cada vez mais informado; com uma eficiência que poucos teriam sonhado. O século XX ficou para trás. Mas a definição de Chesterton continua viva.

ARRUDA SANGRANDO

Quanto mais demorar a novela Arruda, no DF, mais sangue sairá das veias do governador. O DEM não tem outra alternativa que a de expulsar dos quadros seu único governador. O PSDB e o PMDB já saíram do governo. O DF é a sala de visitas da Nação. Ali se concentra a turma mais barulhenta do palanque das ruas: alas radicais de funcionários públicos, militância ferrenha de movimentos sociais, dirigentes sindicais plantados sobre grana (isso mesmo, grana, não grama) e oportunistas de todos os tipos. Que ganharam de presente o mensalão do DEM para continuar o barulho. Com direito à invasão da Câmara Legislativa.

A FORÇA DE KASSAB

Com a saída de José Roberto Arruda, a maior referência do DEM passa a ser o prefeito Gilberto Kassab. Que tenta administrar uma cidade invadida pelas águas. São Paulo tem enfrentado dias conturbados. Chuvas e mais o congestionamento de fim de ano formam a receita do caos. Kassab, após o ciclo caótico, deverá repensar seu futuro. Liderar o DEM em direção a novos horizontes, trabalhar por uma ampla bancada na Câmara Federal, juntar os elos perdidos do DEM numa corrente menor, porém mais forte, ou até imaginar outras rotas partidárias? A conferir.

PEDAÇO DE HISTÓRIA (1)

A fim de conquistar o poder, César ligava-se à pessoas de todas as classes, das altas às mais baixas. Tornou-se um homem vulgar. Divorciou-se de Pompeia, sua segunda esposa, porque "a mulher de César deve estar acima de qualquer suspeita". E ela não estava. Mas ele era infiel à esposa. Mantinha casos amorosos com mulheres diferentes, inclusive a mãe de Bruto. O veneno de ação lenta corroia seu ser. A depravação da Roma caia como sombra sobre a luminosa promessa de seu futuro.

O FILHO DO BRASIL

Este consultor não tem dúvidas: o filme da família Barreto, Lula, o Filho do Brasil, não será apenas uma gigantesca cascata de lágrimas. Deverá receber, nos circuitos mais centrais, algumas marolinhas de vaias. Que se começam a ouvir no trailer do filme. Em cinemas não periféricos.

QUEM EXPLICA?

O Brasil é, em certos momentos, indecifrável. Vejam esta: teremos um Natal fervilhando de compras. Economia super aquecida. Lojas e supermercados cheios. A indústria automobilística nunca vendeu tanto. Lula nas alturas. Brasil bombando. Um estouro. Estouro? Anotem: a inadimplência subiu. Chegou ao índice de 20% dos consumidores. No mês anterior, esse índice era de 14%. Manchete dos jornais desta semana. Senhores economistas, expliquem logo esse paradoxo. Ou é assim mesmo? Quanto mais consumo, mais inadimplência? Mas, e a grana distribuída ou financiada pelo governo?

E O PRUDENTE, HEIN?

Que não se perca pelo nome. Mas o deputado Prudente, de primeiro nome Leonardo, foi IMPRUDENTE, quando se meteu na máfia da propina. Prudente é presidente da Câmara Legislativa do DF. Enfiou dinheiro pelos bolsos do paletó e dentro das meias. E ainda dirigiu a Oração da Propina. Se os prudentes no Brasil fossem como ele, já teríamos sido engolidos por um tsunami propineiro.

LADRÕES DE BOM HUMOR

Temos de reconhecer. A ladroagem se aperfeiçoa. Os métodos se sofisticam. Ladrões alugaram uma casa, cavaram túnel, fabricaram carrinhos próprios para carregar 20 milhões de reais. E deixaram um malote com notas de 2 reais. Tremenda gozação. Tiveram imensa paciência. E escolheram o dia: final de campeonato. Festa das galeras. Barulho total. Natal gordo. Prenderam seis suspeitos.

PEDAÇO DE HISTÓRIA (2)

Michelangelo subia pela escada, trepava no andaime e deitava-se de costas para pintar o teto. Escravizado à sua arte criadora, esquecia-se de comer e de dormir. Enxotava um auxiliar atrás do outro. Só abria a porta quando escutava o bater da bengala de Júlio II, o papa. Que não entendia de arte, mas sabia distinguir a grandeza.

- Quando, quando ficará pronto? – indagava o Papa impaciente.

Um dia, o Sumo Sacerdote dá o ultimato:

- Basta, já está pronto. Desça desse andaime, senão mando tirá-lo daí.

Michelangelo concordou.

Lá estava o Gênese, a história da Criação, da Queda do Homem e do Dilúvio.

Com um gesto autoritário, Deus divide o firmamento; insufla o pó de um sopro divino, e eis Adão, feito à Sua imagem, o dedo de Deus ainda no ato de soltar o de Adão, enquanto o primeiro homem contempla com olhos de adoração a face do seu Criador. Eva, agasalhada sob o braço do Onipotente, lança o olhar de curiosidade e medo para o seu senhor e mestre. Profetas e sibilas enchem os difíceis espaços do teto. Há ali 343 grandes figuras, todas sublimes; cada uma tem na pintura a pujança da escultura.

CONSELHO AOS PATROCINADORES DE PESQUISA

Esta coluna dedica sua última nota a pequenos conselhos a políticos, governantes e líderes nacionais. Na edição passada, o espaço foi destinado aos dirigentes do DEM. Hoje, volta sua atenção aos patrocinadores de pesquisa:

1. Procurem solicitar dos Institutos de Pesquisa novas abordagens com a finalidade de descobrir os fatores que influenciam o sistema cognitivo do eleitor.

2. Seria interessante mapear a escala de critérios e valores que estão por trás das escolhas e preferências das classes e segmentos eleitorais.

3. As pesquisas poderiam ainda radiografar as vontades eleitorais a partir das diferenças sócio-culturais entre as classes nas diversas regiões do país, a fim de evitar sua homogeneização.

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(Por Gaudêncio Torquato)

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