terça-feira, 9 de agosto de 2011

POLÍTICA & ECONOMIA NA REAL

Os olhos, de novo, voltarão à Europa

Os EUA tiveram sua rodada de más notícias completadas, nesta fase, nas últimas duas semanas. Agora, o mundo vai observar como os europeus, desorganizados e desunidos, tratarão suas mazelas. Há considerável possibilidade de que as recentes lições sirvam de exemplo e, assim, Espanha e Itália possam sair da linha de tiro dos investidores internacionais. Ficará claro, a partir de agora, o vergonhoso papel que os europeus exerceram sobre a crise grega, sobretudo a Alemanha, sabedora dos impactos que iria gerar. Será preciso controlar os riscos de crédito para depois, quem sabe, tratar da tragédia que recai sobre o setor produtivo das economias. A chance para a União Européia é aprofundar a integração. O problema é como fazer isto quando eles não falam a mesma língua, literalmente.

A China é um grande risco

Não nos iludamos. A acusação chinesa de que a América é muito endividada procede. É o "óbvio ululante". Será a democracia a resolver esta realidade, na base do voto e do suor da grande nação do ocidente. Do lado chinês a coisa é bem pior: o país vive do dumping social, da ausência de condições de trabalho de grande parte de sua massa trabalhadora, da falta de liberdade política e social e das práticas comerciais que levam ao barateamento de sua produção. Os chineses nem sequer ajustaram sua taxa de câmbio para evitar o aguçamento da crise estrutural por qual passa o globo. Agora, ficará evidente que a China vive do abuso de consumo dos norte-americanos que se endividam com terceiros para comprar e comprar. Deste modelo, pacificamente participam os chineses. Os efeitos da desaceleração econômica recairão sobre a China e por lá não há democracia para estabilizar o sistema econômico. Vale a política da repressão. Este risco ainda não surgiu no horizonte, mas há de nascer como um poente para os preços inflacionados, incluindo as nossas commodities.

Brasil, chance estratégica pode ser perdida

O Brasil tem a oportunidade histórica de se sair melhor após esta crise. Sua situação fiscal não é deplorável como os países centrais, e sua posição externa é bem mais estável. É certo que a atividade econômica sofrerá os efeitos da queda de preços no exterior, sobretudo das matérias-primas que vende para que os outros as industrializem. Todavia, o país nos próximos dez anos deveria aumentar o grau de conteúdo tecnológico na produção industrial e reformar sua infraestrutura, além de cumprir a "velha" agenda relacionada com a educação, saúde e previdência. Bem, o que se vê é um Estado ainda despreparado para cumprir esta tarefa estratégica e, do ponto de vista conjuntural, câmbio completamente fora de lugar e, ao seu lado, os maiores juros da face da Terra. A corrupção e os desmandos na área política também compõem este misto de rara oportunidade estratégica e absoluta falta de autoestima com suas próprias possibilidades.

Efeitos sobre o mercado ainda incipientes

Não podemos ignorar o fato de que a crise externa ainda não contaminou nossa economia. Estamos ainda na fase primeira deste processo. Ou seja, ninguém deveria acreditar que a queda recente da bolsa de valores local e os efeitos já ocorridos no campo dos juros já passaram. Nada disso. O ciclo negativo se iniciou há cerca de três meses, conforme alertamos aqui neste espaço, e deve se propagar mais nos próximos meses. Não nos arriscamos a prever uma espiral negativa profunda, mesmo que esta possa ser provável. Que a trajetória é claramente negativa, não resta dúvida. Portanto, reforçamos nossa mensagem de prudência para os investidores e para o setor real. É preciso não sucumbir ao dia a dia do noticiário, sob pena de se adotar o comportamento esquizofrênico que o "tal do mercado" assume em momentos como o que estamos passando.

Sem nos precipitarmos...

