terça-feira, 5 de abril de 2011

POLÍTICA & ECONOMIA NA REAL


Estaria o BC certo? (I)

Muito se comenta sobre a possibilidade de um aumento da inflação sem que haja, do lado do governo, reação efetiva para conter este processo. Um governo nunca deve ceder aos interesses do tal do "mercado" quando estes não atendem aos interesses públicos. Veja-se, a título de ilustração, a negligência generalizada dos BCs ao redor do mundo relativamente à especulação com títulos oriundos do setor imobiliário durante mais de 15 anos até a eclosão da crise de 2008. Com boa fé, alguém poderia perguntar, no caso atual do Brasil, se o BC não estaria certo em não aumentar os juros apenas para atender ao tal do mercado? Afinal, os juros básicos no Brasil são muito elevados. Para que mais?

Estaria o BC certo? (II)

Para responder a nota acima, é preciso analisar todo o contexto, o qual pode ser resumido em algumas perguntas capitais: (i) temos um regime fiscal sustentável a longo prazo?; (ii) as medidas "macroprudenciais" em relação ao crédito (contenção) e ao ingresso de capitais externos (taxação e controles) estão funcionando para conter o avanço dos preços?; (iii) há de fato uma inflação de demanda que facilita o "espalhamento" dos preços pela economia como um todo?; (iv) o BC é considerado confiável pelos agentes? Nas questões anteriores, não há nenhuma premissa de hierarquia. Vamos às nossas sucintas respostas: (i) não há um regime fiscal sustentável no Brasil a longo prazo por duas razões básicas: a primeira é que a expansão das despesas do setor público tem sido elevada e rápida e o ritmo dos investimentos (poupança) é capenga; (ii) ainda é cedo para se afirmar se a contenção do crédito vai ser suficiente para afetar a demanda, mas a queda do dólar evidencia que, apesar das medidas implementadas para conter a entrada de moeda estrangeira, somente mais medidas de controle de capitais evitará a expansão do crédito doméstico; (iii) a demanda persiste forte o que facilita a expansão da inflação por toda a economia. Se o real cair (dólar para cima), este processo será ainda mais acentuado; (iv) não se trata de afirmar "que falta credibilidade ao BC". A questão vai além: foi o próprio governo que estimulou os agentes a pensarem que a política monetária passou a ser decidida na Fazenda e não mais no BC. A imagem de Alexandre Tombini foi "construída" como sendo mais "palatável" à área econômica do governo. Logo, o mercado resolve "testar" a independência operacional do BC.

Concluindo (III)

Se o governo quiser recuperar credibilidade, terá de ser mais enérgico: seja para aumentar os juros básicos e não deixar dúvidas de que não permitirá o aumento da inflação e/ou terá de apertar bem mais o crédito, inclusive com medidas de controle da entrada de dólares. Há quem já tenha perdido os cabelos ao analisar esta questão... Apenas para lembrar... A aplicação da austeridade fiscal continua em xeque: nos três primeiros meses do ano, os gastos do governo Federal com custeio e juros foi R$ 13 bi maiores do que o mesmo período do ano passado enquanto os investimentos foram menores em R$ 300 mi, segundo o portal Contas Abertas; as pressões políticas, do Congresso, dos prefeitos e até dos governadores para afrouxar a "conciliação" está num nível tal que já levou até a própria presidente Dilma a prometer rever a anulação dos restos a pagar de 2007, 2008 e 2009. O consolo é que a arrecadação de impostos está em alta.

Uma reforma sem consenso

O Congresso continua prometendo que agora fará a sempre encantada reforma tributária, embora até agora não tenha dado nenhum passo em direção nenhuma. Dilma Rousseff, bem consciente das dificuldades de mexer em tal ninho de abelhas, fala em reforma fatiada - ou pontual. Coisas como redução da contribuição social das empresas, providência para acabar com a guerra fiscal entre os Estados nos portos... A Fiesp acaba de apresentar um sugestão de correções na cobrança do ICMS que pode facilitar muito a vida das empresas. É um conjunto de idéias positivas. Mas segundo lembra o professor da EAESP da FGV em São Paulo e advogado especialista em tributos, Fernando Zilveti, antes será necessário aparar arestas políticas e os interesses legítimos que tarefa de tal magnitude envolvem. Um exemplo das dificuldades está na recente decisão de 18 Estados do Norte, Nordeste e Centro-Oeste de passarem a dividir a cobrança do ICMS nas compras feitas pela internet. A cobrança atualmente é feita toda ela pelos governos estaduais onde se localizam as empresas vendedoras. Estados como São Paulo, Rio de Janeiro e Minas Gerias não assinaram o convênio. E podem recorrer à Justiça.

