segunda-feira, 29 de agosto de 2011

50 ANOS DE MISTÉRIO


Esmerino Arruda esteve no centro dos acontecimentos que antecederam a renúncia de Jânio Quadros, em 1961. Ele garante: se a carta tivesse passado por suas mãos mudaria a história, rasgando-a.

Era madrugada de 25 de agosto de 1961, exatos 50 anos atrás. Deputado federal pelo Ceará, Esmerino Arruda tomava uísque na casa do então ministro da Justiça, Pedroso Horta. Saiu de lá às 4 horas e seguiu para descansar no Palace Hotel. Nem imaginava as surpresas que o dia lhe reservava. Chegou às 11 horas à Câmara Federal, quando o deputado Abelardo Jurema lia um texto para a Casa lotada. “Um alvoroço doido”. Para seu espanto e dos colegas, era a carta de renúncia do presidente Jânio Quadros.

“Foi uma decepção muito grande. Como é que o sujeito renuncia sem dar satisfação a ninguém?”, questiona. Para Esmerino, ninguém na festa, que teve início na noite do dia 24 e varou a madrugada, podia prever a atitude que Jânio Quadros estava prestes a tomar. Se estivesse na Casa no momento em que a carta chegou, ele acredita que teria mudado a história. “Se eu estivesse lá, tinha rasgado essa renúncia”, admite.

Hoje, com 89 anos, ainda ativo na política e prefeito licenciado de Granja, Esmerino tem suas teorias para explicar a atitude de Jânio. Para ele, tratou-se de uma tentativa fracassada de “golpe”.

Por dentro

Esmerino Arruda trabalhou na campanha do “Vassourinha” e sabia dos bastidores. Presidente e vice-presidente eram eleitos em votos diferentes. Oficialmente, Jânio declarava apoio a Milton Campos para ser seu vice. “Mas ele mandava a gente botar (apoio a João Goulart) por trás. Era Jan Jan, Jânio e Jango”, conta Esmerino, mostrando a foto do veículo usado na campanha com os nomes de Jânio Quadros e João Goulart como se formassem uma chapa única.


No entender de Esmerino, quando Jânio decidiu apoiar Jango como vice, já estava “maquinando” a renúncia. “Jango não tinha a simpatia dos militares e Jânio sabia que as forças armadas não o aceitavam. Ele fantasiou a renúncia achando que ninguém ia aceitar. Já fez isso de malandro”, interpreta Esmerino. João Goulart havia viajado para China. Seria o momento perfeito. Jânio imaginava que o povo e os militares não aceitariam sua renúncia e clamariam por sua volta. “Se voltasse, Jânio ia pedir plenos poderes”, especula Esmerino. Não foi o que aconteceu.

O presidente da Câmara dos Deputados, Ranieri Mazzili, assumiu a presidência. O povo também não reagiu. Segundo Esmerino, os militares dificultaram a entrada de João Goulart ao país, retardando sua posse.

Na sua lembrança, Jânio era um homem de grande autoridade, muito inteligente, falava corretamente o português, tinha o prestígio dos militares, mesmo que tivesse desagradado a classe quando condecorou Che Guevara e recebeu a visita de Fidel Castro. Tinha oscilações de humor. “Ele era uma pessoa estranha. Mudava da água pro vinho, coisa de doido”, ri.

Jânio foi vereador, deputado estadual, prefeito da maior cidade da nação, São Paulo, governador, deputado federal e chegou a presidente da República, num curto intervalo de tempo. Governou o país por apenas sete meses. No reencontro com Jânio, Esmerino não se satisfez com as explicações. “Falei com ele depois, mas ele não se justificava, sabe? Dizia que foi por forças ocultas. Mas isso não existia”, garante.


Lucinthya Gomes
lucinthya@opovo.com.br

(Publicado no Jornal O POVO, em 25.08.2011)

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