sexta-feira, 28 de janeiro de 2011

O ENIGMA CHINÊS


O enigma chinês toma conta do mundo, e o mundo não sabe decifrá-lo.

O perigo é o mundo ser devorado pelo Dragão (símbolo milenar da China), sem poder se defender.

Henry Kissinger acaba de publicar um artigo no The Washington Post que só faz confirmar a universalidade de sua inteligência no meio dos pigmeus intelectuais que respondem pela política internacional.

O ex-secretário de Estado adverte: ou Estados Unidos e China se entendem enquanto é tempo, ou a guerra fria entre ambos será inevitável. As nações teriam que escolher de que lado ficariam, levando a disputa à política interna de todas as regiões, enquanto questões como a proliferação nuclear, o meio ambiente, a energia e o clima exigem uma solução global abrangente.

O que estamos vendo é que as lideranças políticas das duas maiores potências não se entendem. São incapazes de articular uma linguagem comum que permita chegar a um acordo. O problema não terá solução enquanto ambas não aprenderem a subordinar aspirações nacionais à visão de uma ordem global.

Sim, mas como construir uma ponte de entendimento com cabeças chinesas, guiadas por padrões culturais opostos aos da cultura ocidental?

Outro dia assisti na TV a um conhecido debate semanal comandado por certo jornalista dos mais experientes. Falando sobre a China, este jornalista levantou a questão que está na cabeça de todos os economistas do mundo capitalista: - como entender que a China fique a cada dia mais rica e não se democratize? Um dos participantes do debate, diplomata que viveu e trabalhou na China, observou que os dirigentes chineses adotam maneira sempre muito peculiar de lidar com contradições de todo tipo, e saem sempre ganhando.

Esse diplomata, Abdenur, sabe o que diz. Kissinger enfatiza em seu artigo que a diferença é que a estratégia americana privilegia a solução dos problemas. Para nós, ocidentais, parece natural que seja assim. Só que em matéria de cultura, o que parece natural não vale. A China – diz Kissinger – em sua história milenar, acredita que poucos problemas podem ter solução final.

O americano parte direto e em linha reta para a solução do problema.

O chinês prefere dar a volta ao problema. "A China sente-se à vontade tratando das contradições sem pressupor que podem ser solucionadas" (H.Kissinger, "Evitando uma nova guerra fria", OESP, 18/01/11).

O método chinês – explica Kissinger – combina elementos estratégicos, econômicos e políticos – e buscar o resultado por meio de um extenso processo.

Em outras palavras: o americano prefere o estilo afoito de Júlio César: "cheguei, vi e venci". O chinês, muito mais cauteloso, toma outro caminho: cheguei, parei para pensar, e venci. Troca o mecanismo primitivo dos reflexos pelo critério sereno da reflexão.

A superioridade da China na contenda com o Ocidente, é que ela está mais treinada do que o ocidente para pensar em termos de globalidade. Ou seja, para ver, ao mesmo tempo, os vários lados de uma questão.

O segredo dos chineses, que os americanos e os ocidentais desconhecem, é que a China, a civilização mais antiga do mundo, adota a cultura do "não-agir", ensinada pelo seu maior sábio, que não foi Confúcio, e sim Lao-Tseu, (sc.VI AC), fundador do taoísmo. O "não-agir", em chinês, é o agir pelo não-agir. A montanha não se move, mas ela atua em toda a paisagem.

O conceito central do taoísmo é o TAO, cuja tradução aproximada é o "sentido". Ensina Lao-Tseu:

O Tao não opera,
E, no entanto, todas as coisas são feitas por ele.
Ele é impassível,
E, no entanto, sabe planejar.

Eis aí: o rosto chinês é impassível, mas sabe planejar em silêncio.

Será que atingiremos no Ocidente, um dia, tal grau de sutileza?


(Por Gilberto de Mello Kujawski)

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