Podemos dizer neste momento que a recessão que deverá vir pela frente na economia mundial tem tudo para ser mais profunda e mais longa que a de 2008. O sistema financeiro mundial está em frangalhos, as políticas keynesianas já foram implementadas e provocaram enormes crises fiscais e os investidores (da economia real e do mundo financeiro) estão mais céticos. Estas são das poucas (e relevantes) razões para evidenciar o difícil período que virá. O que falta mais? A política, os políticos e suas estruturas não estão preparados para liderar um New Deal que possa engendrar a solução dos problemas estruturais da crise atual. Infelizmente, Obama não é Roosevelt e o Congresso dos EUA já deu provas que virou suas costas para as novas gerações e mira nas próximas eleições. Na Europa, os alemães, mais uma vez, provam que em matéria de assuntos continentais seu papel é deplorável. Por fim, temos a China e sua ditadura, pronta a dar lições para o mundo, sem que isso seja exemplo crível para ninguém.

Dilemas econômicos

A turbulência econômica no mundo, que ninguém sabe onde vai parar nem quanto vai durar, parece ter embaralhado de vez a cabeça econômica do governo Dilma. Há pessoas internas que acham que o governo terá de aprofundar o ajuste fiscal e elevar mais os juros para se prevenir da "marolinha" que está no ar. Há outros, que pensam o contrário : terá de reduzir juros, ampliar gastos oficiais, afrouxar o controle de crédito, mesmo receituário adotado com sucesso em 2008. Certo, ao que se sabe, é a ordem da presidente : não se sacrifica o crescimento. Não se pode também deixar a inflação desgarrar, e a renda e o emprego caírem. Como as principais variáveis da crise não estão em águas territoriais brasileiras, o como e quando agir é o grande dilema da turma do ministro Mantega. Mas justiça se faça : a dúvida é do planeta e quem diz que sabe o que vai acontecer, seguramente está muito mal informado.

Cuidado com o chamado rally de alta

É muito comum os investidores olharem as cotações de hoje e repararem que estas estavam bem mais altas há poucas semanas. A tentação de comprar ativos é grande... Todavia, os movimentos de recuperação, embora muitas vezes vigorosos, são um caminho que muitas vezes obscurece a verdade dos fundamentos. Neste sentido, movimentos de alta no curto prazo devem ser oportunidades de venda e não de compra. Isto exige enorme disciplina. Assim.

PMDB: geléia real ou mel diluído?

Jactam-se os peemedebistas, pelo menos para o consumo externo, de que agora, com Dilma, o PMDB é um partido no poder, e não apenas um aliado de segunda categoria. Verdade? Não é o que parece, haja vista:

1. O vice-presidente Michel Temer, o símbolo desse novo "poder", não participa das decisões cruciais, é comunicado a posteriori.

2. O Conselho Político, no qual o partido adquiriu assento, faz reuniões formais. O que importa é definido por Dilma, solitariamente, ou em pequenas audiências nas quais o PMDB não tem presença.

3. Num dos ministérios ditos do partido, o da Defesa, Nelson Jobim entrou e saiu sem consultas partidárias. E agora ainda voou em direção a um neopetista.

4. Outro ministro peemedebista, Pedro Novais, do Turismo, é ex-ministro desde a posse, só o PMDB e ele mesmo não se deram conta disso.

5. Moreira Franco, amigo do peito do vice-presidente Temer, ocupa uma pasta que se desaparecer ninguém notará, nem a presidente Dilma.

6. Wagner Rossi, da Agricultura, entrou na linha de tiro dos aliados. Se sobreviver, será de muletas. Se o PMDB ficar com o Ministério, será sob atenta observação palaciana.

7. Edison Lobão no ministério das Minas e Energia é ministro de meio expediente, não toma nem cafezinho sem ser monitorado pela própria Dilma ou por um dos auxiliares que ela lá pôs.

8. Da lista de mais de 40 nomes que o PMDB apresentou para cargos representativos no segundo escalão, lista que começou nas mãos de Palocci e passou para as "fraquinhas" de Ideli Salvatti, nenhum ainda frequentou o "DOU".

O PMDB pensa que é geleia real. Está mais para mel aguado.

Coisas de amigos

Não há a menor dúvida: a saraivada de denúncias (caso Jobim é negócio separado) que há mais de três meses mantém o governo Dilma em constante ebulição, tem de fato origem nas próprias forças governistas. A maior parte dos dedos aponta para o PT, mesmo no caso Palocci. Por isso, avalia-se no Congresso que a qualquer momento pode surgir um torpedo em direção a um petista, como troco. Quando surgir, vai bater em poucos dias numa CPI no Senado, com folgas de assinaturas.

