terça-feira, 4 de outubro de 2011

APRESENTAÇÃO DO “JITIRANAS DE LUZ” EM BSB

Esta noite está plena de significação simbólica. Ou melhor, como cantou o poeta, salpicaram de estrelas o nosso chão. É um desses raros momentos em que nos entregamos ao relax do espírito para a prática do exercício da dilatação da fraternidade.

Estamos no espaço de uma Loja Maçônica. Somos – a grande maioria – oriundos de uma urbe do interior do Ceará que este ano celebra o Centenário e aqui vimos prestigiar um amigo-irmão que mais uma vez nos brinda com uma primorosa peça de arquitetura literária. Este ambiente está, pois, incensado com o perfume original da terra, o bálsamo da natureza, o orvalho que emerge das raízes.

Primeiro porque Maçonaria é História, caminhada épica, trajetória heróica. Sua inspiração é milenar. Sua origem se perde no boqueirão dos séculos seculorum. Porém é nova, embora seja antiga (novae sed antiqva). Sua doutrina é atualíssima. É uma instituição iniciática, progressista e evolucionista. Uma de suas bússolas é a tríade que motivou a Revolução Francesa: l'égalité, la fraternité et la libertee. Tríade que responde aos maiores desafios da humanidade. l'égalité – Igualdade – que se resume àquela lição básica dos nossos antepassados: trate os outros com respeito, de igual para igual ou da forma como gostaria de ser tratado. Os eruditos chamam isso de ética. La Fraternité – fraternidade – diz respeito a gentileza, que rima com beleza. Belo, fino, elegante não é quem veste roupa de grife ou freqüenta ambientes suntuosos. Elegante é quem trata os outros com fineza, distribui gestos de bondade e profere palavras amáveis. Essa é a verdadeira estética. A estética da alma. La libertee – Liberdade – tem a ver com a postura dos profetas bíblicos, que eram também poetas. Denunciavam a escuridão das injustiças e das guerras e anunciavam a alvorada da justiça e da paz. Cantavam, como Isaias, que o lobo e o cordeiro pastariam juntos em uma terra onde escorria leite e mel. Portanto, ser ético, estético e profético – os maiores e mais eficazes antídotos para as provações contemporâneas – são legados dos mais operosos obreiros da Maçonaria e também dos amantes da poesia.

E amantes da poesia Crateús teve muitos. Destaque-se um iluminado como José Coriolano. Quando pequeno via seu busto na Praça da Matriz de Crateús e ficava me interrogando de quem se tratava. Depois descobri tratar-se de um dos maiores gênios da poesia no século XIX. Nascido na fazenda Graça, teve a graça de alcançar os píncaros da glória. Magistrado, poeta, político, jornalista. Foi deputado provincial pelo Piauí, por duas legislaturas, e presidente da Assembléia Legislativa. Participou ativamente da imprensa no Recife e Teresina. Foi eleito Príncipe dos Poetas Piauienses (pois à época em que viveu Crateús pertencia ao Piauí).

Outro foi meu parente Lucas Boquady, nascido Alexandre Ferreira Barros. Lucas era um homem culto, teve formação jurídica, era um grande orador e político atuante. Poeta e caricaturista, era crítico ferrenho das mazelas do seu tempo e um jornalista combativo. Em 1928, com Manoel Bezerra Cavalcante, fundou o jornal Rio Poti, o primeiro periódico de Crateús. Eram famosas suas contribuições para os jornais periódicos de Crateús, mesmo residindo nos longínquos estados de Goiás e Mato Grosso. Adotou o sobrenome Boquady, palavra que ele havia conhecido em um dicionário tupi-guarani, que significa jatobá – "folha dura" ou "árvore de fruto duro".

Muitos outros tivemos que rivalizaram com esses em brilho e talento, genialidade e fulgor. E hoje estamos aqui reunidos para festejar aquele que atualmente é o mais legítimo e autentico agrimensor desse território lúdico, inventariante dessa argila de sonho, herdeiro necessário desse espólio abençoado: Dideus Sales. Este ano, que a chuva generosa transformou no ano das jitiranas, Dideus saiu como um pastor de ovelhas selecionando as melhores, as mais brilhantes, as mais finas e delicadas para nos presentear em forma de livro.

Trata-se do seu mais esmerado álbum, costurado com os hoje raros fios de algodão branco e alisado com cera de carnaúba. Sintam o olor do mufumbo, a sombra das nossas ontológicas oiticicas, a melodia dos riachos, a generosidade dos alpendres, o vigor de uma terra mágica que, ao simples toque dos fios delicados das primeiras chuvas, transmuta a desértica paisagem e faz rebentar a fartura e a alegria.

São essas flores de indescritível beleza que o Dideus nos entrega. Chamam-se Jitiranas de Luz!


(Palavras proferidas por Júnior Bonfim na Loja Maçônica Filhos de Salomão, em Brasília, por ocasião do lançamento do livro Jitiranas de Luz, de Dideus Sales, no dia 16.09.2011)

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