terça-feira, 8 de maio de 2012

POLÍTICA & ECONOMIA NA REAL

Mercados nervosos I

Dois países, duas sociedades, decidiram que querem mudar o rumo das suas economias. A França e a Grécia, esta última com maior intensidade, votaram neste último fim de semana e a conclusão é que para os cidadãos o sofrimento com o desemprego e a depressão econômica estão pesando muito para serem tratados como mero assunto econômico. A liderança da Alemanha e a sua receita "tradicional" está sob risco. Com isso, o mercado financeiro ficou novamente nervoso e temeroso de que um cenário incrementado de risco venha a prevalecer. O certo é que na Grécia mais de 50% dos jovens (até 30 anos) não tem emprego - a taxa de desemprego total é de cerca de 25%. Na Espanha o cenário é igualmente grave. Na França está se agravando. Em Portugal prevalece o pessimismo. E assim vai.

Mercados nervosos I

Angela Merkel, muito bem acomodada politicamente nas fronteiras alemãs, sabe que as coisas mudaram e trabalhará para que tudo continue como dantes. Todavia, o tempo e o sofrimento social não permitirão que os problemas sejam tratados como se as economias funcionem como se fossem orçamentos domésticos. Lord Keynes já descobriu nos anos 30 do século passado que num cenário depressivo receitas tradicionais de nada servem. É preciso inventividade e liderança, ainda mais quando a origem da crise surgiu pela irresponsabilidade dos governos no tratamento de suas contas fiscais associadas a uma especulação secular. Nas próximas semanas, as páginas políticas da mídia é que darão o tom dos mercados e fazer apostas neste momento é tarefa arriscada. De nosso lado, a recomendação é de cautela. De toda a forma, a tendência mais clara é que passaremos por uma nova rodada de tensões nas próximas semanas. A começar pela Grécia dividida que terá de anunciar para o seu povo que vem aí mais uma rodada de aperto fiscal para pagar as contas de junho e julho. Quem viver, verá.

Riscos financeiros

A estabilidade do sistema bancário europeu está mais do que tensa. O cenário de iliquidez está voltando com tudo. Enquanto isso, as agências de classificação de riscos continuam trabalhando como se fossem marinheiros do Titanic : sabem o que está acontecendo, mas ficam com seus alertas inúteis.

Desconstruindo Lula?

Não por gosto, mas por necessidade, o fato é que a presidente Dilma tem procurado afastar cada vez a imagem de seu governo da de seu antecessor. Não passam despercebidos de nenhum bom observador da cena política nacional os movimentos da presidente, iniciado com a história da "faxina" - amainado em seguida porque, insegura politicamente ainda, ela precisou de Lula para acalmar muitos aliados - agora a faxina é retomada. O tiroteio contra os bancos, a firme determinação de forçar o BC a continuar empurrando os juros básicos para baixo e a ousadia política de alterar as regras de remuneração das cadernetas de poupança, contrastam com a timidez de Lula nesta área. Auxiliares de Dilma discretamente chamam a atenção para esta diferença entre os dois. Ousa-se até dizer que o padrinho dela era um tanto submisso ao interesse do mundo financeiro e à vontade do BC lembrando que o dito guardião da moeda era dirigido por um ex-banqueiro, Henrique Meirelles, e hoje o é por um homem da instituição e com uma diretoria de funcionários públicos comprometidos com a questão de Estado.

Mais evidências da "faxina"

A ofensiva da Dilma (com Graça Foster na presidência da Petrobras) para reduzir a influência política na empresa, também é apresentada - e visto externamente - como parte desse processo de "desconstrução" de certa herança lulista. Um processo que atinge também parte do PT mais ligado ao ex-presidente, especialmente sua vertente paulista. Dilma, avalia-se, continuará prestando todas as homenagens que Lula merece, como a participação direta nas homenagens que ele recebeu no Rio de Janeiro, das universidades públicas, na sexta-feira. Até com direito a choro presidencial. Mas o distanciamento do estilo Lula de governar será marcado cada vez mais.