No ritmo de Maria Fumaça

A licitação do trem bala descarrilou mais uma vez. Como está não está "atraente" para os interessados, mesmo com as concessões via BNDES, entrada de estatais e dos onipresentes fundos de pensão. O governo parou para pensar em novas atrações para os possíveis concorrentes, novas concessões. Devia se mirar no caso Bertin. O grupo foi "incentivado" a entrar no setor hidrelétrico. Não teve até agora de Brasília socorro para substituir o "socorrido".

Mensalão: a fantasia e o real

A divulgação pela revista "Época" do inquérito da PF sobre o mensalão Federal (ou do PT), confirmando a existência do grande negócio político-eleitoral do primeiro mandato do presidente Lula, derruba algumas fantasias em circulação - a de que o tal não existiu, a de que foram apenas recursos "não contabilizados" de campanha - e a tentativa de reabilitação de alguns dos réus do processo. A defesa dos acusados ficou mais difícil e mais e mais valerão as manobras protelatórias. Em um caso elas podem ser bem sucedidas: em agosto, a acusação de formação de quadrilha prescreve, se o STF não apressar o julgamento das ações. Será um duro golpe para a imagem do Supremo se de fato ocorrer a prescrição. Pode-se até entender que os mensaleiros fiquem livre das acusações, porque os ministros os consideraram inocentes, etc. Mas se eles ficarem livres porque a Justiça foi lenta é inimaginável, inadmissível. Em tempo: a atuação no processo do mensalão será o grande teste de "qualidade" dos dois mais recentes ministros da Corte Suprema: José Antonio Tofolli e Luiz Fux.

Relações estremecidas

Não convidem para a mesma mesa de conciliação alguns setores do Judiciário e o Legislativo. Há queixas quase insanáveis. O Judiciário considera insuportável a demora do Congresso de definir os aumentos salariais do setor. Os juízes Federais prometem até uma greve no fim do mês. Deputados e senadores consideram insuportável a "interferência" da Justiça, principalmente a eleitoral, em assuntos que eles consideram de sua exclusiva competência. Há até movimentos, muito bem apadrinhados, para conter a ação do Judiciário. A questão da fidelidade partidária ainda não foi ruminada totalmente.

Relações delicadas

É maior do que se admite a insatisfação do PMDB com o tratamento recebido pelo partido da presidente Dilma. Diz-se: é tudo para o PT. O vice-presidente Michel Temer recebe atenção, pompa e circunstância, mas sua influência, a não ser em questões jurídicas, é relativa. As "adoradas" e esperadas nomeações só saem a fórceps. Vê-se em manobras como o nascimento do PSD uma tentativa de enfraquecer o partido de Sarney e cia. na aliança governista. Até a turma peemedebista do Senado, sempre mais atendida, está infeliz. Contabiliza-se até a falta de atenção aos ministros da legenda. Segundo levantamento de "O Globo", dos seis ministros que ainda não foram recebidos uma única vez pela presidente, quatro são do PMDB. Entre eles o ministro de uma pasta estratégica - Wagner Rossi, da Agricultura.

Relações delicadíssimas

Os tucanos armaram seu primeiro divã sábado em Minas Gerais para buscar seus novos rumos, numa reunião que contou com seus oito vistosos governadores. E decidiu não decidir nada: estuda a formação de um conselho superior, provavelmente a ser comandado pelo ex-presidente FHC, para encontrar um rumo para a legenda. No vai da valsa que o PSDB costuma dançar é de se perguntar se terão algum sentido até as eleições de 2012 - ou até de 2014. Enquanto a "comunidade" não se decide, as figuras mais emplumadas vão se definindo. Aécio Neves surpreendeu com um contundente discurso de crítica do governo Dilma, depois de ter passado toda a campanha eleitoral e os primeiros 100 dias da presidente bem ao seu estilo "mineiro". E José Serra, como não quer nada, vai criando possíveis rotas de fuga. O PSD de seu fiel parceiro Gilberto Kassab vai nascendo para a irritação tucana, menos a dele. Seu vice na disputa com Dilma já foi para a nova legenda. Até Dilma, segundo indiscretas revelações de uma conversa reservada dela com o presidente de Portugal Cavaco Silva, sente falta de uma oposição, para deixá-la menos vulnerável ao apetite de insaciáveis parceiros. Só a oposição, parece, não sentir falta de uma oposição no país.

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A coluna Política & Economia NA REAL é assinada por José Marcio Mendonça e Francisco Petros.

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