terça-feira, 16 de abril de 2013

SOBRE O LIVRO “LUIZ GONZAGA – MUITO ALÉM DE UM SANFONEIRO”



Dizem que o primeiro filósofo da política do mundo moderno, Nicolau Maquiavel, cumpria um rigoroso ritual antes de se entregar às tarefas da escrita de O Príncipe. Costumava, após o banho, substituir as roupas do dia a dia por vestimentas de nobres, a fim de receber inspiração superior. Lembrava que uma das veredas do sucesso era mirar o exemplo dos grandes vultos da História.

Quisera eu nesta noite memorável, energizada pela fraterna amizade, perfumada pelas essências do afeto, em que um grupo de amigos se reúne para reverenciar um grande vulto da história recente da cultura popular da nossa Pátria; quisera eu possuir a fortuna da eloquência para pronunciar aqui a oração que a ocasião reclama. Como não fui dadivado com o vigor oracular, procurarei compensar essa deficiência com a precisão da síntese.

Permitam-me compartilhar três breves pontos.

O primeiro é que este livro é a homenagem de um fidalgo da literatura popular ao monarca da música do povão, o Rei do Baião. Dideus Sales, um poeta popular universal e completo, aqui restou insuperável porque aureolado pela radiosa colaboração de Audífax Rios. Disse ontem que Dideus é uma espécie rara, um ser híbrido que nos mimoseia com a genialidade de um versejador nato e, ao mesmo tempo, de um estimulador do talento alheio. É uma fonte original da mais autêntica poesia popular e, também, uma casa de apoio e incentivo para a germinação lúdica de outros artistas. Mensalmente, escolhe o portal de uma cidade cearense para inserir estrofes que enobrecem a alma humana. Vez por outra, promove um festival de cantadores e violeiros para semear alegria e esperança nos corações amargurados pela aridez existencial. Constantemente cunha um livro melhor que o anterior. E permanece em sintonia perene com as aves e as árvores da nossa surpreendente geografia para cantar o amor e a amizade, o instrumental da festa do viver. Parabéns, poeta!

O segundo parágrafo é que às vezes fico perscrutando qual a razão que leva algumas pessoas a alcançarem os píncaros da reverência dos seus concidadãos, aquilo que os latinos chamavam de aura popularis. E sempre deságuo na conclusão de que, neste caso, inexiste motivo racional. A glória não é produto da racionalidade, mas da gratuidade. Gratuidade de uma força superior, que soprou o verbo e o fez carne, alimento para a nossa alma. Como explicar um fenômeno como Francisco, o nosso Papa atual? Francisco, sem contratar qualquer empresa de marketing e/ou publicidade, em menos de 24 horas se tornou uma marca poderosa. Como lembra Nizan Guanaes, “Francisco quer dizer coma moderadamente num mundo obeso. Francisco quer dizer beba com alegria num mundo que enfia a cara no poste. Francisco quer dizer consumo responsável em sociedades de governos e consumidores endividados. Francisco quer dizer o uso responsável do irmão ar, do irmão mar, do irmão vento e de todas as riquezas debaixo do irmão Sol e da irmã Lua”.

Ao dizer que a glória é gratuidade, ouso lembrar que a consequência da gratuidade há que ser sempre a gratidão. Alguém que foi agraciado com o celeiro da criatividade deve lembrar que tem uma missão exponencial. Como bem leciona a música, “se um dom especial é dado para alguém, é pra ajudar o bem na luta contra o mal”. Esta a grande, a única, a excelsa tarefa dos escritores em todos os tempos: insuflar o bem, sufocar o mal.

A última palavra. Há duzentos e dez anos o poeta alemão Frederico Hölderlin, premido pela saudade de uma temporada no sul da França – ainda sob os eflúvios do protagonismo da Revolução Francesa - lapidava seu belo poema A Lembrança, cujo último verso consigna que “o que permanece é aquilo que é fundado pelos poetas”.

A poesia de Dideus, a gravura de Audífax, a música de Luiz Gonzaga são alicerces civilizacionais. Suas obras cantam a mais surpreendente, a mais envolvente, a mais sofrida, a mais valente, a mais valorosa região desta Pátria: o Nordeste Brasileiro, em especial o nosso mágico Sertão.

Honra e louvor a esses visionários fundadores!

(Júnior Bonfim, no Flórida Bar, em Fortaleza, Ceará, na noite de 04 de abril de 2013, publicado na edição de hoje do Jornal Gazeta do Centro Oeste, Crateús, Ceará)

Um comentário:

Anônimo disse...

Postado no Site do "Claudio Humberto" Hoje:

Surrando o vernáculo

Contam no Ceará que o prefeito de Crateús, Raimundo Rezende, certa vez denunciava num comício o temperamento violento de um adversário:
- ...e o Raimundo Bezerra, então, deu um tapa neu!
- “Em mim”, prefeito – corrigiu um assessor, ao seu ouvido.
Rezende apontou para o assessor e gritou:
- Bateu nesse também!

Remetente: José de melo Neto
(Zéneto)