Desconstruindo a oposição?

Sem alarde, mas com atitudes de gosto popular, tal qual a cruzada contra os bancos e a campanha dos juros baixos, a presidente está também tirando o fôlego da oposição. Seus líderes não têm nada a dizer - de bom e de concreto - sobre essas últimas ações da presidente. Nem propostas alternativas. Nem mesmo sobre as mudanças na caderneta de poupança, um risco político calculado que Dilma resolveu tomar, os oposicionistas sabem o que falar. Perplexos, sem discurso, parecem estar esperando algum Godot: um possível, eventual fracasso das medidas da presidente. Correm risco de completa inutilidade.

O PMDB desconstruído

O partido de Sarney, Temer, Jucá, Henrique Alves e Renan viu os movimentos para a convocação da CPI com um sorriso maroto e com aquele ar blasé de quem não tem nada com os fatos e estava esperando o circo incendiar-se para cobrar alto pelos serviços de bombeiro para controlar a crise que, ao gosto peemedebista, engolfaria a oposição e o PT e pelo menos parte de gente do governo, com Lula e Dilma. O PMDB de tantas batalhas inglórias sentia-se desta vez nas nuvens. Mandou até um segundo time para a CPI. Errou o cálculo quando na liça entrou o volúvel governador do Rio, Sérgio Cabral, amigo de fé e irmão camarada de Fernando Cavendish e da empreiteira Delta. Sérgio Cabral nunca foi da cozinha dos caciques peemedebistas, era mais lulista que tudo - e até ousou, em suprema audácia, insinuar-se para uma vice-presidência de Dilma em 2014. Mas o comando do PMDB, mesmo a contragosto, não pode jogar Cabral aos leões - respingaria no partido, cujo currículo nesse campo nunca foi dos melhores. O PMDB já mergulhou na CPI, agora não mais como um simples e isento observador. O momento de "vestal" ao modo Demóstenes Torres dos peemedebistas durou muito pouco.

A meta de Dilma

Sai definitivamente do ar a meta de inflação e entra a meta do PIB. Todas as decisões do governo só têm este objetivo: alavancar o crescimento da economia. E como o ritmo ainda está lento para o lado da indústria, com estoques elevados, não se descartam novas medidas de incentivo ao setor, independentemente da baixa dos juros.

Conselhos do Conselheiro

Do ex-ministro Delfim Neto em artigo no jornal "Valor Econômico":

"Devido à finitude dos fatores de produção internos e do limite do crédito para financiar as importações, não é permanentemente possível maximizar, ao mesmo tempo, o crescimento econômico e a inclusão social sem produzir ou um aumento da taxa de inflação, que anula e torna uma ilusão a inclusão social, ou um déficit em conta corrente não financiável, que acaba matando ao mesmo tempo o crescimento e a inclusão. O problema é físico e não ilidível por mágicas monetárias, fiscais ou cambiais".

Em tradução livre: não é possível fazer a economia crescer a tapas e pontapés.

A batalha dos juros

Enquanto os bancos oficiais, por "indução" da presidente, ampliam os cortes de suas linhas de crédito, os bancos privados, depois de reduzirem marginalmente suas taxas, parecem ter adotado um modelo "Gandhi" - resistência passiva para ver o que vai dar.

O credo presidencial

Da presidente Dilma no dia em que anunciou as alterações na poupança:

"Queremos um país com taxas de juros compatíveis com aquelas praticadas no mercado internacional. Queremos que o nosso câmbio não seja objeto de políticas [monetárias] expansionistas, que, de forma artificial, sobrevalorizem a moeda brasileira e tornem também de forma artificial os nossos produtos pouco competitivos. É a chamada amarra do câmbio. E queremos que o país tenha impostos mais baixos para segurar a produtividade dos seus produtos, dos seus processos de trabalho (grifo nosso)".

