terça-feira, 2 de julho de 2013

OBSERVATÓRIO

Principio com uma fábula. Um abastado negociante de óleos e arroz vivia numa imponente mansão. A sua posição social e a sua mansão só não eram perfeitas porque, à direita e à esquerda da propriedade, havia, há algum tempo, dois ferreiros que trabalhavam ininterruptamente, tinindo e retinindo malhos, bigornas e ferraduras. Incomodado, o negociante resolveu chamar os dois ferreiros, e ofereceu a eles 1000 iens de compensação, para que ambos se mudassem com suas ferrarias. Os dois ferreiros acharam tentadora a proposta (um ien, na época, valia mil euros) e prometeram pensar no assunto com todo empenho. E pensaram. Foi tanto o empenho que, apenas dois dias depois, prevenidamente acompanhados de advogados, compareceram juntos diante do proponente. E assinaram contrato, cada um prometendo se mudar para outro lugar dentro de 24 horas. O rico comerciante pagou imediatamente os 1000 iens (que a essa altura já eram 10.000) prometidos a cada um e foi dormir feliz, envolvido em lençóis de seda e adorável silêncio. Mas no dia seguinte acordou sobressaltado, os ouvidos estourando com o mesmo barulho de sempre. E, quando ia reclamar violenta e legalmente contra a quebra de contrato, verificou que não tinha o que reclamar. Os dois ferreiros tinham cumprido fielmente o que haviam prometido. Ambos tinham se mudado. O ferreiro da direita tinha se mudado pra esquerda e o da esquerda tinha se mudado pra direita...

AS MANIFESTAÇÕES

Como na fábula acima, firmou-se um entendimento de que tradicionalmente, no Brasil, as coisas mudam de lugar para permanecerem do mesmo jeito. É óbvio que há um pouco de exagero nessa assertiva. As caudalosas ondas de ebulição popular que ganharam corpo no país inteiro ultimamente trouxeram à praia da nossa consciência éditos de transformação. A avalanche das ruas, produto de um desordenado, porém crescente movimento nos trouxe a clara certeza que era ilusória a zona de conforto antes imaginada. O progresso das políticas sociais implementadas nos últimos anos suscitou a vã conclusão de que o país das bolsas estava com o bolso cheio de felicidade. Era a aparência, mas não a essência da realidade.

AS MANIFESTAÇÕES II

A verdade é que havia um latente sentimento de inconformismo que estourou nos últimos dias. Alguns recados, de tão nítidos, são inquestionáveis. 1. A mobilização das massas deixou de ser prerrogativa das lideranças, políticas ou sindicais. Anônimos, de posse de um aparelho conectado à internet e uma mensagem convincente, podem levar multidões às ruas. 2. Há uma repulsa ao autoritarismo. Um governo, mesmo lastreado em popularidade (como era o caso da Presidenta Dilma), não pode se achar no direito de vomitar arrogância. O respeito e o apoio populares não suprimem a necessidade do diálogo constante. 3. O povo cansou do riso vitorioso das velhas raposas da política tradicional. A política, enquanto arte da esperteza e do malabarismo ardiloso, recebeu um cartão vermelho. Por isso o slogan “o povo unido sem partido”; por isso foi hasteada a bandeira da candidatura avulsa. O modelo de escolha dos nossos representantes está ultrapassado, em especial o formato de financiamento das campanhas eleitorais. 4. O dínamo da História é inexorável. A obtenção de conquistas gera o desejo de aquisição de outras melhorias, algumas dantes nunca imaginadas. Há um impulso permanente para se subir novos degraus na escada da vida. Quem representa o povo não pode desconsiderar isso. 5. Enganou-se quem imaginou ser esse um movimento pontual. Ele é mais amplo do que se pressupõe. Um dos antes anônimos que se sobressaiu nessa luta concedeu entrevista à Revista Veja desta semana argumentando que a sua luta não é por centavos, mas pelo aprofundamento da democracia, por um País melhor. 6. A Pátria parece passar por uma espécie de catarse, processo de purgação. Segundo Aristóteles, a catarse refere-se à purificação das almas por meio de uma descarga emocional provocada por um drama. 7. Valores como a transparência, a decência, o diálogo, a humildade, o respeito e o cuidado são valores que iluminam a montanha sagrada da essencialidade permanente. O desassossego civilizacional que experimentamos parece sinalizar que o caminho é a retomada desses princípios de vida. Isso, porém, é um movimento que deve começar dentro de cada um de nós. Não basta transferir culpas. Temos que assumir primeiro as nossas responsabilidades cidadãs, dando o exemplo. 8. É indiscutível que essa escalada mudancista, em grau de intensidade que ainda não podemos aferir, terá reflexos nos embates políticos municipais. Quem sobreviver, verá!

SANTA INÊS

Os que serviram à Escola de Primeiro Grau Santa Inês (1966-2004) na condição de dirigentes, professores, funcionários e alunos promoveram um animado reencontro no dia 08 de junho de 2013. A homenageada principal foi a primeira diretora da escola, professora Maria do Carmo de Sousa Lima, que surpreendeu os ex-colegas de trabalho distribuindo para cada um presentes que ela mesma confeccionou. Na ocasião li uma crônica.

PARA REFLETIR

“A utopia está lá no horizonte. Me aproximo dois passos e ela se afasta dois passos. Caminho dez passos e o horizonte corre dez passos. Por mais que eu caminhe, jamais alcançarei. Para que serve a utopia? Serve para isto: para que eu não deixe de caminhar.” (Fernando Birri, cineasta argentino)

(Júnior Bonfim, na edição de hoje do Jornal Gazeta do Centro Oeste, Crateús, Ceará)




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