Um peso, duas medidas?

Está o mundo de olho na forma como a presidente Dilma vai se comportar nas denúncias envolvendo o ministério da Agricultura e a Conab, já apelidada de "o DNIT do PMDB". Vai ficar apenas na demissão do Jucazinho e do secretário executivo do ministério, ou vai acionar também sua máquina da faxina, sem olhar a quem? Se o tratamento for distinto do dado ao PR no ministério dos Transportes, sem justificativas plausíveis, vai ficar explícita a dependência do governo ao PMDB.

Militares e diplomatas

Em princípio, parece uma temeridade a escolha de Celso Amorim para o ministério da Defesa. Um não tem nada a ver com o outro. A experiência dos militares com o diplomata José Viegas, extraordinário profissional, foi desastrosa. Mas Amorim tem o espírito maleável e isso pode ajudar. Mas ele terá de ter um trunfo na manga - quem sabe a recomposição das verbas orçamentárias que Nelson Jobim estava renegociando - para começar a conversar. A escolha de Amorim denota outra coisa: a falta de opções no quadro político oficial de quadros para os postos mais delicados.

Equívocos do marketing

Os marqueteiros palacianos armaram os palanques para fazer do "Programa Brasil sem Miséria" uma plataforma positiva para a presidente Dilma. Gorou por causa do episódio Palocci e também porque o programa é genérico demais. Em seguida, preparam o lançamento do Brasil Maior com o mesmo objetivo. O plano também está gorando, em parte por causa das crises Jobim/Conab, mas também porque o programa foi considerado, no mínimo, fraco pelos analistas e empresários, com raras exceções. Boas embalagens não são suficientes na maioria das vezes. O conteúdo é essencial.

Um banco privilegiado

O "Brasil Maior" vai jogar mais recursos do Tesouro nos cofres do BNDES, para aplicações subsidiadas, às custas dos contribuintes. Os ministros econômicos haviam avisado que esta fonte para o banco estatal havia se esgotado, mas o pacote de Dilma mudou os conceitos de Mantega e cia. O que reforça um movimento da oposição para criar no Senado uma CPI sobre o assunto. Dizem os oposicionistas que já têm 22 assinaturas para ela, das 27 mínimas necessárias. Pode ser por aí o susto que muitos governistas querem dar no Planalto.

Nada de marolas

Com tanta confusão, a orientação oficial é evitar a todo custo pôr em votação qualquer projeto mais polêmico na Câmara e no Senado. A tarefa é facilitada pelas MPs que trancam as pautas das duas casas e porque Marco Maia e José Sarney, responsáveis pela agenda de votação, não são de contestações. Sarney não botará em votação, se não houver acerto com o Planalto, nem o projeto de autoria dele mesmo modificando as regras de tramitação das MPs.

Mas o boicote não pode durar muito

O governo sabe, porém, que não pode segurar o Congresso em "banho-maria" por muito tempo. Até porque tem coisas vitais de seu interesse para votar e que demanda negociação. É o caso da prorrogação da Desvinculação das Receitas da União, a ser extinta no fim do ano. O mecanismo permite o governo gastar como quiser 20% das receitas obrigatoriamente destinadas a áreas como saúde, educação. Sem ela, a administração do Orçamento, extremamente engessado, torna-se complicada. Ela nasceu ainda no governo FHC, com o nome de Fundo Social de Emergência.

Tesouro reforçado

A propósito de um ajuste conjuntural aqui, um ataque a um problema surgido na economia acolá, o governo vai reforçando discretamente seu caixa. Nos últimos meses, anotem, foram elevadas as alíquota do IPI das bebidas, o imposto dos cigarros, o IOF nos cartões de crédito, nos derivativos cambiais, nos financiamentos habitacionais, no crédito ao consumo, sobre ingressos de capital externo e, por fim, a alíquota da Cofins e do PIS sobre alguns produtos importados. De grão em grão, o Tesouro vai enchendo o papo.


(Por Francisco Petros e José Marcio Mendonça)

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