Para a primeira oração do credo, Dilma já botou toda a sua fé, ameaça e os bancos oficiais no ar. Para a segunda, está fazendo o que pode com o BC agindo para desvalorizar o real. Nas duas, porém, nem tudo depende dela. A terceira, porém, a dos impostos mais baixos, está totalmente no colo do governo e do Congresso. Por isso, a pergunta : quando, com a mesma vontade do ataque aos juros, ela vai botar o governo na linha dos impostos mais decentes. E como um todo e não apenas pontualmente, para alguns setores apenas ?

Manda quem pode...

... obedece quem tem juízo. O ministro das Minas e Energia, Edison Lobão, anunciou como iminente a demissão do diretor financeiro da Petrobras, Almir Barbassa, um dos poucos remanescentes da era José Sérgio Gabrielli na diretoria da empresa. Sem subterfúgios, Graça Foster desmentiu secamente a informação. E Lobão calou. Que a Petrobras não dá bola, a não ser formalmente, ao ministério das Minas e Energia não é novidade. Lobão sabe das decisões da empresa na última hora, quando elas são fato consumado - quando não sabe pela imprensa. No entanto, alguns atribuem o "escorregão" do ministro, agora, a um lance político calculado. Seria uma tentativa de embolar as mudanças que Graça Foster está fazendo na direção da empresa, criar algum constrangimento para ela e salvar a cabeça de dois protegidos do PMDB que também estão quase na porta da rua : o diretor internacional, Jorge Zeleda, e o presidente da Transpetro, Sérgio Machado. Inútil tentativa.

Fala quem pode

Estranha-se no universo político o silêncio dos mais midiáticos dos ministros da presidente Dilma : Aloizio Mercadante, da Educação, e Alexandre Padilha, da Saúde. Eles estão agora falando para dentro ou, como diz em Brasília, roucos de tanto calar. Outro cujo silêncio deixou de incomodar, falar agora somente sobre o que é pertinente a sua área, deixou de ter opiniões próprias sobre a política econômica, é o presidente do BNDES, Luciano Coutinho. São coisas que confirmam cada vez mais o temor que os auxiliares têm da presidente Dilma, de seus humores e de suas cobranças.

Poupança: só as cadernetas?

Não há analista sério, do ponto de vista econômico, estritamente técnico, que não tenha aplaudido a presidente Dilma no caso da alteração das cadernetas de poupança. Mas, há, pelo menos, três observações que são repetidas :

1. Alterou-se a remuneração, mas não se eliminou a indexação.

2. É preciso avançar na desindexação da economia brasileira, iniciada com o Plano Real e nunca completada. Outras amarras emperram mudanças mais profundas no sistema financeiro brasileiro.

3. O governo pegou a sua parte na história, pois a alteração na caderneta visa também garantir a manutenção dos clientes para os títulos da dívida pública. Quando ela vai dar uma contribuição maior, reduzindo mais velozmente essa dívida ?

4. Será preciso atacar agora também os juros do crédito imobiliário.

A poupança e a política

Em princípio, Dilma não enfrentará resistências políticas no Congresso no caso das cadernetas. Mas tudo vai depender de como a população reagirá, se ela vai entender as mudanças, com regras mais complexas, e aceitá-las. O governo tem agora pela frente uma batalha da comunicação e vai precisar da ajuda dos bancos particulares. Por precaução, Dilma não saiu para defender a medida. Para atacar os bancos, aproveitou todas as oportunidades possíveis. Nas cadernetas, deixou a exposição mais para Mantega e o BC.

Os efeitos da política de juros

Em que pese os acertos que o governo tem conseguido na política de juros e de câmbio, não há que se esperar uma taxa de crescimento robusta para este ano. Além dos efeitos nefastos da crise internacional, tem-se de considerar que o emprego se estabilizou, que a renda disponível dos assalariados está comprometida com empréstimos do passado e a confiança do consumidor e do investidor está mais baixa relativamente a fase de prosperidade do período entra 2009 e 2011. Talvez tenha chegado o momento do governo fazer um "choque de gestão" no PAC de forma a dar uma injeção de ânimo no setor privado.

(por Francisco Petros e José Marcio Mendonça)

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